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A reforma dos dispositivos processuais penais relativos à prova: Lei n.º 11.690/2008

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V) Arts. 201, 210, 212 e 217 do CPP

Lei n.º 11.690/2008 Art. 201 – Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. Parágrafo único – Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo, o ofendido poderá ser conduzido à presença da autoridade. Art. 201 - Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. § 1.º - Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo, o ofendido poderá ser conduzido à presença da autoridade. § 2.º - O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem. § 3.º - As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por ele indicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico. § 4.º - Antes do início da audiência e durante a sua realização, será reservado espaço separado para o ofendido. § 5.º - Se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado. § 6.º - O juiz tomará as providências necessárias à preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, determinar o segredo de justiça em relação aos dados, depoimentos e outras informações constantes dos autos a seu respeito para evitar sua exposição aos meios de comunicação." Art. 210 – As testemunhas serão inquiridas cada uma de per si, de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz adverti-las das penas cominadas ao falso testemunho. Art. 210 - As testemunhas serão inquiridas cada uma de per si, de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz adverti-las das penas cominadas ao falso testemunho. Parágrafo único - Antes do início da audiência e durante a sua realização, serão reservados espaços separados para a garantia da incomunicabilidade das testemunhas." Art. 212 – As perguntas das partes serão requeridas ao juiz, que as formulará à testemunha. O juiz não poderá recusar as perguntas da parte, salvo se não tiverem relação com o processo ou importarem repetição de outra já respondida. Art. 212 - As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. Parágrafo único - Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição."

O art. 201 manteve, ipsis literis, a mesma redação do caput, introduzidos parágrafos que visam a adequada e justa prestação de contas da atividade processual às vitimas, inclusive por meio eletrônico (e-mail), além da determinação judicial de assistência multidisciplinar.

No entanto, o § 6.º do art. 201 merece interpretação e regulamentação cuidadosa, para que esse segredo não dificulte ou prejudique processualmente o acusado, estabelecendo-se uma aparente utilidade processual, traduzida por verdadeira dificuldade à garantia de ampla defesa, em nome de um "populista" processo penal da vítima. Exemplo disso é o Provimento n.º 32/2000, da Corregedoria Geral de Justiça do TJ-SP, cujas distorções práticas apenas servem de obstáculo que dificulta a ampla defesa e celeridade processual.

A exposição nefasta nos meios de comunicação deve ser o objetivo. Jamais cogitado qualquer sigilo que dificulte a atividade dos sujeitos processuais, direta ou indiretamente.

Também o art. 210 manteve a redação anterior de seu caput. Por meio do parágrafo único, deste artigo, expressou-se a exigência legal quanto à incomunicabilidade das testemunhas, antes do início e durante a realização da audiência, as quais, como se ressaltou, permanecerão em locais separados.

O art. 212 selou o fim de uma formalidade desnecessária, consistente na repetição, pelo juiz, das perguntas às testemunhas, formuladas pelas partes. Agora, acusação e defesa podem questioná-las diretamente. Atente-se, porém, para a introdução de nova causa de indeferimento de perguntas.

Antes da Lei de 2008, apenas aqueles questionamentos que nada tenham com a demanda ou repetitivos podem ser vetados pelo presidente da audiência. Com a nova redação em comento, a partir de sua vigência, o juiz também estará expressamente autorizado a não admitir pergunta que entenda "induzir a resposta" da testemunha, o que é muito subjetivo e pode cercear a atuação da defesa e da acusação, caso não haja bom senso judicial.


VI) Art. 217 do CPP e suas modificações:

Quadro Comparativo VI

Decreto-Lei n.º 3.389/1941 Lei n.º 11.690/2008
Art. 217 – Se o juiz verificar que a presença do réu, pela sua atitude, poderá influir no ânimo da testemunha, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará retirá-lo, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor. Neste caso deverão constar do termo a ocorrência e os motivos que a determinaram. Art. 217 - Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor. Parágrafo único – A adoção de qualquer das medidas previstas no caput deste artigo deverá constar do termo, assim como os motivos que a determinaram."

O art. 217 do CPP teve excluído, diante da nova redação, o termo "atitude".

A conseqüência poderá ser a seguinte: a mera presença do réu que, causar temor, humilhação, sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, conforme o subjetivismo judicial, prejudicando o depoimento e sua veracidade, autorizará a videoconferência como meio de se obter a versão da vítima e das testemunhas. Na impossibilidade do meio eletrônico, será o réu retirado do recinto.

O primeiro ponto consiste no alerta sobre a retirada do termo "atitude" da redação, prejudicial ao réu.

A alteração impossibilitaria, sem concretos motivos, o concurso presencial entre os partícipes processuais, divisão de mesmo espaço que é essencial para a busca da verdade real. Tal presença em concurso, na sala de audiências, conforme redação original, somente poderia ser evitado por atitude, ação, comportamento objetivo do acusado contra o ofendido ou testemunhas, atividades estas que deveriam constar do respectivo termo de audiência e exigiriam adequada fundamentação quando do registro judicial mencionado.

Com a supressão do termo, considerando que ainda não há parafernália eletrônica suficiente para a videoconferência - não obstante as críticas construtivas ou negativas que mereceria essa medida - poderá ocorrer um elevado subjetivismo na determinação de retirada do réu da audiência, violando-se o seu direito constitucional de presença, e assim, a ampla defesa.

Deve-se evitar, ao máximo, o incentivo ao processo penal ocultista, baseado em testemunhas desnecessariamente "sem rosto", facilidade nefasta que também advém do Provimento do TJ-SP, acima mencionado.

Nem se diga que o juiz terá o dever explícito, legal e constitucional, de fundamentar suas manifestações e decisões de qualquer natureza. Ora, se não mais é exigida a "atitude" do réu para sua retirada da sala de audiências, bem como não é necessária - por conseqüência - a discriminação judicial da ação, a motivação de determinados juízes eventualmente será equivalente àquelas usadas para a decretação de muitas prisões cautelares aparentemente motivadas, isto é, haveria a possibilidade de mera menção ao texto legal pelo magistrado, aludindo ao seu entendimento acerca da caracterização das hipóteses do novo art. 217 do CPP apenas, constando a retirada do termo próprio e sem indicação concreta, objetiva.

É pouco e merece atenção do meio jurídico.


VII) Art. 386 do CPP – importantes alterações:

Quadro Comparativo VII

Decreto-Lei n.º 3.389/1941 Lei n.º 11.690/2008
Art. 386 – O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: Art. 386 – O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
I – estar provada a inexistência do fato; I – estar provada a inexistência do fato;
II – não haver prova da existência do fato; II – não haver prova da existência do fato;
III – não constituir o fato infração penal; III – não constituir o fato infração penal;
IV – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal;
V – existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena (arts. 17, 18, 19, 22, 24, § 1.º, do Código Penal); V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;
VI – não existir prova suficiente para a condenação. VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência;
VII – não existir prova suficiente para a condenação.
Parágrafo único – (...) II – ordenará a cessação das penas acessórias provisoriamente aplicadas; Parágrafo único – (...) II – ordenará a cessação das medidas cautelares e provisoriamente aplicadas;
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O art. 386 do CPP teve o caput mantido e nova distribuição de seus incisos, atualização e inclusão no seu quadro normativo. Incluiu-se no inciso IV, a hipótese absolutória por "estar provado" que o réu não concorreu para a infração penal.

Ressaltou-se, agora no inciso V, o favor rei, mantida - em novo inciso (era o antigo inciso IV) - a absolvição pela inexistência de prova de ter o réu concorrido para a infração penal.

No inciso VI mencionou-se a existência das circunstâncias que excluem crime ou isentam de pena, atualizando-se a referência aos artigos pertinentes, observando-se a Reforma da Parte Geral do Código Penal de 1984 (v. arts. 20; 21; 22; 23; 26 e 28, § 1.º, todos do CP).

Note-se, no entanto, a influência do favor inocentiae na expressão final: "ou mesmo se houver fundada dúvida sobre a sua existência". Portanto, não apenas se comprovadas as causas de exclusão de crime ou isenção de pena, mas também deverá ser absolvido o réu caso haja dúvida, mas dúvida fundada nos elementos colhidos na instrução, sobre a existência das primeiras.

Avanço redacional importante.

A absolvição baseada na hipótese de insuficiência probatória, do inciso VI, do art. 386, passa a constar, diante da redação legal inovadora, do inciso VII deste mesmo artigo.

Por fim, ressalta-se a adequação procedida quanto ao inciso II, do art. 386 do CPP, uma vez que, no Direito Processual Penal Pátrio já não cabia mais a figura das penas acessórias provisórias. Menciona-se, agora, a cessação de medidas cautelares e provisoriamente aplicadas, cujos efeitos ainda vigorem, pois o acusado restou absolvido.

Enfim, as alterações motivarão importantes e proveitosos debates, material jurisprudencial e doutrinário, durante e depois dos próximos sessenta dias de vacatio legis.

Este artigo constitui uma modesta contribuição ao debate que será desenvolvido com o passar do tempo.

A intenção foi a de contribuir.

Espera-se que tenha sido alcançada.

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Sobre o autor
Érick Vanderlei Micheletti Felicio

Advogado Criminalista. Bacharel em Direito pela Universidade de Sorocaba (UNISO). Especialista em Direito Constitucional Brasileiro pela Universidade São Francisco (USF). Mestre em Direito da Saúde pela Universidade Santa Cecília (UNISANTA). E-mail: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FELICIO, Érick Vanderlei Micheletti. A reforma dos dispositivos processuais penais relativos à prova: Lei n.º 11.690/2008. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1850, 25 jul. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11532. Acesso em: 18 mai. 2024.

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