Essa é o tipo de decisão que nos faz pensar e repensar aspectos relevantes da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) e o entendimento dos magistrados em cada caso concreto...
Uma decisão da 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), foi negado provimento ao recurso de apelação de um homem condenado por descumprir medida protetiva de urgência contra ele, conforme o artigo 24-A da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006).
"Artigo 24-A: Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos ."
O caso envolveu uma situação não tão rara: O réu e a vítima encontraram-se voluntariamente em um motel, mesmo o ex estar proibido judicialmente de se aproximar dela. Em outras palavras, organizaram um encontro íntimo discreto, mas a situação acabou sendo revelada por conta de novas agressões físicas.
Entende-se que o consentimento da vítima, que estava sob medida de proteção (distanciamento de 300 metros e qualquer tipo de contato), não isenta o réu do crime, uma vez que o delito de descumprimento de medida protetiva visa resguardar a administração da Justiça como principal bem jurídico, e não apenas a proteção da vítima.
O entendimento do Relator Desembargador Euvaldo Chaib, foi de que:
"O consentimento da vítima inserida em medida de proteção não desnatura o delito em tela, porquanto no crime de descumprimento de medida protetiva de urgência o bem jurídico a ser tutelado, administração da Justiça, é o principal e, apenas indiretamente, a proteção da vítima”.
O relator da apelação, desembargador Euvaldo Chaib, destacou que o caráter indisponível do bem tutelado justifica a manutenção da tipicidade do fato, mesmo com o consentimento da vítima na aproximação do agressor.
Além do crime previsto na Lei Maria da Penha, o réu também foi condenado por lesão corporal dolosa com motivação de gênero, conforme o artigo 129 §13° do Código Penal.
As penas aplicadas foram de quatro meses e dois dias de detenção em regime inicial semiaberto, e um ano, quatro meses e dez dias de reclusão em regime inicial fechado, com impossibilidade de apelação em liberdade.
O relator rejeitou a argumentação da defesa, que buscava a absolvição do réu alegando a ausência de dolo no descumprimento da medida protetiva.
Chaib ressaltou que, no contexto de violência doméstica, é comum a vítima se expor ao perigo por conta da relação afetiva existente, mas a atuação estatal é fundamental para proteger a vida e a integridade da vítima e afirmou:
“Imprescindível a atuação estatal para proteger a vida e a integridade da fragilizada vítima. Esse o espírito da Lei Maria da Penha, diploma normativo destinado a reprimir a crescente violência doméstica. O escopo é a manutenção do respeito às decisões judiciais e à administração da Justiça”.
Os desembargadores Camilo Léllis e Edison Brandão concordaram com o voto do relator, mantendo integralmente a sentença proferida pelo juízo da 5ª Vara Criminal de Santos (SP).
Os eventos de descumprimento da medida protetiva e agressão ocorreram em 28 de abril de 2023, quando a vítima (em situação claramente vulnerável) aceitou se encontrar com o ex-namorado na tentativa de reconciliação.
No entanto, ela alegou não ter solicitado a revogação da proteção da Maria da Penha previamente, pois não se sentia totalmente segura devido ao histórico de comportamentos e violências do autor (muito provavelmente, um relacionamento abusivo).
Em suma: Medida Protetiva de Urgência deferida, nem que a "ex" queria, o agressor pode "chegar perto" ou manter qualquer tipo contato.
Qual é a sua visão sobre essa abordagem judicial? Compartilhe suas ideias e participe da discussão!
Processo 1501824-58.2023.8.26.0536
Fonte: TJ/SP.