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Assédio moral: problema antigo, interesse recente

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4. CONSEQÜÊNCIAS DO MOBBING PARA A VÍTIMA, ORGANIZAÇÃO EMPRESARIAL E SOCIEDADE.

A violência psicológica cometida em relação ao empregado seja por um superior, subordinado, ou colega de trabalho de igual hierarquia, acarreta graves conseqüências não apenas à vítima, mas também à empresa e à sociedade.

Os sucessivos ataques dirigidos à vítima ensejam distúrbios psicossomáticos e psicológicos, sendo de mais comum ocorrência a cefaléia, transtornos digestivos e cardiovasculares, insônia, fadiga, irritabilidade, ansiedade, burnout (estresse por acúmulo de trabalho), crises de choro, sentimento de inutilidade e fracasso, dificuldade de concentração, obsessões, fobias, crises de auto-estima, depressão, angústia, sentimento de culpa, aumento de peso ou emagrecimento exagerado, redução da libido, aumento da pressão arterial, abuso de álcool, tabaco e outras drogas e pensamentos suicidas.

Não bastassem os resultados nefastos que o mobbing provoca nas vítimas, também as empresas sentem as conseqüências dessas situações de violência moral cometidas no ambiente profissional, que envolvem o absenteísmo (ausência ao trabalho), queda da produtividade e da competitividade, rotatividade de mão-de-obra pela saída do assediado do emprego, gastos com a qualificação do novo contratado, diminuição da qualidade dos produtos e serviços, deterioração da imagem da empresa e despesas com o pagamento de indenizações decorrentes de processos judiciais por assédio moral.

Outrossim, é inegável que o psicoterror aumenta os riscos de acidente de trabalho, pois em razão dos constantes ataques sofridos, a vítima fica desatenta e com dificuldade de concentração, incumbindo à empresa, em caso de infortúnio, arcar com os prejuízos decorrentes do evento e com os primeiros quinze dias de afastamento do empregado. Notório, portanto, que o assédio moral nenhuma vantagem traz a qualquer das partes, representando, sob o ponto de vista do empregador, uma queda em sua lucratividade.

Não se olvide, ainda, que a violência moral no trabalho projeta efeitos negativos sobre a sociedade, podendo-se sob este prisma mencionar como conseqüências do assédio "a precarização das condições de qualidade de vida, crises de relações familiares e comunitárias, custos sociais por enfermidade, aumento do mal-estar, riscos de suicídio, de aborto e divórcios, além do desemprego" (FERREIRA, 2007, p.48/49).

Assim, também o Estado sofre os efeitos perversos do assédio moral, arcando com elevados custos no que tange à saúde pública, à assistência e à previdência social, prestando serviços de reabilitação profissional e concedendo benefícios previdenciários em razão do afastamento precoce dos empregados/segurados.


5. TRATAMENTO LEGAL CONFERIDO AO ASSÉDIO MORAL NO BRASIL.

Como antes afirmado, o termo assédio moral surgiu no Brasil, pela primeira vez, no texto do Projeto de Lei nº 425/1999 apresentado à Câmara Municipal de São Paulo, que versava sobre a aplicação de penalidades à prática desse comportamento no âmbito da administração direta municipal.

Apesar do pioneirismo deste projeto de lei, elaborado em 1999, o mesmo somente foi convertido em lei municipal (Lei 13.288) em 2002, e, neste intervalo de tempo, enquanto se aguardava a aprovação pela Câmara do Município de São Paulo, foi publicada, pelo município de Iracemápolis, a primeira lei municipal brasileira sobre assédio moral, a Lei nº 1.163/2000, com aplicação restrita aos servidores públicos dessa Edilidade e dispondo sobre o tema nos seguintes termos:

Artigo 1º - Ficam os servidores públicos municipais sujeitos às seguintes penalidades administrativas na prática de assédio moral, nas dependências do local de trabalho:

(...)

Parágrafo Único - Para fins do disposto nesta Lei, considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a auto-estima e a segurança de um individuo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução da carreira profissional ou à estabilidade do vínculo empregatício do funcionário, tais como: marcar tarefas com prazos impossíveis, passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um funcionário só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; subestimar esforços . grifei

Após a louvável iniciativa do município de Iracemápolis-SP, diversos outros trilharam o mesmo rumo editando leis próprias que combatessem a prática do assédio moral no âmbito da administração municipal, a exemplo de Cascavel – PR (Lei nº 3.243/01), Guarulhos – SP (Lei nº 358/01), Sidrolândia – MS (Lei nº 1.078/01), Jaboticabal - SP (Lei nº 2.982/01), São Paulo – SP (Lei nº 13.288/02), Natal – RN (Lei nº 189/02), Americana – SP (Lei nº 3.671/02), Campinas – SP (Lei nº 11.409/02) e São Gabriel do Oeste – MS (Lei nº 511/03).

Fácil concluir, então, que os poderes legislativos de diversos municípios, por todo o país, se empenharam em aprovar leis de combate ao assédio moral, conceituando o fenômeno e impondo penalidades aos servidores que nele incorressem. No âmbito estadual, entretanto, a produção legislativa não se revelou tão intensa quanto se fazia necessário, figurando o Estado do Rio de Janeiro como o pioneiro na edição de lei contra o psicoterror, a Lei nº 3.921, de 23 de agosto de 2002, vedando esta prática no âmbito dos órgãos, repartições ou entidades estatais.

A despeito de existir alguma proteção legislativa municipal e estadual às vítimas de assédio moral, ainda que limitada aos servidores públicos, não podemos deixar de lamentar a ausência de legislação em vigor no âmbito federal que discipline este tema, sendo vários os projetos em trâmite perante o Congresso Nacional que abordam o tema do assédio moral, inclusive tipificando-o como crime, a exemplo dos Projetos de Lei nº 4.742/2001 e nº 5.971/2001, no entanto, todos se encontram pendentes de apreciação e aprovação.

É de se registrar, ainda, que a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, datada de 1º maio de 1943, também não possui nenhum dispositivo em seu bojo que contemple de forma direta e específica o assédio moral no âmbito laboral, ficando o empregado, portanto, carente de proteção legal.

Após os argumentos tecidos, pode-se indagar: se inexiste no âmbito federal diretiva específica para o combate à ocorrência do assédio moral, como se concretizará a proteção do empregado? Ante a insuficiência legislativa, resta claro que não pode a vítima do assédio psicológico ficar à míngua de proteção, sendo imperiosa, então, a invocação de princípios constitucionais protetivos de aplicação imediata ao caso concreto.

5.1 Recurso aos princípios constitucionais e à teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Como explanado no tópico anterior, a legislação acerca do assédio moral revela-se insipiente, clamando, portanto, a invocação de princípios constitucionais basilares, a fim de impedir e fazer cessar as violações à intimidade e dignidade do trabalhador assediado.

É de clareza solar que os atos de perseguição e humilhação praticados pelo perverso, que minam a auto-estima da vítima e visam destruí-la, afrontam, diretamente, o princípio constitucional da dignidade humana, estampado no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. Este princípio constitucional, ao ser erigido à condição de fundamento da República Federativa do Brasil, demonstra o intento do constituinte em conferir à pessoa humana posição de destaque no sistema jurídico, figurando como fundamento e fim da sociedade e do Estado.

Neste contexto de análise da primazia do princípio da dignidade da pessoa humana, emergem questionamentos acerca dos destinatários deste preceito, isto é, se a observância de tais normas são obrigatórias tão somente em relação ao Estado, ou se também vincula os particulares.

Durante longo período reinou a interpretação de que os direitos fundamentais possuíam eficácia apenas vertical, ou seja, somente eram oponíveis aos poderes públicos, não tendo aplicabilidade e eficácia entre particulares, por vigorar entre estes o princípio da autonomia privada.

Em contraposição à corrente até então adotada, exsurge, através da doutrina alemã, a teoria da eficácia imediata ou direta dos direitos fundamentais, também denominada teoria da "Drittwirkung", que reconhece a ampla oponibilidade dos direitos fundamentais nas relações privadas, eis que não apenas o Estado é capaz de violá-los.

A doutrina majoritária, atualmente, se inclina a favor desta última teoria, pois não há como se conferir prevalência ao princípio da autonomia privada se este se funda na inverídica premissa de "igualdade entre as partes". Esta igualdade, na prática, revela-se meramente formal e, no dizer de Guedes (2005, p.125), "vem se esboroando diante da perversa realidade do agigantamento crescente do poder privado".

É clarividente, portanto, que não apenas o Estado pode figurar como agente violador de direitos fundamentais, mas também os particulares, impondo-se, por tais motivos, a eficácia direta e imediata destes direitos nas relações ditas horizontais.

Saliento que a adoção da teoria do "Drittwirkung" implica no reconhecimento da unidade do ordenamento jurídico e, por conseguinte, na "impossibilidade de se conceber o Direito Privado como um gueto, à margem da Constituição e dos direitos fundamentais" (SARMENTO, 2004, p. 245/246). Ademais, entendo que esta teoria está em perfeita harmonia com o exposto no §1º, do artigo 5º, da Carta Magna, o qual dispõe que as normas definidoras dos direitos fundamentais possuem eficácia imediata.

Assim, plenamente possível é a invocação do princípio da dignidade humana, previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, como forma de proteção ao empregado que, no exercício do seu labor, é assediado moralmente por um empregador que, ao praticar tais atos ou consentir que os mesmos sejam praticados, viola princípios, normas constitucionais e descumpre com a função social do contrato de trabalho.

Por outra vertente, temos que os ataques perpetrados pelo agressor no ambiente de trabalho, que achincalham a auto-estima da vítima e ofendem sua honra (subjetiva e objetiva), intimidade e imagem, infringem o direito fundamental elencado no artigo 5º, inciso X, da Carta Magna, assegurando-se, ao ofendido, o direito à indenização pelos danos materiais e morais decorrentes da violação.

Outras normas constitucionais podem, ainda, ser invocadas para a proteção do empregado, a exemplo dos artigos 7º, inciso XXII, 170, inciso VI e 225, caput, que obrigam o empregador, sob pena de responsabilização, a garantir um meio ambiente de trabalho seguro e sadio, livre de fenômenos maléficos que causem danos à saúde física e psíquica do obreiro, como o assédio moral.

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Por fim, enalteço que ao se vislumbrar a prática do assédio moral como ofensiva aos direitos personalíssimos do empregado, este pode, além de obter indenização pelos danos morais sofridos, pleitear a rescisão indireta do contrato de trabalho, invocando, para tanto, as alíneas "a", "b" ou "e", do artigo 483, da CLT, fazendo jus, assim, a todas as verbas inerentes à despedida sem justa causa.


6. FORMAS DE PREVENÇÃO.

As conseqüências trazidas pelo assédio moral no meio ambiente profissional mostram-se extremamente negativas e de intensa gravidade e, extirpar este fenômeno quando já inserido no meio laboral, torna-se tarefa de destacada dificuldade, mormente pelo pacto de tolerância e silêncio que geralmente acompanham esta forma de violência psicológica.

Urge, então, a necessidade de agir com antecedência, através da adoção de políticas eficazes de prevenção do assédio moral no ambiente de trabalho, que minimizem as conseqüências desta prática não apenas para vítima, mas também para a empresa e a sociedade, sendo analisadas no presente estudo algumas propostas, deixando em aberto inúmeros outros caminhos e idéias que possam surgir e efetivamente contribuir para a erradicação desta nefasta prática.

6.1 Atividades de relaxamento e entretenimento.

Sempre que estivermos diante de organizações de trabalho que incentivem a competitividade desmedida, a produtividade acima do bem estar dos obreiros e que, rotineiramente, se valham da ameaça do desemprego como forma de pressão, o assédio moral encontrará ambiente fértil para nascer e se difundir. O primeiro passo, portanto, é dar aos empregados melhores condições de trabalho como forma de afastar o estresse da rotina laboral, pois melhorando a qualidade de vida, a frustração dos trabalhadores diminui.

Inúmeras são as tentativas empreendidas pelo setor de recursos humanos e psicólogos das empresas a fim de combater o estresse, sendo uma das técnicas mais bem sucedidas e utilizadas a que prevê a reserva, geralmente no período matutino, de alguns minutos do horário de trabalho para o incentivo de atividades lúdicas e físicas, como exercícios de alongamento, respiração e meditação através de músicas relaxantes.

É importante que nestes momentos de interação, descontração e relaxamento participem conjuntamente todos os empregados, desde os integrantes do mais alto escalão da organização empresarial até o denominado "chão da fábrica".

Trata-se de medida simples, de baixo custo e que gera resultados extremamente positivos, pois ao se dispensar atenção e cuidado aos empregados, estes elevam sua auto-estima, aumentam sua auto-confiança e, conseqüentemente, melhoram a qualidade de vida mantendo incólume sua saúde mental.

6.2 Novas técnicas de gerenciamento. A técnica da avaliação 360 graus.

É certo que a depender do modelo de gerenciamento adotado na empresa, pode o fenômeno da violência psicológica encontrar um ambiente propício para o seu desenvolvimento, a exemplo da gestão por estresse, por injúria ou pelo medo.

A fim de evitar formas de administração que permitam a proliferação do mobbing no ambiente de trabalho e que culminam por causar graves prejuízos de ordem econômica à empresa – como as elevadas indenizações por danos morais - emergem novas técnicas de gerenciamento, como a avaliação ou "feedback" de 360 graus.

Esta técnica de gestão, surgida nos Estados Unidos na década de 70, permite a melhora na comunicação, o aumento da transparência nas relações de trabalho e atua como eficaz instrumento para detecção de problemas e sua correção no âmbito empresarial interno. Trata-se de um sistema de avaliação de múltiplas fontes, por meio do qual é possível avaliar os colegas de trabalho e superiores hierárquicos, garantindo-se, sempre, o sigilo, o anonimato e a confidencialidade das manifestações e opiniões expressadas.

Assim, através da troca de informações, vislumbra-se um impacto positivo no meio ambiente de trabalho, pois permite o crescimento e o amadurecimento pessoal e profissional do avaliado que, muitas vezes, somente através desta avaliação toma ciência de seu desempenho, virtudes e defeitos dentro do grupo empresarial.

Note-se que esta técnica não deve ser aplicada apenas no sentido horizontal e vertical descendente, onde somente os subordinados são avaliados, mas também no sentido vertical ascendente, de forma a que os chefes, diretores, supervisores e gerentes sejam avaliados por seus inferiores hierárquicos, assimilem as críticas e, com este aprendizado, empreendam, se necessário, mudanças no perfil de liderança exercido.

A materialização desta técnica de gerenciamento ocorre geralmente através de questionamentos, nos quais são formuladas afirmações e o empregado ou superior hierárquico decide em qual categoria inserir a pessoa em questão, se ineficaz, não muito eficaz, razoavelmente eficaz, eficaz, extremamente eficaz ou não observado.

Os questionamentos hodiernamente indagam acerca do foco do avaliado ao cliente, do seu gerenciamento de equipe, se valoriza opiniões diferentes, se motiva e orienta, se possui bom relacionamento, se adota uma conduta ética no emprego, se existe coerência entre o que fala e o que faz, se valoriza o desenvolvimento dos empregados, dentre inúmeros outros.

Facilmente se percebe, então, que a implantação desta técnica na empresa pode contribuir significativamente na detecção do problema do assédio moral, pois ao se garantir o sigilo e o anonimato das manifestações, a vítima sente-se segura para identificar e expor seu agressor, sem medo de represálias. Em casos tais, deve o departamento de recursos humanos intervir energicamente, repreendendo o agressor por seu comportamento e conscientizando-o da gravidade que sua conduta representa ao bom andamento da organização empresarial.

6.3 Condutas afirmativas da empresa.

Apesar de ser a tática utilizada por muitos empregadores, negar a ocorrência de assédio moral no interior das empresas não minimiza e muito menos soluciona o problema, mas sim o agrava, pois o agressor ao não encontrar limites, prossegue inescrupulosamente até atingir o seu objetivo final de eliminação da vítima do ambiente de trabalho.

Ao invés da negativa, deve buscar o empregador adotar medida diversa, também revestida de simplicidade e baixo custo, que pode acarretar efeitos positivos à organização empresarial, como a divulgação e sensibilização dos obreiros acerca da realidade do assédio moral e suas devastadoras conseqüências.

O treinamento de gerentes para monitorar e identificar as primeiras indicações de conflito e prevenir a deterioração que o mobbing provoca, igualmente se revela uma eficiente medida, pois demonstra claramente não estar a empresa compactuando e tolerando esta forma de violência. Neste trabalho de primazia à informação, deve a empresa escolher profissionais especializados, como médicos do trabalho, psicólogos e advogados militantes nesta seara, que se engajem em uma campanha de explicação e conscientização desta prática, distinguindo o mobbing de outros fenômenos, abrindo espaço para debates, promovendo palestras, confeccionando e distribuindo folhetos explicativos e ensinando técnicas de autodefesa verbal aos ataques do agressor.

6.4 Ouvidorias e mediações.

Uma eficiente forma de combate à violência psicológica no ambiente de trabalho é o incentivo ao diálogo, o que permite uma boa comunicação no âmbito interno da empresa.

As vítimas do assédio moral hesitam em interpelar seus agressores e expor os atos de violência a que estão sendo submetidos, porque temem que assim venham a agravar a situação vivenciada. Sobressai, então, a necessidade de contar com a ajuda de terceiros em quem confiem, que os ouçam e os ajudem a proteger-se e a livrar-se dos ataques de que são vítimas diárias.

É neste contexto que surgem as ouvidorias, órgãos situados dentro da própria empresa, que recebam a queixa individual dos empregados e garantam o anonimato e o sigilo do queixoso e das denúncias formuladas. O acesso a este setor deve ser viabilizado não só pessoalmente, mas também através de correio eletrônico e contato telefônico, para que assim, sinta a vítima do mobbing mais conforto e segurança para denunciar o problema vivenciado.

Para o sucesso desta medida, é mister que os integrantes da ouvidoria gozem de independência de atuação e que possam intervir imediatamente no caso de denúncias de violência psicológica cometidas no ambiente de trabalho. O ideal é que a ouvidoria seja composta por uma equipe multidisciplinar, com profissionais de diversas áreas, principalmente psicólogos que ofereçam tratamento adequado à vítima, a fim de recuperar os danos que a violência psicológica perpetrada pelo agressor já possa lhe ter ocasionado.

Paralelamente ao tratamento adequado conferido à vítima, ao se detectar o problema, é importante que tenha início uma divulgação das nefastas conseqüências do fenômeno para a empresa, uma intensa fiscalização para impedir novas ocorrências e a punição exemplar dos agentes agressores identificados.

Além da implantação de uma ouvidoria, outra medida que também nos parece eficaz é a instituição de núcleos de mediação, onde o mediador, um terceiro imparcial, preferencialmente profissional da área da psicologia, auxiliará no conflito existente, aconselhando os envolvidos. Este mediador deverá gozar da independência necessária para exercer seu papel, possuir bom sentido de escuta e uma sensibilidade à problemática do assédio moral no ambiente de trabalho, repassando aos envolvidos segurança e imparcialidade em sua atuação.

Para que a eficiência desta medida não seja comprometida, urge que as informações obtidas e os encontros designados para o gerenciamento do conflito sejam mantidos na confidencialidade, longe do alcance de curiosos e livre de comentários maldosos e impertinentes de colegas insensíveis ao problema.

6.5 Marketing social dos sindicatos.

O sindicato desponta como importante ator social na luta contra o terror psicológico no trabalho. Através da utilização do marketing social, contribuem as entidades sindicais para dar efetividade à máxima da "informação ao alcance de todos", conscientizando os trabalhadores e combatendo esta prática perversa.

Método bastante utilizado pelos sindicatos é a elaboração de cartilhas, com frases de impacto, ilustrações explicativas, definições, formas de manifestação, conseqüências, proteção legal, direito a indenização, modos de prevenção, dentre outros aspectos relevantes, que demonstram que o problema existe, não é de rara ocorrência e que pode ser evitado.

Outra interessante forma de combate ao mobbing exercida pelos sindicatos é a inserção nas convenções e acordos coletivos de trabalho de cláusulas que vedem, responsabilizem e imponham pesadas multas às empresas que pratiquem ou permitam a prática do assédio moral no meio ambiente laboral.

É evidente que qualquer uma das medidas acima aludidas dá projeção a este problema social que afeta cada vez mais as relações de trabalho e, ao ser desmistificado e colocado ao conhecimento de todos, propicia o surgimento de novas e mais eficientes técnicas de combate ao fenômeno.

6.6 Abordagem pelo SESMT e CIPA.

Como exaustivamente mencionado, as conseqüências do assédio moral são devastadoras e geram moléstias que, em razão do nexo de causalidade que possuem com as atividades desenvolvidas no trabalho, podem ser definidas como doenças ocupacionais, equiparando-se, portanto, ao acidente do trabalho, conforme estatui o artigo 20, incisos I e II da Lei 8.213/91.

Assim, o trabalhador que é assediado moralmente e, por conseqüência desta agressão é acometido de qualquer moléstia, poderá se afastar do emprego e reclamar o benefício do auxílio-doença acidentário, sendo-lhe garantida a estabilidade provisória do emprego, como reza o artigo 118, da Lei 8.213/91.

O Decreto nº 3.048/99, que regulamenta a Lei dos Planos de Benefícios, especifica em seu anexo II alguns distúrbios originados da prática do mobbing, senão vejamos:

ANEXO II

DOENÇAS

AGENTES ETIOLÓGICOS OU FATORES DE RISCO DE NATUREZA OCUPACIONAL

(...)

X – Outros transtornos neuróticos especificados (Inclui "Neurose Profissional") (F48.8)

Problemas relacionados com o emprego e com o Desemprego (Z56.-): Desemprego (Z56.0); Mudança de emprego (Z56.1); Ameaça de perda de emprego (Z56.2); Ritmo de trabalho penoso (Z56.3); Desacordo com patrão e colegas de trabalho (Condições difíceis de trabalho) (Z56.5); Outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho (Z56.6)

(...)

XII - Sensação de Estar Acabado ("Síndrome de Burn-Out", "Síndrome do Esgotamento Profissional") (Z73.0)

1.       Ritmo de trabalho penoso (Z56.3)

2.       Outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho (Z56.6)

Inconteste, portanto, que estas doenças advêm da ausência de equilíbrio no meio ambiente laboral, acarretando o estresse profissional e ensejando diversas perturbações de ordem psíquica e física que podem, caso não haja o afastamento do empregado, contribuir para a ocorrência de acidentes de trabalho típicos.

O SESMT - Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho, regulamentado pela Portaria nº. 3.214, de 08 de junho de 1978, Norma Regulamentadora - NR–4, artigo 162 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, visa assegurar, promover e proteger a saúde e a integridade do trabalhador no local de trabalho.

A CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes - tem por objetivo "observar e relatar as condições de risco nos ambientes de trabalho e solicitar medidas para reduzir até eliminar os riscos existentes e/ou neutralizar os mesmos...", contribuindo para a preservação da saúde e integridade física dos trabalhadores e de todos os que interagem com a empresa.

Assim, compreendendo-se que o assédio moral ocasiona moléstias que podem constituir acidente de trabalho, não restam dúvidas que sua abordagem, através de reuniões e palestras, deve ocorrer também no âmbito do SESMT e da CIPA, órgãos cujas atribuições consistem exatamente em assegurar a saúde e o bem estar dos empregados no ambiente de trabalho.

Desta forma, além de programas de combate ao fumo, combate ao sedentarismo e ginástica laboral, já verificados em diversas empresas pelo país, devem ser incluídos e implantados programas de combate ao assédio moral, que contribuam para promoção de um ambiente de trabalho mais transparente e sadio, no qual vigore a ética e o respeito às diferenças.

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Sobre a autora
Maria Rita Manzarra Garcia de Aguiar

Juíza do Trabalho do TRT da 21ª Região (RN). Especializanda em Processo Penal pela Universidade de Fortaleza (CE). Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AGUIAR, Maria Rita Manzarra Garcia. Assédio moral: problema antigo, interesse recente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1907, 20 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11741. Acesso em: 2 mai. 2024.

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