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A questão do imposto de renda incidente sobre a complementação de aposentadoria paga por entidades fechadas de previdência privada

07/08/2009 às 00:00
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A discussão se resume, fundamentalmente, em face das alterações relativas à cobrança do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) por força das Leis 7.713/88 e 9.250/95.

Devo, de início, dizer que, com certeza, não sou um tributarista. Aprendi, na faculdade, que esse é um ramo do Direito extremamente especializado. E eu não reúno, confessadamente, conhecimentos para advogar com destemor na área.

O que não me impede de analisar situações concretas.

Em 2004, durante encontro de aposentados (sou um deles), um dos presentes me mostrou uma carta recebida de um escritório de advocacia sobre o tema acima. Fui solicitado a analisar a matéria, e cheguei a algumas conclusões.


1. Legislação

A discussão se resume, fundamentalmente, em face das alterações relativas à cobrança do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) por força das Leis 7.713/88 e 9.250/95.

Na vigência da lei anterior (7.713/88), o salário era tributado antes de ser descontada a contribuição para a entidade de previdência privada. Ou seja, a tributação (IRPF) incidia também sobre a contribuição do empregado para a formação de sua reserva atuarial na fundação de seguridade social à qual se filiara, mediante contrato de adesão (exemplo: Previ, Petros, Sistel, Telos, Eletros ou congênere), a ser, mais tarde, a fonte (ou uma das fontes) básica responsável pelo pagamento dos benefícios complementares aos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Logo, os benefícios pagos pelas entidades privadas, e recebidos naquela época, não deveriam ser tributados (IR) na fonte, porque isso caracterizaria bitributação (bis in idem). Aqueles benefícios estariam, por assim dizer, isentos de IR (na verdade, já tinha havido a tributação, daí, talvez, seja impróprio dizê-los "isentos").

A partir de 01/01/1996, com a entrada em vigor da Lei 9.250/95, a contribuição mensal para o fundo de pensão (entidade de previdência complementar fechada) passou (melhor dizendo, voltou) a ser deduzida da base de cálculo do Imposto de Renda na fonte, não se configurando, pois, mais a dita bitributação. Isto é, se não houvera tributação, caberia a incidência do Imposto de Renda sobre o total da complementação decorrente dessas contribuições posteriores a 1995.


2. A questão da devolução

Há que se considerar um primeiro aspecto relativo a quando teve início o recebimento do benefício (a complementação de aposentadoria ou a pensão). Se antes de 01/01/1996, em princípio, não cabia qualquer tributação, pois a contribuição do empregado (o aposentado ou quem deixou a pensão) para a constituição do fundo (ou de sua "conta própria") já fora tributada. Isso se projeta no tempo e mesmo as complementações / pensões recebidas depois de 01/01/1996 estariam "isentas". Se o IRPF fora cobrado na fonte, caberia a devolução do indébito (ressalvada a questão da prescrição).

Contudo, a questão não é tão simples assim, como se verá.

Cumpre analisar a questão quanto àqueles que hajam começado a receber o benefício na vigência da nova legislação (Lei 9.250/95), ou seja, a partir de 01/01/1996.

Esses, presumivelmente, tiveram contribuições às respectivas fundações sob as legislações tributárias anteriores à vigência da Lei 7.713/88, durante e, quem sabe, depois da vigência dessa legislação que levava à não-tributação.

Isto é, têm uma situação que chamo de "híbrida".

A questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça há cerca de 10 anos, tendo nem sempre os cinco Tribunais Regionais Federais decidido de forma homogênea.

Nas primeiras decisões daquela Mais Alta Corte infraconstitucional brasileira, suas duas Turmas, também, nem sempre decidiram harmonicamente.

Cabe lembrar que uma decisão judicial é, normalmente, aplicável àquele caso particular. Eventualmente, é aplicável a um grupo. Potencialmente, a uma categoria ou mesmo a uma grande maioria de casos. Porém não se pode garantir que a jurisprudência seja aplicável erga omnes sempre.


3. A jurisprudência

Diz a jurisprudência mais recente do STJ, de forma uníssona e já pacificada pela Primeira Seção daquela Corte (composta pelos Ministros que compõem a Primeira e a Segunda Turmas), que a complementação / pensão paga mensalmente aos aposentados / pensionistas deve ser isenta de tributação proporcionalmente ao tempo durante o qual houve a tributação (recolhimento de IR na fonte) sobre a contribuição (de 01/01/1989 a 31/12/1995), somente sendo tributável a parcela correspondente aos outros períodos (antes de 01/01/1989 e depois de 01/01/1996).

Digamos que alguém contribuiu desde janeiro de 1976 para uma fundação, e que integralizou o tempo requerido para a obtenção do benefício do INSS e sua complementação em dezembro de 1996. Teria contribuído durante 21 anos, dos quais 7 anos sob uma legislação que daria a dita "isenção" (de 1989 a 1995) e 14 anos submetido à outra legislação (que não tributava a contribuição na fonte).

Com isso, verá sua complementação tributada correspondentemente aos períodos de 1976 a 1988 e aos doze meses de 1996.

Conseqüentemente, em tal caso, 1/3 (um terço) de sua complementação é isenta de tributação e 2/3 (dois terços), tributáveis. Em outros casos, pode ter havido 1/4 (um quarto) de contribuições sob a Lei 7.713/88 e 3/4 (três quartos) sobre as demais legislações. Ou proporções diferentes, que variam, ou podem variar, de zero a 100%.


4. Prazo prescricional

Situação peculiar é a daqueles dos quais foi descontado IRPF na fonte sobre os benefícios complementares pagos (início da percepção) entre janeiro de 1989 e dezembro de 1995, isto é, na vigência da Lei 7.713/88.

Tais benefícios, naquele período, eram isentos de tributação na fonte, embora pudessem vir a compor a base de cálculo da tributação na Declaração de Ajuste anual.

Assim, quem haja tido imposto de renda recolhido na fonte, entre janeiro de 1989 e dezembro de 1995, sobre os benefícios recebidos dessas fundações de previdência privada fechada, teria (ou teve) o direito de postular da União (Fazenda Nacional / Secretaria da Receita Federal), perante a Justiça Federal, a correspondente devolução daquele indébito, devidamente atualizada pela Taxa Selic, observado o prazo prescricional (há casos particulares em que a atualização monetária sofre pequenas alterações, não cabendo, por exemplo, os juros de mora, mas apenas a Taxa Selic).

Conforme a legislação aplicável, na bitributação (bis in idem), o prazo para a restituição começa a fluir a partir da ocorrência do fato gerador (a tributação, indevida, sobre o benefício, que era isento). Até junho de 2005, esses 5 anos eram acrescidos de mais 5 anos, contados do fim daquele prazo anterior que era o atribuído ao Fisco para verificar o "quantum" devido a título de tributo, dito de sua "homologação".

Quer dizer que, na prática, havia um prazo de 10 anos para ajuizar a ação de devolução do IRPF retido na fonte.

Dessa forma, em 01/04/2004, por exemplo, podia-se ajuizar ação requerendo a devolução do que houvesse sido retido, a título de IR, na fonte desde 02/04/1994, sem que a União pudesse alegar prescrição.

A legislação mudou e, a partir de junho de 2005 (Lei Complementar 118, de 2005), restringe-se a apenas 5 anos (e não mais a 10 anos).

Majoritariamente, a Justiça tem entendido que, na maioria dos casos, ainda vige a prescrição decenal, por se tratar de tributo submetido à homologação.

Ver, a respeito, a decisão, unânime, da Corte Especial do STJ ao julgar o Agravo de Instrumento nos E-REsp 644.736-PE, em 06.06.2007 (DJ 27/08/2007):

"CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. LEI INTERPRETATIVA. PRAZO DE PRESCRIÇÃO PARA A REPETIÇÃO DE INDÉBITO, NOS TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. LC 118/2005: NATUREZA MODIFICATIVA (E NÃO SIMPLESMENTE INTERPRETATIVA) DO SEU ARTIGO 3º. INCONSTITUCIONALIDADE DO SEU ART. 4º, NA PARTE QUE DETERMINA A APLICAÇÃO RETROATIVA.

1 Sobre o tema relacionado com a prescrição da ação de repetição de indébito tributário, a jurisprudência do STJ (1ª Seção) é no sentido de que, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo de cinco anos, previsto no art. 168 do CTN, tem início, não na data do recolhimento do tributo indevido, e sim na data da homologação – expressa ou tácita - do lançamento. Segundo entende o Tribunal, para que o crédito se considere extinto, não basta o pagamento: é indispensável a homologação do lançamento, hipótese de extinção albergada pelo art. 156, VII, do CTN. Assim, somente a partir dessa homologação é que teria início o prazo previsto no art. 168, I. E, não havendo homologação expressa, o prazo para a repetição do indébito acaba sendo, na verdade, de dez anos a contar do fato gerador.

2Esse entendimento, embora não tenha a adesão uniforme da doutrina e nem de todos os juízes, é o que legitimamente define o conteúdo e o sentido das normas que disciplinam a matéria, já que se trata do entendimento emanado do órgão do Poder Judiciário que tem a atribuição constitucional de interpretá-las.

3O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar esses mesmos enunciados, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a ''interpretação'' dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal.

4.Assim, tratando-se de preceito normativo modificativo, e não simplesmente interpretativo, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.

5.O artigo 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI).

6.Argüição de inconstitucionalidade acolhida."


5. Quem tem direito

Há um princípio jurisprudencial que diz não haver direito adquirido em matéria tributária. Quer dizer, se a legislação mudar, não se pode arguir contra isso. Quem já recebia benefício (aposentadoria ou pensão) desde a vigência da legislação que antecedeu a Lei 7.713/88, se ela lhe fosse tributariamente menos onerosa, não poderia reclamar do "prejuízo", com uma maior tributação e menor renda líquida mensal, resultante da mudança da legislação fiscal. O mesmo com relação ao advento da Lei 9.250/95, a partir de 01/01/1996.

Por conseguinte, quem já estivesse percebendo benefício da Telos, Petros, Previ, Eletros, Sistel,. .... e descontou IR na fonte, pode mover a competente ação judicial ("devolução do indébito") para receber a restituição do montante recolhido indevidamente desde igual data de, agora, cinco anos antes do ajuizamento. Se ajuizada antes da entrada em vigor da LC 118 / 2005, pode postular os dez anos anteriores.


6. Abrangência

Raciocínio semelhante se aplica ao resgate das contribuições (devolução da Reserva de Poupança, para quem não quis ficar como aposentado ou pensionista), bem como se fosse o caso de a entidade de previdência privada ser extinta e seu patrimônio rateado entre os seus segurados (rateio). Nada disso caracterizaria acréscimo patrimonial.

Logo, também é inteiramente isento de tributação, e cada um estará simplesmente recebendo de volta aquilo que contribuíra para a constituição do fundo.


7. Evolução jurisprudencial

Na espécie, verificou-se uma evolução jurisprudencial muito grande. As primeiras decisões, talvez dadas as peculiaridades daqueles casos, muitas vezes "esqueceu" ou deixou de levar na devida conta que, antes da Lei 7.713/88, vigera outra, a Lei 6.435/77. E que esta antiga legislação, tal como a nova (desde 1996), não tributava na fonte a contribuição do empregado.

Com essa não-consideração, inúmeras foram as decisões transitadas em julgado que concederam isenção total, meramente pelo fato de a aposentadoria ter começado a ser complementada na vigência da Lei 7.713/88, como se todo o tempo de contribuição se regesse por tal legislação.

Fez coisa julgada e, como sabido, nem cabe ação rescisória, porque decidido consoante a jurisprudência de então.

No julgamento do REsp 705.599, em abril de 2005, a relatora (Ministra Eliana Calmon, da Segunda Turma), concluiu, ao constatar divergências entre as duas Turmas:

"Desse modo, entendo de absoluta importância a reanálise da matéria".

A reanálise proposta pela Eminente Ministra levou à uniformização do entendimento jurisprudencial da Primeira Seção daquela Corte no sentido oposto ao entendimento que vinha sendo sustentado por Sua Excelência.

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Registre-se, ainda, que ela também passou a adotar o decisum uniformizador, ainda que pudesse ressalvar sua posição pessoal, como na Decisão monocrática no REsp 833.372, em 06/06/2006, publicada no DJ de 14/06/2006:

"A Segunda Turma desta Corte, a partir do julgamento do REsp 642.641/DF, revendo posicionamento anterior, concluiu pela legitimidade da cobrança do imposto de renda sobre complementação de aposentadoria, independentemente de ter sido recolhida a contribuição mensal na vigência da Lei 7.713/88 ou da Lei 9.250/95 pelas razões resumidas na ementa a seguir transcrita:

(........)

A tese foi submetida à apreciação da Primeira Seção desta Corte no julgamento do EREsp 673.274/DF, em 12/12/2005, relatado pelo Min. Teori Zavascki. O voto condutor do julgado, após tecer considerações a respeito da legislação pertinente (Leis 6.435/77, 7.713/88, 9.250/95 e LC 109/2001), concluiu que:

a) não obstante seja indefinido no tempo o valor futuro do benefício que será pago (..............) não se pode negar o fato de que as contribuições vertidas aos beneficiários no período de vigência da Lei 7.713/88 (e que em alguma proporção integram o benefício devido) já foram tributadas pelo IRPF;

b) sob pena de incorrer-se em bis in idem, é inexigível o imposto de renda sobre os benefícios de previdência privada auferidos a título de complementação de aposentadoria até o limite do que foi recolhido pelo beneficiário sob a égide da Lei 7.713/88.

Disse mais a Ministra:

"(.....) ressalvo o meu pessoal entendimento sobre a matéria, conforme demonstrado em diversos julgados, dentre eles o REsp 642.641/DF, para acompanhar a posição majoritária da Primeira Seção.

Com essas considerações, estando o acórdão a quo em consonância com esse entendimento, nos termos do art. 557 do CPC, NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL."

Outro Ministro, Teori Zavascki, foi relator de pelo menos duas paradigmáticas decisões da Primeira Seção do STJ, sendo, além daquela citada pela Ministra Eliana Calmon (EREsp 673.724), a, talvez, de maior relevância à espécie,:em outubro de 2008, no REsp 1.012.903, com os efeitos da Lei dos Recursos Repetitivos (regime do art. 543-C do CPC), transitada em julgado em 14/11/2008.


8. Declaração da PGFN

Não bastassem a jurisprudência (ou em decorrência da jurisprudência), a Fazenda Nacional continua, aqui e ali, interpondo Apelações Cíveis que vão de encontro ao Ato Declaratório nº 4, de novembro de 2006 (DOU de 17/11/2006), em que está dito:

"(.....), tendo em vista a aprovação do Parecer PGFN/CRJ/Nº 2139/2006, desta Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, pelo Senhor Ministro de Estado da Fazenda, (.....), DECLARA que ficam dispensadas a apresentação de contestação, a interposição de recursos e fica autorizada a desistência dos já interpostos, desde que inexista outro fundamento relevante:

"nas ações judiciais que visem obter a declaração de que não incide imposto de renda sobre a complementação de aposentadoria correspondente às contribuições efetuadas exclusivamente pelo beneficiário no período de 1º de janeiro de 1989 a 31 de dezembro de 1995, até o limite do imposto pago sobre as contribuições deste período, por força da isenção concedida no inciso VII do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, na redação anterior a que lhe foi dada pela Lei nº 9.250, de 1995.

JURISPRUDÊNCIA: REsp nº 808.488/AL (DJ 30.06.2006), AgRg no REsp nº 792.843/RS (DJ 19.06.2006), REsp nº 828.823/SC (DJ 29.05.2006)"

Seria o caso de se indagar: a interposição dessas Apelaçõs Cíveis não teria sido uma espécie de flagrante insubordinação funcional dos Procuradores da Fazenda Nacional que as subscreveram?


9. Como se propala a informação

Andou circulando, como se fora uma grande novidade, a notícia de que "STJ define que é indevida cobrança de IR s/Aposentadoria Complementar"

A notícia jornalística é típica de quem seja leigo em Direito ou não acompanhe a jurisprudência Não mudou nada, na essência, de uma hora para outra, pois, apenas, fora reiterada, em outubro de 2008 (ao julgar o REsp 1.012.903) a mesmíssima jurisprudência do STJ existente havia pelo menos uns 3 anos.

Quando a Imprensa deu aquela notícia agora requentada, eu escrevera:

"Previsivelmente, a imprensa não especializada cometeu pequenos senões, e pode ter dado a impressão equivocada, por exemplo, que todos os proventos de aposentadoria estariam isentos. A Folha de São Paulo de 09/10/2008 traz essa matéria (caderno Dinheiro) "Receita não pode cobrar IR sobre aposentadoria, diz STJ".

Não é bem isso. O tema já fora discutido e decidido (inclusive pela própria Primeira Seção do STJ) mais de uma vez.

Como dito antes, a respeito dessa tributação, o Superior Tribunal de Justiça já consagrara, de forma reiterada e harmônica, que somente incide imposto de renda sobre parte das complementações previdenciárias pagas por entidades de previdência privada."


10. Como entendo a jurisprudência do STJ

Extrai-se do Voto do Ministro-Relator do REsp paradigma (REsp 1.012.903):

"O imposto de renda não incide sobre a complementação de aposentadoria quanto aos resgates e benefícios decorrentes de contribuições cujo ônus tenha sido exclusivamente dos participantes do plano de previdência privada, sob o regime da Lei 7.713/88 (janeiro de 1989 a dezembro de 1995), não abrangendo, contudo, as contribuições vertidas pelo empregador e os ganhos oriundos de investimentos e lucros da entidade, ex vi do artigo 6º, VII, "b", da referida lei (Precedentes desta Corte: REsp 717537/RN, Primeira Turma, DJ de 29.08.2005; REsp 584584/DF, Segunda Turma, DJ de 02.05.2005; AgRg no AG 677532/MG, Segunda Turma, DJ de 22.08.2005; REsp 531308/PR, Segunda Turma, DJ de 01.02.2005; AgRg no AgRg no REsp 475.995/PR, Primeira Turma, desta relatoria, DJ de 02.06.2003)."

"O limite da isenção é o valor do Imposto de Renda pago sobre os recolhimentos realizados pelo beneficiário ao plano de previdência privada no período de vigência da Lei 7.713/88, antes das alterações promovidas pela Lei 9.250/95."

"Logo, não estão sujeitos à incidência do Imposto de Renda os proventos de complementação de aposentadoria recebidos (......) relativamente às contribuições de previdência privada por ele efetuadas no período compreendido entre 1º de janeiro de 1989 e a data em que teve início a sua aposentadoria."

Vê-se que não se trata de uma isenção ampla, geral e irrestrita.

A decisão do STJ diz que a complementação não deve ser integralmente tributada, em certos casos (no de 4 dos 5 autores julgados naquele recurso) - há hipóteses em que a complementação pode ser "integralmente" tributada -, mas apenas deve sê-lo "proporcional" ou "correspondentemente" à parcela que resulte da contribuição do empregado (uma primeira redução do universo), não se podendo olvidar que há a parcela resultante da contribuição da Mantenedora e há outra parcela resultante de aplicações financeiras da Fundação. E, ademais, somente das contribuições efetuadas naqueles 7 anos (jan/89 a dez;95).

Venho procurando obter, nas ações que patrocino, decisões que definam, na fase de conhecimento, o percentual que, a meu ver, represente a melhor exegese da jurisprudência do STJ. Não se deve deixar para uma fase posterior (na de liquidação ou na fase de cumprimento).

Há entendimentos judiciais diferentes, reconhecendo que já houve uma tributação na fonte, mas, por exemplo, mandando devolver o IR retido na fonte durante aquele tempo, que teria onerado a contribuição.

A questão não é simples, muitas soluções podem advir, e nenhuma delas será perfeita ou ideal. O caso é bastante complexo.

Elaborei um artigo a respeito, que a Revista do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (Brasília) publicou em seu número de abril passado (p. 39 a 47), "Complementações de aposentadorias pagas por entidades de previdência privada – quanto tributar?"

Nele, sustento a tese segundo a qual a jurisprudência prevalecente, e supostamente definitiva, do STJ diz que a complementação paga mensalmente aos aposentados deve ser isenta de tributação proporcionalmente ao tempo durante o qual houve a tributação (recolhimento de imposto de renda na fonte) sobre a contribuição (de 1º/01/1989 a 31/12/1995), somente sendo tributável a parcela correspondente aos outros períodos (antes de 1º/01/1989 e depois de 1º/01/1996).

No Voto condutor no REsp 1.012.903, lê-se:

"Importa ressaltar que também os valores recebidos a título de complementação de aposentadoria representam, em certa medida, a retribuição de recursos vertidos pelos beneficiários (as contribuições), além de verbas empregadas pela entidade patrocinadora. (.....).

Dispunha, ainda, o § 3º do art. 21 desse diploma legal [a Lei 6.435/77, que regia a matéria antes da L. 7.713/88] que "o pagamento de benefício ao participante de plano previdenciário dependerá de prova de quitação da mensalidade devida, antes da ocorrência do fato gerador, na forma estipulada no plano subscrito''. Tais normas demonstram inequivocamente que o benefício representa, em alguma medida, a retribuição decorrente das contribuições vertidas."

E prosseguiu o Eminente Ministro-Relator:

"A Lei Complementar 109/2001, que rege atualmente a matéria, dispõe em seu art. 18 que ''o plano de custeio (...) estabelecerá o nível de contribuição necessário à constituição das reservas garantidoras de benefícios (...)''. Ademais, preconiza o parágrafo único do art. 7º da referida lei a existência de, ao menos, três modalidades de planos de benefícios (benefício definido, contribuição definida e contribuição variável). Em todos eles, o que se percebe é a correlação entre contribuição e benefício segundo critérios atuariais - no primeiro, o valor do benefício pretendido pelo participante determinará sua contribuição; nos outros, o benefício variará de acordo com a contribuição que o participante decide verter. Evidentemente, não existe uma identidade exata entre contribuição e benefício. Entretanto, essas modalidades demonstram que a medida do benefício varia de acordo com a medida da contribuição, permitindo a conclusão de que aquele inclui esta em sua composição.

O parágrafo único do art. 18 estabelece que ''o regime financeiro de capitalização é obrigatório para os benefícios de pagamento em prestações que sejam programadas e continuadas''.

Citando a doutrinadora Samira Engel Domingues, disse o Relator:

''Na capitalização, os recursos das contribuições passam a constituir um fundo, individual ou coletivo, cujo ativo é aplicado a fim de que seja multiplicado, para no futuro poder garantir o pagamento dos benefícios acordados (....).

Reportou-se, adiante, a outro doutrinador, Wladimir Novaes Martinez, de quem citou:

''É da natureza do empreendimento previdenciário a projeção das despesas futuras, para que o custeio das obrigações dos atuais contribuintes seja financiada por eles próprios e não pelas gerações posteriores (grosso modo, descaracterizando o regime de repartição, em que os jovens aportam para os benefícios dos idosos). A idéia básica é que o futuro esteja garantido (não necessariamente num só momento, em virtude do fluxo de caixa) para que essa consolidação independa do presente; por isso faz parte da definição da previdência certa concepção de poupança individual ou coletiva, facultativa ou obrigatória. Através de mensalidades consecutivas, durante muitos anos, o titular da conta acumula valores durante sua vida profissional para consumir, ainda através de mensalidades, o que foi poupado e a rentabilidade que o saldo remanescente do capital acumulado é capaz de criar.''"

Quanto a este último aspecto, conquanto existam, basicamente, três fontes de financiamento da reserva matemática que custeará a futura complementação de aposentadoria (contribuições do empregado, contribuições da Mantenedora e rendimentos das aplicações feitas pela própria fundação), nada indica que aquela reserva matemática haja sido seja formada, em partes iguais, de 1/3 de cada qual daquelas três fontes.

Por oportuno, não se está cogitando de auferir qualquer redução, ou vantagem, relativamente às contribuições patronais, ou mesmo relativamente aos rendimentos resultantes das aplicações e a boa gerência financeira da entidade que paga a complementação de aposentadoria.

O que se postula é que, com fincas em nosso melhor Direito e na jurisprudência, seja devidamente levada em conta, na tributação da complementação de aposentadoria devida e paga., a parcela correspondente às contribuições do empregado hoje inativo, e tão somente àquelas contribuições efetuadas na vigência da Lei nº. 7.713, de 1988.

O que significa dizer entre janeiro de 1989 e dezembro de 1995 (exatos 7 anos. Ou 84 meses. Ou 2.256 dias - houve um ano bissexto)

Potencialmente, não haverá duas situações rigorosamente iguais, porquanto um empregado pode ter contribuído mais tempo ou menos tempo que outro, bem como pode ter contribuído para sua fundação:

- somente até antes da entrada em vigor da Lei 7.713/88;

- apenas após dezembro de 1995 (já vigência da Lei 9.250, de 1995;

- antes, durante e depois daquela lei de 1988; ou

- sob duas dessas três legislações (a de 1977, a de 1988 e a atual, de 1995).

Nos dois primeiros casos (somente até antes de 1989 e somente depois de 1995), pode até, no limite, caber a tributação integral do benefício.

Porém, nos casos que chamei "híbridos", essa tributação, indubitavelmente, há de ser parcial, consoante a mais atual jurisprudência, correspondente e proporcionalmente às contribuições recolhidas pelo hoje inativo à entidade de previdência complementar privada, fechada, e apenas aquelas recolhidas entre 1º de janeiro de 1989 e 31 de dezembro de 1995., se for o caso (evidentemente, há quem contribuiu sob a Lei 7.713/88 por menos tempo que os 7 anos de sua vigência).

Mais uma observação, pela sua pertinência:

Computar as contribuições efetuadas durante a vigência da Lei 7.713/88 como um "quantum" a devolver (o que não constituía um indébito, de acordo com a lei então vigente) não resultará no protraimento da proporcionalidade tão reiteradamente presente nas decisões, pois seria um valor limitado, em pecúnia.

A meu ver, a solução de devolver o IRPF recolhido sobre as contribuições à entidade de previdência privada naqueles 7 anos é a pior de quantas eu já haja conhecido. No mínimo, porque o valor do IR recolhido "sobre as contribuições à entidade de previdência privada naqueles 7 anos "é de dificílima apuração e comprovação, posto que não seja impossível.

È que, no valor retido e recolhido a título de IRPF, está a tributação sobre o salário e sobre a contribuição à fundação. - e nem todos os empregados guardaram os demonstrativo / holerites mensais.

Ter-se-ia que se extrair, talvez por proporcionalidade ou outro meio, quanto teria sido o IRPF sobre a contribuição à fundação.

A fundação, provavelmente, não sabe quanto, ou como, foi tributado (não era a fonte pagadora de então) e o antigo empregador também vai procurar se escusar de entrar nessa discussão.

Talvez a Fazenda Nacional / SRF (hoje, SRFB) possa "abrir" seus antigos arquivos (será que ainda conserva dados de mais de 15, chegando a mais de 20 anos?).

Por isso é que sustento que a fixação do percentual de tributação da complementação tem que ser na fase de conhecimento.

O que me parece mais justo, e exeqüível, é estabelecer o percentual que tributará a complementação de aposentadoria, por todo o tempo, com base na proporcionalidade de suas contribuições, conforme houvesse, ou não, sido tributadas na fonte. Pois essa complementação de aposentadoria, sabidamente, será devida por um tempo imprevisível, se de um, cinco, dez, vinte anos ou mais.

Seja computando-se em anos, em meses ou em dias, vê-se que a proporção daqueles 7 anos, 84 meses ou 2.256 dias de vigência da Lei 7.713/88 no tempo total de contribuição ao fundo de pensão não varia muito, resultando em que a parcela tributável da complementação de aposentadoria, que lhe é devida e paga, deve ser tributada em um percentual que seja o complemento da "isenção".

Qualquer que seja o critério, diminui-se, do tempo total de contribuição, o de contribuição sob a Lei 7.713/88 e divide-se a diferença pelo número total de contribuições.

Entendo que assim e, somente assim, a complementação de aposentadoria paga pela fundação de seguridade social vai observar a proporcionalidade de que tanto fala a jurisprudência pátria, que reconhece já ter havido tributação na fonte em 7 anos (ou em 84 meses) do tempo total de contribuição à entidade de seguridade privada, fechada.

Pensando melhor, a proporcionalidade mais justa nem seria o cômputo em dias, meses ou anos, mas em tempo de contribuição. Dessa forma, incluem-se as contribuições efetuadas para a constituição do fundo de reserva sobre as gratificações natalinas.

Com esta última consideração (tempo de contribuição), ter-se-ia por minuendo os 91 "meses" (os 84 do calendário mais as sete contribuição sobre o 13º salário) que já haviam sido tributados na fonte.

A relevância da definição desse percentual destina-se, por fim, a permitir que a fonte pagadora saiba quanto reter e recolher a título de imposto de renda.

Posso estar errado, estou aberto a argumentos que possam me convencer de eventual erro, mas, até prova em contrário, é essa a melhor exegese da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria.

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Sobre o autor
João Celso Neto

advogado em Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CELSO NETO, João. A questão do imposto de renda incidente sobre a complementação de aposentadoria paga por entidades fechadas de previdência privada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2228, 7 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13289. Acesso em: 18 abr. 2024.

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