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A oposição e seu papel no cenário da representação política

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4.CONCLUSÃO

De todo o exposto, conclui-se que a proteção ao efetivo exercício do direito de oposição qualifica-se como uma das funções de um Estado Democrático, pois, sob a proteção que se confere ao estatuto jurídico de oposição, encontra-se, também, o respeito a outros direitos fundamentais, como o da livre manifestação do pensamento, o da liberdade de opinião, o da livre associação, além de outros direitos de natureza política titularizados pelas minorias.

Uma das dificuldades que se tem, no entanto, é saber o exato limite em que oposição e democracia coexistem, sem que uma possa se tornar o fator de erosão da outra.

Para arbitrar, em cada caso, os limites dentro dos quais podem ser desenvolvidas atividades contestatórias, há o Poder Judiciário, poder independente e titular da missão de salvaguardar, a um só tempo, o princípio democrático e a efetividade dos instrumentos de participação e fiscalização conferidos às minorias.

O direito de oposição tem sua origem e seu amadurecimento atrelado ao desenvolvimento do Parlamentarismo, sistema onde ganha maior vigor e homogeneidade dado o movimento pendular da alternância perfeita, fundada no bipartidarismo.

É o parlamentarismo, também, quem confere maior relevo institucional à oposição, que, nesse contexto, tem o dever de apresentar propostas responsáveis e viáveis e que, para tanto, conta com toda uma estrutura orgânica (shadow cabinet) destinada ao auxílio na formulação de políticas alternativas.

O presidencialismo, por sua vez, também convive bem com o fenômeno da oposição (notadamente se se tratar de um panorama bipartidário), valendo frisar, sempre, a necessidade de que as políticas de oposição sejam responsáveis e viáveis, e não demagógicas e meramente contestatórias, o que muitas vezes se verifica nos ambientes multipartidários, em que as políticas de coligações fazem com que a responsabilidade por determinada formulação permaneça difusa e indeterminada.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

  1. Frise-se, neste ponto, que o conceito de oposição política não se confunde com o conceito de oposição parlamentar. Nesse sentido: GOMES CANOTILHO, Joaquim José, Direito Constitucional, 6ª ed., Coimbra: Almedina, 1996, p. 454/455.
  2. Diz-se represálias desproporcionais porque, como todos os demais direitos, também o direito à livre manifestação do pensamento não é absoluto, devendo ser restringido quando, após análise concreta do caso e ponderação dos valores envolvidos, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade (direito alemão) e da razoabilidade (direito americano), estiver sendo utilizado com o propósito de lesionar outros direitos também fundamentais. Exemplo disso são os discursos de ódio (hate speach).
  3. Nesse sentido: FISS, Owen, The Irony of Free Speech. Cambridge,. Harvard University Press, 1996.
  4. GOMES CANOTILHO, Joaquim José, opus cit., p. 454.
  5. Entendendo a separação de poderes e o bicameralismo como idéias fundadas no direito de oposição: DUVERGER, Maurice, Os Partidos Políticos, Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1970, p. 446; SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, Oposição na Política, São Paulo: 1995, Angelotti, p. 20/21.
  6. Sobre o tema, Cf o capitulo intitulado "Protección de la minoria a través de mayorías cualificadas", in LOEWENSTEIN, Karl, Teoría de la Constitución, 2ª ed., 4ª reimpressão, Barcelona: 1986, Ariel, p. 245/250
  7. Sobre o direito de investigar como elemento integrante do campo de atuação das minorias parlamentares e como fator componente do próprio direito de oposição, conferir brilhante voto proferido pelo Ministro Celso de Mello, no MS 24.831.
  8. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 14. A autora, neste ponto, enfatiza, no desenvolvimento da idéia de oposição, a importância do pensamento de Bolinbroke, que delineou o conceito de oposição patriótica.
  9. FINER, Samuel. Política de Adversários y Reforma Electoral, México: Fondo de Cultura Econômica, 1980.
  10. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p.16.
  11. MORAES, Alexandre de, Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional, São Paulo: Atlas, 2002, p.165.
  12. GOMES CANOTILHO, Joaquim José., opus cit., p. 454/455.
  13. Canotilho, neste ponto, faz um contraponto com a idéia clássica de oposição britânica, onde o líder da oposição recebe, ao lado de um salário do erário público, o título de "Líder de Oposição ao Governo de Sua Majestade". Cf., a tal propósito, a obra clássica de A. S. Foord, His Majesty’s Opposition.
  14. Para J. M. Silva Leitão, "o estado de partidos (parteienstaat) é uma expressão geralmente aceite: ‘As mais importantes decisões não são tomadas em conseqüência do debate parlamentar, sequer das reuniões do gabinete ou de assembléias de massas, mas no conventículos dos dirigentes máximos dos partidos". SILVA LEITÃO, José Manuel, Constituição e Direito de Oposição, Coimbra: Almedina, 1987, p. 139/140. Cite-se, no entanto, o entendimento de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que, em sucessivos trabalhos, sustentou a "inviabilidade da democracia pelos partidos no Brasil". FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, A Reconstrução da Democracia, São Paulo: 1979, Saraiva, p. 120/121 e Sete Vezes Democracia, São Paulo: 1977, Convívio, p. 52/53.
  15. Nesse sentido, as lições da Professora Mônica Caggiano, que se apóia, para tanto, em Maurice Duverger. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 19/21.
  16. DUVERGER, Maurice, opus cit., p. 447/449.
  17. A hipótese de conjunção de extremos a que alude Maurice Duverger, longe de configurar situação meramente teórica, pode ser constatada com freqüência em sistemas multipartidários. Um bom exemplo, no Brasil, foi o caso em que a Senadora Heloísa Helena (então sem partido, pois expulsa do PT), comemorava, juntamente com líderes da "direita", como Arthur Virgílio, a queda de medida provisória do Governo que reajustava, em 2004, e em nível abaixo do reivindicado, o valor do salário mínimo.
  18. A questão das políticas de coligações e da instabilidade governamental que ela acarreta foi bem percebida pela Professora Mônica Caggiano, que assim se manifestou sobre a questão: "A política de coligação, porém, encontra campo de expressão nos domínios da proporcionalidade, a ensejar a ‘representação-semelhança’, que, se de um lado, assegura a presença de numerosos e diversificados segmentos da comunidade junto à esfera de discussão e decisão dos negócios públicos, por outro, investe contra a estabilidade governamental, deflagrando um campo aberto à conflitualitá e, assim, ao estágio da ingovernabilidade. Alimentando uma esfera propícia a múltiplas, e não raras vezes, frágeis coligações, inaugura a fase do un gouvernement par probléme, rótulo que lhe é acoplado por Cotterret-Émeri". SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 64.
  19. A verificação, nos sistemas multipartidários, de uma oposição interna, que decorreria da necessidade de o Governo apoiar-se em vários partidos coligados para fins de exercício legítimo do poder, tem sido muito constatada na gestão federal do Governo do PT, sendo freqüentes as notícias de que determinadas denúncias ou críticas partiram da própria base de apoio do Governo (o chamado "fogo amigo").
  20. DUVERGER, Maurice, opus cit., p. 449/450.
  21. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman. opus cit., p. 34.
  22. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Curso de Direito Constitucional, São Paulo: 1992, Saraiva, p. 65/66
  23. Tendentes a atender, em maior ou menor medida, os requisitos identificadores da Poliarquia de Robert Dahl.
  24. Cf., sobre o elemento do terror como integrante da noção conceitual de totalitarismo: ARENDT, Hannah. Los Orígenes Del Totalitarismo, Madrid: Taurus Ediciones, 1974.
  25. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 49.
  26. SCHMITT, Carl. O Conceito de Político, Petrópolis: Editora Vozes, 1992.
  27. Apud SILVA LEITÃO, João Manuel, Constituição e Direito de Oposição, Coimbra: 1987, Almedina, p. 220.
  28. Requisitos indicados por Dahl e acolhidos pela Professora Mônica Herman Caggiano.
  29. A tolerância repele a distinção amigo-inimigo de Schmitt e evita que se adote medidas extremas no campo da disputa pelo poder.
  30. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 57
  31. SILVA LEITÃO, José Manuel, opus cit., p. 198/199.
  32. Idem, p.67/68.
  33. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, A Democracia Possível, 2ª ed., São Paulo: 1974, Saraiva, p.67/68.
  34. Normas que delimitam o momento, o modo e os instrumentos de atuação da oposição. Para J. M. Silva Leitão, "Os princípios, regras e órgãos relativos à actividade de oposição política, na sua unidade, formam o estatuto do direito de oposição. Este consigna os direitos políticos capazes de assegurar o exercício da oposição política no quadro da ordem constitucional". SILVA LEITÃO, João Manuel, opus cit., p.135.
  35. Cf., sobre o tema: M. QUEIROZ, Cristina M., Os Actos Políticos no Estado de Direito – O Problema do Controle Jurídico do Poder, Coimbra: Almedina, 1990, p. 205/216, capítulo intitulado: "Estado de direito e justiça constitucional: judicialização da política ou politização da justiça?".
  36. LINZ, Juan. Totalitarian and Authoritarian Regimes, in Handbook of Political Sciense, v. 3, Addison-Wesley, 1965, p. 183
  37. Nesse sentido, deve-se destacar a classificação adotada pela Professora Mônica Caggiano, no que se refere à oposição: (1) quanto ao lócus de expressão: parlamentar ou extraparlamentar; (2) quando ao conteúdo: dissensão, limite ou alternância; (3) quanto ao regime operativo: organização ou função; (4) quanto aos objetivos visados: contestatória (constitucional ou extraconstitucional/anti-sistema) ou construtiva e (5) quanto ao grupo envolvido: fracionária. No caso citado no corpo do texto, estar-se-ia diante de uma oposição contestatória extraconstitucional ou anti-sistema. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 129/130.
  38. SILVA LEITÃO, José Manuel, opus cit., p. 200/201.
  39. Sobre a composição dualista do Executivo, irretocável a lição da Professora Mônica Caggiano, no sentido de que "Tal configuração se revela como fator benéfico no que tange às crises políticas. Essas não abalam o Executivo em toda a sua integridade. Atingem apenas uma de suas cabeças...".SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 148.
  40. Nesse sentido: SALEM CAGGIANO, Mônica Herman. opus cit.,. p. 148.
  41. O regime do deux partis et demi, ou o bipartidarismo imperfeito, vigente na Alemanha, também se adapta bem ao parlamentarismo.
  42. Também chamado de política de adversários.
  43. Nas palavras de J. M Silva Leitão: "no sistema parlamentar, o embate decisivo localiza-se nas eleições legislativas: é esse o momento de transformação da oposição política em poder de governo". SILVA LEITÃO, José Manuel, opus cit., p. 205.
  44. Cf., sobre o shadow cabinet ou gabinete paralelo, SALEM CAGGIANO, Mônica Herman., opus cit., p. 119/128.
  45. SALEM CAGGIANO, Mônica Herman, opus cit., p. 125.

46. Cf., sobre o presidencialismo, SALEM CAGGIANO, Mônica Herman., opus cit., p. 157/164.

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Sobre a autora
Maria Cláudia Bucchianeri Pinheiro

advogada. professora de pós-graduação do IDP/LFG. mestra em direito e estado pela Universidade de São Paulo. membro da ABLIRC - ass. bras. de liberdade religiosa e cidadania

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINHEIRO, Maria Cláudia Bucchianeri. A oposição e seu papel no cenário da representação política. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2203, 13 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13145. Acesso em: 23 abr. 2024.

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