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A decisão do STF e a multa fundiária

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6. A multa fundiária e a demanda trabalhista

Enquanto não houver uma solução para extensão do direito reconhecido pelo STF a todos os Empregados, para os contratos resilidos, o Empregado que almeja a diferença da multa fundiária, deve ajuizar a ação trabalhista, comunicando-se a questão judicial em relação aos aumentos discutidos na Justiça Federal, solicitando a diferença da multa, para evitar a prescrição trabalhista.

A prescrição trabalhista, de acordo com o teor do art. 7º, XXIX, da CF é bienal, ou seja: o empregado, após a rescisão contratual, deve propor a ação trabalhista para solicitar a reparação de seus direitos no prazo de dois anos.

No caso do Empregado ajuizar a ação trabalhista, a mesma poderá ficar suspensa até a solução da discussão judicial quanto ao cabimento ou não da diferença pelo reajuste econômico (art. 265, IV, a, CPC).

Porém, como é de notório saber, a suspensão não poderá ser superior a um ano (art. 265, § 5º). Nesse caso, surge a seguinte indagação: O juízo trabalhista pode reconhecer, de forma incidental, a referida correção, determinando na seqüência o pagamento da diferença da multa fundiária?

Em tese, o Empregador pode argumentar a incompetência material da Justiça do Trabalho para determinar o reconhecimento judicial dessa diferença, como questão prejudicial(16), para o deferimento a posteriori da multa fundiária.

Entendemos que a alegação de incompetência deve ser rejeitada, já que o Judiciário Trabalhista pode reconhecer que houve a supressão dos índices inflacionários, porém, não com autoridade de coisa julgada (art. 470).

Além disso, os motivos importantes e necessários para o alcance da parte dispositiva (art. 469, I), bem como a apreciação da questão prejudicial (art. 469, III), não fazem coisa julgada.

O Judiciário Trabalhista estabelece a supressão, de forma motivada, como causa próxima – fundamento jurídico, deferindo-se o pedido – diferença da multa fundiária.


7. Conclusão

O reconhecimento judicial da correção fundiária pela recomposição dos índices monetários leva a novas discussões, entre elas: a diferença pela multa fundiária. O ponto da interação é a imposição legal que estabelece a base de cálculo da multa fundiária.

Em regra, a multa fundiária decorre de situações legais específicas quanto aos critérios da rescisão contratual, constituindo-se em uma obrigação trabalhista, cujo devedor é o empregador. A correção monetária deriva da recomposição monetária do saldo da conta vinculada, sendo que o responsável é o próprio Fundo (art. 13, § 2º, Lei n. 8.036/90).

As discussões judiciais quanto a diferença ou majoração da multa fundiária pela supressão dos índices inflacionários, já reconhecido como de direito dos trabalhadores, faz com que a diferença seja de responsabilidade do empregador em um primeiro momento.

Contudo, parece-nos que os Tribunais poderão considerar a União como responsável pelas diferenças ou majoração da multa fundiária, com fundamento nos argumentos da responsabilidade pelos danos decorrentes de lei declarada nula, inconstitucional ou inválida e a responsabilidade objetiva do Estado.


Notas

1. Ementa da decisão: Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS. Natureza jurídica e direito adquirido. Correções monetárias decorrentes dos planos econômicos conhecidos pela denominação Bresser, Verão, Collor I (no concernente aos meses de abril e maio de 1990) e Collor II.

- O fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), ao contrário do que sucede com as cadernetas de poupança, não tem natureza contratual, mas, sim, estatutária, por decorrer de Lei e por ela ser disciplinado.

Assim, é de aplicar-se a ele a firme jurisprudência desta Corte no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico.

- Quanto à atualização dos saldos do FGTS relativos aos Planos Verão e Collor I (este no que diz respeito ao mês de abril de 1990), não há questão de direito adquirido a ser examinada, situando-se a matéria exclusivamente no terreno legal infraconstitucional.

No tocante, porém, aos Planos Bresser, Collor I (quanto ao mês de maio de 1990) e Collor II, em que a decisão recorrida se fundou na existência de direito adquirido aos índices de correção que mandou observar, é de aplicar-se o princípio de que não há direito adquirido a regime jurídico.

Recurso extraordinário conhecido em parte, e nela provido, para afastar da condenação as atualizações dos saldos do FGTS no tocante aos Planos Bresser, Collor I (apenas quanto à atualização no mês de maio de 1990) e Collor II (STF - RE n. 226.855-7 - Rel. Min. Moreira Alves - Recte: Caixa Econômica Federal CEF - Recdo: Ademar Gomes Mota - Assist. União Federal - j. 31.8.2000 – DJ 13.10.2000).

2. SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 126.

3. Com objetividade, Sérgio Pinto Martins aduz: "Há necessidade, entretanto, de se perquirir o significado de certas palavras empregadas no § 2º do art. 477 da CLT, como valor, parcela, quitação e do advérbio apenas, visando uma correta interpretação do referido dispositivo legal. Parcela tem o significado de prestação, partícula, pedaço, fragmento de um todo, valores, números que devem somar-se a uma adição. Parcela, portanto, não é sinônimo de direito. Assim, não são quitados, por conseguinte, os direitos do empregado. Título, por outro lado, traz a idéia de rótulo, assunto, denominação, fundamento, podendo ter o significado de direito num sentido amplo. A lei ou o enunciado poder-se-iam referir a quitação de títulos se houvesse a quitação das rubricas pagas. Exige o art. 940 do Código Civil, apenas, que a quitação deverá designar o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor e o tempo e lugar de pagamento. Tem a quitação, portanto, o sentido de desobrigar o devedor em razão do pagamento realizado ao credor. A quitação da parcela importa a quitação do valor, pois não será quitado aquilo que o empregado não recebeu. O advérbio apenas se refere às parcelas que estão sendo quitadas e não ao total ou a tudo o que é devido ao empregado, demonstrando que aquilo que não for pago se encontra ainda devido ao empregado. Se não houvesse o uso do advérbio apenas a quitação poderia ser total. Temos, porém, que analisar conjuntamente, sistematicamente, os significados das palavras estudadas para chegarmos a uma conclusão, que não pode ser tomada isoladamente em relação ao exame de apenas uma das palavras empregadas no texto legal. Assim, a quitação envolve apenas as parcelas e os valores pagos e não os títulos. Se não houve o pagamento integral, o empregado poderá reclamar eventuais diferenças ou até mesmo verbas que não foram pagas e que, portanto, não foram quitadas" (Direito do Trabalho. São Paulo: Malheiros, 4ª edição, 1997, p. 553).

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4. Maria Helena Diniz, Dicionário Jurídico, v. 2, p. 520.

5. BARROS, Alice Monteiro de - coordenadora. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 3ª edição, 1997, p. 485.

6. CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. São Paulo: Saraiva, 25ª edição, 2000, p. 370.

7. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - Vol. VII. São Paulo: Saraiva, 10ª edição, 1996, p. 80.

8. JORGE NETO, Francisco Ferreira. CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Responsabilidade e as Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 1998, p. 180.

9. A expressão – ato jurídico perfeito, nas palavras de Maria Helena Diniz, representa: "Direito constitucional e teoria geral do direito. 1. É o consumado segundo a norma vigente ao tempo em que se efetuou, produzindo seus efeitos jurídicos, uma vez que o direito gerado foi exercido. A segurança do ato jurídico perfeito é um modo de garantir o direito adquirido pela proteção que se concede ao seu elemento gerador, pois, se a novel norma considerasse como inexistente ato já consumado sob o amparo da precedente, o direito adquirido, fundado em lei, dela decorrente desapareceria por falta de fundamento. Se a norma constitucional não o resguardasse, haveria destruição de direitos subjetivos, formados sob o império de antiga norma, prejudicando interesses legítimos de seus titulares, causando a desordem social. 2. O que se aperfeiçoou sob a égide da velha lei, por terem sido cumpridos todos os requisitos para sua formação, podendo vir a produzir, futuramente, efeitos. 3. Aquele que está apto a produzir suas conseqüências jurídicas, imunizando-se de qualquer alteração legal quanto a sua forma. Assim, se alguém tiver um direito por ele resguardado, não poderá tê-lo negado apenas porque uma nova norma veio a exigir outra solenidade para sua exteriorização" (Dicionário Jurídico - vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 321).

10. As atribuições da CEF, na qualidade de agente operador, são as seguintes: a) centralizar os recursos do FGTS, manter e controlar as contas vinculadas, e emitir regularmente os extratos individuais correspondentes às contas vinculadas e participar da rede arrecadadora dos recursos do FGTS; b) expedir atos normativos referentes aos procedimentos administrativo-operacionais dos bancos depositários, dos agentes financeiros, dos empregadores e dos trabalhadores, integrantes do sistema do FGTS; c) elaborar as análises jurídica e econômico-financeira dos projetos de habitação popular, infra-estrutura urbana e saneamento básico a serem financiados com recursos do FGTS; d) emitir Certificado de Regularidade do FGTS; e) elaborar as contas do FGTS, encaminhando-as ao Ministério da Ação Social; f) implementar os atos emanados do Ministério da Ação Social relativos à alocação e aplicação dos recursos do FGTS, de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Curador (art. 7º, Lei n. 8.036/00).

11. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 6ª edição, 2000, p. 410.

12. CAVALCANTI, Amaro apud Yussef Said Cahali. Responsabilidade Civil do Estado. São Paulo: Malheiros, 2ª edição, 1996, p. 654.

13. CRETELLA JÚNIOR, José. O Estado e a Obrigação de Indenizar. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 293.

14. CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade Civil do Estado. São Paulo: Malheiros, 2ª edição, 1996, p. 664.

15. CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 286.

16. A expressão – questão prejudicial representa um elemento de direito material que, tanto pode ser o precedente lógico para a análise do mérito da decisão, como o objeto de uma ação autônoma. No presente artigo, o reconhecimento judicial da correção fundiária é um fator primordial e necessário para o deferimento da diferença da multa fundiária.


Bibliografia

BARROS, Alice Monteiro de - coordenadora. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 3ª edição, 1997.

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DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico – vol. 1 e 2. São Paulo: Saraiva, 1998.

________________ . Curso de Direito Civil Brasileiro - vol. VII. São Paulo: Saraiva, 10ª edição, 1996.

JORGE NETO, Francisco Ferreira. CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Responsabilidade e as Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 1998.

MARTINS. Sergio Pinto. Direito do Trabalho. São Paulo: Malheiros, 4ª edição, 1997.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Saraiva, 16ª edição, 1999.

SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.

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Sobre os autores
Francisco Ferreira Jorge Neto

Juiz do Trabalho em São Paulo, mestre em Direito das Relações Sociais – Direito do Trabalho pela PUC/SP, professor convidado da pós-graduação lato sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Escreveu vários livros sobre Direito do Trabalho. Foi professor concursado do Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano do Sul (IMES).

Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante

advogado, professor de Direito da Faculdade Mackenzie, ex-procurador chefe do Município de Mauá, mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, mestrando em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JORGE NETO, Francisco Ferreira ; CAVALCANTE, Jouberto Quadros Pessoa. A decisão do STF e a multa fundiária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. -943, 1 dez. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1183. Acesso em: 6 mai. 2024.

Mais informações

Este trabalho foi publicado no Suplemento trabalhista LTr, 161/00, p. 875

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