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Atos jurídicos imperfeitos. Praticados por menores absolutamente incapazes. Validade

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02/03/2009 às 00:00
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A questão dos efeitos dos atos ou negócios jurídicos praticados por certos menores absolutamente incapazes ainda não conseguiu chamar a atenção de muitos daqueles que operam com o direito.

S U M Á R I O:. INTRODUÇÃO. Justificativa. Delimitação do problema. Material e método. CAPÍTULO I- PERSONALIDADE E CAPACIDADE. 1.1 Noções gerais. 1.2 Capacidade e direito comparado. 1.3 Limitações da capacidade. 1.4 Capacidade para a prática de ato jurídico. CAPÍTULO II- FATO JURÍDICO. 2.1 Noções gerais. 2.2 Fatos que independem da vontade. 2.3 Fatos que dependem da vontade. 2.4 Fatos jurídicos em sentido estrito. 2.5 Fatos voluntários lícitos. 2.6 Direito subjetivo. CAPÍTULO III- ATO JURÍDICO. 3.1 Noções gerais. 3.2 A vontade no ato jurídico. 3.4 A vontade no ato jurídico stricto sensu. 3.5 Ato jurídico e negócio jurídico. 3.6 Capacidade para a prática de negócio jurídico. 3.6 A autonomia da vontade. 3.7 Teorias da vontade e da declaração. 3.8 Incapazes de praticar ato jurídico válido. CAPÍTULO IV- ATO JURÍDICO ANULÁVEL, INEXISTENTE E NULO. 4.1 Noções gerais. 4.2 Ato jurídico anulável. 4.3 Vícios da vontade. 4.4 Erro. 4.5 Dolo. 4.6 Coação. 4.7 Simulação. 4.8 Fraude contra credores. 4.9 Lesão e estado de perigo. 4.10 Ato jurídico inexistente. 4.11 Ato jurídico nulo. 4.12 Atos de objeto ilícito ou impossível. 4.13 Atos jurídicos que não revestem forma legal. 4.14 Preterição de solenidade legal. 4.15 Ato que a lei declara nulo ou nega efeito. 4.16 Atos praticados pelos absolutamente incapazes. 4.17 Atos praticados pelo menor de dezesseis anos. CAPÍTULO V- ATOS PRATICADOS PELOS MENORES ABSOLUTAMENTE INCAPAZES E SEUS REFLEXOS. 5.1 Direito comparado. 5.2 A boa fé. 5.3 Incapacidade absoluta e atos jurídicos efetivos. 5.4 Menores absolutamente incapazes e autonomia privada. 5.5 Atos dos menores absolutamente incapazes e seus reflexos.. CONSIDERAÇÕES FINAIS. BIBLIOGRAFIA.


R E S U M O

A questão dos efeitos - e não são poucos - dos atos ou negócios jurídicos praticados por certos menores absolutamente incapazes, conquanto seja realmente de notável percepção pelo alto interesse e importância que representa no campo prático, em realidade ainda não conseguiu chamar a atenção de muitos daqueles que operam com o direito, seja porque em primeira e não cuidadosa análise a entendem por demais simples, seja porque não se propuseram a enfrentá-la aprofundadamente porquanto isto poderia levar à insólita conclusão pela ruptura de um segmento do sistema jurídico brasileiro, qual seja, o referente às nulidades definidas pelo Código Civil.

A Constituição Federal ao estabelecer no seu art.5º, inciso XXXVI que: a lei não prejudicará... o ato jurídico perfeito... fez anotar a vontade do legislador constituinte de que as relações jurídicas revestidas de normalidade e regularidade recebam proteção legal, da mesma forma que, em sentido negativo, aqueles atos jurídicos marcados por irregularidades que os comprometam, em regra, não terão apoio quer da legislação constitucional, quer da infra-constitucional.

O mandamento principal que contém o inciso - subjetivo em geral - é a segurança e enfoca a lei no tempo. Mas o verdadeiro escopo é conceder às pessoas a estabilidade nas relações jurídicas entre elas e o Estado, até porque, a propósito do tema, a própria Constituição Federal tutela a autonomia privada (artigo 1º, IV), e assegura aos menores, quaisquer que sejam, a convivência comunitária (artigo 227, CF), aí compreendida, evidentemente, a prática dos atos de sua vida civil.

Preciso é entretanto que o ato jurídico seja perfeito, o que, segundo o artigo 6º, § 1º, da LICC, significa o seguinte: reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. E quanto aos seus requisitos também para a perfeição, os descreve o artigo 82 do Código Civil como sendo: agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. O artigo 104 do Código Civil de 2002 pouco altera os aludidos requisitos, definindo-os como: agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei.

Por outro lado o presente escrito argumenta sobre a análise dos efeitos que o ordenamento jurídico como um todo concede àqueles atos - negócios - jurídicos que não são revestidos de total perfeição. Vale dizer: analisar-se-á, sob um aspecto, os reflexos ou efeitos do ato jurídico imperfeito, notadamente aquele praticado por agente incapaz, isto é, menores absolutamente incapazes, em determinadas circunstâncias.

Não se cuidou dos negócios jurídicos quanto aos menores relativamente incapazes porque a eles já se deu tratamento legal seja expresso, seja implícito ou tácito, conforme artigos 154, 155, 156 e 157 do Código Civil e artigos 180 e 181 do Novo Código, de 2002, bem assim pelo próprio instituto da ratificação (artigos 148, 149 e 150 do Código Civil e artigos 172 a 174, do Novo Estatuto).

Especificamente perquiriu-se sobre como solucionar o questão decorrente da existência da norma fulminante do artigo 145 do Código Civil (de 1916 e do artigo 104 do novo Código Civil de 2002) em cotejo com os negócios jurídicos envolvendo coisas móveis e de pequeno valor, praticados por pessoas com idade que as coloca em situação de absoluta incapacidade e que via de regra não recebem qualquer censura jurídica. Em outras palavras, aqui haverá tutela legal de um ato jurídico imperfeito, sem que isto implique em afronta à mencionada norma constitucional. Essa é a realidade fenomênica que o trabalho procurará analisar, compreender e explicar.

Portanto verifica-se que ao mesmo tempo em que a Constituição dá apoio legal aos atos jurídicos perfeitos, acaba ela indiretamente tutelando também alguns atos imperfeitos e que, por motivos de interesse público e de política de adoção dos bons costumes, do interesse social e do princípio da boa fé, vêm a receber validade, até porque a Carta não os proibe expressamente.

No primeiro capítulo foi abordada a noção de personalidade e capacidade.

No segundo abordou-se a idéia de fato jurídico, com a correspondente digressão sobre o que vêm a ser fatos voluntários e não voluntários e as diferenças entre fato e ato jurídico.

No terceiro estudou-se propriamente sobre o ato jurídico, o elemento vontade como requisito do ato, a diferença entre ato e negócio jurídico e a prática de ato jurídico pelos incapazes.

No quarto capítulo cuidou-se do ato anulável, inexistente e nulo, com noções gerais e específicas de cada um, especialmente os atos praticados pelos menores absolutamente incapazes.

No quinto capítulo cuidou-se da elaboração de noção sobre a boa fé, focalizando o ato jurídico em relação ao terceiro de boa fé e, por derradeiro, sobre o ponto principal do trabalho, ou seja, os efeitos e reflexos do ato jurídico praticado pelo menor absolutamente incapaz, notadamente ao terceiro de boa fé.

Por derradeiro pautamos sob a consideração de que o ato jurídico nulo, em situações tais (praticados por menores absolutamente incapazes), atualmente podem produzir efeitos válidos, principalmente aos terceiros de boa-fé, pois se revestem de praticamente todos os requisitos exigidos pela lei, doutrina e princípios gerais de direito e não atentam contra os bons costumes.

Por isso consideramos que a boa fé e os costumes, mais a autonomia privada, em casos tais, têm o condão de fazer a convalescença do negócio jurídico que aparentemente nasceu inválido, assim vigente a máxima de que na hipótese então inexistiria inconstitucionalidade (art. 5º, XXXVI, CF) na proteção de ato jurídico imperfeito.


I N T R O D U Ç Ã O

Em primeiro lugar mostra-se convinhável fazer anotado que a expressão negócio jurídico, adotada pelo novo Código Civil, de 2002, no Título I, do Livro III, aqui tomará lugar, em sentido genérico, à de ato jurídico, porém acentuando-se que para levar em conta o trabalho e tendo em vista que na Constituição Federal - artigo 5º, XXXVI - perdura a segunda expressão, bem como que a pesquisa envolve sucessivas remissões ao Código Civil de 1916, ambas serão usadas genericamente e terão o mesmo sentido, dada a concepção unitarista outrora adotada pelo direito civil brasileiro.

Pois bem. O estudo a respeito do negócio jurídico, sobre adquirir contornos da maior complexidade e encanto, revela-se também de suma importância, dada a sua onipresença em praticamente todas as fontes do direito material.

A pesquisa ora retratada se direciona, basicamente, à análise em torno de pontos ainda não claramente solucionados pelas literaturas nacional e estrangeira, pois não há uma firmeza de entendimento sobre os efeitos de alguns negócios jurídicos praticados pelos menores absolutamente incapazes.

Esse fenômeno, pouco debatido pelos juristas, nos fez proceder a dissertação colacionando dados e elementos de autores estrangeiros e da literatura jurídica brasileira, procurando compreender e explicar as respectivas noções dos atos dos menores, notadamente os direcionados aos terceiros de boa fé, considerando, os resultados daí advindos.

É certo que a doutrina destaca, com precisão, o conceito de negócio jurídico nulo, efetuado pelos menores absolutamente incapazes, em relação aos demais atos defeituosos, porém obviamente tal diferença deverá ser aferida e objetivada, também, quanto à vontade do incapaz, ao comportamento da sociedade e ao terceiro que participa desse negócio nulo, ou de seus efeitos. Essa é a principal argumentação do presente trabalho.

A exemplo do Direito de Família, em específico no que toca ao instituto do casamento, o Código Civil houve por bem informar as noções do ato nulo, ato inexistente e ato anulável, em variadas situações, cujos limites também procuraremos de certa forma demonstrar.

A boa fé, sabe-se, em determinados casos faz nascer direitos com extremo vigor, conforme as doutrinas mais modernas do mundo jurídico, inclusive sendo acolhida pelo próprio ordenamento brasileiro, especialmente no artigo 113 do novo Código Civil, de 2002, bem assim se acha inserta no artigo 4º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, dentre outros.

E nem é por acaso que SILVIO DE SALVO VENOSA acentua que o novo diploma orienta o legislador para, ao procurar o sentido de uma manifestação de vontade, ter sempre em mira os princípios de boa fé, regra geral dos contratos bem como a orientação dos costumes que cercam a realização do negócio (Direito Civil, Parte Geral, ed. Atlas, S.Paulo, 2002, p.403).

Não obstante, parece correto que a regra deve ser levada em conta no campo da excepcionalidade, pois o direito somente existe e surge como instrumento regulador dos conflitos intersubjetivos sociais quando há campo válido para a semeadura, devendo essa sua fonte ser lícita, por isso que a se concluir somente nascer e se originar o direito quando para tanto há meio justo para um justo fim, em decorrência aqui excluído, por completo, o adágio segundo o qual os fins justificam os meios.

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Nesse desiderato considera-se que em regra a nulidade letal e fulminante do negócio jurídico consiste num óbice para a proliferação de seus efeitos, até porque o que nasce morto desvanecido permanecerá. Porém como tudo que é próprio da dialética do direito, esse conceito merecerá a contrapartida da excepcionalidade, rubrica que o trabalho tende a trazer ao enfocar importante tema.

Reconhece-se que há imensa polêmica acerca da idéia do conceito de negócio jurídico, cuja pesquisa se mantém inesgotável aqui e no estrangeiro. Porém, com relação aos efeitos do negócio jurídico praticado diretamente pelos menores absolutamente incapazes, máxime, portanto, na ausência de representação legal, a questão não chega a ser de todo explicitada e pacificada. A doutrina, senão omissa - pois remete a outros princípios e institutos - é incompleta e a jurisprudência praticamente inexiste, havendo poucos julgados que consideram aqueles atos válidos ou apenas anuláveis.

Dir-se-ia que o problema, no direito civil brasileiro, é de ser resolvido por regras de direito objetivo e por princípios gerais, na medida em que nos casos em que os menores absolutamente incapazes praticam negócios jurídicos, estariam eles representados (artigo 84, CC, artigo 116 do CC de 2002) ainda que indiretamente pelos pais ou responsáveis, assim sendo aqueles apenas longa manus destes em tais atos negociais. Entretanto a solução não parece adequada seja porque tal conduta se incompatibiliza por completo com o instituto da representação e também porque não haveria explicação para as hipóteses em que os incapazes estivessem, por qualquer motivo, sem representação legal.

Tal estado de coisas, contudo, é resolvido em outros países por intermédio de regras específicas do direito objetivo, de modo que, tanto na Alemanha, França, Itália, Portugal e Suíça, os negócios jurídicos cometidos pelos menores absolutamente incapazes são, às vezes, considerados tão somente anuláveis na medida em que praticados sem qualquer ofensa ao seu próprio interesse ou ao social.

No que pertine à distinção entre ato jurídico e negócio jurídico, a doutrina, na sua grande maioria, fecha questão pela acolhida do negócio jurídico, em cuja esteira acabou vindo o novo Código Civil de 2002, ao expressar este último - negócio jurídico - a partir do artigo 104, em frontal posicionamento com o Código de 1916, Livro III, Título I.

O Código Civil - no caso o de 1916 - em países como o Brasil, Itália e França, consagrou a teoria unitarista ao definir o ato jurídico, pois engloba neste o negócio jurídico, não fazendo qualquer distinção de conceitos, conquanto civilistas como Vicente Ráo e Caio Mario da Silva Pereira dentre outros, há tempos já ensinem que a separação, como dizem os autores alemães, atende melhor à técnica e aos fins práticos, chegando este último, aliás, a asseverar a existência de ato jurídico lato sensu e stricto sensu, sendo o primeiro uma manifestação de vontade tendente a gerar efeitos jurídicos e a segunda consistente numa manifestação volitiva do homem visando a obtenção de um resultado.

O novo Código Civil brasileiro acabou por fazer adoção da teoria dualista, ao mencionar tanto o negócio jurídico (artigo 104) como o ato jurídico (artigo 185), terminando por centrar explicitações no primeiro, de cuja essência são na maioria as relações jurídicas de direito material.

Embora no direito comparado, como se viu, adote-se a teoria unitarista, vários autores sustentam que melhor se apresenta a dualidade de conceitos, dada a sua melhor apuração técnica ajustável aos atos e negócios jurídicos, certo que aos autores alemães, que fazem a distinção entre o ato jurídico e o negócio jurídico, se deve a origem dessa dualidade, e a esse respeito Vicente Rao lembra Enneccerus, Kipp e Wolff.

Também pesquisamos informalmente a jurisprudência e verificamos divergências existentes.

A justificativa sobre o assunto se fixa nas contradições que existem entre a aceitação dos efeitos dos atos praticados, na chamada vida corrente, pelos menores absolutamente incapazes, quando ausente a representação legal, como válidos ou não e seus reflexos à sociedade como um todo e ao terceiro de boa fé.

Orientam-se vários julgados, na esteira do pertinente dispositivo legal (artigo 145, CC) e da própria doutrina, no sentido de que os atos levados a efeito pelos referidos menores são nulos. E se por outro lado estamos a sustentar que aqueles atos, desde que relativos à vida cotidiana ou corrente, envolvendo serviços ou coisas móveis de pequeno valor são válidos, deduz-se que essa orientação, na vida prática, dará a oportunidade de uma sustentação jurídica de situação de fato, real, sobre cuja validade pouco se discute, conquanto, repise-se, se revele de suma importância na vida em sociedade até pelo volume quantitativo com que se apresenta.

Os autores nacionais não abordam o problema de maneira conveniente e satisfatória e, por outro lado, o Código Civil não dá a solução devida, por norma específica, obrigando o jurista a buscar explicações e soluções na parte geral.

E como, repita-se, também não há jurisprudência definida, somos do pensar que este trabalho, sobre levar a uma necessária reflexão que o assunto exige, poderá abrir caminho para se discutir solução normativa, até porque insta anotar que, quando se dispõe a elaborar trabalho de cunho científico, lógico, não se procura solucionar a matéria simplesmente à vista dos efeitos que ela apresenta, mas sim buscar a causa e a própria essência em sua constituição.

Portanto, no estudo da questão acerca dos menores absolutamente incapazes enquanto sujeitos de relações jurídicas de direito material, procuramos demonstrar que o elemento volitivo efetivamente existe na ação daqueles e atua no rumo de elaborar um ato jurídico informado pela boa fé, pela normalidade dos costumes, pelo interesse social, pela não ofensa ao interesse público e, sobretudo, pela autonomia da vontade privada.

Seria mais lógico e fácil, como acontece na vida prática judicial e na jurisprudência de um modo geral, atestar que os atos jurídicos elaborados pelos menores absolutamente incapazes são nulos simplesmente porque quanto à mente destes não há que se cogitar de vícios do consentimento, assim somente se falando de vício na formação estrutural do negócio.

Entretanto o trabalho mostra que a vida prática, mais que isto, exige reflexão a respeito dado o volume das relações jurídicas em que aqueles atuam diariamente e com absoluta normalidade quer quanto à sua formação, quer quanto à execução ou efeitos, inclusive revelando-se - tais relações jurídicas - como verdadeiro fator de sustentação de determinados segmentos econômicos da sociedade, os quais se conduzem voltados para a correspondente faixa etária (envolvendo aqueles incapazes), oferecendo-lhe e colocando à disposição produtos e serviços. Praticam os tais menores, portanto, nesses casos, negócios jurídicos cuja formação estrutural não padece de qualquer eiva.

Convém anotar ainda que, quando estudamos os problemas relativos ao direito de Família notadamente no que respeita ao casamento, concluímos que em determinadas situações o ato nulo e até o inexistente produzem efeitos válidos em atendimento aos fins sociais, compreensão que, mutatis mutandis, não tem porque não ser estendida para a presente proposição.

Por derradeiro é certo que o trabalho compreendeu, para o seu desenvolvimento, colheita de pesquisas em trabalhos diversos, livros, revistas, nacionais e estrangeiros, internet e em jurisprudência, pelo que conclui-se que o material é eminentemente bibliográfico.

Deixa-se assentado que o método usado é o dialético, de modo que apresentaremos a tese, a antítese e, finalmente, a síntese, e ainda que, como a lei é algo que denota uma realidade histórica na progressão do tempo, não poderemos deixar de invocar, também, o denominado método Histórico - Evolutivo, por pensar que o Direito enquanto ciência deve ser adaptado às exigências sociais imprevistas, assim como às sucessivas variações do meio.


CAPÍTULO PRIMEIRO

Sumário. 1. Noções Gerais. 2. capacidade e direito comparado. 3. limitações da capacidade. 4. capacidade para a prática de ato jurídico.

1. Noções gerais.

A conceituação doutrinária sobre personalidade e capacidade é tema que não sugere grandes debates.

Personalidade é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações (Caio Mário, in Instituições, vol. I, p.153).

E dí-lo Pontes de Miranda: é a capacidade de ser titular de direitos, pretensões, ações e exceções e também de ser sujeito (passivo) de deveres, obrigações, ações e exceções. Capacidade de direito e personalidade são o mesmo. E acrescenta: Ninguém pode manifestar vontade, ou criar cláusulas interpretáveis a respeito de todas essas matérias (Tratado de Direito Privado, Tomo 1, p.209).

A definição é derivada do artigo 2º do Código Civil. O início da personalidade civil do homem é o seu nascimento com vida, de acordo com o artigo 4º do mesmo diploma legal.

Uma vez afirmado e definido que todo homem é titular de direitos e obrigações desde o seu nascimento com vida, a lei adotou critérios para estabelecer em que condições pode o homem exercer pessoalmente a titularidade de uma relação jurídica. Tem-se então a divisão dos homens em absolutamente incapazes, relativamente incapazes e capazes.

O Código Civil, em seu artigo 5º relaciona os absolutamente incapazes, quais sejam, menores de dezesseis anos, loucos de todo o gênero, surdos-mudos que não puderem exprimir sua vontade e os ausentes, declarados tais por ato do juiz.

Os relativamente incapazes, elencados no artigo 6º do Código Civil são: os maiores de dezesseis anos e menores de vinte e um anos, os pródigos e os silvícolas.

Agente capaz, em contrapartida, é aquele que não se encontra nas situações dos artigos 5º e 6º do Código Civil e artigos 3º e 4º do novo estatuto civilista a entrar em vigor, as quais definem a incapacidade relativa e a absoluta, daí inferir-se que menores absolutamente incapazes são as pessoas com idade abaixo de dezesseis anos.

2. Capacidade e direito comparado

Os Códigos Civis Português e Italiano, menos severos, declaram que a maioridade civil se inicia aos 18 anos.

Em arremate a essa maior liberalidade, e como se verá adiante, no capítulo V, que trata dos atos jurídicos praticados por menores absolutamente incapazes, tem-se que, a exemplo do Código Civil Português, o suíco e o alemão entendem que menores absolutamente incapazes são aqueles que ainda não completaram sete anos de idade e o italiano, por seu turno, não define a idade da incapacidade absoluta mas apenas declara que qualquer que seja o menor, os seus negócios jurídicos só serão anulados se lhe trouxerem prejuízo. Já nos Estados Unidos (Código Civil, artigo 301) e na Inglaterra, a incapacidade absoluta termina aos quatorze anos de idade.

Com a divisão - entre incapacidade absoluta, relativa e capaidade - teve o legislador a intenção de proteger os incapazes, sejam eles absolutos ou relativos, preservando os seus interesses, em virtude que lhes falta a completa maturidade para discernir e praticar os atos de sua melhor conveniência. Essa maturidade completa e capacidade integral para o exercício de atos jurídicos somente é adquirida aos vinte e um anos de idade, segundo o critério objetivo adotado pelo legislador - artigo 9º do Código Civil, afora os casos de emancipação ditados pelo mesmo artigo. O critério objetivo da idade para dividir as capacidades é conveniente já que seria extremamente desgastante e inviável a realização de exames médicos ou psicológicos em cada indivíduo para se determinar se este já atingiu o grau de discernimento compatível com a prática pessoal dos atos civis.

Fala-se então em capacidade de gozo e em capacidade de exercício, sendo esta a que habilita o indivíduo a exercer pessoalmente os atos da vida civil, e aquela a capacidade dos absolutamente ou relativamente incapazes que, embora titulares de direitos e obrigações, não podem exercê-los pessoalmente, necessitando de representação ou assistência.

3. Limitações da capacidade

Segundo Orlando Gomes, a capacidade de direito ou de gozo confunde-se, hoje, com a personalidade, porque toda pessoa é capaz de ter direitos. Ninguém pode ser totalmente privado dessa espécie de capacidade. Não obstante, admitem-se restrições de caráter especial. Há pessoas que são privadas do gozo de certos direitos.

E mais: as limitações da capacidade de fato prendem-se ao estado da pessoa. São de ordem física ou jurídica. Produzem incapacidade geral, ou incapacidade parcial, e incapacidade absoluta e relativa. Ora impedem totalmente o exercício dos direitos, ora inabilitam a pessoa à prática de um ou vários atos jurídicos. A natureza da causa impeditiva influi do modo de suprir a incapacidade.

Dessume, prossegue o autor, que a incapacidade para o exercício dos direitos consta de preceitos legais de ordem pública, que abrem exceções à regra geral da capacidade. A lei priva da capacidade as pessoas que presume não tenham discernimento necessário para a prática de alguns ou de todos os atos jurídicos. A incapacidade não tem, desse modo, a mesma extensão. Ora se impõe à pessoa em relação a todos os direitos civis, ora a alguns ou ao modo de exercê-los. Divide-se, conseqüentemente, em incapacidade absoluta e incapacidade relativa. Admite-se ainda a incapacidade natural que é a incapacidade de entender e de querer, que não está judicialmente declarada (o interdito ainda não declarado tal por ato do juiz). (Introdução ao Direito Civil, 9ª ed. Forense: Rio de Jneiro, 1987, p.140/150)

4. Capacidade para a prática de ato jurídico

A incapacidade absoluta consiste na impossibilidade do exercício dos atos da vida civil. Suas causas ligam-se ao estado individual da pessoa: a idade e a saúde.

A capacidade legal, muitas vezes, é um fictio legis, pois, em casos tais, nem sempre o sujeito é desprovido do querer e do discernimento. É o que ocorre, por exemplo, no caso dos ausentes, no de certos menores, além de outras situações.

Portanto, quando a lei traça os limites de capacidade da pessoa, fácil se torna a aferição objetiva em cada caso concreto, e isso é evidente. No entanto, quando a pesquisa há de ser feita nas lindes da capacidade natural, o problema se torna bastante crucial em certos casos, mesmo porque, conforme sabemos, a mente humana é deveras complexa.

Tomando-se como base essa orientação concluímos que a vontade, nas declarações alusivas aos atos jurídicos, deverá se revestir das características da vontade válida, não podendo ter vícios que a maculem.

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Sobre o autor
Reinaldo Lucas de Melo

promotor de Justiça titular em Ribeirão Preto, professor de Direito Civil da UNIP – Ribeirão Preto, especialista "lato sensu" em Direito Público pela UNIP – Ribeirão Preto, mestrando em Constituição e Processo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Reinaldo Lucas. Atos jurídicos imperfeitos. Praticados por menores absolutamente incapazes. Validade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2070, 2 mar. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12362. Acesso em: 4 mai. 2024.

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