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Limites aos poderes do empregador

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09/08/2009 às 00:00
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Considerações finais

Numa era de globalização da economia, a redução de custos para garantir a competitividade no mercado mundial produziu profundos reflexos nas relações de trabalho. Essas relações acompanham, praticamente, o mesmo ritmo da economia mundial.

Nesse contexto, os imperativos econômicos promovem um questionamento acerca da permanência do princípio da proteção ao trabalho, que visa nivelar as desigualdades existentes entre as partes no pacto empregatício.

Buscando a modernização do direito heterônomo trabalhista, o sistema legal sofreu alterações, em descompasso com as premissas constitucionais vigentes e em detrimento dos direitos sociais dos trabalhadores. Surgiram os fenômenos da desregulamentação e da flexibilização. Esta última tentativa gerou formas precárias de trabalho.

Disseminou-se o argumento falacioso de que a imperatividade das normas trabalhistas estatais é a causa principal do grave desemprego que assola o país, como se houvesse uma dicotomia entre o direito ao trabalho e o direito do trabalho em condições dignas. Um não pode prescindir do outro para a concretização da ordem social.

Nesse contexto de vulnerabilidade da proteção ao emprego, a efetivação dos direitos fundamentais deve ser o norte para o resgate da cidadania dos trabalhadores. Como salienta Romita, "a aplicação dos direitos fundamentais à relação individual de trabalho pode compatibilizar-se com a subordinação, desde que eles sejam entendidos pelo prisma de limitação dos poderes do empregador" [32].

O exercício do poder diretivo encontra limite na dignidade e no valor social do trabalho. Deve ser assegurado, como piso mínimo intransponível, o trabalho decente que, de acordo com José Cláudio Monteiro de Brito Filho:

É um conjunto mínimo de direitos do trabalhador que corresponde: à existência de trabalho; à liberdade de trabalho; à igualdade no trabalho; ao trabalho com condições justas, incluindo a remuneração, e que preservem sua saúde e segurança; à proibição do trabalho infantil; à liberdade sindical; e à proteção contra os riscos sociais [33].

Como leciona Alice Monteiro de Barros, o persistente vigor dos direitos fundamentais dos trabalhadores nas empresas poderá traduzir, segundo a doutrina espanhola, "um antídoto para emancipar o contrato de trabalho de sua excessiva subordinação à economia, permitindo que essa disciplina recupere o seu papel de assegurar a auto-realização, autodeterminação do empregado como cidadão" [34].


BIBLIOGRAFIA

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Notas

  1. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do trabalho. 5 ed. São Paulo: LTr, 2006. p. 629.
  2. SUSSEKIND, Arnaldo ...[et al.]. Instituições do direito do trabalho. vol. 1. 21 ed. Atual. São Paulo: LTr, 2003. p. 243.
  3. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do Trabalho. 16 ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 452.
  4. SIMÓN, Sandra Lia. A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado. São Paulo: Ltr, 2000. p. 112.
  5. Op. cit., p. 670-677.
  6. Op. cit., p. 243.
  7. SARAIVA, Renato. Direito do Trabalho para concursos públicos. São Paulo: Método, 2006.
  8. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o direito constitucional internacional. 7. ed. ver. , ampl. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2006. p. 151.
  9. ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. 2 ed. ver. e aum. São Paulo: LTr, 2007. p. 45.
  10. Op. cit., p. 72.
  11. Não há substituição gradativa de uma geração por outra. Existe um processo de acumulação e não de sucessão cronológica, tendo em vista a interdependência e a indisivisibilidade dos direitos fundamentais.
  12. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito constitucional. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 571.
  13. SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e relações privadas. 2 ed. Rio de janeiro: Lúmen Júris, 2006. p. 329.
  14. O princípio da proporcionalidade é ínsito ao Estado Democrático de Direito. Deve balizar a colisão entre direitos fundamentais, garantindo a menor restrição possível aos seus núcleos essenciais. Este princípio proíbe excessos ou arbitrariedades. Deve ser analisado de acordo com os seguinte requisitos: adequação da medida ao fim almejado, necessidade da restrição para assegurar a efetividade do direito, proporcionalidade em sentido estrito, que promove um juízo de ponderação entre a restrição imposta e o fim almejado.
  15. Op. cit., p. 27.
  16. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6 ed. ver. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 118.
  17. Márcio Túlio Viana apud Sandra Lia Simón, Op .cit., p. 155.
  18. MENEZES, Mauro de Azevedo. Constituição e reforma trabalhista no Brasil: interpretação na perspectiva dos direitos fundamentais. São Paulo: LTr, 2003. p. 185.
  19. Op. cit., p. 119.
  20. Op. cit., p. 422.
  21. GUEDES, Márcia Novaes apud DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho: dano moral e material, acidente e doença do trabalho, dano pré e pós-contratual, responsabilidade subjetiva e objetiva, dano causado pelo empregado, assédio moral e sexual. São Paulo: LTr, 2005. p. 233.
  22. BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Discriminação no trabalho. São Paulo: LTr, 2002. p. 39.
  23. A discriminação pode ocorrer de forma direta (tratamento desigual fundado em critérios proibidos) ou indireta (tratamento apenas formalmente igual, mas que desiguala os candidatos a emprego. É dissimulada).
  24. Op. cit., p. 141.
  25. Op. cit., p. 170.
  26. Op. cit., p. 208.
  27. Deve ser o último recurso. Primeiramente, o empregador irá socorrer-se de outras formas de controle ou de tecnologias disponíveis.
  28. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 2 ed. São Paulo: LTr, 2006. p. 560.
  29. Op. cit., p. 148.
  30. Op. cit., p. 157.
  31. STF – Proc. HC 70814-5, Rel. Min. Celso de Mello. DJU de 24.06.1994, p. 16649, transcrito em ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. 2 ed. ver. e aum. São Paulo: LTr, 2007. p. 303.
  32. Op. cit., p. 412.
  33. BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Trabalho Decente: análise jurídica da exploração, trabalho forçado e outras formas de trabalho indigno. São Paulo: LTr, 2004. p. 61.
  34. Op. cit., p. 614.
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Sobre o autor
Marcius Cruz da Ponte Souza

Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil. Pós-graduando em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Christus.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Marcius Cruz Ponte. Limites aos poderes do empregador. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2230, 9 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13296. Acesso em: 19 abr. 2024.

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