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Garantia de indenidade do reclamante empregado, frente a represálias patronais, em face do Direito brasileiro

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04/07/2007 às 00:00
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VI - CONCLUSÕES

            Dos argumentos expostos, concluímos que no ordenamento brasileiro encontram-se normas que garantem a indenidade do trabalhador frente a represálias patronais pelo exercício do direito de ação contra esse mesmo empregador, pois entendimento em sentido diverso leva à dedução de que o direito brasileiro tolera o desrespeito a vários princípios constitucionais, sobretudo o desrespeito ao princípio da não discriminação, ao princípio da igualdade, ao princípio da dignidade da pessoa humana, e tolera a violação frontal de um dos fundamentos do Estado Brasileiro, o da cidadania. Se não há efetiva garantia de acesso ao Judiciário, por parte do trabalhador empregado, consagra-se, na prática, a existência de dois tipos de cidadãos, ou melhor, consagra-se a existência de uma sobrecidadania e uma subcidadania, [21] ferindo-se de morte a dignidade do trabalhador reduzido, neste aspecto, à condição de servo do patrão; faz-se tábula rasa do princípio republicano, que identifica a liberdade com ausência de dependência do indivíduo da vontade arbitrária de outros homens.

            Portanto, devem ser consideradas nulas quaisquer represálias tomadas pelo empregador contra o empregado que buscar o amparo do Judiciário, em contraposição ao seu patrão, visando a corrigir uma hipotética lesão ao seu direito, uma vez que tais atos patronais violam frontalmente os já referidos princípios constitucionais e o disposto no art. 9° da CLT, que comina nulidade de pleno direito aos atos destinados a desvirtuar, impedir ou fraudar os preceitos protetores do hipossuficiente. No caso de despedida, deve ser determinada a reintegração do empregado, com o conseqüente pagamento da remuneração do período que decorreu desde a data do afastamento até a reintegração, assegurando-se todos os demais direitos decorrentes do contrato de trabalho.

            Na construção da democracia que almejamos, como nação civilizada anelada, não podemos ter uma parcela significativa da nossa população à qual se confere certos direitos fundamentais, impossibilitada de exercê-los efetivamente por conta da vontade arbitrária de outrem. Opus iustitiae pax.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

            1 − Alonso, Diego Álvarez. La garantía de indemnidad del trabajador frente a represalias empresariales, 1ª edição, Albacete, Espanha: Editorial Bomarzo, 2005.

            2 − Barcellos, Ana Pula. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da diginidade da pessoa humana. Rio de Janeiro, Editora Renovar, 2002.

            3 – Barroso, Luiz Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito. Revista da Escola Nacional de Magistratura. Brasília, ano I, N° 2, p. 26 − 72. Outubro de 2006.

            4 − Berlin, Isaiah. Dos conceptos de liberdad y otros escritos, Madrid: Alianza Editorial, 2001.

            5 − Bobbio, Norberto e Viroli, Maurizio. Diálogo em torno da república, Rio de Janeiro: Editora Campus 2002.

            6 − Bonavides, Paulo. Curso de direito constitucional, 16ª edição, São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

            7 − Canaris, Caus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na Alemanha, "In:" Sarlet, Ingo Wolfgang. (Org.) Constituição, direitos fundamentais e direito privado, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2006. p. 225 – 245.

            8 − Cervantes, Miguel. Don Quijote, Madrid, Santillana Ediciones Generales, 2004.

            9 − Ferrajoli, Luigi. Los Fundamentos de los derechos fundamentales, Madrid, Editorial Trotta, 2001.

            10 − Houaiss, Antônio, Dicionário eletrônico da língua portuguesa, Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2001.

            11 − López, Manoel-Carlos Palomeque. Derecho del trabajo e ideologia, 6ª edição, Madrid: Editorial Tecnos, 2002.

            12 − Marques, José Frederico. Manual de direito processual civil, 2ª edição, São Paulo: Editora Saraiva, 1974.

            13 − Mello, Marco Aurélio de Faria. Óptica constitucional a igualdade e as ações afirmativas. Revista da Escola Nacional de Magistratura. Brasília, ano I, N° I, p. 82 − 91. Abril de 2006.

            14 − Neves, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil, 1ª edição, São Paulo, Editora Martins Fontes, 2006.


NOTAS

            01

Bobbio e Viroli, 2002, p. 16.

            02

Houaiss, 2001.

            03

Usamos normas no sentido de regras positivadas, não sendo relevante, para os propósitos do texto, a distinção entre regra e princípio.

            04

Barroso, 2006, p. 37, na nota 25 afirma que há princípios que não são direitos fundamentais como os da livre iniciativa.

            05

Mello, 2006, p. 86.

            06

Bonavides, 2005, p. 632.

            07

Ana Paula Barcelos, 2002, p. 305, inclui o acesso à justiça dentro do mínimo existencial que compõe a dignidade da pessoa humana.

            08

Marques, 1974, p. 71.

            09

É desse tipo de liberdade que trata esta famosa passagem de Don Quijote: "La libertad, Sancho, es uno de los más preciosos dones que a los hombres dieron los cielos; con ella no pueden igualarse los tesoros que encierra la tierra ni el mar encumbre; por la libertad así como por la honra se puede y debe aventurar la vida". Cervantes, 2004, p. 984 – 985.

            10

Berlin, 2001, p. 47 e 48.

            11

Berlin, op. Cit., p. 59.

            12

Canaris, 2006, p. 241 e 242.

            13

Acórdão da 5ª T. Proc: RR N°: 726101 ano: 2001, Publicado no: DJ - 06/02/2004, Rel. Min. Rider Nogueira de Brito.

            14

Ferrajoli, 2001, p. 26, discorda da existência de normas meramente programáticas e entende que um direito fundamental positivado, sem a correspondente garantia provoca uma lacuna no ordenamento jurídico que cumpre ao legislador colmatar.

            15

O TST, no Recurso de Revista número 592182/99, julgado em 18/04/2007 e publicado no DJ - 04/05/2007, confirmou decisão que anulou uma dispensa imotivada, por dois fundamentos, um deles por considerar que esta dispensa se deu por motivo discriminatório em razão de ter o empregado ajuizado, anteriormente, reclamação contra a empresa, uma vez que a dispensa por motivo de regular exercício do direito de ação não observa elemento essencial e desrespeita a Constituição.

            16

López, 2002, p. 44.

            *

Em suma, o direito fundamental à tutela judicial efetiva, consagrada pelo art. 24. 1 da Constituição espanhola restaria privado, no essencial, de sua eficácia se a proteção que confere não incluísse as medidas que pode chegar a adotar um empresário, como reação repressiva frente a uma ação judicial exercida por um empregado ante os tribunais. O temor a tais medidas poderia dissuadir aos trabalhadores de fazer valer seus direitos e, portanto, por em grave perigo a consecução do objetivo perseguido pela consagração constitucional da efetividade da tutela judicial, dissuadindo aos trabalhadores de fazer uso de seu direito à proteção jurisdicional perante os órgãos do Poder Judicial.

            *

* há de concluir-se que o despedimento do trabalhador que buscou o amparo judicial se conectava diretamente com uma atuação tendente a impedir o processo, o que, nos termos antes assinalados, constitui uma vulneração da garantia de indenidade contrária ao art. 24. 1 da Constituição espanhola. (tradução livre, do autor do presente texto)

            17

Disponível em www.tribunalconstitucional.es.

            18

Alonso, 2002, p. 9.

            19

Barroso 2006, p. 49.

            20

Alonso, op. cit., p. 10.

            21

Neves, 2006, p. 248/9 afirma: "Para os subintegrados (subcidadãos) os dispositivos constitucionais têm relevância quase exclusivamente em seus efeitos restritivos de liberdade. Os direitos fundamentais não desempenham nenhum papel significativo no seu horizonte de agir e vivenciar, inclusive no concernente à identificação de sentido das respectivas normas constitucionais".
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Sobre o autor
Eduardo Sérgio de Almeida

juiz do Trabalho da 13ª Região, pós-graduado em Filosofia e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, doutorando pela Universidade Castilla La-Mancha em Ciudad Real (Espanha)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Eduardo Sérgio. Garantia de indenidade do reclamante empregado, frente a represálias patronais, em face do Direito brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1463, 4 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10095. Acesso em: 6 mai. 2024.

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