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Reflexos da Lei de Porte de arma sobre a competência da Justiça Federal

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NOTAS

(1) Nessa circunstância reside o "caráter parasitário" (ou acessório) da receptação, que não entra em rota de colisão com a reconhecida autonomia do delito, pois, uma vez confirmada a existência material do crime antecedente (furto, roubo, contrabando, descaminho, etc.), a receptação tem vida totalmente independente. Nesse sentido, confira-se elucidativa passagem de julgamento efetuado pelo TRF/2ª Região, em caso idêntico envolvendo receptação de armamento proibido, no qual foi ressaltada a autonomia desse delito face ao contrabando: "Em que pesem as bem lançadas razões, o crime de receptação é, em verdade autônomo, possuindo caráter próprio, sem relação de gênero e espécie, resumindo-se a mencionada relatividade a um delito antecedente para sua existência, nos moldes em que firmado no citado acórdão, mas que não determina a competência por força do crime principal. No mesmo sentido: STF, RHC nº 59.591-6, RT 565/407; TJSC, HC, Rel. Wladimir d´Ivanenko, Jurisprudência Catarinense 58/320. Neste, ficou consignado que a "A receptação é delito autônomo, não sujeito, portanto, à conexão. O Juízo competente é o do lugar de sua consumação, que pode ser ou não ser o do crime anterior". Sendo assim, não se pode firmar pura e simplesmente, a competência pela ocorrência, ou mesmo pela sua suposição, de violação de crime sujeito à jurisdição da Justiça Federal" (TRF/2ª Região, Ap. Crim. nº 96.02.31348-0, 3ª T., Rel. Des. Fed. Paulo Freitas Barata, v.u., julg. em 01.04.97, DJU de 10.06.97).
(2) Sobre a necessidade da conexão probatória estar lastreada em elementos objetivos e concretos, e não meramente em dados circunstanciais, assim já teve oportunidade de decidir o STF, ao julgar o conhecido "Caso Naji Nahas" (HC nº 67.769-SP, 1ª T., v.m., Rel. p/ Acórdão Min. Sepúlveda Pertence, julg. em 28.11.89, RTJ nº 142/491). Recentemente, a mesma fundamentação foi acolhida no HC nº 75.219-RJ (1ª T., Rel. Min. Octavio Gallotti, julg. em 12.8.97, transcrito no Informativo STF nº 83), que versava sobre a suposta conexão envolvendo os vários crimes imputados aos chamados "banqueiros" do jogo do bicho, em curso na Justiça Estadual e Justiça Federal . No corpo do decisum foi consignado que: "Trata-se, a conexão instrumental - ao contrário do que a prática forense dela tem feito - de um vínculo objetivo entre os crimes, "que se insinua por entre as infrações em si mesmas". É ler o preceito legal. Não se contenta ele com mera utilidade probatória da reunião de ações, como a prática forense tende a fazer..."
(3) Em julgado anterior, o STJ já tinha decidido de forma semelhante, conforme demonstra a ementa a seguir colacionada: "PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA. CRIME DE DESCAMINHO E CRIME DE RECEPTAÇÃO. CONEXÃO. INEXISTÊNCIA. DELITOS INDEPENDENTES. Não há conexão, suscetível de modificar a competência judiciária, na hipótese em que os crimes - descaminho e receptação - foram praticados por agentes diferentes, em momentos diversos, sem qualquer comunicação entre os desígnios criminosos. Conflito conhecido. Competência do Juízo Suscitado, Juízo de Direito do Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária de São Paulo - DIPO" (CC nº 4634-SP, 3ª Seção, Rel. Min. Vicente Leal. v.u., julg. em 02.03.95, DJU 27.03.95).
(4) Acompanhando a evolução da jurisprudência do STJ sobre o assunto, após alguns meses da elaboração inicial deste trabalho, verificamos que, malgrado o tema ainda não tenha sido enfrentado sob a égide da Lei do Porte de Arma de Fogo, houve uma verdadeira guinada no entendimento então dominante na 3ª Seção, passando-se a decidir, reiteradamente, pela competência da Justiça Estadual sempre que a prova constante dos autos revelar-se insuficiente para positivar que o agente preso em poder do armamento de uso proibido foi o responsável pelo respectivo contrabando. A título de exemplificação, confira-se o seguinte aresto: "PENAL E PROCESSUAL PENAL - POSSE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTES E ARMA DE FOGO - PRISÃO EM FLAGRANTE - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - JUSTIÇA COMUM E JUSTIÇA FEDERAL.1. Inexistindo elementos caracterizadores de crime federal, especialmente contrabando e tráfico internacional de entorpecentes, como no caso, a competência para o processo e julgamento do feito recai na Justiça Comum Estadual.2. Conflito conhecido. 3. Competência do Juízo suscitado (1ª Vara Criminal Regional de Santa Cruz-RJ)" (CC 20.461-RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julg. em 22.10.97, v.u., DJU de 23.03.98). Na mesma sintonia: CC 20.451/RJ (Rel. Min. William Patterson, julg. em. 22.10.97, v.u., DJU de 10.11.97); CC nº 15.485/SP (Rel. Min. Flaquer Scartezzini, julg. em 27.08.97, DJU de 27.10.97); CC nº 17.539-RJ (Rel. Min. Vicente Leal, julg. em 08.10.97, DJU de 15.12.97; CC nº 17.865-RJ (Rel. Min. Vicente Leal, julg. em 26.11.97, ainda não publicado, certidão do resultado do julgamento no DJU de 09.12.97, pág. 64880); CC nº 20.374-RJ (Rel. Min. Vicente Leal, julg. em 08.10.97, DJU de 27.10.97); CC nº 20.493-RJ (Rel. Min. José Dantas, julg. em 26.11.97, DJU de 15.12.97); CC nº 20.916-RJ (Rel. Min. Fernando Gonçalves, julg. em 18.12.97, DJU de 09.02.98) e CC 20.193, (Rel. Min. Fernando Gonçalves, julg. 16.03.98, DJU de 23.03.98).
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Sobre o autor
Aloísio Firmo Guimarães da Silva

procurador da República no Rio de Janeiro

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Aloísio Firmo Guimarães. Reflexos da Lei de Porte de arma sobre a competência da Justiça Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 25, 24 jun. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1123. Acesso em: 2 mai. 2024.

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