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Natureza jurídica do contrato firmado entre o "moto-boy" e a empresa intermediária

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01/08/2000 às 00:00
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3. A RELAÇÃO ENTRE A EMPRESA INTERMEDIÁRIA E A CONTRATANTE FINAL

A relação entre a contratante final e a intermediadora é regulada pelo Direito Civil, pois representa uma prestação de serviço onde a intermediadora fornece um serviço referente à atividade-meio da contratante final.

A contratante final, ao buscar os serviços de uma empresa intermediária, espera os seguintes benefícios: a) a redução de custos; e/ou b) o aumento na qualidade dos serviços da área-meio.

A relação entre os atores aqui citados é contratual, vez que há um acordo de vontades que busca a aquisição de direitos eminentemente patrimoniais.

O contrato entre a contratante final e a intermediadora pode ter um prazo determinado, mas o termo certo não tem o condão de transformar o "moto-boy" em trabalhador temporário, pois o citado profissional não presta serviços destinados às necessidades transitórias de substituição de pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de tarefas (área-fim).


4. A RELAÇÃO ENTRE O "MOTO-BOY" E A CONTRATANTE FINAL

No direito brasileiro, não há contratos por via indireta, portanto a relação travada entre o "moto-boy" e a contratante final é meramente fática, ou seja, como já foi explicitado, para os autores que embasaram o presente trabalho, não há, originariamente, qualquer relação juridicamente relevante entre os atores citados.

A subordinação jurídica, traço primordial para a configuração do contrato de emprego, é formada por três elementos: a) o poder de dirigir; b) o poder de fiscalizar; e c) o poder disciplinar ou de sanção. A ausência de qualquer um deles, na relação contratual, descaracteriza a subordinação jurídica, a ponto de torná-la inexistente.

De logo, nota-se que na relação travada entre os atores ora estudados não há o poder sancionatório, portanto a subordinação jurídica não existe.

O ilustre Délio Maranhão afirma que:

"Evidente que contrato de trabalho somente configura-se entre a empresa fornecedora e os empregados que contrata. Relação jurídica, ou seja, no caso, relação de emprego, haverá, apenas, entre os sujeitos do contrato de trabalho: a fornecedora e os trabalhadores contratados. Acontece que estes, porém, diferentemente do que ocorre nos contratos comuns de trabalho, acertam que a prestação deles exigível por quem os contratou se realiza, de fato, em favor de um terceiro. Entre a empresa cliente e o trabalhador fornecido, não há, nem pode haver, relação jurídica de trabalho.

O poder de comando delegado não decorre tão somente dessa delegação (análise jurídica), mas do fato de o trabalho vir a ser prestado numa empresa que pressupõe estrutura hierárquica da qual resulta para quem quer que nela e para ela trabalhe, seja em que condição for, a sujeição a um certo poder discretivo, como sublinha CORRADO. A este poder sujeitam-se, em diferentes graus, o avulso e o próprio autônomo. A análise, aqui, é sociológica e não jurídica".

Além de clara ausência da subordinação jurídica, não há, na relação entre o "moto-boy" e o contratante final, a pessoalidade, vez que o citado profissional pode, durante o seu contrato de emprego com a intermediadora, prestar serviços a diversas contratantes finais. Ressalte-se, também, que na relação fática ora estudada não há o requisito da permanência pelo mesmo motivo já elencado. A onerosidade, também, não está presente na relação entre o "moto-boy" e a contratante final, vez que essa retribui serviço do citado profissional através de uma contraprestação da qual somente a empresa intermediária é credora.


5. CONCLUSÕES

1- O "moto-boy" é uma figura nova e absolutamente autônoma que surgiu da junção de duas figuras já existentes.

2- Além da subordinação jurídica, que pode ser notada através da faculdade sancionatória emergente dos poderes de fiscalização e direção, os outros elementos essenciais à existência do contrato de emprego podem ser notados na relação entre o "moto-boy" e a intermediadora, são eles: a) onerosidade; b) pessoalidade; e c) permanência. Logo, o contrato firmado entre os atores citados é um contrato de emprego.

3- Não é justo que a contratante final, após o inadimplemento da intermediadora, seja responsável pelo descumprimento das obrigações legais e contratuais referente à relação firmada entre o "moto-boy" e a inadimplente, mesmo tendo cumprido o seu contrato e os imperativos hipotéticos da legislação vigente.


NOTAS

  1. KELSEN (Teoria pura, 2ª ed., p.73) reserva o termo "proposição jurídica (Rechtssatz) às proposições da ciência do Direito. Estas contêm enunciados sobre o conteúdo ou a vigência das normas jurídicas: são proposições enunciativas que pelo seu conteúdo se referem às normas, mas não são, elas próprias, normas.
  2. Trilateralidade defendida pelo professor Prunes, que não é abraçada pelo autor do presente estudo.
  3. Ressalte-se a contradição existente entre as expressões "relações triangulares" e "contratos geminados bem delineados".
  4. Citado pelo professor Damásio Evangelista de Jesus, vide referências bibliográficas.
  5. Expressão utilizada pelos penalistas.
  6. Autor peruano citado por José Luiz Ferreira Prunes, vide referências bibliográficas.
  7. Alguns autores tratam da subordinação rarefeita, ou seja, aquela menos densa e, consequentemente, de difícil averiguação, ressaltando que a rarefação não descaracteriza o contrato de emprego.
  8. Como os autores espanhóis preferem tratar a subordinação

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Sobre o autor
Reinaldo de Souza Couto Filho

advogado da União, mestre em Direito Econômico pela Universidade Federal da Bahia, professor de Direito Constitucional

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COUTO FILHO, Reinaldo Souza. Natureza jurídica do contrato firmado entre o "moto-boy" e a empresa intermediária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 44, 1 ago. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1186. Acesso em: 23 abr. 2024.

Mais informações

Trabalho realizado para a disciplina Direito do Trabalho II, do Mestrado em Direito Econômico, pela Universidade Federal da Bahia, sob a orientação do Prof. Washington Luiz da Trindade.

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