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Responsabilidade dos administradores de sociedade anônima

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06/01/2011 às 09:35
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Nas sociedades anônimas, a responsabilidade dos administradores se afigura com maior utilidade em relação aos demais tipos societários, porquanto há uma maior dispersão das participações societárias.

Sumário: Introdução. 1. Aspectos gerais da sociedade anônima. 2. Alguns modelos de responsabilidade dos administradores. 2.1. Direito alemão. 2.2. Direito francês. 2.3. Direito português. 2.4. Direito inglês. 3. Os deveres gerais de conduta dos administradores. 3.1. Dever de diligência. 3.2. Dever de obediência. 3.3. Dever de lealdade. 3.4. Dever de informação. 4. Os pressupostos da responsabilidade dos administradores. 4.1. Ato ilícito. 4.2. Dano. 4.3. Nexo de causalidade. 5. A solidariedade dos administradores na gestão da sociedade. 6. As ações de responsabilidade dos administradores. 6.1. Ação social. 6.2. Ação individual. 7. A indenização por danos causados à sociedade. Conclusões. Bibliografia.


INTRODUÇÃO

O instituto da responsabilidade dos administradores adquiriu inevitável interesse em nosso ordenamento jurídico, dentro de um contexto de crescente relevância da responsabilidade civil como instrumento de tutela das relações que envolvem as atividades empresariais, notadamente com o intuito de se equilibrar os poderes da administração e o modo de controle do seu respectivo exercício.

Nas sociedades anônimas o tema da responsabilidade dos administradores se afigura com maior utilidade em relação aos demais tipos societários, porquanto geralmente nas companhias há uma maior dispersão das participações societárias, conjuntura que acaba por conferir aos diretores maior autoridade e autonomia nas suas funções. Diante desse quadro, a responsabilidade poderá constituir uma indispensável forma de controle dos órgãos de administração pelos acionistas.

A problemática, então, surge com a necessidade de se definir os contornos dessa responsabilidade. É consabido que, a princípio, o risco é inerente atividade empresarial, mormente em razão da crescente competitividade das empresas num mercado cada vez mais internacionalizado; aliás, é indubitável que, quanto maiores os riscos, mais elevados tendem a ser os lucros. Nessa direção, os administradores se encontram numa posição na qual a sua margem de atuação dentro do risco permitido e a atuação ilícita podem se confundir.

Como se depreende do título, a presente investigação objetiva analisar os aspectos que envolvem a responsabilidade dos administradores de sociedade anônima em relação à própria sociedade e os seus acionistas.

Buscamos principalmente, compreender os exatos limites dessa responsabilidade. Abordaremos os aspectos gerais da sociedade anônima, modelos jurídicos de responsabilidade, deveres gerais de conduta dos administradores, pressupostos da responsabilidade, solidariedade dos administradores na gestão social, ações de responsabilidade civil e indenização por danos causados à sociedade.

Excluímos propositalmente do âmbito desta investigação questões relacionadas à responsabilidade dos administradores perante credores alheios à sociedade, por débitos cíveis, tributários, trabalhistas ou previdenciários: primeiro, porque entendemos que a complexidade desse tema demandaria uma investigação própria; depois, porquanto nos ateremos à responsabilidade versada pelos artigos 153 e seguintes da Lei das S/As (Lei n.º 6.404/76).

Esperamos que esse trabalho acadêmico, além de fornecer elementos doutrinários e jurisprudenciais sobre o tratamento jurídico da responsabilidade dos administradores, possa proporcionar aos operadores do direito uma visão mais clara de como esse instituto opera no direito pátrio, ou seja, em quais circunstâncias se deve reconhecer a sua existência e em quais se deve excepcioná-la.


1. Aspectos gerais da sociedade anônima

A sociedade anônima – ou companhia – é uma sociedade tipicamente de capital, na medida em que as características pessoais dos sócios são irrelevantes para o sucesso ou insucesso do negócio explorado pela empresa, sendo a contribuição material conferida pelos acionistas o único elemento a considerar. Por conseguinte, pode o acionista vender a sua participação societária a terceiros, independentemente da anuência dos demais1.

As principais características da sociedade anônima são a limitação da responsabilidade dos acionistas e a possibilidade de livre negociação das suas ações, as quais constituem ferramentas essenciais para despertar o interesse de investidores e propiciar a reunião de grandes montas de capital2.

Sendo a sociedade anônima dotada de atributos que favorecem a captação de recursos para o desenvolvimento do seu objeto social, a mesma acaba por ser o tipo societário preferido para a execução de atividades empresariais que requerem um maior volume de investimentos, dentre as quais podemos destacar – a titulo exemplificativo – a bancária, securitária, petrolífera, automobilística, portuária e energética.

O capital social das sociedades anônimas é dividido em ações, com ou sem valor nominal, distribuídas entre os acionistas, conforme as suas correspondentes subscrições. Além de representarem uma parcela do capital da companhia, as ações correspondem também a uma fração do patrimônio social e, ressalvadas algumas exceções3, à quantidade de votos que o seu respectivo titular tem direito na assembléia geral.

Classifica-se a sociedade anônima em fechadas e abertas. As primeiras somente podem negociar as suas ações diretamente com os investidores interessados, ao passo que as segundas podem negociá-las em qualquer bolsa de valores4 ou no mercado de balcão56.

Nessa direção, podemos conceituar a sociedade anônima como a "sociedade empresária com o capital social dividido em valores mobiliários representativos de um investimento, cujos sócios têm pelas obrigações sociais responsabilidade limitada ao preço de emissão das ações que titularizam"7.

Historicamente, tem-se o registro de que a experiência mais antiga no domínio das sociedades anônimas foi o Banco de San Giorgio, estabelecido em Gênova no ano de 14078. Embora estudos mais recentes ponham em dúvida que o mesmo consistisse numa verdadeira companhia no sentido hodierno, tinha tal instituição alguns aspectos marcantes, como os da pluralidade de participantes e da limitação das suas correlatas responsabilidades, ante as obrigações da pessoa jurídica.

Foi no início da idade moderna, a partir do século XVII, que as sociedades anônimas surgiram verdadeiramente, impulsionadas pelas políticas colonialistas dos Estados europeus. Dependentes de outorga do rei ou do governo para funcionar, tais sociedades tiveram como objetivo a expansão da conquista de novos territórios, a conservação das colônias agregadas e o desenvolvimento do comércio marítimo. A mais antiga foi a East India Company fundada no ano de 1.600 pelo Reino Unido9.

Os Estados, então, promoveram a constituição de sociedades anônimas para captar do setor privado parte dos investimentos necessários à realização das viagens ultramarinas, assemelhando-se ao que conhecemos hoje como parcerias público-privadas ou sociedades de economia mista10.

No ano de 1.807, o imperador Napoleão Bonaparte sancionou o Code de Commerce francês, o qual foi o primeiro código de leis a tratar expressamente das sociedades anônimas, ainda que de forma concisa11. Posteriormente, a Lei francesa de 24/07/1867 veio a abolir definitivamente a necessidade de autorização administrativa para a constituição de sociedades anônimas12.

Também noutros países europeus, seguiu-se o movimento de inclusão da matéria das companhias nos seus correlatos códigos comerciais. Teve-se, a título ilustrativo, o Allgemeine Deutsche Handelsgesetzbuch de 1.861 na Alemanha, o Codice di Commercio de 1.865 na Itália e o Código Comercial de 1.888 em Portugal.

No Brasil, sob a égide do Império, as sociedades anônimas ganharam espaço no Código Comercial de 1850, cujo artigo 29513 requeria autorização governamental prévia para a constituição de qualquer companhia. Dez anos depois, publicou-se a Lei n.º 1.083/1860 – a primeira lei específica das sociedades anônimas – que, contudo, manteve ainda tal exigência. Somente com a publicação da Lei n.º 3.159/1882 e do Decreto n.º 8.821/1882 é que se aboliu a obrigatoriedade da autorização, passando o direito brasileiro a seguir a tendência de países europeus e norte-americanos ao incorporar o sistema de regulamentação.

Durante o Estado Novo, promulgou-se o Decreto-Lei n.º 2.627/1940, que venho a ser a segunda lei brasileira a disciplinar as sociedades anônimas. No Período Militar esse diploma foi parcialmente revogado14 pela Lei n.º 6.404/1976, competente por reger atualmente a matéria em nosso direito, com as alterações introduzidas pelas Leis n.ºs 9.457/1997, 10.303/2001 e 11.941/2009.

Ressalte-se que, com a entrada em vigor da Lei n.º 6.385/1976, a constituição das companhias abertas através da subscrição pública de ações passou a depender de autorização prévia da Comissão de Valores Mobiliários15. Daí podemos afirmar que o direito brasileiro possui uma dualidade de sistemas no que diz respeito à constituição das sociedades anônimas: o da regulamentação para as companhias fechadas e o de autorização para as companhias abertas.

Conforme se lê na sua exposição de motivos, a Lei n.º 6.404/1976 – doravante denominada simplesmente Lei das S/As – teve como objetivo principal a criação de uma estrutura jurídica necessária ao fortalecimento do mercado de capitais de risco no país, imprescindível à sobrevivência da empresa privada naquela fase da economia brasileira. A mobilização da poupança popular e o seu encaminhamento voluntário para o setor empresarial exigiram o estabelecimento de uma sistemática apta a assegurar ao acionista minoritário o respeito a regras definidas e equitativas, as quais, sem imobilizar o empresário em suas iniciativas, oferecessem atrativos suficientes de segurança e rentabilidade.

No tocante aos órgãos de administração da sociedade anônima, Lei das S/As, em seu artigo 138, dispôs que "a administração da companhia competirá, conforme dispuser o estatuto, ao conselho de administração e à diretoria, ou somente à diretoria". Vê-se que o nosso direito acolheu tanto o sistema de gestão monista, como o dualista, sendo possível que a administração social por um ou dois órgãos, ressalvando-se que, em se tratando de companhia aberta, será necessária a instituição de uma diretoria e um conselho de administração.

A diretoria da companhia será composta por no mínimo dois membros, acionistas ou não, residentes em território nacional, eleitos pela assembléia geral – em se tratando do sistema monista – ou pelo conselho de administração – na hipótese do sistema dualista – para o exercício de um mandato de até três anos, permitida a reeleição16. Cada diretor atuará, observados os limites da lei e do estatuto social, de forma autônoma e independente, excepcionando-se as situações em que, por regulamento estatutário, determinadas matérias precisem ser deliberadas em reunião da diretoria17.

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O Conselho fiscal, por seu turno, é um órgão colegiado, integrado por acionistas, residentes ou não, eleitos pela assembléia geral, para cumprir um mandato de até três anos, permitida igualmente a reeleição18.

Quanto às competências, aos diretores incumbem a representação da companhia e a prática dos atos necessários ao seu funcionamento regular, enquanto ao conselho de administração cabe a orientação geral dos negócios da companhia, a fiscalização da gestão dos diretores e a prática de outros atos expressamente previstos no artigo 142 da Lei das S/As19 e no estatuto social.


2. Alguns modelos de responsabilidade dos administradores

De uma forma geral, o instituto jurídico da responsabilidade dos administradores encontra muitas semelhanças nos diversos ordenamentos estatais, considerando-se que todos impõem aos membros dos órgãos de administração, determinados deveres de conduta20 cujo descumprimento importará na sua responsabilização em relação à sociedade.

Os mecanismos processuais aptos a responsabilizar os administradores variam consideravelmente conforme cada direito pátrio. Alguns possuem somente a ação ut universi (direito alemão), outros prevêem além desta a ação ut singuli (direitos francês e português) e, ainda, há os que dispõem de ações de regime geral baseadas em precedentes jurisprudenciais (direito inglês).

2.1. Direito alemão

O direito alemão é conhecido pelo tratamento dualista que o Aktiengesetz de 06/11/1965 alterado pelas Leis de 26/02/1993 e 31/07/2009, estabelece em relação ao modelo de gestão das sociedades anônimas.

A administração das sociedades anônimas é realizada por uma diretoria (Vorstand) e um conselho de supervisão (Aufsichtsrat), os quais se sujeitam às deliberações da assembléia de acionistas (Hauptversammlung). A diretoria pode ser composta por um ou mais membros21, pessoas naturais, sócios ou não, nomeados pelo conselho de supervisão para exercer um mandato de até cinco anos e investidos dos necessários poderes para a direção interna e representação da sociedade perante terceiros. O conselho de supervisão, por sua vez, é um órgão colegiado composto por no mínimo três conselheiros22, pessoas naturais, sócios, eleitas pela assembléia de acionistas por um prazo de no máximo quatro anos, tendo como principais atribuições a fiscalização e controle dos atos da diretoria, das quais lhe são assegurados o exame dos livros sociais, contas da sociedade e propostas de distribuição dos lucros23.

Os membros da diretoria têm como principal dever o de atuar com a cautela de um administrador diligente e consciencioso na condução da companhia, zelar pelos interesses desta, abster-se de praticar qualquer ato que possa prejudicá-la e respeitar as oportunidades empresariais24. Os diretores responsabilizam-se em relação à companhia pela infração desses deveres ou, ainda, se praticarem alguns dos seguintes atos expressamente vedados pela AktG, a saber: (a) restituição ilícita do valor integralizado pelos acionistas ao capital social; (b) pagamento indevido de juros ou lucros a acionistas; (c) subscrição, aquisição, resgate ou recebimento ilegal de ações próprias ou de sociedades coligadas; (d) emissão de certificados de ações antes da completa integralização do seu valor nominal; (e) distribuição irregular de haveres da companhia; (f) realização de pagamentos depois de consumado o endividamento excessivo ou configurada a insolvência da sociedade; (g) concessão de bonificações legalmente não previstas aos membros do conselho de supervisão; (h) prorrogação de empréstimos; e (i) emissão anormal de novas ações25.

Constatando-se que os diretores incorreram em infração quanto ao cumprimento dos seus deveres legais e/ou estatutários, a sociedade poderá promover em desfavor dos mesmos, dentro do prazo de seis meses, a competente ação social de responsabilidade civil ut universi, desde que a assembléia de acionistas aprove tal medida pelo critério da maioria simples, ocasião em que também poderá designar representante especial para o ajuizamento da ação. Ressalte-se oportunamente que a ação social ut singuli inexiste no direito alemão26.

As disposições relativas à responsabilidade dos diretores são aplicáveis também aos membros do conselho de supervisão quando na sua atuação houverem violado as suas obrigações de fiscalização e controle. Finalmente, os liquidantes – quando da liquidação da companhia – podem ser responsabilizados pelos prejuízos causados à sociedade no caso de descumprimento das obrigações atinentes à liquidação.

2.2. Direito francês

No direito francês as sociedades anônimas encontram-se disciplinadas no Code de Commerce de 2000, o qual incorporou, com as devidas alterações, a Loi des Sociétés Commerciales de 24/07/196627.

O direito societário francês dispõe de duas diferentes estruturas de organização da administração social. A primeira, tradicional do direito francês, consiste num sistema monista no qual a gestão é conferida a um conselho de administração e ao seu presidente, este na condição de diretor geral com atribuições próprias. A segunda aproxima-se do direito alemão quanto à organização dualista da administração social, cujas atribuições são divididas entre a diretoria (directoire) e o conselho de supervisão (conseil de surveillance).

Na estrutura monista, o conselho de administração é um órgão deliberativo composto de três a dezoito conselheiros, pessoas naturais ou jurídicas, a princípio acionistas28, eleitos pela assembléia geral (assemblée générale), para o exercício das funções de orientação, aprovação e censura dos atos do diretor geral, além de preparar as questões que serão submetidas à resolução da assembléia.

Por sua vez, na dualista os diretores são escolhidos pelo conselho de supervisão dentre até cinco pessoas naturais, sócias ou não, para cumprir um mandato de até quatro anos, dispondo aqueles de amplos poderes para dirigir os negócios da sociedade e representá-la perante terceiros. Quanto às regras de composição do conselho de supervisão, aplicam-se as mesmas legalmente impostas ao conselho de administração existente na estrutura monista. A diferença residirá no rol de competências, porquanto o conselho de supervisão tem como principal múnus exercer controle permanente sobre a atividade da diretoria, não apenas sob o enfoque da regularidade dos seus atos, mas, sobretudo, no que diz respeito ao juízo de oportunidade, hipótese em que serão analisados aspectos técnicos e comerciais próprios da gestão.

Os administradores são solidariamente responsáveis perante a sociedade pelos prejuízos causados a esta por violação da lei ou dos estatutos sociais, bem como pelas faltas cometidas na sua gestão. Tais prejuízos podem ser ressarcidos à sociedade através da ação social ut universi, promovida por iniciativa dos seus administradores independentemente de prévia deliberação da assembléia geral, através da ação social ut singuli, ajuizada por qualquer acionista ou grupo de acionistas, ou, ainda, mediante a promoção de ação social sui generis por iniciativa de grupo de acionistas representando 0,5% a 5% do capital social, conforme for o seu montante, em benefício da sociedade29.

Por último, ressalte-se que essas ações não prejudicam o direito de cada acionista pleitear de forma individual a reparação de danos pessoais diretamente experimentos em decorrência de atos ilícitos eventualmente praticados por administradores.

2.3. Direito português

A responsabilidade dos administradores perante a sociedade é tratada no Código das Sociedades Comerciais de 1986. O legislador português regulou tanto os aspectos substantivos da responsabilidade, como processuais, recebendo influência simultânea dos modelos jurídicos alemão e francês.

A administração social divide-se em duas modalidades de organização: monista e dualista. Na primeira, a administração da companhia é confiada a um administrador único ou ao um conselho de administração executivo com poderes para exercer atos de gestão e representar a sociedade, composto por um número impar de membros, cujo presidente é escolhido pelos seus pares ou pela assembléia de acionistas, conforme dispuser os estatutos sociais. Os membros desse conselho poderão ser acionistas ou não, pessoas naturais ou jurídicas, eleitos para um mandato de até quatro anos.

No modelo dualista, adotado pelas companhias de grande porte, a administração é integrada por um conselho de administração executivo e um conselho geral e de vigilância. Este último é composto por acionistas eleitos em assembléia, funciona de forma plenária ou por intermédio de comissões específicas, e exerce principalmente atividades de supervisão3031.

Os deveres de conduta impostos pelo direito português são: (a) dever de cuidado e lealdade; (b) dever de relatar a gestão e prestar contas; (c) dever de abster-se de concorrer com a sociedade; (d) dever de não atuar em conflito de interesses; (e) dever de informação; e (f) dever de respeitar as deliberações da assembléia de acionistas32.

Os administradores respondem civilmente em relação à sociedade pelos prejuízos causados em decorrência da prática de atos comissivos ou omissivos que importem na violação dos deveres de conduta legal ou estatutariamente estabelecidos, ressalvada a hipótese de comprovarem ter procedido sem culpa33.

Como instrumento para a responsabilização dos administradores, a companhia dispõe da ação social ut universi, que, depois de aprovada em assembléia de acionistas pelo quórum de maioria simples, poderá ser ajuizada por representantes designados especialmente para esse fim. Havendo retardamento na propositura da actio por prazo superior a seis meses, os acionistas representando pelo menos 5% do capital social poderão propor a ação social ut singuli, independentemente de qualquer autorização da sociedade34.

2.4. Direito inglês

O direito societário anglo-saxão não é codificado, havendo apenas atos legislativos esparsos que versam sobre a matéria35. São várias as espécies de sociedades e organizações associativas empresariais, dentre as quais figura a company limited by shares que equivale à nossa sociedade anônima.

A legislação inglesa é bem lacunosa a respeito da estrutura administrativa das companhias, conjuntura que naturalmente confere grande autonomia aos estatutos sociais para a regulação do tema. Por outro lado, os costumes do meio empresarial acabam por conferir certa uniformidade a esses estatutos, em virtude da adoção dos formulários veiculados como anexos dos companies acts.

As companhias precisam ter dois órgãos de administração: a assembléia geral de acionistas (shareholders’ general meeting) e a diretoria (board of directors). Este último é integrado por diretor único, se em companhias fechadas, e por dois ou mais diretores, se em companhias abertas. Os diretores podem ser pessoas naturais ou jurídicas, acionistas ou não.

Por via de regra a diretoria das companhias abertas funciona como um órgão colegiado, cujos diretores não dispõem de atribuições individuais. Sem embargo, a lei faculta a nomeação de um diretor-geral (managing director) com atribuições administrativas próprias, ou a investidura de mais um diretor executivo (executive director) para o desempenho de funções específicas. Decorre daí que na prática os diretores executivos conduzem a gestão da companhia, enquanto a diretoria, como órgão colegiado, orienta e supervisiona as atividades daqueles36.

Embora a gestão dos negócios seja confiada aos diretores, podendo os acionistas apenas dar instruções gerais, percebe-se que no direito inglês os acionistas têm poderes mais amplos de controle em relação aos administradores, se comparado com os países de origem romano-germânica.

No que se refere aos deveres da diretoria, é importante notar que no direito inglês os diretores assumem uma posição de mandatários da companhia, administrando bens que não lhe pertencem, motivo pelo qual se afirma que tais deveres têm natureza fiduciária em relação à sociedade a qual representam. Daí, então, extrai-se as seguintes regras de conduta: (a) os diretores devem agir de boa-fé e sempre no interesse da sociedade; (b) devem exercer os seus poderes com consideração à finalidade para o qual foram outorgados; e (c) devem abster-se de agir em situação de interesse conflitante com a sociedade37.

Para assegurar o cumprimento desses deveres a companhia poderá ajuizar a ação social de responsabilidade contra os administradores, após a sua destituição ou término do seu mandato, como resposta a pratica de ato ilícito cometido quando na gestão da sociedade. Por seu turno, os acionistas, objetivando obter a reparação de um prejuízo direto em seu patrimônio, poderão pleitear judicialmente contra os administradores em nome próprio e de outros pares que eventualmente se encontrem em idêntica situação – nesta última hipótese, tratando-se de um dano individual homogêneo38.

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Sobre o autor
Laerte Meyer de Castro Alves

Coordenador da Área Empresarial Internacional de R. Amaral Advogados. Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza, Mestre em Ciências Jurídico-Internacionais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Pós-Graduado em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Vice-Presidente da Associação dos Jovens Advogados do Estado do Ceará, Diretor Executivo do Instituto de Direito Internacional do Estado do Ceará.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES, Laerte Meyer Castro. Responsabilidade dos administradores de sociedade anônima. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2745, 6 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18209. Acesso em: 29 dez. 2024.

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