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Controle dos gastos com pessoal pelo Congresso Nacional

Controle dos gastos com pessoal pelo Congresso Nacional

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O exame de compatibilidade e adequação dos projetos de lei e medidas provisórias em tramitação no Congresso Nacional mostrou-se inovador nos anos noventa e hoje carece de aprimoramentos.

            Evolução histórico-constitucional do controle dos gastos com pessoal. Despesas obrigatórias e discricionárias. Relevância e mecanismos de controle dos gastos com pessoal no âmbito federal. LRF e LDO. Exame de compatibilidade e adequação dos projetos de lei e medidas provisórias em tramitação no Congresso Nacional. Controle jurisdicional das leis que infrinjam o art. 169 da Constituição. Aprimoramentos do sistema de controle de gastos com pessoal.


            Os gastos com pessoal, representando mais de 1/3 da receita corrente líquida da União, são suscetíveis de controle e adequação pelo Congresso Nacional? Que instrumentos estão disponíveis e passíveis de aprimoramento para tal controle? O controle desses gastos mostra-se um desafio inatingível no âmbito Legislativo?


RESUMO

            O artigo enfoca a evolução histórico-constitucional das infrutíferas tentativas de controle dos gastos com pessoal e os atuais mecanismos. A magnitude dos gastos com pessoal na União: mais de 35% de sua receita corrente líquida. Os mecanismos de controle dos gastos com pessoal na Lei de Responsabilidade Fiscal e no direito comparado norte-americano divergem, cada qual com suas fragilidades e inconsistências, em especial na distinção entre despesas obrigatórias e discricionárias e os diferentes mecanismos de controle: compensação e contingenciamento. Apesar de terem sido criados nas LDOs vários dispositivos de controle de tais gastos, identificam-se resistências da administração aliado à interferência corporativa que resultam em relativa ineficácia do controle prévio dos gastos com pessoal. O exame de compatibilidade e adequação dos projetos de lei e medidas provisórias em tramitação no Congresso Nacional mostrou-se inovador nos anos noventa e hoje carece de aprimoramentos. A interpretação pelo STF de que a inobservância do art. 169 pelos atos legais que criam despesas com pessoal gera mera suspensão da eficácia do dispositivo mitiga a cogência do instrumento constitucional. LDOs: foros adequados para os aprimoramentos do sistema de controle de gastos com pessoal.

            Propõe-se, como medida de planejamento e controle dos gastos com pessoal, a imediata instituição do Conselho Federal de Política de Administração e Remuneração de Pessoal, órgão suprapoderes e de natureza técnica, como previsto no caput do art. 39 da Constituição, decorrente da EC 19, de 1998, e nunca instituído. Criar-se-ia um foro para exame e avaliação dos inúmeros pleitos de forma sistemática e técnica, sem afastar a apreciação posterior pelas Casas do Congresso Nacional da conveniência e oportunidade das medidas propugnadas.


DA OPORTUNIDADE DO TEMA

            A interposição da ADIN nº 3.599-DF, em 17/10/2005, em face das Leis nº 11.169 e nº 11.170, publicadas no DOU de 5/9/05, por violação aos artigos 2°; 5°, caput; 37, X; 61, § 10, II, "a"; e 169, § 1°, todos da Carta da República, trouxe à baila questão tormentosa relacionada à sistemática de criação de obrigações para o Estado. No caso específico, trata-se da concessão de aumento, em 15%, na remuneração dos servidores da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, entre outras questões, sem a devida autorização nos termos do art. 169, § 1º, da Constituição.

            Provocou-se o controle concentrado e abstrato de normas em face da Constituição por argüir-se a inobservância, pelos diplomas legais supra, dos princípios constitucionais da isonomia, da iniciativa legislativa privativa e do equilíbrio orçamentário. Este estudo tem por escopo analisar, no âmbito maior da busca do equilíbrio orçamentário-financeiro estatal, a evolução da sistemática de controle dos gastos com pessoal em nível constitucional e legal. Afinal, as despesas com pessoal só encontram paralelo no horizonte dos gastos primários obrigatórios com os benefícios previdenciários e assistenciais do regime geral.

            A título de exemplo da relevância dos valores tem-se o PL 5.845/2005, que reestrutura as carreiras do Poder Judiciário da União e que possui o declarado impacto financeiro de R$ 4,9 bilhões. O real impacto só a efetiva implantação das folhas de pagamento dirá. Detalhe, hoje esse PL não possui qualquer dos requisitos exigidos pelo art. 169 da Constituição, autorização na lei de diretrizes orçamentárias ou dotação orçamentária.

            O fato não pode ser visto descolado do todo. O tema é recorrente no noticiário nacional, a exemplo da reportagem de capa da Folha de S. Paulo, de 16/4/2006, "Governo Lula criou 37,5 mil cargos públicos em 3 anos", onde identificam-se pontos marcantes do processo de geração de gastos com pessoal pela Administração federal. Mencionam-se os Estudos Técnicos do Ministério de Planejamento nº 82/06 e nº 85/06 com o seguinte excerto: "Quando cargos criados tiverem provimento autorizado, o processo deverá respeitar a prévia existência de recursos orçamentários destinados a tal finalidade". O líder da minoria na Câmara dos Deputados, Deputado José Carlos Aleluia, alerta :"O governo compromete o presente e o futuro. Está criando despesas vitalícias e de difícil reversão, que vão exigir uma carga tributária cada vez maior para serem sustentadas". Relevante ainda é o dado de que 74% dos cargos concursados criados nos três anos de Governo Lula foram criados por medida provisória, prática que não é inovação desse governo.


DA EVOLUÇÃO HISTÓRICO-CONSTITUCIONAL DO CONTROLE DOS GASTOS COM PESSOAL

            Perspicaz, senão irônica, a análise feita por João Barbalho (1992:130), Senador do Império e Deputado na Constituinte de 1891, sobre o art. 34, 25, da Constituição Federal de 1891, que atribuía privativamente ao Congresso Nacional a competência para "crear e supprimir empregos publicos federaes, fixar-lhes as attribuições, e estipular-lhes os vencimentos" ao afirmar:

            Finalmente, comprehende-se que, si isso ficasse ao executivo, a creação e remuneração dos cargos publicos mais facilmente obedeceriam aos interesses de clientela e espirito de corrilho, peste dos governo; e os empregos poderiam ser menos para o serviço publico que para pagar serviços de partido.

            A longínqua Constituição de 1934 já se preocupava com a geração de obrigações para o Estado, sem a correspondente fonte de financiamento, ao estatuir em seu art. 183: "Nenhum encargo se criará ao Tesouro sem atribuição de recursos suficientes para lhe custear a despesa."

            O reconhecimento da geração de despesas obrigatórias pela legislação permanente, que independam da lei orçamentária, viu-se presente na Constituição democrática de 1946, que em seu art. 73, § 2º, preceituava: "O orçamento da despesa dividir-se-á em duas partes: uma fixa, que não poderá ser alterada senão em virtude de lei anterior; outra variável, que obedecerá a rigorosa especialização."

            A Constituição de 1967, sintomaticamente, e em resposta aos desmandos orçamentário-financeiros vividos pela República no princípio dos anos 60, registrou explicitamente, pela primeira vez em um texto constitucional, o princípio do equilíbrio orçamentário formal: "Art 66 - o montante da despesa autorizada em cada exercício financeiro não poderá ser superior ao total das receitas estimadas para o mesmo período."

            A Magna Carta de 1967 ainda acresceu dispositivos visando assegurar o atingimento desse equilíbrio, prevendo formas embrionárias dos sistemas de compensação sistêmica (contingenciamento) e tópico (na própria norma), que só vieram a ser albergados pelo ordenamento muito depois na Lei Complementar nº 101, de 2000, Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em seus arts. 9º, 14 e 17. Assim, a compensação sistêmica do contingenciamento e tópica já eram previstas no art. 66, §§ 2º e 3º, diga-se, logo revogados pela EC nº 1 de 1969, nos seguintes termos:

            § 2º Juntamente com a proposta de orçamento anual ou de lei que crie ou aumente despesa, o Poder Executivo submeterá ao Poder Legislativo as modificações na legislação da receita, necessárias para que o total da despesa autorizada não exceda à prevista.

            § 3º Se no curso do exercício financeiro a execução orçamentária demonstrar a probabilidade de deficit superior a dez por cento do total da receita estimada, o Poder Executivo deverá propor ao Poder Legislativo as medidas necessárias para restabelecer o equilíbrio orçamentário.

            A preocupação do constituinte de 1967 com o equilíbrio de longo prazo fez com que fossem introduzidos limites aos gastos com pessoal no art. 66, § 4º: " A despesa de pessoal da União, Estados ou Municípios não poderá exceder de cinqüenta por cento das respectivas receitas correntes."

            Contudo, o axioma clássico de boa administração para as finanças públicas perdeu seu caráter absoluto, tendo sido abandonado pela doutrina o equilíbrio geral e formal, embora não se deixe de postular a busca de um equilíbrio dinâmico. Inserem-se neste contexto as normas que limitam os gastos com pessoal, agora sob a redação da Constituição cidadã de 1988, art. 169, ou a vedação à assunção de obrigações superiores às dotações orçamentárias e a realização de operações de créditos que excedentes às despesas de capital, art. 167, II e III, nos seguintes termos:

            II - a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais;

            III - a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta;

            Hoje não mais se busca o equilíbrio orçamentário formal, mas sim o equilíbrio amplo das finanças públicas, como ressalta Marcos Nóbrega (2002:32), ao analisar a LRF e o princípio do equilíbrio:

            O grande princípio da Lei de Responsabilidade Fiscal é o princípio do equilíbrio fiscal. Esse princípio é mais amplo e transcende o mero equilíbrio orçamentário. Equilíbrio fiscal significa que o Estado deverá pautar sua gestão pelo equilíbrio entre receitas e despesa. Dessa forma, toda vez que ações ou fatos venham a desviar a gestão da equalização, medidas devem ser tomadas para que a trajetória de equilíbrio seja retomada.


DAS DESPESAS OBRIGATÓRIAS E DO ENGESSAMENTO ORÇAMENTÁRIO

            O venerável mestre Aliomar Baleeiro (1968:426), já nos idos de 50, assinalava a profunda distinção, no âmbito das finanças públicas pátria, dos gastos fixos e dos variáveis, hoje classificados como obrigatórios e discricionários:

            Quanto às despesas, há que distinguir se são fixas ou variáveis. As primeiras só poderão ser alteradas por efeito de lei anterior, evidentemente porque resultam da execução da Constituição ou de leis, como os subsídios do Presidente da República e congressistas, vencimentos dos funcionários, obrigações da dívida pública etc. Nesses casos, os agentes públicos tem a sua competência vinculada. O Presidente da República incorrerá em crime de responsabilidade se suspender a realização de tais dispêndios. O próprio Congresso está vinculado e não poderá evadir-se do dever de incluí-las no orçamento.

            As despesas variáveis como simples autorizações, destituídas de amparo em lei, facultam a ação do Executivo até limite previsto. São créditos limitativos e não imperativos.

            Destarte, não direito subjetivo em favor das pessoas ou instituições as quais viriam a beneficiar - uma instituição de caridade, por exemplo, não terá ação em juízo para reclamar do Tesouro um auxilio pecuniário autorizado no Orçamento, mas que não foi objeto de concessão em lei. Fica ao discricionarismo administrativo do Presidente da República ou do Ministro de Estado ordenar ou não a efetivação do pagamento. Há, entretanto, quem sustente o contrário. Não houve, ainda, a propósito, pronunciamento de tribunais brasileiros. Fundamos nossa opinião na circunstância de ser o orçamento mero ato-condição e não lei.

            A sanção contra o Presidente da República, governador ou ministros que não realizam despesas variáveis autorizada pelo Parlamento é de caráter puramente político: o Congresso há de compeli-lo ao cumprimento de sua vontade pelas represálias no terreno das autorizações pedidas pelo Executivo. A supremacia do Congresso, por essa tática, tem como conseqüência transformar o regime presidencial em regime parlamentar. A evolução não é tão chocante, se nos recordarmos de que o parlamentarismo inglês, o mais perfeito de todos, provém da perseverança da Câmara dos Comuns contra reis insolentes.

            Assim, o processo orçamentário deve observar, além das vinculações de receitas, pelo lado da despesa, os compromissos assumidos pelo Estado por intermédio da legislação ordinária, como relações estatutárias e contratuais com seus servidores, a assunção de obrigações no âmbito do sistema financeiro (juros e amortização) ou decorrentes de decisões judiciais (precatórios), entre outros. Tais despesas são classificadas como despesas obrigatórias, ao lado das ditas despesas discricionárias, de cunho tipicamente orçamentário, como os investimentos.

            Como dito, as despesas obrigatórias têm o seu montante potencialmente determinado por disposições legais ou constitucionais, enquanto que as discricionárias são fixadas em conformidade com a disponibilidade de recursos financeiros. Essa distinção é fundamental no processo de fixação e acompanhamento do resultado primário.

            A LRF tornou obrigatório o estabelecimento de meta de resultado primário, a ser alcançado durante a execução do orçamento, e instituiu processo operacional de viabilização do cumprimento dessa meta fiscal, art. 9º: reavaliação bimestral das projeções de receitas e despesas e limitação de empenho, no denominado contingenciamento, instrumento de controle orçamentário que reduz temporária ou definitivamente o montante das autorizações de despesas constantes da lei orçamentária anual.

            Os gastos públicos são também classificados em financeiros, em sua maioria amortização e encargos da dívida, juros e financiamentos, e não-financeiros, os denominados gastos primários, dentre os quais destacam-se os dispêndios com pessoal, benefícios previdenciários e assistenciais, custeio da administração e investimentos. O resultado primário é encontrado da equação entre receitas primárias e despesas primárias.

            A limitação de empenho não pode ser aplicada a todas as ações governamentais. As despesas obrigatórias constituem valores que devem ser executados, não podendo ser reduzidos, mesmo no caso de ser necessária a redução geral de despesas como meio de se alcançar o resultado primário fixado na LDO. Além das ações que constituem obrigação legal ou constitucional da União, o § 2º do art. 9º da LRF exclui da aplicação daquele ajustamento as despesas que forem ressalvadas na lei de diretrizes orçamentárias.

            Assim, para fiscalizar a correta aplicação do processo de limitação de empenho, que abrangerá todos os Poderes e o Ministério Público, tornou-se necessário identificar quais ações constituem obrigação constitucional ou legal da União. Então, como distinguirmos nos dias atuais aquelas despesas obrigatórias vinculativas daquelas variáveis ou discricionárias?

            Na esfera federal desde a Lei 9.995/2000, LDO para 2001, em observância ao art. 17 da LRF, as leis de diretrizes orçamentárias contêm anexo que indicam o rol de despesas obrigatórias por força constitucional ou legal, incluindo outras não passíveis de contingenciamento, ainda que em sua origem discricionária.

            E as despesas obrigatórias não param de crescer absoluta e relativamente nos projetos de lei orçamentária: em 2004 representavam 87,4%; em 2005, atingiam 88,1%; e agora em 2006 chegam a 89% do total dos gastos primários do Governo Federal. Destaque para os gastos com benefícios previdenciários e com pessoal. Tais números significam que 9/10 dos gastos primários federais não passam pelo processo orçamentário tradicional, mas são por ele meramente chancelados, visto já terem sido criados por legislação permanente ou fixados pelas LDOs.

            Verifica-se que mais de 1/3 da receita corrente líquida da União [01] é destinada a gastos com pessoal como se verifica no quadro a seguir:

EVOLUÇÃO DAS DESPESAS COM PESSOAL E ENCARGOS SOCIAIS 2000 – 2006 em R$ ilhões
Ano Dotação Inicial Autorizado 1 Liquidado % exec. 2 RCL 5 % da RCL 6
2000 52.086,8 58.977,4 58.240,6 98,8 145.950,0 39,9
2001 59.483,7 65.949,8 65.449,4 99,2 167.739,0 39,0
2002 68.497,8 75.322,1 75.029,0 99,6 188.560,0 40,0
2003 77.046,2 79.301,1 78.974,7 99,6 198.835,0 39,7
2004 84.120,0 90.296,8 89.431,6 99,0 257.553,1 34,7
2005 98.109,6 101.679,3 94.068,5 4 92,5 278.930,0 33,7
2006 112.655,3 3 - - - 313.292,5 35,9

            Fonte: Siafi/Prodasen/STN.

            1. autorizado = dotação inicial + créditos adicionais;

            2. percentual de execução = liquidado/autorizado;

            3. previsão constante do Autógrafo da Lei Orçamentária para 2006.

            4. O baixo nível de execução em 2005 se deve ao fato de que a contribuição patronal não foi executada (despesas financeiras-RP=0).

            5. receita corrente líquida no autógrafo

            6. liquidado/receita corrente líquida


DOS MECANISMOS DE CONTROLE DE GASTOS COM PESSOAL NA LRF E NO DIREITO COMPARADO

            Até a LRF, várias tentativas de controle dos gastos com pessoal foram feitas ao longo dos anos 90 com a denominada Lei Camata I, (Lei Complementar nº 82, de 27/3/1995), revogada pela Lei Camata II (Lei Complementar nº 96, de 31/5/99), que foi revogada pela LRF, que, em seu art. 19, expressamente estatui a função de disciplinar os limites previstos no art. 169 da Constituição. Da simples fixação de limites por esfera da Federação passou-se com a LRF à segregação de tais limites por esfera em razão dos Poderes constituídos (arts. 19 e 20). Ademais, fixaram-se limites prudenciais e mecanismos de redução caso ultrapassados (arts. 22 e 23).

            O caput do art. 20 conceitua minudentemente o conceito de despesas com pessoal para fins da LRF, tendo inovado ao incluir os gastos com terceirização em seu parágrafo único, dificultando a burla aos limites por ela impostos. [02]

            O art. 21 da LRF decretou nulidade absoluta, juris et de jure, dos atos que criem despesa com pessoal sem a observância das exigências previstas em seus arts. 16 e 17 e nos arts. 37, XIII, e 169,§ 1º, ambos da Constituição. [03]

            O art. 16 da LRF volta-se para a criação de gastos no âmbito administrativo pelo gestor e o art. 17 da LRF destina-se ao processo legislativo ao conceituar despesa obrigatória de caráter continuado como sendo a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

            Ao apreciar as consequências da decretação da nulidade dos atos que infrinjam os dispositivos acima mencionados Maria Cristina Dourado (2001:263) faz as seguintes considerações:

            Do exposto, tem-se que, relativamente à nulidade dos atos, estatuída no art. 21 da Lei de Responsabilidade Fiscal, não se aplica o prazo decadencial de 5 (cinco) anos, nem são esses passíveis de convalidação.

            Outro aspecto interessante a abordar quanto à nulidade aqui tratada, consiste na verificação dos efeitos decorrentes da prática de tais atos.

            Com efeito, considerando, de um lado, a total vinculação da atividade administrativa aos princípios jurídicos, aqui particularmente aos da legalidade e da moralidade administrativa, traduzida na conduta de boa-fé e, de outro, o atributo da presunção de legitimidade que peculiariza o ato administrativo, resulta que, embora nulos, são reconhecidos os seguintes efeitos:

            a) os que atingem terceiros de boa-fé;

            b) os de natureza patrimonial correspondentes a despesas já realizadas ou prestações já incorporadas à Administração, realizadas por administrado de boa-fé, em atendimento ao próprio comando do ato.

            Nesse segundo caso, cumpre à Administração Pública efetivar as devidas indenizações, sob pena de estar a mesma se locupletando.

            Os atos que criarem ou aumentarem despesa obrigatória continuada deverão vir instruídos com a estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que entrar em vigor e nos dois seguintes, com demonstração de que não afetarão as metas fiscais (resultado primário), e deverão ter seus efeitos financeiros compensados, seja pela redução de despesa permanente seja pelo aumento de receita permanente, mediante, neste caso, elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, criação ou majoração de tributos. As medidas de compensação deverão integrar o ato que criou ou aumentou despesa obrigatória, o qual só entrará em vigor depois que entrarem em vigor as medidas de compensação.

            Assim, passa-se do controle genérico com limites amplos para os gastos com pessoal para o regime da compensação puntual e específica, verificável caso a caso, com a imediata compensação pela redução de despesas permanentes ou aumento de receitas permanentes.

            Como bem delineado por Wéder de Oliveira (2005:736), o regime de controle fiscal pela compensação específica estatuído pela LRF, apesar do modelo geral ter se inspirado no neozelandês da Fiscal Responsability Act, mostra traços semelhantes com as regras norte-americanas do "pay-as-you-go", ou "PAYGO".

            Esse modelo foi implantado nos Estados Unidos a partir de 1990 com a edição do Budget Enforcement Act (BEA), um conjunto de novas regras orçamentária, parte de um pacote de medidas que visava reduzir o crescente deficit norte-americano, entre as quais estava o processo PAYGO. Voltado para restringir futuras decisões orçamentárias do Congresso e do Presidente, o PAYGO requer que as legislações sobre receitas e despesas obrigatórias aprovadas no ano sejam, em seu conjunto, neutras quanto ao déficit orçamentário.

            A criação ou expansão de programas mandatórios ou a redução de tributos deve ser compensada por aumento em outras receitas, redução de despesas obrigatórias, ou ambos. Ocorre que no modelo norte-americano tal compensação não deve se dar necessariamente no projeto de lei que afeta o resultado fiscal mas no conjunto de gastos. Para Wéder de Oliveira esse conjunto poderia ser, em nosso modelo, representado pela margem de expansão das despesas obrigatórias. Ocorre, como reconhece o mesmo autor que ainda não dispomos de órgãos e procedimentos especializados na estimação do impacto e quantificação dessa margem, fazendo-se de forma apriorística e superficial.

            Nossos gastos com pessoal se assemelham aos "entitlements", como conceituado pelo "The Congressional Budget Act", de 1974, ou seja, são autorizações, por meio de lei, para efetuar pagamentos ou destinar recursos orçamentários a qualquer pessoa ou entidade governamental. Assim, a lei fixa não o montante de gastos a serem realizados, mas as condições que devem ser preenchidas pelos interessados para poderem exigir o bem, serviço, ou transferência de recursos.

            A nosso ver, os crescentes déficits norte-americanos põem em dúvida a eficácia do sistema de controle de gastos obrigatórios mencionado, fazendo crer que um procedimento genérico como o lá vigente está mais propenso a injunções de políticas conjunturais, como a Guerra no Iraque, do que subsistemas próprios e segregados, a exemplo do controle de gastos com pessoal adotado por nosso ordenamento.

            Apesar das várias proposições apresentadas ao Congresso Nacional propondo alterações nos critérios e limites para gastos com pessoal presentes na LRF, em regra os abrandando, até o presente nenhuma atingiu seu desideratum.


DA REGULAÇÃO PELAS LDOs DA CRIAÇÃO OU ALTERAÇÃO DOS GASTOS COM PESSOAL

            A Constituição de 1988, ao fixar em seu art. 169 a atribuição das LDOs de conterem a autorização para qualquer aumento de gasto direto com pessoal, exceto a revisão geral prevista no art. 37, X, transformaram-no no instrumento por excelência do controle dos gastos com pessoal. [04]

            Ocorre que, desde a Lei nº 9.995/2000 (LDO/2001), art. 62, tais autorizações vêm sendo remetidas a anexo da lei orçamentária anual, atualmente Anexo V – autorizações específicas de que trata o art. 169, § 1º, inciso II, da Constituição, relativas a despesas de pessoal e encargos sociais, conforme estabelece o art. 89 da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2006.

            Tal delegação legislativa, cuja constitucionalidade inicialmente chegou a ser questionada, mostrou-se com o tempo a mais adequada em razão de a apropriação dos recursos a serem futuramente alocados quando da aprovação da lei específica se dar melhor operacionalmente quando da discussão dos montantes disponíveis, o que só vem a ocorrer durante o processo orçamentário propriamente dito. Ainda que presente nas LDOs, os anexos com a margem para despesas obrigatórias de duração continuada mostraram-se, ao menos para as autorizações para gasto com pessoal, distantes no tempo e circunstância do debate orçamentário, tendo sido substituído pelo anexo da lei orçamentária.

            O mecanismo de preverem-se especificamente por Poder, órgão e carreiras, já na lei orçamentária anual, as alterações em termos orçamentário-financeiros da criação e/ou provimentos de cargos, empregos e funções, bem como ou provimento de cargos, empregos e funções, bem como admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, e as alterações de estrutura de carreiras e aumento de remuneração, mostrou-se eficaz pois os valores ali autorizados devem necessariamente ser compatíveis com as dotações presentes nos respectivos créditos orçamentários da mesma lei. Alterações do Anexo V ocorrem ao longo do exercício, tendo em 2005 sido apresentados três projetos de lei de alteração do Anexo V aumentando limites ali fixados.

            As LDOs têm criado progressivamente procedimentos visando dar transparência e confiabilidade às informações relativas aos gastos com pessoal, a exemplo de:

            1. fixação de limites para elaboração das propostas orçamentárias para os Poderes, em regra a folha de pagamento de abril do exercício vigente projetada com os acréscimos legais, com exceções expressas, a exemplo da revisão geral ou da justiça eleitoral em anos de eleições;

            2. publicação periódica de informações sobre os quantitativos e valores relativos a gastos com pessoal para todos os órgãos, inclusive demonstrativo dos saldos das autorizações para admissões ou contratações de pessoal a qualquer título prevista no art. 169,§1º, II, da Constituição;

            3. disposições sobre provimento de cargos e funções e realização de serviços extraordinários;

            4. exigências quanto aos projetos de lei relacionados a aumentos de gastos com pessoal e encargos sociais que deverão ser acompanhados de:

            I - declaração do proponente e do ordenador de despesas, com as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, conforme estabelecem os arts. 16 e 17 da Lei Complementar nº 101, de 2000;

            II - simulação que demonstre o impacto da despesa com a medida proposta, destacando ativos e inativos, detalhada, no mínimo, por elemento de despesa;

            III - manifestação, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, no caso do Poder Executivo, e dos órgãos próprios dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público da União, sobre o mérito e o impacto orçamentário e financeiro;

            IV - em se tratando de projetos de lei de iniciativa do Poder Judiciário e do Ministério Público da União, parecer sobre o mérito e o atendimento aos requisitos deste artigo, respectivamente, do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, de que tratam os arts. 103-B e 130-A da Constituição;

            5. previsão do Anexo da lei orçamentária para atendimento ao disposto no art. 169, § 1º, II, da Constituição;

            6. execução de despesas não previstas nos limites estabelecidos na LDO somente podendo ocorrer após a abertura de créditos adicionais para fazer face a tais despesas; e

            7. obrigatoriedade de os demais Poderes e o Ministério Público fornecerem dados à Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão para a unificação e consolidação das informações relativas a despesas de pessoal e encargos sociais e elaboração do demonstrativo da execução previsto art. 165, § 3º da Constituição.

            O PLDO/2007 inova ao reconhecer a necessidade do controle das despesas obrigatórias e determinar em seu art. 2º, §3, que: "as propostas de atos que resultem em criação ou aumento de despesa obrigatória de caráter continuado, entendida aquela que constitui ou venha a se constituir em obrigação constitucional ou legal da União, além de atender ao disposto no art. 17 da Lei Complementar no 101, de 2000, deverão, previamente à sua edição, ser encaminhadas aos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão e da Fazenda, para que se manifestem conjuntamente sobre a adequação orçamentária e financeira dessas despesas face ao disposto no § 2o deste artigo (redução das despesas correntes em 0,1% do PIB)". O autógrafo da LDO/2007 preserva a autonomia dos demais Poderes e sujeita o exame aos órgãos competentes desses Poderes.


DO EXAME DE COMPATIBILIDADE E ADEQUAÇÃO ORÇAMENTÁRIO-FINANCEIRA DA LEGISLAÇÃO PERMANENTE QUE CRIA OU AUMENTA GASTOS COM PESSOAL

            A análise de adequação e compatibilidade orçamentária e financeira realizada na Câmara dos Deputados consiste em verificar a conformidade da proposição legislativa com as leis orçamentárias previstas no art. 165 da Constituição Federal e com as normas pertinentes a elas e à despesa e receita públicas. Essa análise decorre da necessidade de observância do princípio de equilíbrio orçamentário acolhido pelo art. 167, II, III e V, da Carta Magna, pelo art. 7º, § 1º, da Lei nº 4.320/64 e pela LRF. Essa análise tem por finalidade preservar a programação de trabalho da União aprovada pelo Congresso Nacional e os compromissos relativos ao equilíbrio fiscal.

            Observamos não possuir o Senado Federal procedimento próprio ao exame de compatibilidade e adequação orçamentário-financeira das proposições relativas à legislação permanente, exceto nos casos das medidas provisórias, para as quais rege a Resolução nº 1/2002-CN.

            O exame de adequação e compatibilidade orçamentário-financeira da legislação permanente que veicula gastos com pessoal está prevista no art. 53, II, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD). Nos termos do art. 32, X, "h", é atribuição da CFT o exame dos aspectos financeiros e orçamentários públicos de quaisquer proposições que importem aumento ou diminuição da receita ou da despesa pública, quanto à sua compatibilidade ou adequação com o plano plurianual, a lei de diretrizes orçamentárias e o orçamento anual.

            O exame se dá antes da deliberação do Plenário da Casa ou independente de sua deliberação, quando dispensado, no caso de matérias que tramitem em caráter conclusivo pelas Comissões.

            O exame de compatibilidade verifica a conformidade da proposição legislativa com o Plano Plurianual (PPA), com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e com o Orçamento Anual (LOA) e com as normas pertinentes a eles e à receita e despesa públicas, em especial com a LRF. Já a adequação se dá em relação à existência dos recursos orçamentários exigidos pela proposição, verificado por seu impacto orçamentário-financeiro oriundo dos compromissos e obrigações gerados pelas disposições legais.

            O art. 54 do RICD fixa o caráter terminativo do parecer emitido pela CFT no tocante à incompatibilidade ou inadequação, significando que a incompatibilidade ou inadequação da proposição acarreta seu arquivamento, salvo recurso ao Plenário. A incompatibilidade ou inadequação orçamentária ou financeira pode ser saneada por meio de emenda. Se a emenda saneadora for aprovada pela CFT e incorporada em substitutivo, a matéria prosseguirá em seu curso normal. Mas, se for apresentada em Plenário, terá prioridade na votação (RICD, art. 145, § 1º), quando, em apreciação preliminar, o Plenário deliberará sobre a proposição somente quanto à sua adequação financeira e orçamentária.

            Desde 1996 vige a Norma Interna da CFT, que dispõe sujeitar-se ao exame qualquer proposição "que implicar aumento ou diminuição da receita ou da despesa da União ou que repercutir, de qualquer modo, sobre os respectivos orçamentos, sua forma ou seu conteúdo" (§ 2º, art. 1º, da NI-CFT), de conformidade com o art. 139, II, "b", do RICD. Esse dispositivo determina que apenas a proposição que "envolver aspectos financeiro ou orçamentário públicos" será distribuída à CFT por despacho do Presidente, para o exame da compatibilidade ou adequação orçamentária. Incluem-se no rol de proposições sujeitas ao exame as emendas apresentadas tanto nas Comissões como no Plenário da Câmara (art. 121 do RICD).

            A apreciação das Medidas Provisórias Congresso Nacional é normatizada pela Resolução nº 1, de 2002-CN. Seu art. 5º determina o exame de compatibilidade e adequação orçamentária e financeira no prazo de 14 dias pela Comissão Mista ad hoc; ocorre que em regra essa não chega a se reunir e o parecer de adequação é dado no Plenário das duas Casas. O art. 19 da Resolução nº 1/2002-CN também determina a elaboração de Nota Técnica pela Consultoria de Orçamentos da Casa a que pertencer o Relator, como subsídio para esse e a Comissão, em sua análise da compatibilidade e adequação das medidas propugnadas na MP, fazendo parte do processado. [05]


DO CONTROLE JURISDICIONAL DOS LIMITES FIXADOS PELO ART. 169 DA CONSTITUIÇÃO

            O Supremo Tribunal Federal tem entendido não serem passíveis de impugnação em sede de controle concentrado de constitucionalidade normas que infrinjam disposições constantes de leis de diretrizes orçamentárias por serem elas normas com efeitos concretos; sendo assim, a inobservância do art. 169 pela inexistência de autorização na LDO, ali exigida, não qualifica a infração como inconstitucionalidade direta. No caso, a afronta à Lex Legum dá-se de forma reflexa, atingindo indiretamente o mandamento constitucional, tratando-se sim de ilegalidade impeditiva da plena eficácia do diploma legal, superável por autorização legislativa superveniente. Tal posicionamento pode ser apreendido dos arestos a seguir, oriundos do Pleno do Excelso Pretório:

            O STF tem dado por inadmissível a ação direta contra disposições insertas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, porque reputadas normas individuais ou de efeitos concretos, que se esgotam com a propositura e a votação do orçamento fiscal v. g. (ADI 2.100, Jobim, DJ 01/06/01)." (ADI 2.535-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 21/11/03)

            Lei de diretrizes orçamentárias, que tem objeto determinado e destinatários certos, assim sem generalidade abstrata, é lei de efeitos concretos, que não está sujeita à fiscalização jurisdicional no controle concentrado." (ADI 2.484-MC, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 14/11/03)

            I. Despesas de pessoal: limite de fixação delegada pela Constituição à lei complementar (CF, art. 169), o que reduz sua eventual superação à questão de ilegalidade e só mediata ou reflexamente de inconstitucionalidade, a cuja verificação não se presta a ação direta; existência, ademais, no ponto, de controvérsia de fato para cujo deslinde igualmente é inadequada a via do controle abstrato de constitucionalidade.

            II. Despesas de pessoal: aumento subordinado à existência de dotação orçamentária suficiente e de autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias (CF, art. 169, parág. único, I e II): além de a sua verificação em concreto depender da solução de controvérsia de fato sobre a suficiência da dotação orçamentária e da interpretação da LDO, inclina-se a jurisprudência no STF no sentido de que a inobservância por determinada lei das mencionadas restrições constitucionais não induz à sua inconstitucionalidade, impedindo apenas a sua execução no exercício financeiro respectivo: precedentes." (ADI-MC 1585 / DF Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE Julgamento: 19/12/1997 Órgão Julgador: Tribunal Pleno.Publicação: DJ 03-04-1998)(grifamos)

            EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI CATARINENSE Nº 9.901, DE 31.07.95: CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EFETIVO DE FISCAIS DE TRIBUTOS ESTADUAIS E DE AUDITORES INTERNOS. ALEGAÇÃO DE QUE A EDIÇÃO DA LEI NÃO FOI PRECEDIDA DE PREVIA DOTAÇÃO ORCAMENTARIA NEM DE AUTORIZAÇÃO ESPECIFICA NA LEI DE DIRETRIZES ORCAMENTARIAS (ART. 169, PAR. ÚNICO, I E II, DA CONSTITUIÇÃO).

            1. Eventual irregularidade formal da lei impugnada só pode ser examinada diante dos textos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei do Orçamento Anual catarinenses: não se esta, pois, diante de matéria constitucional que possa ser questionada em ação direta.

            2. Interpretação dos incisos I e II do par. único do art. 169 da Constituição, atenuando o seu rigor literal: e a execução da lei que cria cargos que esta condicionada as restrições previstas, e não o seu processo legislativo. A falta de autorização nas leis orçamentárias torna inexequível o cumprimento da Lei no mesmo exercício em que editada, mas não no subsequente. Precedentes: Medidas Liminares nas ADIS n.s. 484-PR (RTJ 137/1.067) e 1.243-MT (DJU de 27.10.95). 3. Ação Direta de Inconstitucionalidade não conhecida, ficando prejudicado o pedido de medida cautelar. (ADI-MC 1428 / SC – Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA. Julgamento: 01/04/1996. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: DJ 10/5/1996.)(grifamos)


FECHO

            O tema controle de gastos com pessoal é extremamente sensível, tanto para o Estado, pela magnitude dos números e conseqüente repercussão nas contas públicas, quanto para os agentes públicos envolvidos, sejam políticos ou administrativos. Os interessados, em regra, são oriundos dos próprios órgãos detentores das dotações que servirão para financiar o gasto com prestações de natureza alimentar, portanto preferenciais e de caráter existencial. Como segundo maior item da despesa primária federal, logo após os benefícios previdenciários e assistenciais, os gastos com pessoal exigem um sistema de controle permanente e eficaz sob pena de fragilizar o regime de responsabilidade fiscal trazido pela LRF.

            O sistema de controle de gastos com pessoal adotado no art. 169 da Constituição, e materializado pela LRF, vem sendo aprimorado pelas subseqüentes leis de diretrizes orçamentárias. Ademais, há de ser restringido o uso de medidas provisórias para criação de cargos ou reestruturação de carreiras em razão do necessário planejamento que deve preceder tais alterações no perfil da administração de recursos humanos.

            Propõe-se, como medida de planejamento e controle dos gastos com pessoal, a imediata instituição do Conselho Federal de Política de Administração e Remuneração de Pessoal, órgão suprapoderes e de natureza técnica, como previsto no caput do art. 39 da Constituição [06], decorrente da EC 19, de 1998, e nunca instituído. Criar-se-ia um foro para exame e avaliação dos inúmeros pleitos de forma sistemática e técnica, sem afastar a apreciação posterior pelas Casas do Congresso Nacional da conveniência e oportunidade das medidas propugnadas.


BIBLIOGRAFIA

            BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das Finanças. Rio de Janeiro: Forense, 1968.

            BARBALHO, João. Constituição Federal brasileria: comentários por João Barbalho U.C. Ed. fac-similar. Brasília: Senado Federal, Secretaria de Documentação e Informação.1992

            DOURADO, Maria Cristina. Despesa com pessoal na Emenda Constitucional n° 19/98 e na Lei de Responsabilidade Fiscal. in: Aspectos relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal (coordenador Valdir de Oliveira Rocha). São Paulo: Dialética, 2001.

            NÓBREGA, Marcos. Lei de Responsabilidade Fiscal e leis orçamentárias. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira. 2002.

            OLIVEIRA, Wéder de. Lei de Responsabilidade Fiscal, margem de expansão e o processo legislativo federal. in: IX Prêmio Tesouro Nacional: coletânea de monografias. Brasília: ESAF, 2005.


NOTAS

            01 No caso da União, entende-se por receita corrente líquida o total da receita corrente deduzidas: i) as transferências constitucionais e legais a Estados, Distrito Federal e Municípios; ii) as receitas de contribuição para a Previdência Social provenientes do PIS/PASEP; iii) os valores correspondentes às despesas com o pagamento de benefícios do Regime Geral da Previdência Social; iv) despesas com previdência de servidores civis e militares. No caso dos Estados e Distrito Federal: o total da receita corrente deduzidas as transferências constitucionais e legais aos Municípios.

            02 Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

            § 1º Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como "Outras Despesas de Pessoal".

            03 Art. 21. É nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda:

            I - as exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei Complementar, e o disposto no inciso XIII do art. 37 e no § 1º do art. 169, da Constituição;

            II - o limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo.

            Parágrafo único. Também é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20

            04 Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

            § 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:

            I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;

            II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

            05 Art. 19. O órgão de consultoria e assessoramento orçamentário da Casa a que pertencer o Relator de Medida Provisória encaminhará aos Relatores e à Comissão, no prazo de 5 (cinco) dias de sua publicação, nota técnica com subsídios acerca da adequação financeira e orçamentária de Medida Provisória.

            06 Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HELENA, Eber Zoehler Santa. Controle dos gastos com pessoal pelo Congresso Nacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1140, 15 ago. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8805. Acesso em: 26 abr. 2024.