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Salvem Alice. Direito de imagem da criança e a necessidade de conscientização

Salvem Alice. Direito de imagem da criança e a necessidade de conscientização

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Chamou-me a atenção o noticiário em geral a respeito da mãe, da criança de nome Alice, que se encontrava revoltada com a utilização da imagem da sua filha em memes de cunho político e religioso. A criança ficou conhecida nas redes sociais pela correta pronúncia de palavras difíceis, tendo sido contratada para estrelar uma campanha publicitária juntamente com uma atriz de renome. E a partir disso a imagem da criança difundiu-se e passou a ser utilizada nos citados memes. Sem adentrarmos na discussão sobre a utilização de imagens de crianças expostas a exaustão em diversas redes sociais de forma não muito responsável, não sendo o objeto do presente artigo, importa tecer pontos cruciais a respeito da proteção da imagem no ambiente digital, em especial da criança e adolescente, ainda mais depois de ouvir em um programa de rádio que discutia o assunto, o seguinte argumento: caiu na internet, vira domínio público.. Não meu caro, não cai em domínio público! A discussão não encontra tamanha ausência de saliência (raso). A imagem, atributo da personalidade jurídica, irrenunciável, absoluto, vitalício e intransmissível, goza de proteção constitucional e legal, e a simples disponibilização da imagem em uma rede social ou em anúncio publicitário, não avaliza que terceiros não autorizados a utilizem ao seu bel prazer. A esse respeito a Constituição Federal: Art. 5º ()
X  São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação, e o Código Civil: Art. 20 - Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.. No caso em comento, a situação ganha maior complexidade por se tratar de criança, protegida pela Lei de nº 8.609/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seu art. 3º preceitua que: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.. Desta forma, a utilização da imagem da criança, assim como qualquer outra imagem, por qualquer meio ou por qualquer finalidade (ainda que em um, inocente meme) deve ser coibida, cessada e indenizada, pois há vasta proteção jurídica em nosso ordenamento jurídico. Ocorre que o lesado, ou seu representante legal no caso em que ensejou o presente artigo, no âmbito digital encontra enorme dificuldade, podendo dizer impossibilidade, na defesa do seu direito a imagem diante da vastidão da rede mundial de computadores. E isso nos leva a invocar o artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.. Trata-se assim de um dever de TODOS, a ser motivado e incentivado mediante campanhas de conscientização a respeito, tanto da exploração da imagem das crianças por seus pais e/ou responsáveis nas redes sociais, como da sua utilização indevida por terceiros, sem embargo das medidas judiciais a serem analisadas e efetivadas pelo Poder competente, objetivando que as imagens de crianças sejam utilizadas dentro do que preconiza a legislação, de forma coerente, razoável e sem prejuízo a criança, como a pequena Alice (e demais outras crianças), inocente, e única prejudicada em toda essa barbaridade.


Autor

  • Luciano Oliveira Delgado

    Pós-graduado em Direito Processual Civil (PUC/SP), com extensão em Propriedade Intelectual (CEU/SP); Direito de Energia (ESA/SP); Curso Geral de Propriedade Intelectual (OMPI), Direitos Autorais(FGV/RJ), Curso Básico de Propriedade Intelectual (Agência USPInovação/INPI), Curso Intermediário de Propriedade Intelectual (INOVAUnicamp/INPI).Diretor Acadêmico Adjunto do IASSA (Instituto dos Advogados de Sorocaba, Salto de Pirapora e Araçoiaba da Serra).Assessor Técnico da Secretaria da Administração da Prefeitura Municipal de Sorocaba-SP (2012/2014);

    Procurador-Geral Autárquico do SAAE – Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Sorocaba (2015/2016);

    Conselheiro Fiscal da Empresa Pública Municipal “Urbes Trânsito e Transportes” (2015/2016);

    Conselheiro Fiscal da Empresa Pública “Parque Tecnológico de Sorocaba” (2015/2016);

    Membro da Comissão de Loteamento do SAAE – Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Sorocaba (2015/2016);

    Membro da Comissão de Sindicâncias e PADs do SAAE – Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Sorocaba (2015/2016);

    Palestrante e autor de diversos artigos publicados em revistas especializadas.

    Autor colaborador do livro “Direitos Trabalhistas e Previdenciários dos Trabalhadores no Ensino Privado” com o capítulo: “Direito Autoral e de Imagem do Professor” sob a coordenação do Eminente Ministro do TST José Luciano de Castilho Pereira e publicado pela LTr. Autor colaborador do livro “Estudos de Combate a Pirataria, em homenagem ao Desembargador Luiz Fernando Gama Pellegrini”. Sob a coordenação do Professor Eduardo Salles Pimenta e publicado pela Editora Letras Jurídicas, com o capítulo: “Ótica Legal Acerca da Pirataria Musical”.

    Autor colaborador do livro “Direito Autoral Atual”. Sob a coordenação do Professor José Carlos da Costa Netto e publicado pela Editora Elsevier, com o capítulo “A Efetividade da Tutela do Art. 105 da Lei de nº 9.610/1998”.

    Área de atuação: Direito Civil, Propriedade Industrial, Direito Autoral e Conexos, Direito Contratual, Direito do Entretenimento, Direito Administrativo

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