Capa da publicação Autoridades sujeitas ao controle do Legislativo: possível inconstitucionalidade em Juiz de Fora
Capa: DepositPhotos

Uma possível inconstitucionalidade do art. 24 da Lei Orgânica do Município de Juiz de Fora

Exibindo página 2 de 2
Leia nesta página:

6. Análise da jurisprudência do STF, do TJMG e dos legitimados para propor ADI Estadual

6.1. ADI nº 5.289 e da ADPF nº 723

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.289, o Supremo Tribunal Federal entendeu o seguinte: “É incompatível, com o modelo previsto no artigo 50 da Constituição Federal, a ampliação, pelo constituinte estadual, do rol de autoridades sujeitas à fiscalização do Poder Legislativo.”8

Conforme foi decidido pelo STF, a ampliação das autoridades sujeitas à fiscalização do Poder Legislativo é inconstitucional. Sendo assim, dada a natureza subsidiária da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, o STF na ADPF nº 723 prevê que se uma lei municipal violar ao mesmo tempo a Constituição Federal e a Constituição do Estado, a lei deverá ser objeto de Representação de Inconstitucionalidade, no controle concentrado estadual, com base no art. 125, §2º, da CF/88.

AGRAVO REGIMENTAL EM ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. LEI MUNICIPAL QUE INSTITUI FERIADO. ALEGAÇÃO DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. NORMA DE REPRODUÇÃO OBRIGATÓRIA. PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE. INOBSERVÂNCIA. CABIMENTO DE ADI ESTADUAL. DESPROVIMENTO. 1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal exige a aplicação do princípio da subsidiariedade às ações de descumprimento de preceito fundamental (art. 4º, §1º, da Lei 9.882/1999), configurado pela inexistência de meio capaz de sanar a controvérsia de forma geral, imediata e eficaz no caso concreto. Precedentes. 2. A impugnação da norma municipal que desafia tanto o texto federal quanto o estadual, pode ser feita perante o Tribunal local por meio do ajuizamento de ação de controle concentrado. Ausente o requisito da subsidiariedade. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido.

(ADPF 723 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 08/04/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 15-04-2021 PUBLIC 16-04-2021)

6.2. Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

De acordo com os precedentes do STF, o TJMG já julgou pela inconstitucionalidade de outras leis orgânicas que traziam o mesmo dispositivo analisado no presente artigo, acerca da possibilidade de convocar o Chefe do Executivo Municipal para prestar esclarecimentos, vejamos:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE RESSAQUINHA/MG - CONVOCAÇÃO DE PREFEITO PELA CÂMARA MUNICIPAL PARA PRESTAÇÃO DE ESCLARECIMENTOS - OFENSA AO DISPOSTO NOS ARTS. 6º E 54, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, OS QUAIS SÃO DE OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA PELOS MUNICÍPIOS, EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DA SIMETRIA, CONFORME PRECEITUA A ART. 165, §1º, TAMBÉM DA CEMG - PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Incorre em inconstitucionalidade a Lei Orgânica do Município de Ressaquinha ao prever, no seu art. 51, XIII, a possibilidade de a Câmara Municipal convocar o Prefeito para prestar esclarecimentos, aprazando dia e hora para comparecimento e assunto a ser tratado, o que representa ofensa ao princípio constitucional da separação de poderes. Representação julgada procedente.

(TJMG - Ação Direta Inconst 1.0000.14.080868-4/000, Relator(a): Des.(a) Corrêa Camargo, ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 11/05/2016, publicação da súmula em 25/05/2016)

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Orgânica Municipal. Convocação do Prefeito pela Câmara. Infração político- administrativa. Previsão que afronta ao modelo contido na Carta Estadual e na Constituição da República. Violação ao princípio da separação de poderes. Representação acolhida em termos.

(TJMG - Ação Direta Inconst 1.0000.07.460247-5/000, Relator(a): Des.(a) Herculano Rodrigues, CORTE SUPERIOR, julgamento em 09/07/2008, publicação da súmula em 05/09/2008)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI MUNICIPAL - CONVOCAÇÃO PELA CÂMARA MUNICIPAL DO CHEFE DO EXECUTIVO PARA PRESTAR ESCLARECIMENTOS EM DIA E HORA APRAZADOS PARA O ATO - INCONSTITUCIONALIDADE - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA E HARMONIA DOS PODERES PREVISTO NO ART. 173 DA CONSTITUIÇÃO MINEIRA. V.V.P.

(TJMG - Ação Direta Inconst 1.0000.07.466738-7/000, Relator(a): Des.(a) Antônio Carlos Cruvinel , Relator(a) para o acórdão: Des.(a) Wander Marotta , CORTE SUPERIOR, julgamento em 24/02/2010, publicação da súmula em 21/05/2010)

6.3. Legitimidade ativa para propor Ação Direta de Inconstitucionalidade Estadual

De acordo com o art. 125, §2º, da CF/88, as Constituições Estaduais poderão atribuir os legitimados livremente, sendo vedado atribuir a legitimidade a um único órgão.

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.

§2º Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais e municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão.

E nesse sentido, a Constituição do Estado de Minas Gerais, em seu art. 118, incisos I a VIII, o rol de autoridades com legitimidade para propor a ADI Estadual, vejamos:

Art. 118 – São partes legítimas para propor ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade:

I – o Governador do Estado;

II – a Mesa da Assembleia;

III – o Procurador-Geral de Justiça;

IV – o Prefeito ou a Mesa da Câmara Municipal;

V – o Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado de Minas Gerais;

VI – partido político com representação na Assembleia Legislativa do Estado;

VII – entidade sindical ou de classe com base territorial no Estado;

VIII – a Defensoria Pública.

Logo, o controle de constitucionalidade concentrado estadual, só poderá ser ajuizado pelos legitimados supracitados.


7. Conclusão

Diante do exposto, há um possível vício de inconstitucionalidade no artigo 24 da Lei Orgânica do Município de Juiz de Fora/MG, uma vez que o Poder Legislativo só pode convocar para esclarecimentos aquelas autoridades subordinadas ao Chefe do Executivo, sendo possivelmente inconstitucional a convocação do próprio Chefe do Executivo, em nome do princípio da simetria, bem como a separação dos Poderes.

Justicia, a inteligência artificial do Jus Faça uma pergunta sobre este conteúdo:

Além do mais, a doutrina, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, apontam que a ampliação do rol das autoridades sujeitas à fiscalização do Poder Legislativo se deu de maneira inconstitucional.


Referências

BERNARDES, J. T.; In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto. Direito constitucional: organização do Estado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante nº 46 e na Súmula nº 722. Brasília, DF.

DALLARI, D.; In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto. Direito constitucional: organização do Estado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

FILHO, M. G. F.; In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto. Direito constitucional: organização do Estado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

JUIZ DE FORA. Lei orgânica do Município de Juiz de Fora: promulgada em 30 de abril de 2010 / Câmara Municipal de Juiz de Fora. – Juiz de Fora (MG) : Câmara Municipal, 2010.

MINAS GERAIS. Constituição (1989). Constituição do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, 1997.

MASSON, N. Manual de direito constitucional / Nathalia Masson – 8. ed. rev. ampl. e atual. – Salvador: JusPODVM, 2020.

LENZA, P.; Direito constitucional esquematizado. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

SILVA, J. A.; In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto. Direito constitucional: organização do Estado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.


Notas

  1. Lenza, 2015, p. 504

  2. Lenza, 2015, p. 514

  3. Masson, 2020, p. 155

  4. Masson, 2020, p. 155

  5. Masson, 2020, p. 153

  6. Bernardes, 2012, p. 116

  7. Silva, 2011, p. 595

  8. ADI 5.289, rel. min. Marco Aurélio, j. 7-6-2021, P, DJE de 18-8- 2021.

Assuntos relacionados
Sobre os autores
Luis Guilherme Fonseca Ferreira

Graduado em Direito na Universidade Salgado de Oliveira, Juiz de Fora.

Valeria Toschi Valerio

Graduada em Letras pela Universidade Federal de Juiz de Fora; Graduanda em Direito na Universidade Salgado de Oliveira, Juiz de Fora.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos