Súmula vinculante e fontes do direito

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Importante frisar que a lei é a principal fonte formal do Direito e que o fato de ter sido incluída em nosso ordenamento jurídico a figura da súmula vinculante não a qualifica como fonte formal imediata do Direito. Foi estabelecida em nosso sistema jurídico pela Emenda Constitucional nº 45/2004 (art.103-A da Constituição Federal) que dispõe sobre seus pressupostos de validade e formalização.

O caráter geral e abstrato das súmulas é relativizado, pois tais atos não podem substituir a função precípua do Poder Legislativo. São instrumentos que norteiam a uniformização da aplicabilidade da lei. Não é um ato normativo propriamente dito, pois, derivadas as súmulas de ocorrências fatídicas e decisões corriqueiras baseadas na lei que possuem pressupostos de validade para sua edição – regras estabelecidas na lei e na Constituição.

Assim, as súmulas não são instrumentos autônomos de regulamentação ao ponto de inovar o ordenamento jurídico. A Súmula Vinculante definitivamente não pode ser qualificada como fonte primária e formal do Direito, caso em que estaria a Constituição atribuindo ao Poder Judiciário a função de legislador, se não fosse suficiente a errônea interpretação já feita pelo próprio Judiciário quanto aos limites do ativismo, principalmente por parte da Suprema Corte – que se perfaz em arbítrios e inconstitucionalidades corriqueiras.

O STF não possui legitimidade eleitoral democrática e nem possui força superior aos demais para que seja assim denominado de Poder Moderador.

No Estado de Direito a lei deve prevalecer como instrumento indispensável ao controle de excessos por parte dos Poderes, autoridades ou mesmo agentes privados.

A segurança jurídica possui íntima afinidade com o princípio da legalidade, principalmente por constar em vários preceitos constitucionais a exigência de lei para regulamentar ações, relações, criar entidades, órgãos, cargos, viabilizar a tipificação criminal e administrativa, enfim, objetivando limitar o arbítrio do Estado e dos Poderes constituídos, inclusive do Poder Judiciário no exercício da função jurisdicional (inciso II do art. 5º da CF/88).

O art. 926 do Código de Processo Civil – com o fito de resguardar a segurança jurídico-normativa limita o Poder Judiciário – incluindo o STF – ao estabelecer que os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. A relação com os fatos e competências jurisdicionais é indispensável, pois ao editar súmula (incluindo a vinculante), os tribunais deverão observar as circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram a sua edição – limites de suas competências constitucionais e legais.

Posicionamo-nos mais uma vez no sentido de que a súmula vinculante deve ser tida como instrumento de limite do ativismo judicial, tanto que – acreditamos tratar-se de uma regra que limita a cognoscibilidade dos juízos de primeiro, segundo e terceiro graus – o inciso II do art. 927 do Código de Processo Civil é expresso quanto a obrigatoriedade dos juízes e tribunais em observar os enunciados de súmula vinculante. É o suficiente.

Juízes, Tribunais, órgãos do Poder Legislativo e Executivo não deverão observar súmulas vinculantes que não tenham sido tecidas conforme os pressupostos constitucionais para sua criação e nem aquelas que são flagrantemente inconstitucionais – como as que estão fora da alçada de competência do STF.

A Constituição norteia os pressupostos determinantes para que o STF possa produzir os textos pacificadores da jurisprudência constitucional, que deve observar algumas exigências para impulsionar o procedimento de criação de uma súmula vinculante:

a)     A aprovação da súmula deve ocorrer por decisão de 2/3 dos seus Ministros;

b)     Indispensável que previamente ao intuito de elaboração, como pressuposto, que o tema por ela tratado decorra de reiteradas decisões sobre matéria exclusivamente de natureza constitucional;

c)     Ser publicada na imprensa oficial para ter validade e eficácia;

d)     A eficácia possui efeito erga omnes;

e)     A Súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas controvertidas que acarretam insegurança jurídica. Deve-se entender como uma espécie de controle judicial da segurança jurídica das leis – uniformidade hermenêutica.

A junção da Súmula Vinculante com o ativismo judicial tem corroborado para episódios de crise institucional.

Não cabe ao judiciário a função de poder moderador a macular o princípio da Separação dos Poderes, fazendo às vezes dos demais usurpando competências preponderantes e específicas.

Os únicos órgãos efetivamente políticos, e que possuem legitimidade democrática são o Legislativo e o Executivo, onde o primeiro legisla e fiscaliza e o segundo Governa, Administra e executa.

Regulamenta o instituto jurídico da “Súmula Vinculante” constante no art. 103-A da Constituição Federal a Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de 2006.

Para encerrar o argumento sobre a inviabilidade de tê-las como fontes formais, o § 1º do art. 2º da Lei nº 11.417/06 dispõe sobre os seus limites determinando o seu conteúdo. A Lei em comento disciplina a edição, revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo STF.

O procedimento para formalização ou edição de uma súmula vincula tem como pressuposto fático-jurídico “reiteradas decisões sobre matéria constitucional” e, dentro desse contexto, a súmula deverá se limitar à “validade, intepretação e a eficácia de normas determinadas” e que tais normas sejam ou tenham sido objeto de “controvérsias reiteradas que acarretam insegurança jurídica”.

A súmula não tem o condão de inovar no ordenamento jurídico – por isso não pode ser considerada uma fonte formal imediata. Além, não o deveria o ativismo judicial, que tem, contrariamente a separação dos poderes, criado regras de conduta para serem aplicadas aos casos sob apreciação. Estamos nos referindo à irregular criação de regras por parte do STF e não a possibilidade jurídico-normativa de aplicar regras em conciliábulo normativo ou valendo-se da unidade e sistematização do ordenamento.

Retornando ao procedimento de edição da Súmula Vinculante, o início dar-se-á de ofício ou por provocação (legitimados). O membro do Ministério Público junto ao STF (PGR), quando não der início ao procedimento como legitimado, sempre irá se manifestar previamente sobre a edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante.

No que se refere ao quórum de aprovação, a lei determina que a decisão seja tomada por dois terços dos membros da Corte (mínimo de oito membros) em sessão plenária e, aprovado o texto, no prazo de 10 (dez) dias após a sessão em que editar, rever ou cancelar enunciado de súmula com efeito vinculante, o Supremo Tribunal Federal fará publicar, em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União, o enunciado respectivo.

Conforme o art. 3º da Lei nº 11.417/06 são legitimados a propor a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da República; V - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VI - o Defensor Público-Geral da União; VII – partido político com representação no Congresso Nacional; VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; IX – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; e, XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.

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A Lei, em respeito à isonomia dos entes federativos viabiliza que o Município proponha, incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo.

Admite-se manifestação de terceiros em questões específicas.

Apesar da redundância, não deixa de ser importante fazer referência expressa ao conteúdo do Regimento Interno do STF sobre a Súmula Vinculante, pois alguns aspectos do processo administrativo interno e dos órgãos responsáveis pela tramitação da proposta transparecem.

O art. 354-A determina que: “Recebendo proposta de edição, revisão ou cancelamento de Súmula Vinculante, a Secretaria Judiciária a autuará e registrará ao Presidente, para apreciação, no prazo de 5 (cinco) dias, quanto à adequação formal da proposta – análise dos requisitos formais. No caso de adequação, a Secretaria Judiciária publicará edital no sítio do Tribunal e no Diário da Justiça Eletrônico, para ciência e manifestação de interessados no prazo de 5 (cinco) dias, encaminhando a seguir os autos ao Procurador-Geral da República.

Após análise pelo PGR – que deve abranger os requisitos constantes na Constituição e na Lei – este devolverá os autos ao Presidente que submeterá as manifestações e a proposta de edição, revisão ou cancelamento de Súmula aos Ministros da Comissão de Jurisprudência, em meio eletrônico, para que se manifestem no prazo comum de 15 (quinze) dias; decorrido o prazo, a proposta, com ou sem manifestação, será submetida, também por meio eletrônico, aos demais Ministros, pelo mesmo prazo comum.

Após, o Presidente submeterá a proposta à deliberação do Tribunal Pleno, mediante inclusão em pauta, salvo se já houver manifestação contrária à proposta por parte da maioria absoluta dos Ministros do Tribunal, hipótese em que o Presidente a rejeitará monocraticamente. Contra a decisão do Presidente pela rejeição de proposta atinente a súmula vinculante caberá agravo regimental[1], na forma do art. 317 do regimento.

Pensamos que o art. 354-E do Regimento Interno seja inconstitucional, pois alarga o objeto ou mesmo o fundamento para a edição de uma Súmula, qual seja o fato de a justificativa se basear sobre questão com repercussão geral reconhecida (muitas vezes não relaciona aos pressupostos para a edição do instituto), caso em que poderá ser apresentada por qualquer Ministro logo após o julgamento de mérito do processo, para deliberação imediata do Tribunal Pleno na mesma sessão.

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O teor da proposta de Súmula aprovada, que deve constar do acórdão, conterá cópia dos debates que lhe deram origem, integrando-o, e constarão das publicações dos julgamentos no Diário da Justiça Eletrônico.

A proposta de edição, revisão ou cancelamento de Súmula tramitará sob a forma eletrônica, e as informações correspondentes ficarão disponíveis aos interessados no sítio do STF.

Por derradeiro, a súmula terá efeito erga omnes e vinculante sobre o judiciário e os órgãos da administração pública e, em caso de descumprimento caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação, que serão instrumentos subsidiários, já que a lei exige o esgotamento das instâncias administrativas: “Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das vias administrativas”. O êxito na Reclamação resultará na anulação do ato administrativo ou cassação da decisão judicial.



[1] Art. 317. Ressalvadas as exceções previstas neste Regimento, caberá agravo regimental, no prazo de cinco dias de decisão do Presidente do Tribunal, de Presidente de Turma ou do Relator, que causar prejuízo ao direito da parte. § 1º A petição conterá, sob pena de rejeição liminar, as razões do pedido de reforma da decisão agravada. Art. 315, caput — 137 — § 2º O agravo regimental será protocolado e, sem qualquer outra formalidade, submetido ao prolator do despacho, que poderá reconsiderar o seu ato ou submeter o agravo ao julgamento do Plenário ou da Turma, a quem caiba a competência, computando-se também o seu voto. § 3º Provido o agravo, o Plenário ou a Turma determinará o que for de direito. § 4º O agravo regimental não terá efeito suspensivo. § 5º O agravo interno poderá, a critério do Relator, ser submetido a julgamento por meio eletrônico, observada a respectiva competência da Turma ou do Plenário. (Incluído pela Emenda Regimental n. 51, de 22 de junho de 2016).

 

Sobre o autor
David Augusto Souza Lopes Frota

DAVID AUGUSTO SOUZA LOPES FROTA Advogado. Servidor Público Federal. Pós-graduado em Direito Tributário. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Licitações Públicas. Especialista em Servidores Públicos. Foi analista da Diretoria de Reconhecimento Inicial de Direitos – INSS – Direito Previdenciário. Foi analista da Corregedoria Geral do INSS – assessoria jurídica e elaboração de pareceres em Processos Administrativos Disciplinares - PAD. Foi Analista da Diretoria de Recursos Humanos do INSS - Assessor Jurídico da Coordenação de Recursos Humanos do Ministério da Previdência Social – Lei nº 8.112/90. Chefe do Setor de Fraudes Previdenciárias – Inteligência previdenciária em parceria com o Departamento de Polícia Federal. Ex-membro do ENCCLA - Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Ministério da Justiça. Convidado para ser Conselheiro do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS. Convidados para atuação junto ao Grupo Responsável pela Consolidação dos Decretos Federais da Presidência da República. Assessor da Coordenação Geral de Recursos Logísticos e Serviços Gerais do MPS - COGRL. Elaboração de Minutas de Contratos Administrativos. Elaboração de Termos de Referência. Pregoeiro. Equipe de Apoio. Análise das demandas de controle interno e externo do MPS. Análise das demandas de Controle Interno e Externo do Ministério da Fazenda - SPOA. Assessor da Coordenação Geral do Logística do Ministério da Fazenda - CGLOG – SPOA. Assessor da Superintendência do Ministério da Fazenda no Distrito Federal - SMF-DF. Membro Titular de Conselho na Secretaria de Direitos Humanos para julgamento de Processos. SEDH. Curso de Inteligência na Agência Brasileira de Inteligência - ABIN. Consultoria e Advocacia para prefeitos e demais agentes políticos. Colaborador das Revistas Zênite, Governet, Síntese Jurídica, Plenus. Coautor de 3 livros intitulados "O DEVIDO PROCESSO LICITATÓRIO" tecido em 3 volumes pela editora Lumen Juris.

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