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A reforma do CPP em relação aos procedimentos

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12/08/2008 às 00:00
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Foram alterados dispositivos referentes à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos, além de alguns outros esparsos.

Sumário: 1. Introdução. 2. Questões relativas à sentença condenatória. 2.1. Quanto à reparação do dano ex-delicto. 2.2. Decretação de medida cautelar. 3. A função do Ministério Público e a atuação do defensor. 4. Novas regras para a citação: citação com hora certa. 5. Emendatio e mutatio libelli. 6. Procedimentos. 6.1 Disposições comuns a todos os procedimentos. 6.1.1 Juízo de admissibilidade da acusação. 6.1.2 Citação do acusado: defesa preliminar e suspensão do processo. 6.1.3 Absolvição sumária. 6.1.4. Designação de audiência e intimações. 6.1.5 Interrogatório de réu preso. 6.1.6 O princípio da identidade física do juiz. 6.2. Procedimento ordinário. 6.2.1 Audiência de instrução. 6.2.2 Realização de diligências, debates e julgamento. 6.2.3 Ata da audiência. 6.3. Procedimento sumário. 7. Conclusão.


1.Introdução

Dentre os diversos projetos de reforma do Código de Processo Penal, o de n. 4.207/01 se transformou na Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, para entrar em vigor em 22.08.2008.

Por essa lei, foram alterados dispositivos referentes à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos, além de alguns outros esparsos, todos, de uma forma ou de outra, referentes ao aspecto procedimental, em alguma de suas fases.

Embora tenham sido significativas as modificações introduzidas, deve-se destacar que a reforma não abrangeu a modificação proposta para o artigo 366, principalmente no sentido de fixar um prazo para a suspensão da prescrição, no caso de tentativa frustrada de citação por edital e conseqüente suspensão do processo. Com certeza, será preciso tratar dessa questão em outra mini-reforma, se antes não vier uma completa, de todo o CPP.


2.Questões relativas à sentença condenatória

2.1.Quanto à reparação do dano ex-delicto.

De acordo com o art. 63, "transitada em, julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros". Portanto, nova demanda seria necessária para se conseguir a indenização.

Pela reforma, acrescentou-se um parágrafo ao art. 63, estabelecendo que a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado na sentença condenatória, sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido.

Com isso, o texto ficou coerente com a modificação introduzida ao art. 387, VII, que, ao tratar da sentença condenatória, consigna que o juiz "fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido".

Dessa forma, pela nova disciplina legal, a vítima poderá ser mais prontamente satisfeita, no aspecto patrimonial, sem necessidade de aguardar as delongas do processo civil de execução da sentença penal. Outro processo somente será ajuizado, na esfera cível, para eventual complementação, se o valor originalmente fixado pelo juiz criminal for reputado insuficiente.

A crítica que tem sido feita em relação a esse ponto consiste no fato de que o projeto haver trabalhado com a idéia de solvência do acusado, o que não corresponde com as estatísticas em torno do assunto. Mais eficaz teria sido a previsão de indenização pelo próprio Estado.

2.2.Decretação de medida cautelar

Foi acrescentado o parágrafo único ao referido art. 387, constando: "O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta".

Esta determinação faz com que a prisão decorrente de sentença penal condenatória apenas subsista se presentes os requisitos da prisão preventiva, hipótese que se compatibiliza com a presunção de inocência. Deixa de ser condição de admissibilidade do recurso o recolhimento ao cárcere (art. 594), assim como a fuga não impede mais seu conhecimento (art. 595), tudo em consonância com a Declaração Americana sobre os Direitos do Homem.

Como conseqüência e coerentemente, foi revogado o art. 594, que exigia a condição de primariedade para que o réu pudesse apelar em liberdade. E, embora não revogados expressamente, deixam de ter aplicação os arts. 393, I e 595, por manifesta incompatibilidade. Aquele arrola a prisão como efeito automático da sentença condenatória; e este considera que a fuga do acusado após a interposição do recurso equivale à deserção e abandono do próprio recurso, que, nesse caso, deixaria de ser conhecido.

Além do princípio da presunção de inocência, também é levado em conta o direito incondicional ao duplo grau de jurisdição. Eventual prisão, doravante, nessa fase, somente poderá ser decretada em caráter de cautelar e, obviamente, não pode influenciar no direito de recurso, pois:

... é preciso ter em conta que a eventual prisão não pode afetar o direito de recorrer, que dela independe. Conforme enfatizam Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes (2005), ainda que configure a hipótese de prisão cautelar, o juiz não deve condicionar o recebimento ou processamento do recurso ao efetivo recolhimento à prisão. Quando condenar e decretar a prisão, cumpre ao juiz expedir mandado de prisão e, ainda que não cumprido, admitir e dar seqüência à apelação interposta. "É o que sucede na decretação da preventiva: o processo tem regular seguimento enquanto se aguarda a prisão" [01].


3.Função do Ministério Público e atuação do defensor

A nova redação do art. 257 explicita a função do Ministério Público de promover, privativamente, a ação penal pública e a de fiscalizar a execução da lei, em geral. Trata-se de uma melhor adequação ao art. 129, I, da Constituição Federal, quanto à titularidade exclusiva da ação penal pública.

No tocante ao defensor, a reforma atualiza o valor da multa para o caso de abandono do processo, fixando-a em dez a cem salários mínimos. A multa não incide se o abandono se der por motivo imperioso (art. 265).

Ao mesmo tempo, prestigia-se o defensor titular, ao afirmar-se que a audiência poderá ser adiada se, por motivo justificado, ele não puder comparecer à audiência. Antes, ainda que justificada a falta, poderia a audiência ser realizada, com a nomeação de defensor ad hoc.


4.Novas regras para a citação: citação com hora certa

Anteriormente, quando o acusado se ocultava para não receber a citação, tentava-se citá-lo por meio de edital. Essa postura do CPP era criticada, por não adotar a citação com hora certa, conforme já se fazia no âmbito do processo civil. Finalmente, o legislador atendeu a esse reclamo e o novo art. 362 dispõe sobre a citação com hora certa, nos termos dos arts. 227 a 229, do CPC, que assim dispõem:

Quando, por três vezes, o oficial de justiça houver procurado o réu em seu domicílio ou residência, sem o encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, intimar a qualquer pessoa da família, ou em sua falta a qualquer vizinho, que, no dia imediato, voltará, a fim de efetuar a citação, na hora que designar. Art. 228. No dia e hora designados, o oficial de justiça, independentemente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou residência do citando, a fim de realizar a diligência. § 1º. Se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o citando tenha se ocultado em outra comarca. Art. 229. feita a citação com hora certa, o escrivão enviará ao réu carta, telegrama ou radiograma, dando-lhe de tudo ciência.

Em seguida, se ainda assim o acusado não comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo, conforme determina o parágrafo único do art. 362, reformado.

De acordo com o art. 363, caput, "o processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado".

Além disso, não ocorrerá citação por edital em virtude dos demais motivos constantes do art. 363, isto é, quando inacessível, em virtude de epidemia, de guerra ou por outro motivo de força maior, o lugar em que estiver o réu (inc. I); ou quando incerta a pessoa que tiver de ser citada. Apenas se fará a citação por edital caso não seja localizado o acusado (inc. II).

Se o acusado, citado por edital, comparecer, tem prosseguimento o processo (art. 363 § 4.º). Entretanto, se ele não comparecer, nem indicar defensor, aplica-se o 366, que não sofreu alteração.

Com efeito, embora constasse do projeto, não foi reformulada a redação do art. 366 [02], sobretudo quanto ao tempo de suspensão do prazo prescricional, tendo sido vetada a redação nova para o referido dispositivo. Certamente, essa questão justificará outro "remendo" ao Código, como já referido.

Mas, seja qual for a forma de citação, prevalece o disposto no art. 367, segundo o qual "o processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo".


5. Emendatio e mutatio libelli

Em relação ao artigo 383, que trata da chamada emendatio libelli, a reforma altera o caput, para constar que o juiz não modificará a descrição jurídica do fato, embora possa atribuir definição jurídica diversa, caso esta tenha sido indicada erroneamente na inicial. Prevalece, portanto, a regra segundo a qual o acusado se defende dos fatos e não da capitulação dada ao crime.

A esse artigo, acrescentaram-se dois parágrafos, com vistas a propiciar um redirecionamento do processo, quando cabível ou necessário, nas seguintes hipóteses: o primeiro desses parágrafos trata da aplicação da suspensão condicional do processo (Lei n. 9.099/95, art. 89), se a possibilidade surgir em decorrência da nova definição jurídica do fato; já o segundo recomenda o encaminhamento dos autos a outro juízo, se a nova definição jurídica modificar a competência.

Eis a redação atual do dispositivo:

Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.

§ 1º Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei.

§ 2º Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.

Contudo, a mais importante modificação, nesse tópico, consiste em estabelecer nova sistemática para a mutatio libelli (art. 384), que passa a exigir a exata correlação entre acusação e sentença, tornando clara a adoção do sistema acusatório, pois ao juiz não será mais atribuída a iniciativa de provocar o aditamento. Segue a nova redação:

Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público poderá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.

§ 1º Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código.

§ 2º Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento.

§ 3º Aplicam-se as disposições dos §§ 1º e 2º do art. 383 ao caput deste artigo.

§ 4º Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.

§ 5º Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá.

Se, durante a instrução do processo, surgir prova de elemento ou circunstância, não contido na inicial, que provoque alteração da definição jurídica do fato, impõe-se aditamento da inicial, pelo acusador, para que o juiz possa apreciar na sentença essa alteração. Observe-se que o aditamento não é obrigatório, podendo ou não ser feito pelo órgão da acusação. Todavia, ele será indispensável para a apreciação judicial do fato, em obediência ao princípio da correlação.

Embora o art. 384 se refira apenas à ação penal pública, entende-se que também poderá ser facultado ao querelante promover o aditamento, no caso de ação penal privada. Esse posicionamento, que já era defendido no regime anterior, em relação ao parágrafo único do mesmo dispositivo ora comentado, tende a ser acolhido pela doutrina [03].

Ocorrendo o aditamento, se faculta manifestação da defesa e só depois disso pode o juiz sentenciar.

Embora não mais seja admissível que o juiz provoque o aditamento, como no regime anterior, faculdade ampla e unanimemente combatida pela doutrina, a reforma prevê expressamente a aplicação do art. 28 para o caso de não ocorrer o aditamento, pelo Ministério Público. Ou seja, o juiz é mantido no papel anômalo de fiscal do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública.

De fato, dispõe o art. 28 que se o juiz discordar do pedido de arquivamento do inquérito ou das peças de informação, enviará os autos ao Procurador Geral de Justiça, para deliberar a respeito da posição ministerial. No caso de o Procurador Geral não promover o aditamento, restará ao juiz decidir em face da acusação existente, condenando ou absolvendo.

Também em relação à mutatio tem aplicação as disposições que tratam da eventualidade de eventual suspensão do processo ou remessa a outro juízo, se a nova classificação assim o indicar (art. 383, §§ 1.º e 2.º).


6. Procedimentos

6.1.Disposições comuns a todos os ritos

O procedimento será comum ou especial (art. 394 caput), sendo que o comum se subdivide em ordinário, sumário ou sumaríssimo (art. 394, § 1.º).

A definição do rito procedimental se faz de acordo a quantidade da pena prevista para o crime, a saber:

I - ordinário, quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada seja igual ou superior a 4 (quatro) anos de privativa de liberdade;

II - sumário, quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada seja inferior a 4 (quatro) anos de privativa de liberdade;

III - sumaríssimo, para as infrações penais de menor potencial ofensivo, na forma da lei.

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Aplica-se a todos os processos o procedimento comum, salvo disposições em contrário do CPP ou de lei especial (§ 2.º); as disposições dos arts. 395 a 398 aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados no CPP (§ 4.º) e aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos especial, sumário e sumaríssimo as disposições do procedimento ordinário (§ 5.º).

6.1.1.Juízo de admissibilidade da acusação

Pela nova redação do art. 395, a denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I - for manifestamente inepta;

II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou

III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.

Foi expressamente revogado o art. 43, que indicava as causas de rejeição da inicial.

Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. É o que dispõe o caput do art. 396, sendo que o parágrafo único esclarece que no caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído.

Desse modo, a decisão sobre o recebimento da denúncia ou da queixa deverá ser fundamentada, devendo a inicial ser rejeitada quando falta um dos requisitos enumerados no art. 395, a seguir comentados.

6.1.1.1.Inépcia

A denúncia e a queixa, para não serem declaradas ineptas, devem ser formuladas de acordo com os requisitos do art. 41, do CPP, que são: exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias; a qualificação do acusado ou esclarecimento pelos quais possa ser identificado; a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas.

Maior relevância apresenta a descrição pormenorizada dos fatos, pois é deles que o acusado se defende; também, permitirá que o juiz afira sobre a efetiva ocorrência de fato típico, delimitando o campo temático a ser discutido no processo, até o seu final [04].

O segundo requisito é a qualificação do acusado, o que significa informar seu nome completo e, sempre que possível, os demais dados de identificação, inclusive o seu RG, se o possuir, para evitar complicações com homônimos. Quando não se dispuser de dados sobre a qualificação, é suficiente a indicação da identidade física (CPP, arts. 41 e 259).

Outro dos requisitos formais de elaboração da denúncia ou da queixa é a classificação do crime (CPP, art. 41). Como assinala Eugênio Pacelli de Oliveira [05], a exigência visa atender a duas ordens distintas de interesses. A primeira consiste na afirmação inicial da competência jurisdicional, em face das regras de distribuição de competência constantes da Constituição Federal e das leis de organização judiciária.

A segunda visa assegurar a ampla defesa, permitindo ao acusado, desde logo, o conhecimento, o mais completo possível, da pretensão punitiva contra ele instaurada.

Essa classificação, isto é, a capitulação legal do fato, como se sabe, é provisória e só se tornará definitiva com a sentença transitada em julgado.

Finalmente, o art. 41 se refere ao rol de testemunhas. Em regra, há necessidade de se arrolar testemunhas, para comprovação do alegado. O número de testemunhas varia de acordo com o rito do processo.

6.1.1.2.Pressupostos processuais

Os pressupostos processuais podem ser subjetivos e objetivos ou de validade. Pressupostos subjetivos dizem respeito à competência e imparcialidade do juiz e à capacidade das partes. Os objetivos referem-se a formalidades do processo, como a citação válida, a adoção do procedimento adequado, a aptidão da inicial, a inexistência de litispendência, coisa julgada ou de nulidades [06].

Portanto, ao decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, além analisar a peça acusatória sob o aspecto formal, cumpre ao juiz averiguar a existência dos pressupostos da relação processual, velando pela regularidade do processo (CPP, art. 251).

Satisfeitas as condições mínimas para o exercício do direito de ação, resta ao juiz investigar se também estão satisfeitas as condições mínimas de viabilidade da relação processual.

6.1.1.3.Condições genéricas da ação

Para que seja legitimamente recebida a peça inicial da acusação – denúncia ou queixa – é necessário conferir-se a presença das condições genéricas da ação, isto é, verificar se estão presentes os requisitos mínimos indispensáveis para a formação da relação processual, o juiz deverá constatar se estão presentes as três condições da ação: possibilidade jurídica do pedido, legitimidade e interesse de agir. São chamadas de condições genéricas porque comuns a todo tipo de ação, distintas das condições específicas ou de procedibilidade, exigíveis em hipóteses determinadas.

Na realidade, como salienta Maria Thereza Rocha de Assis Moura [07], o CPP não contempla, exatamente, essas três condições, como se pode conferir no seu art. 43, mas a doutrina transpôs para o processo penal as condições da ação, nos moldes em que traçadas para o processo civil, com adaptações.

Contudo, a possibilidade jurídica do pedido foi inserida entre as causas de absolvição sumária, uma novidade da reforma (quanto ao rito comum), a ser comentada mais adiante. Restaram, portanto, legitimidade e interesse de agir.

A Legitimidade para a causa (legitimatio ad causam) é definida como a pertinência subjetiva da ação, a qual somente poderá ser exercida pelo titular de uma situação jurídico-material. Diz respeito, em suma, à titularidade ativa e passiva da ação penal. Está relacionada, portanto, com a questão afeta à legitimidade de parte para propor a ação ou para figurar como réu. Sua ausência provoca nulidade absoluta (CPP, art. 564, II).

No processo penal, em regra, o sujeito ativo é o Estado, como titular do direito de punir, cuja função é exercida, privativamente, pelo Ministério Público (CF, art. 129, I). De maneira excepcional, essa atividade pode ser exercida pelo ofendido, na condição de legitimado extraordinário ou substituto processual. De outro lado, o legitimado passivo é o acusado pelo crime.

Se, por exemplo, for denunciado um menor de 18 anos, a denúncia não poderá ser recebida, por faltar-lhe legitimatio ad causam, já que inimputável. Se o menor for a vítima, faltará legitimidade ad processum, ou seja, capacidade de estar em juízo, devendo também a queixa ser rejeitada. No primeiro caso, a ação deve ser anulada (CPP, art. 564, III) e, no segundo, poderá a queixa ser ratificada ou refeita, conforme art. 568, do CPP [08].

Podem duas ou mais pessoas ter legitimidade para figurar tanto no pólo ativo como no passivo. Assim, pode haver uma denúncia e uma queixa, simultaneamente, estabelecendo-se um litisconsórcio ativo entre o órgão estatal da acusação e o querelante. E, também, uma acusação pode ser dirigida contra vários acusados (litisconsórcio passivo).

Segundo lição adotada por Maurício Zanoide de Moraes [09], em virtude da ocorrência de um fato tido como delituoso, que gera um estado de intranqüilidade social, surge a necessidade do exercício jurisdicional, visando a pacificação, pois de acordo com o art. 5.°, LIV, da CF, "ninguém será privado de sua liberdade e de seus bens sem o devido processo legal". Assim, o interesse de agir tem como causa a controvérsia surgida com o cometimento da infração. E, para que haja a ‘controvérsia’, é imprescindível a presença doe trinômio conduta, ius puniendi e ius libertatis.

6.1.1.4.Condições de específicas ou de procedibilidade

Como visto, as condições genéricas são exigíveis a todo tipo de ação. Porém, em alguns casos, a lei exige o preenchimento de determinadas e específicas condições para o exercício da ação penal. É o caso, por exemplo, das ações públicas condicionadas, em que o Ministério Público somente poderá ingressar com a ação mediante representação ou requisição do Ministro da Justiça.

6.1.1.5.Justa causa

É certo, ainda, que o exercício do direito de ação penal exige que o inquérito ou as peças de informação contenham elementos sérios e idôneos demonstrando que houve uma infração penal, e indícios, mais ou menos razoáveis, de que o seu autor foi a pessoa apontada no processo informativo ou nos elementos de convicção, porque a propositura de uma ação acarreta vexames à pessoa contra quem foi proposta [10].

Em conseqüência, parte da doutrina entende que só existe interesse de agir na ação penal de natureza condenatória quando houver fumus boni iuris ou justa causa, vistos como idoneidade do pedido. Em caso contrário, o juiz pode declarar desde logo inadmissível a acusação, porquanto, faltando justa causa, inexistirá interesse processual.

O art. 43, do CPP, que cuidava das hipóteses de rejeição da ação penal, expressamente, não exigia tais elementos, para o recebimento da denúncia ou queixa; no entanto, pela sistemática do código, já se podia perceber a exigência, tanto que o art. 648, I, do CPP diz que haverá constrangimento ilegal "quando não houver justa causa". E é com fundamento nesse dispositivo que os Tribunais vêm "trancando a ação penal", seja pública, seja privada, todas as vezes em que ela não se arrime em elementos razoáveis de convicção quanto ao fato infringente da norma e sua autoria [11].

Com a reforma, o CPP passa a prever expressamente a justa causa, como requisito de admissibilidade da acusação. Se inexistente, a inicial deverá ser rejeitada, uma vez que a denúncia ou queixa apenas deve ser oferecida (e recebida) quando estiver amparada em provas mínimas de autoria e materialidade do crime, evitando-se acusações temerárias, visando resguardar o status dignitatis do acusado [12]. Caso isso não seja observado, resta o remédio do habeas corpus para trancar a ação penal ou impedir o indiciamento.

6.1.2.Citação do acusado: defesa preliminar e suspensão do processo

Recebida a inicial, o juiz deverá determinar a citação do acusado e notificação para a apresentação de defesa preliminar.

Havendo proposta de suspensão do processo (art. 89, da Lei n. 9.099/95), deverá, ainda, ser designada audiência para apresentação ao acusado e seu defensor.

A suspensão do processo consiste em uma transação entre o Ministério Público e o acusado e seu defensor, a fim de suspender a tramitação do processo, de forma que o acusado abre mão do direito de sustentar sua defesa, na expectativa de ver extinta sua punibilidade, mediante o cumprimento de algumas condições.

De acordo com esse dispositivo, nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidos ou não pela Lei (9.099/95), o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, desde que preenchidas as demais condições exigíveis.

A lei menciona que a proposta ao acusado deva ser feita antes do recebimento da denúncia, mas, segundo a doutrina o recebimento deve preceder a proposta. A esse respeito, escreveram Ada Pellegrini Grinover e outros: "Pela ordem legal, primeiro marcar-se-ia a audiência de conciliação, ouvir-se-ia o acusado, celebrar-se-ia a transação, para depois o juiz examinar a viabilidade da denúncia. Na verdade, o juízo de admissibilidade da denúncia, exigido pela lei, deve anteceder à designação de audiência de conciliação" [13]. No mesmo sentido se posiciona Weber Martins Batista [14]. Também na prática ocorre dessa forma.

O que não nos parecia adequado era a realização do interrogatório antes da proposta de suspensão. Isso não poderá mais ocorrer, porque o interrogatório deixa de ser o primeiro, para ser o último ato da instrução do processo (CPP, art. 400, com a redação da Lei n. 11.1719/08), de forma que, havendo suspensão do processo, ele estará incluído, forçosamente.

Segundo o art. 396-A, na defesa, o acusado poderá argüir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário, processando-se a exceção em autos apartados (art. 396 A § 1.º).

Portanto, a resposta da defesa à acusação tem a finalidade de eliminar desde logo os casos mais aberrantes de inviabilidade de ação penal. Também quando a prova é inequívoca sobre a legítima defesa, por exemplo, faculta-se a imediata absolvição, sem necessidade de se submeter o acusado a um longo e moroso processo.

Essa defesa preliminar, tendo em vista sua finalidade, é obrigatória, devendo ser nomeado defensor dativo para esse fim, se o acusado não o constituir. (art. 396 § 2.º).

6.1.3.Absolvição sumária

A reforma introduziu, na redação ao art. 397, a possibilidade de absolvição sumária, quando o juiz verificar:

I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;

II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou

IV - extinta a punibilidade do agente.

Por isso que a defesa é apresentada em momento anterior à uma decisão de absolvição sumária. Assim, o acusado e seu defensor devem se valer dessa oportunidade para influírem no convencimento do juiz a respeito das possibilidades que se descortinam a partir do artigo 397, evitando-se a delonga desnecessária do processo.

6.1.4.Designação de audiência e intimações

Conforme já referido, no artigo 396, caput consta que o juiz recebe a denúncia e manda citar o acusado. E o art. 399, em repetição, prevê: sendo recebida a acusação, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente. Em verdade, o recebimento já havia ocorrido, inclusive com a determinação de citação do acusado.

A esse respeito, escreveu Gustavo Badaró [15]:

O Projeto de Lei n. 4.207/01 criava uma fase intermediária de juízo de admissibilidade da acusação e concentrando os atos de instrução, debates e julgamento em uma única audiência. Todavia, por força de emendas na Câmara dos Deputados, tal mudança acabou sendo incorporada à Lei n. 11.719/08, que continua prevendo o recebimento imediato da denúncia ou queixa, antes da apresentação da defesa.

Nesse mesmo sentido, assevera Pierpaolo Bottini [16] que o legislador perdeu ótima oportunidade de consagrar o contraditório na fase preliminar ao recebimento da denúncia no processo comum, na Lei n. 11.719/08, "ao estabelecer que, apenas após o recebimento da denúncia, será citado o réu para o oferecimento da resposta".

Entretanto, para Maria Elisabeth Queijo [17]:

... o Projeto de Lei n. 4.207/01 estabeleceu a apresentação de resposta preliminar, pela defesa, antes do recebimento da denúncia. Na Lei n. 11.719, embora o rigor técnico do Projeto não tenha prevalecido, a interpretação sistemática dos arts. 396, 397 e 399, conduz à conclusão da manutenção da resposta à acusação antes do recebimento da peça vestibular.

Penso que a primeira posição seja a mais correta, inclusive porque no art. 399, a lei se refere à intimação. Deve-se entender que, não sendo caso de absolvição sumária, isto é, decidindo pelo prosseguindo da ação, o juiz designará audiência e mandará intimar a todos, requisitando o acusado se estiver preso.

6.1.5. Interrogatório do réu preso

Do § 1.º, do art. 399, consta que "o acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o Estado providenciar sua apresentação".

Entretanto, melhor seria que o legislador adotasse o mesmo critério adotado em relação ao Tribunal do Júri, em que o acusado tem a faculdade de não ser conduzido contra sua vontade [18]. De fato, não faz sentido obrigar o acusado comparecer, quando se sabe que sua presença na audiência é um direito, não obrigação, correspondente ao direito a permanecer calado.

De qualquer modo, assim como consta do capítulo referente ao interrogatório do acusado (arts. 185 e ss), denota-se, mais uma vez, que a lei federal não adotou, ainda, o interrogatório por vídeo-conferência.

6.1.6. O princípio da identidade física do juiz

O § 2.º, desse mesmo art. 399, ao dispor que "o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença", introduz uma novidade ao processo penal, que é a aplicação da regra da identidade física do juiz.

6.2. Procedimento ordinário

De acordo com o § 2.º, do art. 394, aplica-se a todos os processos o procedimento comum, salvo disposições em contrário do CPP ou de lei especial. E o § 4.º acrescenta que as disposições dos arts. 395 a 398 aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados no Código.

Portanto, a partir desse ponto, a disciplina do procedimento é exclusiva do rito ordinário.

6.2.1. Audiência de instrução

O primeiro ponto a se destacar, quanto ao rito ordinário, é a fixação de prazo de 60 (sessenta) dias para a realização de audiência de instrução e julgamento, conforme consta do art. 400, caput.

Nessa audiência, pretende-se que sejam realizadas todas as provas: tomada de declarações do ofendido, inquirição das testemunhas (exceto as que tiverem de ser ouvidas mediante carta precatória), esclarecimentos dos peritos, se requerido previamente (§ 2.º), acareações e reconhecimento de pessoas e coisas e, finalmente, interrogatório do acusado.

A grande novidade trazida pela reforma, no tocante a esse rito, consiste na realização de audiência concentrada, o que, aplaudido por uns, é visto com ceticismo por parte de vários doutrinadores e profissionais, pela dificuldade que se vislumbra. Basta, por exemplo, que falte uma testemunha da acusação, para inviabilizar a conclusão da audiência na mesma data. Além disso, se todas comparecerem, será o grande número de pessoas a serem ouvidas na mesma data, além de outras diligências.

É verdade, que, nos termos do § 1.º, poderá o juiz indeferir as provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Todavia, é preciso conciliar a pretendida celeridade com o direito à prova, evitando-se indevido cerceamento, que poderá ensejar impugnação.

Em obediência aos princípios do contraditório e ampla defesa, devem ser ouvidas em primeiro lugar as testemunhas arroladas pela acusação, inclusive as vítimas, depois as testemunhas arroladas pela defesa, exceto no caso de ser expedida carta precatória.

Outra importante mudança foi o deslocamento do interrogatório para o final, o que era reclamo de grande parcela da comunidade jurídica, com o fim de assegurar plenamente o contraditório e a defesa.

Entretanto, para Jayme Walmer de Freitas [19], se o interrogatório continuasse como o primeiro ato da instrução, o juiz teria melhores condições de ouvir as testemunhas levando em consideração, também, a versão que ele der e não apenas aquela constante da denúncia ou da queixa. Além disso, no caso de confissão, testemunhas poderão ser dispensadas, com a economia de tempo e, consequentemente, maior celeridade processual.

Foi mantido o mesmo número de 8 (oito) testemunhas para o rito ordinário, tal como se previa anteriormente, não computáveis as não compromissadas e as referidas (art. 401).

No art. 401, § 2.º, consta que a parte poderá desistir da inquirição de qualquer das testemunhas arroladas. O projeto previa que a dispensa da testemunha, pelo juiz, dependeria da anuência da outra parte. Mas, a lei não prevê essa condição.

6.2.2. Realização de diligências, debates e julgamento

Ao final da audiência, as partes poderão requerer diligências cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução. O art. 402 reproduz o que constava do art. 499, oportunizando o requerimento de diligências complementares, pelas partes. Entretanto, anteriormente, havia um prazo de 24 horas para a manifestação, enquanto que a reforma prevê o pedido na própria audiência. Realmente, não havia razão para que a manifestação fosse postergada, pois todos os interessados devem estar presentes à audiência e, certamente, já terão condições de saber o que se faz necessário.

Poderá, ainda, o juiz, considerada a complexidade do caso ou o número de acusados, conceder às partes o prazo de 5 (cinco) dias, sucessivamente, para a apresentação de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentença.

De acordo com o art. 403, "não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais, por vinte minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais dez, proferindo o juiz, a seguir, sentença". O tempo previsto para a defesa é individual, isto é, havendo mais de um acusado, vinte minutos para cada um (§ 1.°). Ao assistente do MP, o prazo concedido é de dez minutos, tempo que será acrescido à defesa (§ 2.º).

Assim, ao contrário do sistema anterior, em que as alegações eram sempre oferecidas por escrito (art. 500), a reforma introduziu o formato de debates orais também para o rito ordinário, com a prolação imediata da sentença. A imediação não ocorrerá em situações excepcionais. A primeira hipótese para a apresentação de alegações escritas é a necessidade de diligências (art. 404). A segunda, quando houver complexidade ou grande número de acusados (art. 403, § 3.º).

Nesses casos, a audiência é concluída sem as alegações finais e, consequentemente, sem a sentença. As partes têm cinco dias para apresentarem as alegações escritas e o juiz deverá sem sentenciar em dez dias, nos dois casos (art. 404, parágrafo único).

6.2.3.Ata da audiência

As ocorrências da audiência serão registradas em ata, contendo breve resumo dos fatos relevantes, que assinam as partes e o juiz (art. 405).

A lei dispõe, ainda, que sendo possível, o registro das oitivas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações (art. 405 § 1.°) e "no caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição" (§ 2.º).

Afirma Rodrigo de Abreu Fudoli [20] que essas alterações do procedimento ordinário darão ensejo a novo entendimento sobre o prazo anteriormente aceito como limite para realização de instrução com réu preso (81 dias).

No entanto, a nosso ver, não deverá ocorrer grande modificação, tendo em vista que a soma dos prazos ora fixados se aproxima muito desse mesmo limite. Conforme o próprio autor relaciona, é de dez dias o prazo para conclusão do inquérito (art.10) e de cinco para o oferecimento da denúncia (art. 46), entre um e cinco dias para a decisão de admissibilidade da acusação (art. 800); dez dias para a defesa preliminar (art. 396), que poderá ser computado em dobro, no caso da necessidade de defensor dativo e até sessenta dias para a realização da audiência (art. 400).

Por conseguinte, totaliza-se um prazo equivalente àquele ou pouco superior, se utilizado o prazo máximo para a realização da audiência.

Deve ser levado em conta, também, o disposto no novo art. 412, que fixa o prazo de 90 dias para conclusão da primeira fase do procedimento referente ao Tribunal do Júri, isto é, até a prolação da decisão de pronúncia. Como os atos praticados no rito ordinário correspondem àqueles da fase inicial do júri, pode servir a mesma regra como parâmetro.

Entretanto, como antes, o caso concreto é que permitirá uma correta análise, pois, mesmo naquelas hipóteses em que a audiência não se encerrar no mesmo dia, havendo necessidade de diligências, prazo para memorais e para sentença, a instrução propriamente dita já terá sido concluída, do mesmo modo que ocorria anteriormente, quando esses atos se desdobravam nas previsões dos arts. 499 a 502.

Essa possibilidade de excesso de prazo decorre da adoção da Teoria dos Três Critérios, criada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos e que se aplica no Brasil. Esses três critérios são: complexidade do caso; conduta processual do acusado e conduta das autoridades judiciárias [21].

A partir do art. 406, o CPP disciplina o rito do júri, objeto de reforma por outra lei (Lei n. 11.689/08), que será comentada à parte. Tal distinção não será necessária quando os comentários se referirem ao CPP como um todo, em que não se levará em consideração as leis modificadoras, que serão absorvidas pelo Código.

Assim, tendo em vista que este texto se destina a comentar a Lei n. 11.719/08, prossegue-se com o rito sumário.

6.3. Procedimento sumário

Em relação ao rito sumário, primeiramente, cumpre relembrar que lhe são aplicadas as disposições dos arts. 395 a 398, conforme prevê o art. 394, § 4.º.

Portanto, todos os dispositivos comentados anteriormente devem ser reconsiderados, de modo especial o art. 399, que dispõe: "sendo recebida a acusação, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente"

Então, partindo desse ponto, o art. 531, inicia a descrição do sumário fazendo referência à audiência de instrução e julgamento, ao mesmo tempo em que indica a primeira distinção entre esse procedimento e o ordinário: trata-se do prazo máximo para designação de audiência, que é de 30 e não 60 dias.

No mais, o art. 531 reproduz inteiramente o que consta do art. 400, senão vejamos:

Art. 531. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 30 (trinta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se, finalmente, ao debate.

A segunda distinção entre os dois ritos mencionados se apresenta no art. 532, que estabelece em cinco o número de testemunhas a serem arroladas pelas partes.

De outro lado, dispõe o art. 533 sobre a aplicação ao procedimento sumário do disposto nos parágrafos do art. 400 do CPP. Sendo assim, as provas serão produzidas numa só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias (§ 1.º) e os esclarecimentos dos peritos dependerão de prévio requerimento das partes (§ 2.º ).

Seguem-se, de conformidade com o art. 534, os debates orais e a sentença. Cada parte tem o prazo de vinte minutos, prorrogáveis por mais dez, sendo individual também, o prazo em relação a cada acusado, se houver mais de um (§ 1.º). Havendo assistente do Ministério Público, terá a palavra por dez minutos, tempo que será acrescido ao da defesa (§ 2.º)

Nesse rito não se prevê a possibilidade de concessão de prazo para diligências, alegações escritas e para a sentença. Todos os atos devem ser realizados na audiência, efetivamente concentrada.

Para assegurar a celeridade, dispõe o art. 535: "nenhum ato será adiado, salvo quando imprescindível a prova faltante, determinando o juiz a condução coercitiva de quem deva comparecer".

Nesse caso, "a testemunha que comparecer será inquirida, independentemente da suspensão da audiência, observada em qualquer caso a ordem estabelecida no art. 531 deste Código" (art. 536).

De acordo com o art. 538, quando o juizado especial criminal encaminhar ao juízo comum peças de informação referentes a infração de menor potencial ofensivo, será observado o procedimento sumário.

Como se sabe, o rito para as infrações de menor potencial ofensivo é o sumaríssimo. Contudo, se o acusado não for localizado para citação (art. 66, parágrafo único) ou quando a complexidade do caso exigir (art. 77 § 2.º), ambos da Lei 9.099/95, deve o processo ser remetido ao juízo comum, onde terá prosseguimento.

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Sobre o autor
Antonio Milton de Barros

promotor de Justiça aposentado, mestre e doutorando em Direito pela PUC/SP, professor de Processo Penal na Faculdade de Direito de Franca (SP), fundador-coordenador do Núcleo de Aperfeiçoamento e Crítica de Ciências Criminais (NACCRIM) da Faculdade de Direito de Franca (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Antonio Milton. A reforma do CPP em relação aos procedimentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1868, 12 ago. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11584. Acesso em: 23 nov. 2024.

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