A Nova Lei de Licitações e Contratos e os Fatores Críticos nas Obras

13/10/2023 às 19:11
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A NOVA LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS E OS FATORES CRÍTICOS NAS OBRAS

O dia em que a Lei nº 14.133/2021 passa a ser Norma Geral e única possível de aplicação está a chegar. É imprescindível analisar os fatores críticos que se avizinham pelos que dela farão uso.

INTRODUTÓRIO

A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos é lei posta, sancionada e vigente desde 01/04/2023 e, ainda em regra, sequer utilizada!

O que está acontecendo? A pergunta se tornou o despertar deste artigo aos que se relacionam com esta temática: Obras Públicas.

Não nos esqueçamos, trata-se de mudanças e estas sempre possuem resistências das mais diversas, apesar de, nos últimos anos, a Lei nº 8.666/93 ter sido por muitos (que não me incluo) apedrejada como imprestável e causa de diversos problemas.

Por essa dissonância (utilizar ou não a nova Lei), entendo oportuno neste momento aprofundar tal assunto em alguns pontos críticos na expectativa, não de esgotar o debate, mas sim de forma objetiva trazer à baila o quanto se faz necessário e urgente estabelecer linhas de entendimentos e soluções a fim de não provocar transtornos maiores nesta transição que é complexa e que irá em pouco tempo se tornar obrigatória.

Não é a Lei que queríamos, ou melhor, não existe norma perfeita, mas existem significativos avanços, dentre eles, o foco no planejamento e na fase preparatória, PNCP, COMPIANCE, BIM, dentre vários outros. Acrescento ainda a forma abrangente da Lei, não só por tudo que tenha a ver com as aquisições (licitações, dispensas, inexigibilidades etc.), mas também por incluir ainda as nomas de contratações, gestão, fiscalização, condutas, punibilidades e ações das necessárias fiscalizações pelos Órgãos de Controle.

Assim, a Nova Lei é por demais extensa e formalista (são 194 artigos com muitos incisos, alíneas e parágrafos), principalmente no cumprir para as Administrações de pequeno porte como as municipais, e encontrar soluções ou entendimentos, pelo menos para esses pontos críticos que são intrigantes e afetam diretamente as obras públicas, é o objetivo destes escritos.

1º PONTO – LEILÃO DE MENOR PREÇO PARA LICITAÇÕES DE OBRA

Não adianta tratar o tema de outra maneira, pois é isto com todas as letras que a Nova Lei prescreveu!

De forma a apresentar objetivamente esse ponto crítico vamos na sequência esmiuçar o conteúdo da Lei e sua própria antinomia, transcrevendo literalmente a impossibilidade de se utilizar o pregão para obras (Parágrafo único do Art. 29), e no caput do mesmo Art. 29 determinando que: “a concorrência e o pregão seguem o rito procedimental comum a que se refere o art. 17 desta Lei...”, o que, em verdade, torna-se, no mínimo, um flagrante contrassenso legislativo.

A sancionada Lei de Licitações e Contratos prescreveu as seguintes modalidades (artigo 28 da Lei nº 14.133/2021): pregão, concorrência, concurso, leilão e diálogo competitivo. Na nossa temática deste artigo, apenas vamos nos limitar à concorrência, visto que o parágrafo único do artigo 29 da Lei literalmente exclui o pregão para obras e serviços de engenharia e as demais modalidades não se aplicam em regra as obras. Vejamos:

Artigo 29, § único da Lei nº 14.133/2021 — 

“O pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominante intelectual e de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços de engenharia de que trata a alínea "a" do inciso XXI do caput do artigo 6º desta Lei".

Sobre a exceção informada, que consta na alínea "a" do inciso XXI do art. 6º, apenas se excetuam os "serviços comuns de engenharia", que este autor sequer acredita que existam, estes no mínimo para quem acredita são extremamente raros, pois por definição se exige que estes sejam padronizáveis (o que já é difícil), somado com a preservação das características originais dos bens, ou seja, obra não pode utilizar a modalidade pregão (o bem ainda não existe) e serviço de engenharia normalmente não é padronizável e ainda tem de se tratar de atividade que preserve a característica do bem, novamente remetendo a coisa já existente, o que é dificílimo de ocorrer.

Ultrapassado este ponto, soma-se que as demais modalidades (concurso e leilão) não possuem vinculação com o objeto obra ou serviço de engenharia e o diálogo competitivo é restrito à inovação técnica ou tecnológica sem precisão para as necessárias especificações técnicas, ou seja, foge à regra da lei, o que será excepcionalidade de ocorrência.

Acredita-se, assim, que já se estabeleceu pelo descrito que, em regra, apenas a modalidade concorrência é a única que pode ser utilizada nas licitações das obras e serviços de engenharia, pelo estabelecido na Norma Geral de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021, sancionada e vigente.

Diante dessa modalidade (concorrência), em regra única para licitar obras e serviços de engenharia, vamos adentrar nos procedimentos, considerando apenas os critérios de julgamento das propostas estabelecidos no artigo 33, I e II, respectivamente, menor preço e maior desconto, visto que estes critérios correspondem a mais de 90% dos certames licitatórios, sendo os demais critérios, como técnica, técnica e preço, conteúdo artístico, maior lance e retorno econômico, exceções à regra.

Os procedimentos contidos na Nova Lei (pregão e concorrência), como já mencionado, possuem forma idêntica para ambas as modalidades (artigo 29, caput), remetendo ao artigo 17 da mesma lei a observação de sua sequência nas fases estabelecidas, sendo oportuno transcrevê-las, face a ser este o ponto crítico e fundamental a que estamos estudando:

"Art. 17  O processo de licitação observará as seguintes fases, em sequência:
I — Preparatória;
II — De divulgação do edital de licitação;
III — de apresentação de propostas e lances, quando for o caso;
IV — De julgamento;
V — De habilitação;
VI — Recursal;
VII — de homologação"
.

Observem, senhores, que até o momento anterior a essa Lei, o objeto "obras" não tinha permissão para o uso de lances. Isso ocorria pela temeridade da qualidade e de se tornarem ainda mais inexequíveis as propostas de preço dos licitantes, por total influência dos valores ofertados pelos demais concorrentes, sendo o previsto em Lei neste momento só justificável por um excesso da busca da economicidade.

É do senso comum que é impossível pelo prazo disponível na Lei de dez dias úteis entre a divulgação do edital e da ocorrência do dia de abertura do certame (conforme estabelece o artigo 55, II, "a") ter a empresa participante segurança máxima em seu preço proposto, sendo este, se permitidos lances abertos no certame, submetidos à influência das demais propostas. Assim, se hoje temos problemas de paralisações de obras, como também nos serviços por baixa qualidade e inexecuções, ao se decidir por permitir disputa em lances abertos na modalidade concorrência para obras e serviços de engenharia (serviços futuros a realizar) isso se tornará extremante temerário.

No tocante aos serviços de engenharia, destacamos que os enquadrados como serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual, definidos pelo inciso XVIII do artigo 6º, constante das alíneas "a", "d" e "h" (estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos e executivos, fiscalização, supervisão, gerenciamento de obras e serviços, controle de qualidade, analise, teste, ensaios etc.), de valor superior a R$ 300 mil, tiveram na Lei tratamento diverso, sendo o critério de julgamento determinado por melhor técnica ou técnica e preço (artigo 37, §2º, I e II), o que verdadeiramente foi um avanço considerável, apesar de ter ocorrido no primeiro momento o veto presidencial deste parágrafo, mas ao final o Congresso Nacional restaurou o posicionamento que vem em favor de tentar reduzir o quadro de projeto básico deficiente ou inadequado. Não consigo, entretanto, justificativa para menção de um valor específico para tal, visto que serviços menores sofrem do mesmo mal.

Desta forma, entendemos que a nova Lei de Licitações e Contratos praticamente definiu que as obras e serviços de engenharia serão licitados pela modalidade concorrência e que os serviços de engenharia de predominância intelectual de valores acima de R$ 300 mil terão critério de julgamento por técnica ou técnica e preço.

Assim, é necessário, no entender deste autor, que para as obras e demais serviços de engenharia, quando aplicado o critério de julgamento das propostas por menor preço ou de maior desconto (maioria dos certames licitatórios), não se venha a permitir proposta aberta, submetida a formulação de lances, e sim a participação dos licitantes com a sua proposta que ao menos se valeu de uma análise técnica, mesmo que rápida, considerando no teor dos projetos suas especificações e as dificuldades de execução ao longo da obra, entendendo ser uma temeridade aplicar os lances sucessivos de redução de valor buscando sagrar-se vencedor o que por consequência acarretará o incentivo de ao final se obter propostas com todos os indícios de inexequibilidade pela influência de valores outros em um leilão de quem dá menos para executar o serviço ou obra, sendo no mínimo ao ver do autor uma insensatez absurda.

Cabe ainda inferir que a Lei não estabeleceu de forma clara, precisa e transparente um diretivo objetivo se as obras ou serviços de engenharia quando aplicado o critério de julgamento do menor preço ou maior desconto poderão ou não se submeter a lances. Esta é a questão que merece ser discutida. Destaco que o acréscimo no texto da Lei do inciso III do art. 17, “se for o caso” submete no mínimo a essa reflexão.

Apenas a título de reforço, estamos aqui a defender que as licitações de obras e serviços de engenharia sejam, quando possível, contratadas com o menor preço, porém este deve ser obtido com a proposta ofertada com o mínimo de estudo anterior, sem interferência de preços de empresas outras. Diferença de preços finais superiores ao lucro e às despesas administrativas (o que com certeza vai ocorrer), quando comparados ao orçamento estimativo, não existem, é certeza de problema na maioria das vezes.

Não sejamos ingênuos em nossas análises, srs. Leitores, tirando as exceções, redução de valor sem critério baseado no preço de concorrente em proposta aberta vai provocar redução forte da qualidade ou maior abandono das obras.

Somado a isto, temos que a Nova Lei de Licitações e Contratos, ao tentar acrescer celeridade e reduzir controvérsias nas habilitações, inverteu a ordem das fases de habilitação e proposta (conforme já demostrado o teor do art. 17), e assim a realização de um leilão de preços com empresas sem a habilitação suficiente (já que isto será aferido a posterior) levará a um desastre superior a calamidade já vivenciada e atestada pelo principal Órgão de controle do país nas obras federais, o que também se repete com maior ênfase nas obras Estaduais e Municipais.

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A análise da habilitação posterior ao leilão de preços é contaminante com o menor preço, e de uma maneira ou outra, exceto falhas absurdas, levar o responsável pelo certame a relevar o ocorrido e possibilitar aceitar equívocos e desacertos, visto que a economicidade inicial e aparente transparece a melhor solução para a Administração e este não se sente confortável em rejeitar a “melhor proposta”, somado que até os Órgão de Controle normalmente seguem essa linha da busca da economicidade inicial, porém normalmente não se traduz em sucesso ao final. Entendo sempre que o preço justo seria a melhor das soluções.

Continuando, acreditamos que, ante tudo mencionado, principalmente o contexto atual vivenciado, o propósito de trazer este ponto crítico: proibir leilão de menor preço para obras e serviços de engenharia é mais do que bem vindo em ser estabelecido objetivamente, tema este que vai de encontro ao bem da qualidade da engenharia, ao bom senso, pois nem as pessoas comuns ou as empresas privadas se utilizam da busca desenfreada do menor preço, fazendo leilão de quem dá menos para serviços futuros a executar, principalmente quando não se tem a certeza da qualificação. É no mínimo uma temeridade, arrisco-me a dizer que é e será se mantido tal interpretação uma irresponsabilidade.

Nestas considerações finais sobre esse especifico ponto, é ainda oportuno informar que mesmo considerando que o texto da Nova Lei garanta a discricionariedade da Administração em não oportunizar lances nas licitações de menor preço ou maior desconto em licitação de obras e serviços de engenharia, considerando que os agentes de contratação estão submetidos aos rigorismos de fiscalização que podem vir a interpretar diferentemente do explanado e não definido em decreto, dificilmente esses agentes optarão por não realizar a etapa de lances sucessivos em proposta aberta e assim busco trazer o conteúdo deste a uma reflexão em favor da boa engenharia, do interesse público e porque não dizer em reduzir o enorme passivo de obras inacabadas.

Senhores, é fácil perceber que os legisladores e os especialistas do Executivo que realizam a interpretação das leis (via decretos ou instruções normativas) não adentram no acompanhamento da execução das contratações e suas finalizações. Desta forma, transparece que suas decisões explanadas vêm em favor do melhor para a Administração (busca de economicidade), mas essa economia inicial (normalmente festejada) não se configura com a proposta mais vantajosa prevista na Lei. No artigo 11, I, por exemplo, “assegurar a seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública (...)”, não se configurará em regra, visto que na execução futura os problemas irão ocorrer (falta de qualidade, aditivos, paralisações etc.), e é isso que deve ser buscado evitar e combater.

Assim, ao final dessa análise, que com certeza ainda possui outros pontos que a corroboram, conclamo todos, em especial a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), a academia (escolas e universidades de engenharia), o Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), a Ordem dos Advogados do Brasil  (OAB), a Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), os Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (Creas) e demais entidades afins que lutam por uma engenharia forte, inovadora, de qualidade, somada a evitar desperdício dos recursos da sociedade, para unir forças em não permitir um “leilão de quem dá menos” para as obras públicas, e sim contratá-las por um preço justo e consciente com empresas que possuam as qualificações para sua perfeita execução, como sendo assim a proposta mais vantajosa para a Administração, tudo de acordo com o previsto em Lei.

2º PONTO - A EXEQUIBILIDADE DAS PROPOSTAS DE PREÇOS

Este é outro ponto crítico quando falamos das obras de construção civil. O tema, inclusive, interliga-se ao ponto anterior e à reboque da forma ou modalidade, somado ao critério de julgamento do certame licitatório e como estamos a falar da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021, é nela que vamos estabelecer o que prescreveu o diploma legal sobre exequibilidade.

Objetivamente o capítulo “V” do título II – Das Licitações/do Julgamento, art. 59 é que tomou para si a responsabilidade de definir a postura da exequibilidade (objeto de execução com qualidade), e assim estabeleceu parâmetros e condições listados quando do julgamento na Licitação e quais propostas poderiam ser classificadas. Vamos ao teor da Lei:

“Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

I - Contiverem vícios insanáveis;

II - Não obedecerem às especificações técnicas pormenorizadas no edital;

III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;

IV - Não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração;

V - Apresentarem desconformidade com quaisquer outras exigências do edital, desde que insanável.

§ 1º A verificação da conformidade das propostas poderá ser feita exclusivamente em relação à proposta mais bem classificada.

§ 2º A Administração poderá realizar diligências para aferir a exequibilidade das propostas ou exigir dos licitantes que ela seja demonstrada, conforme disposto no inciso IV do caput deste artigo.

§ 3º No caso de obras e serviços de engenharia e arquitetura, para efeito de avaliação da exequibilidade e de sobrepreço, serão considerados o preço global, os quantitativos e os preços unitários tidos como relevantes, observado o critério de aceitabilidade de preços unitário e global a ser fixado no edital, conforme as especificidades do mercado correspondente.

§ 4º No caso de obras e serviços de engenharia, serão consideradas inexequíveis as propostas cujos valores forem inferiores a 75% (setenta e cinco por cento) do valor orçado pela Administração.

§ 5º Nas contratações de obras e serviços de engenharia, será exigida garantia adicional do licitante vencedor cuja proposta for inferior a 85% (oitenta e cinco por cento) do valor orçado pela Administração, equivalente à diferença entre este último e o valor da proposta, sem prejuízo das demais garantias exigíveis de acordo com esta Lei.”

Posto tal conteúdo legislativo, é inteligível que o § 4º deste artigo é o grande “calcanhar de Aquiles” da análise da exequibilidade da proposta.

Há muito se debate o tema e a Lei anterior, a famosa Lei nº 8.666/93, também se tornou digna de várias interpretações de como estabelecer por Lei quando uma proposta é exequível ou não.

Não vamos trazer o conteúdo da Norma Geral anterior, apenas citar como superado a tentativa de se fixar percentual de valor para demonstrar ser exequível ou não uma proposta de valor global, pois o Tribunal de Contas União – TCU, já se debruçou nesta matéria e a Súmula nº 262/2010 foi acachapante em relação a Lei nº 8.666/93, quando diz:

Súmula nº 262/2010 – TCU

“o critério definido no art. 48, inciso II, §1º, alíneas “a” e “b” da Lei nº 8.666/93 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta.”

Ocorre que ao contrário do entendimento sumulado do TCU, a Nova Lei seguiu o mesmo sentido da anterior, ao criar um percentual de redução em relação ao valor orçado, para declarar se uma proposta pode ser considerada exequível ou não, e desta feita em relação exclusivamente ao valor estimado pela Administração.

Vejam bem, o que está posto objetivamente na Nova Lei é o seguinte: nas obras e serviços de engenharia “serão consideradas inexequíveis as propostas cujos valores forem inferiores a 75% do valor orçado pela Administração.” E se inferior a 85% exige-se garantia adicional (§ 4º e 5º). Neste caso, entendo que a Lei foi objetiva e contundente, não haverá espaço para diligências se inferior a 75% do valor estimado, entendimento este que considero definitivo.

Não há até o presente momento, por parte dos Órgãos de Controle, menção se neste específico ponto crítico se aplicará a súmula 262/2010 do TCU, que no entender do autor encontra-se para a Nova Lei superada pelo seu artigo e parágrafo específico, pois o expressado é Lei e deve ser obedecido.

Destaco, por fim, a importância e o encargo de responsabilidade de quem irá elaborar “o valor orçado pela Administração”, e a este se incube inclusive a responsabilidade de decisão da exequibilidade da proposta dos pretensos licitantes. É por demais relevante que tal profissional ou equipe sejam especialistas preparados e atualizados a fim de assumir tal encargo e responsabilidade, que inclusive exige anotação de responsabilidade técnicas – ART, no Conselho de Classe. Que venha a aplicação do “Building Information Modeling – BIM” no apoio a esses profissionais, somado a uma melhor qualidade na elaboração da fase preparatória e seu projeto básico como bem definiu a Nova Lei.

3º PONTO - A QUALIDADE DE PROJETOS E SEUS ORÇAMENTOS

Tudo se interliga aos pontos anteriores e assim ninguém terá condições de afirmar que o destaque desse ponto crítico não é também fundamental para o sucesso das contratações de obras públicas, e esse é o objetivo do transcrito. Nas palavras da 4ª edição do caderno “Obras Públicas, 2014” do TCU, inicia-se com a frase: “O projeto básico é o elemento mais importante na execução de obras públicas.” E quando estamos a falar de Projeto Básico, estamos a tratar do instrumento que possui os elementos necessários e suficientes para definir e caracterizar o objeto a ser contratado. Isto é, qualidade de projetos e orçamentos são pontos fundamentais para o sucesso de uma obra pública!

Poderia me alongar bastante em descrever o que vem ocorrendo há bastante tempo na redução da qualidade dos projetos de engenharia e seus orçamentos, visto que sem qualidade de projetos, a orçamentação está comprometida. Eles se interrelacionam por completo e o segundo se espelha no primeiro.

No entanto, como prometida a objetividade, foi extremamente feliz a Nova Lei quando deu uma ênfase especial ao detalhamento da Fase Preparatória, nesta incluída o planejamento (caput do art. 18), e por consequência estabeleceu como fluxo a seguinte síntese:

Tal configuração é sequencial e perfeitamente inteligível e, desta forma, as Obras e serviços de Engenharia se realizam pela demanda com seu plano de necessidades que vai exigir forte planejamento, passando por um bem elaborado Estudo Técnico Preliminar, o consequente anteprojeto e, se não for utilizado da contratação integrada ou semi-integrada, será necessário e obrigatório a elaboração completa do Projeto Básico e Executivo com seus Cadernos de Encargos, especificações, e por fim o orçamento e cronograma. São etapas sequenciais, nas quais o BIM, se aplicado, será o coroamento de tudo interrelacionado e analisado, e a falha de um leva ou erro do outro instrumento por consequência.

Todo este arrazoado é um demonstrativo a tudo quanto é de responsabilidade exclusiva do contratante, Administração Pública, que necessita estar equipada de profissionais para ter sucesso no objeto contratual. Não adianta partir para uma terceirização dessa fase se por outro lado a Administração não tem capacidade de avaliar o produto final do que foi contratado.

Em razão disto, a necessidade já mencionada e inclusive constante na Nova Lei vem a privilegiar a chamada Fase Preparatória, e antes de publicar o edital avaliar o conteúdo desta, que cabe inferir que com vista na otimização da Fase Externa, o êxito desta depende em muito da eficácia daquela para obtenção plena do atendimento da Demanda com sucesso.

As Administrações Públicas estão preparadas e capacitadas para o que previu a Nova Legislação? Este é o ponto.

Não podemos deixar de registrar, além do conteúdo dessa Fase Preparatória, o que a Nova Lei estabeleceu em seu art. 18: “a Fase Preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento(...)” ou seja, planejamento requer tempo e isso também é fundamental. Aqui destaco, não terá futuro alguma licitação de obra ou serviço de engenharia que o cronograma tem por base o tempo político, ou “o que o gestor quer”. Este deve ser estabelecido por especialista com experiencia e observando a complexidade da demanda, tanto na fase de elaboração dos instrumentos da fase preparatória, quanto e principalmente na fase de execução dos serviços, assim entendo, e só especialista é capaz de aferir qual será o período necessário.

4º PONTO DA CRONOLOGIA DE PAGAMENTO

Este específico ponto crítico é uma bandeira antiga do Sindicato da Industria da Construção Civil de Pernambuco – SINDUSCON-PE. e me aproprio dos entendimentos do eminente jurista desse sindicato, Dr. Ediel Frazão e de seu Presidente atual, Dr. Antônio Claudio, como uma das questões mais essenciais e negligenciadas com violação das normas pelas Administrações Públicas, sendo de cumprimento coercitivo e ferindo de morte vários princípios, quais sejam: da legalidade, impessoalidade, isonomia, moralidade, publicidade entre outros tantos.

Falar da cronologia de pagamento, é entender que seu descumprimento fere também o bom senso. Quem concluiu primeiro um serviço tem que receber primeiro, e isto é tão difícil de ocorrer que foi necessário constar em Lei de forma literal e expressamente! A Lei nº 8.666/93 em seu artigo 5º combinada com a pena explicitada da reclusão e multa constante do artigo 92 não foram capazes de evoluir por completo em seu cumprimento.

Na Nova Lei, por sua importância e relevância destaco o seu conteúdo completo:

“Art. 141. No dever de pagamento pela Administração, será observada a ordem cronológica para cada fonte diferenciada de recursos, subdividida nas seguintes categorias de contratos:

I - Fornecimento de bens;

II - Locações;

III - prestação de serviços;

IV - Realização de obras.

§ 1º A ordem cronológica referida no caput deste artigo poderá ser alterada, mediante prévia justificativa da autoridade competente e posterior comunicação ao órgão de controle interno da Administração e ao tribunal de contas competente, exclusivamente nas seguintes situações:

I - Grave perturbação da ordem, situação de emergência ou calamidade pública;

II - Pagamento a microempresa, empresa de pequeno porte, agricultor familiar, produtor rural pessoa física, microempreendedor individual e sociedade cooperativa, desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato;

III - pagamento de serviços necessários ao funcionamento dos sistemas estruturantes, desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato;

IV - Pagamento de direitos oriundos de contratos em caso de falência, recuperação judicial ou dissolução da empresa contratada;

V - Pagamento de contrato cujo objeto seja imprescindível para assegurar a integridade do patrimônio público ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do órgão ou entidade, quando demonstrado o risco de descontinuidade da prestação de serviço público de relevância ou o cumprimento da missão institucional.

§ 2º A inobservância imotivada da ordem cronológica referida no caput deste artigo ensejará a apuração de responsabilidade do agente responsável, cabendo aos órgãos de controle a sua fiscalização.

§ 3º O órgão ou entidade deverá disponibilizar, mensalmente, em seção específica de acesso à informação em seu sítio na internet, a ordem cronológica de seus pagamentos, bem como as justificativas que fundamentarem a eventual alteração dessa ordem.”

Observem srs. Leitores, que desta feita a Lei foi ainda mais clara pois além de mencionar as categorias de contratos, como na Lei anterior, explicitou as exceções que são limites no § 1º e no § 2º imputou responsabilidade ao agente e determinou aos Órgãos de Controle sua fiscalização.

Por fim, também já se estabeleceu no art. 178 da Nova Lei, combinado com Código Penal (Decreto Lei nº 2.848/1940) em seu art. 337-H a capitulação e a pena, que inclui multa, como segue:

“Art. 337-H. Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do contratado, durante a execução dos contratos celebrados com a Administração Pública, sem autorização em lei, no edital da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa.”

Ou seja, a pena foi acrescida ao dobro em relação a Lei anterior (Lei nº 8.666/93), em caso de descumprimento “PAGAR FATURA COM PRETERIÇÃO DA ORDEM CRONOLÓGICA DE SUA EXIGIBILIDADE.”

Entendo que isto é essencial de obediência e, portanto, ressalto como um ponto crítico fundamental a favor da moralidade institucional e de como a Administração Pública pode cobrar princípios do contratado? Como se pode exigir o COMPLIANCE (agir de acordo com as regras da legislação) se isto foi sempre de ocorrência constante, não só pelos Entes Municipais como se poderia pensar, mas inclui-se neste desrespeito também os Entes Federais e Estaduais.

Gostaria que ficasse entendido, não se tratar de uma mera obrigação de aplicação da Lei, trata-se de garantia para o contratado e paralelamente permite o regular andamento da execução contratual e sua conclusão. Mitigar o número de obras paralisadas ou não conclusas advém muitas vezes do respeito a essa cronologia, e é a isto que busco alertar.

Esta matéria, de descumprimento da ordem de pagamento (cronologia) no serviço público já devia estar superada. Nos tempos atuais, é um desrespeito com os contratados que muitas das vezes necessitam mendigar e oferecer favores para terem seus direitos respeitados, mas isto ainda existe e deve ser combatido exemplarmente. Alguns agentes públicos se valem de falta de Decreto regulamentando, porém isto não procede, pois a Lei é e sempre foi objetiva. Uma simples planilha de Excel é suficiente, na qual se lança a fatura atestada pela execução, divulga-se, obedece a sequência e assim atinge a transparência da cronologia por categoria e o cumprimento da Lei. Simples assim.

Por fim, entendo por oportuno, trazer aqui as palavras do eminente jurista, Joel de Menezes Niebuhr/2016, quando destacou outra artimanha da Administração e como combater, quando diz:

“Não é raro que a Administração, para não pagar o contratado, recuse-se a liquidar a despesa. Ou seja, o contratado executa o contrato, entrega à Administração Pública, porém ela se recusa a fazer as medições, a reconhecer o que foi executado. Sucede que ela precisa liquidar a despesa para o contratado emitir a nota de faturamento e, com isso, entrar na fila da ordem cronológica. A Administração Pública se recusa a liquidar a despesa porque daí parece ao Controle que não há problemas de inadimplemento. Isto deve ser coibido e o mesmo vale para o pagamento e para todos os pedidos formulados pelos contratados.

De qualquer maneira, a competência dos Tribunais de Contas para fazer valer o respeito à regra comentada é inconteste. Mais do que isso tratar-se de importante resguardo da obediência aos princípios da impessoalidade e moralidade, impedindo a consagração de privilégios incompatíveis com o regime republicano. No que toca à prevenção e combate a corrupção, chaga brasileira, trata-se de bloquear mais uma possibilidade de aplicação do adágio “criar dificuldade, para vender facilidade.”

Por fim, com estas palavras do Professor Administrativista renomado do nosso país, acredito que não tenho mais o que acrescentar e como bem estabeleceu a Lei nº 14.133/2021 no tocante ao controle das contratações (art. 169 a 173), o quanto é dever de todos, agentes públicos, licitantes, sociedade, órgãos de controle etc. Tornou-se este o motivo e a obrigação de destacar tal ponto crítico que vem também na busca da legalidade, adicionado a eficácia e efetividades das contratações, novamente para o sucesso da execução das obras públicas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É de se registrar novamente que muito se tem a apresentar de outros pontos críticos a serem superados na Nova Legislação, porém seria extremamente difícil apontar todos em um único artigo. Julguei assim oportuno iniciar por estes que inclusive serão por mim apresentados e discutidos no seminário “Fatores Críticos de Sucesso para uma Obra Pública”, que está a ser realizado pelo SINDUSCON em 19/10/2023.

Em nenhum momento busquei personalizar autores e instituições sobre os pontos críticos apresentados, pois a busca é trazer ao debate pontos dos novos procedimentos de contratações de obras e serviços que ainda se apresentam na Lei nº 14.133/2021 digna de aperfeiçoamento e de interpretações e jurisprudências objetivas.

Que venham os debates e os contraditórios no aperfeiçoamento desse especial e complexo normativo legislativo tão sujeito a interpretações diversas, que inclusive são mutantes ao longo do tempo e que em muitos casos necessitam a observância do caso concreto.

Por fim, boa leitura a todos e espero ter contribuído para o melhor das contratações das obras e serviços de engenharia.

Sobre o autor
Alberto de Barros Lima

Advogado e Engenheiro. Mestre em Leis de Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, com mais de 35 anos de atuação na área de licitações. É autor das obras: "Como participar de licitações públicas", "As vantagens nas licitações e nas compras governamentais para as MPE´s", "As Leis de Licitações e Contratos", "Termo de Referência e Projeto Básico nas Aquisições Públicas" e "Lei nº 14.133/2021 - A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos COMENTADA". É Consultor SEBRAE e Participante da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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