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Registro Civil

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2 O NOME CIVIL: DIREITO DA PERSONALIDADE

Nos primórdios das civilizações, Hebreus e Gregos eram identificados por um só nome [55], equivalente ao prenome nos dia de hoje. Tal prática, todavia, foi sendo superada em virtude do crescimento populacional, que acabou impondo a adoção de nomes complementares para evitar a homonímia e alcançar uma identificação efetiva.

Os hebreus, conforme o Novo Testamento, começaram agregar ao prenome mais um, indicativo de sua origem. No sentido da evolução da formatação do nome civil, os gregos [56] também foram mudando suas práticas, acrescentando outros nomes: o nome do pai e o da gens ou tribo.

Os Romanos usavam mais de um nome, acrescentando um apelido relacionado à circunstâncias pessoais. Assim Publius Cornelius Scipio Africanus seria o indivíduo da Cornelia, da família dos Scipio, notabilizado por feitos [57] em batalhas na África. Publius equivaleria ao prenome nos dias de hoje, enquanto os sobrenomes indicariam naturalidade, família e um feito especial, caso houvesse.

Nos dias de hoje adotam os países ocidentais, de um modo geral, a dupla denominação: nome individual, chamado prenome, e sobrenomes. A atual formatação do nome é um dado que deve ser entendido dentro dos ditames dos Direitos da Personalidade.

O professor Gustavo Tepedino leciona que "a categoria dos Direitos da Personalidade é fruto de elaborações doutrinárias germânica e francesa da segunda metade do século XIX, compreendendo os direitos inerentes à Pessoa Humana, considerados essenciais a sua dignidade e integridade." [58]

A despeito [59] do registro histórico do mestre Tepedino, os direitos em comento começaram a ser consagrados com o surgimento de textos fundamentais e históricos como o Bill of Rights, dos Estados Americanos em 1689, a Declaração de Independência das colônias inglesas na América do Norte em 1776 e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão [60] em 1789, marco da Revolução Francesa.

Nessa linhagem histórica, tem-se ainda a Declaração de Direitos de 1793 – na qual foram considerados naturais os direitos à igualdade, liberdade, segurança e propriedade –, a Declaração Universal dos Direitos do Homem em 1948 e a Convenção Européia dos Direitos Humanos, esta de 1968.

Como leciona o professor Francisco Amaral, a personalidade jurídica é a "aptidão para titularidade de direitos e deveres congênitos ao homem" [61], com a qual se atribui à pessoa possibilidade de participar de uma relação jurídica, ou seja, de ser sujeito de direitos. Esses direitos, assentes nos artigos 11 e seguintes do Código Civil, dizem pertinência ao que o dicionarista Houaiss chama de "conjunto de traços distintivos de alguém; caráter; originalidade, identidade".

Juridicamente os Direitos da Personalidade são consagrados como sendo "o conjunto de todos os direitos subjetivos e obrigações conferidos pela ordem jurídica ao ser humano, a partir do momento em que ele ingressa em sociedade, isto é, quando ele nasce com vida" [62], consoante lição de Flávia de Oliveira.

Infere-se, no sentido colacionado, tratarem-se do conjunto de faculdades que se reconhece à Pessoa Humana; conjunto que decorre de sua própria natureza, não tendo, pois, caráter patrimonial [63]. São os direitos com os quais a pessoa defende o que lhe é inerente, como o nome, não sem razão alçado a esta condição com o advento do Código Civil vigente.

Com os Direitos da Personalidade se tutela aspectos que são próprios da pessoa. Estes incidem sobre o sujeito de direito de forma intangível, não podendo ser destacados [64], caso da vida, do nome, da liberdade, da privacidade, da imagem, da honra etc. Nessa ordem, podemos dizer que estes direitos são dotados de caráter absoluto, sendo imprescritíveis, indisponíveis [65], irrenunciáveis, impenhoráveis, inalienáveis, inatos – já que inerentes ao ser humano – e intransmissíveis.

A Constituição da República de 1988, no afã de atender aos anseios de uma sociedade debelada por um regime totalitário, onde garantias individuais mínimas foram suprimidas, acabou por consagrar muitos Direitos Fundamentais, dentre estes os Direitos da Personalidade.

Nessa esteira, o caput do pétreo [66] artigo 5º da Carta Política garante a igualdade formal, a inviolabilidade da vida e da liberdade. Mais que enumerar taxativamente os direitos em exame, o legislador constituinte usou o expediente de anunciá-los sem afastar outras manifestações da personalidade. Desta forma, como se assevera no parágrafo segundo do citado artigo, os Direitos colacionados não excluem outros não expressos na Carta Política. Ademais, resguardou os direitos que podem ser depreendidos dos princípios pela Constituição adotados e os decorrentes dos tratados internacionais [67] de que seja signatário o Estado Brasileiro.

Uma questão bastante intrigante no que concerne à disponibilidade dos Direitos da Personalidade diz pertinência à possibilidade de ablação de órgãos humanos quando se pretende "assumir a identidade de seu verdadeiro gênero" [68].

A pertinência temática [69] da proposição tracejada com a questão do nome é total, já que da ablação surge um novo corpo, e não nos parece fazer sentido se impor a mantença de um nome que evoca o gênero masculino a quem ostente um corpo feminino e vice-versa, mesmo que tal corpo seja uma manifestação fenotípica construída cirurgicamente, sem correlação com a composição cromossômica.

O diploma civil disciplina em seu artigo 16 que toda pessoa tem Direito ao Nome, constituído pelo prenome – próprio da pessoa – e pelo sobrenome, que indica a filiação: o apelido de família ou patronímico.

Por ser indicativo de família entendeu o Superior Tribunal de Justiça – no REsp 66.643-SP, de relatoria do eminente ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira – em um caso de renegação do sobrenome paterno, configurado na substituição deste pelo da mãe, motivado pelo abandono do genitor, ser possível a troca. Tal entendimento parece-nos ter sido baseado na premissa teleológica e axiológica do sobrenome: identificar laços familiares. Se estes laços não existem, não faz sentido se manter um patronímico que faça remição a estes.

O nome civil da pessoa natural é integrante da personalidade por ser o elemento externo pelo qual se individualiza e se reconhece a pessoa na sociedade, não podendo expor seu titular à situação vexatória. Ao lado do estado civil e do domicílio é um dos elementos a individualizar a pessoa em sociedade [70], sendo um dos mais importantes Direitos da Personalidade.

2.1 PROBLEMATIZAÇÃO TERMINOLÓGICA: ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO NOME

O Direito ao Nome, consoante disposição da Lei de Introdução ao Código Civil [71] em seu artigo 7º, é regulado pela lei do domicílio da pessoa. Verbis: "A lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família".

O sistema depreendido da Lei de Introdução é encampado pelo Código Civil em seu artigo 16, onde se estabelece que o nome compreende prenome e sobrenome, e pela Lei de Registros Públicos, especificamente no Título II – que trata do Registro de Pessoas Naturais –, Capítulo IV, afeito a cuidar do Nascimento, artigo 54.

É importante se destacar que a terminologia adotada na Lei de Registros Públicos diverge da encampada no Código Civil. Neste a locução "nome" é gênero de que são espécies o prenome e o sobrenome. É um conceito coeso e assentado de forma convergente ao longo do texto legal. Em outro sentir, a Lei de Registros Públicos utiliza a expressão "nome" como sendo o correspondente a sobrenome, conforme artigo 54, 4º [72]. Não é um conceito uníssono, todavia, eis que no artigo 57, § 2º [73] quem assume a acepção de sobrenome é patronímico.

A confusão referente ao sobrenome, referenciado de forma diferente ao longo da Lei de Registros Públicos, não se repete quanto ao prenome. Em relação a este, tanto a Lei Registral quanto o Código Civil apontam em sentido convergente, qual seja, a acepção de nome particular.

A idéia de nome particular – aquele de livre escolha pelos legitimados à declaração de nascimento enumerados no artigo 52 –, assume na locução legal um só sentido: o de prenome. É exatamente quanto a este que deve redobrar a atenção o registrador, já que no concernente ao sobrenome existe fórmula legal que norteia sua aposição, pela qual se faculta inclusive a colocação de ofício, consoante anúncio de seu artigo 55 [74].

Visto o tratamento legal conferido ao nome na Lei de Introdução, Código Civil e Lei de Registros Públicos, aponta-se que, por razões de sistematização semântica a locução nome será empregada no sentido de gênero do qual fazem parte prenome e sobrenome, na direção consagrada no Código Civil.

Tal orientação, além de se nos parecer proposição coerente, vai ao encontro do que anunciava o professor André Franco Montoro – em sua clássica obra Introdução à Ciência do Direito [75] – ao cuidar do fenômeno da revogação de leis, de onde se depreende que normas de igual hierarquia se revogam quando trazem apontamentos divergentes. Considerando que a Lei de Registros Públicos e o Código Civil são leis ordinárias, e cuidam da questão terminológica de forma divergente, parece-nos que as orientações do codex devem se sobrepor às da lei registral, não obstante a especialidade da lei de 1973. Esse entendimento decorre da necessidade de melhor sistematização dos termos, certamente bem esclarecidos no código.

Superado o tratamento das leis conferido à terminologia do nome, é preciso se compreender como este é percebido no senso comum e na doutrina. Nesse sentir se chega ao consagrado de modo dicionarizado, aferindo-se ser o nome "critério de identificação", "sinal característico a distinguir dos demais".

Por um lado o nome identifica e distingue, sendo expressão de cultura e tradição, o que arrazoa a premente necessidade de sua tutela. Por outro atende aos interesses do Estado, já que através deste tem o ente público possibilidade de exercer seu poder de império em questões como tributação, serviço militar, cadastramento de eleitores etc.

Observado sob a ótica do Direito Civil, o nome se mostra uma questão de simples resolução. A partir desta perspectiva é critério de identificação de que se vale o Estado e suas instituições, pelo que todos os indivíduos o portam. Por outro lado, afigura ser um Direito Subjetivo com o qual a possibilidade de identificação exsurge para o particular.

Afora a proposição civilista, resta-nos fora de dúvida que o nome é Direito Fundamental, inserto no contexto dos Direitos da Personalidade. Assim, constatando-se haver um Direito ao Nome, necessário se mostra a proteção [76] de seu titular de situações em que possa haver constrangimentos.

É nessa seara que a possibilidade de mudança do prenome ganha relevo. Essa prerrogativa, a qual se somou as alterações da Lei nº 9.708/98 referentes à adoção de apelidos públicos e notórios, certamente está em sintonia com os conceitos da Cidadã Constituição vigente, que busca dar primazia aos Direitos Individuais.

De há muito apontava o mestre Miguel Maria de Serpa Lopes que "o nome é uma obrigação frente à sociedade, quanto ao seu uso necessário e à sua imutabilidade." [77] Percebe-se de seu magistério preocupação com o nome enquanto obrigação, e não prerrogativa, entendimento que precisa ser repensado à luz do atual estágio do Direito, voltado para a afirmação da individualidade.

Afirmava ainda o professor Serpa Lopes que o modo de compor o nome e "sua formação ortográfica não podem estar sujeitos ao arbítrio da lei ou do Estado, desde que fiquem respeitados certos princípios essenciais ao seu reflexo na coletividade." [78]

Em um primeiro momento assinala ser o nome uma obrigação do indivíduo para com o Estado. Logo depois aponta que a formação deste não pode ser controlada pelo Poder Público, a não ser quanto a princípios ditos essenciais. Nesse ponto seus apontamentos vão ao encontro do que consagra a Lei de Registros Públicos ao rechaçar a aposição de prenomes ridículos, pelo que são absolutamente válidos. Quanto à perspectiva meramente obrigacional, entretanto, merecem ser sopesado o entendimento citado.

Por certo não há regras a informar a composição do prenome, mas se afigura claro que a estruturação deste deve ser feita com base em princípios, sobretudo a razoabilidade. Não importa simplesmente a agradabilidade deste aos ouvidos dos pais, mas também, e, principalmente, o interesse do menor, entendimento que encontra respaldo na legislação afeta a cuidar da criança e do adolescente: Lei nº 8.069/90.

2.1.1 Prenome

Prenome é o signo que distingue cada indivíduo. É a marca que o diferencia ante os demais membros da família e o identifica perante as demais pessoas e instituições. Em nosso país – diversamente do que se dá em outros, como a Itália – o prenome vem à frente da procedência familiar; do sobrenome.

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É através do prenome que usualmente se identifica seu titular. Claramente esse se sobrepõe ao sobrenome no trato diário. Assim, afere-se que personagens históricos são conhecidos pelo prenome, como Jesus (Cristo) e Napoleão (Bonaparte), ainda que exceções à regra possam ser constatadas, caso do estadista Hitler (Adolph) e do jurista Bobbio (Norberto).

O poder de identificação do prenome é grande, assertiva que se mostra indubitável. Além disso, na escolha deste afloram sentimentos os mais diversos, como a corporificação do amor que é "Jurilza" – filha de Juvenal e Marilza – e muitos outros, sendo certo que os elementos inventivo e criativo são fortes determinantes da escolha.

No trato do prenome não há regras positivadas, a não ser a tutela oblíqua decorrente do que assevera o artigo 55 parágrafo único da Lei de Registros Públicos, de onde se extrai a possibilidade de alteração do prenome ridículo. Teleologicamente se infere, logo, que não devem ser apostos prenomes ridículos, pois estes poderão vir a serem mudados posteriormente.

O Direito brasileiro, como se afere na redação do artigo referido, não se valeu do expediente de cercear liberdades individuais. Na verdade adotou uma postura de maior fiscalização, em detrimento da intervenção. Desta feita se preserva a vontade dos pais, salvo tal aspiração não poder ser albergada pelo Direito, ocasião em que o registrador lançará mão do procedimento de dúvida para que o Juiz com atribuição registral diga da possibilidade ou não do emprego de um prenome.

Por evidente a capacidade criativa não deve ser, em princípio, cerceada, já que é um fato a manter vivo o idioma, permitindo sua evolução. Tal orientação, contudo, não pode ser usada como meio a criar situações embaraçosas, de recorrentes constrangimentos para o registrando.

No sentir da seara que se percorre é lição de Manuel Vilhena de Carvalho, onde se informa que "todas estas restrições relevam da preocupação de apenas deverem atribuir-se às pessoas nomes próprios adequados e idôneos para as designar com a dignidade que lhe é intrínseca e cujo reconhecimento lhes é devido" [79]. Seguindo tal linha de raciocínio aponta ainda que:

"não pode deixar de considerar-se extraordinariamente amplo e rico o campo de escolha de nomes próprios considerados adequados à designação das pessoas e, por outro, parece também defensável que, em cada momento, se impeçam como designações pessoais todas aquelas que possam ferir os seus titulares, agredir a susceptibilidade geral, ou pôr em causa as regras mínimas que a Antroponímia, como ciência dos nomes, estabelece para a sua formação." [80](destacou-se)

Equilíbrio é, assim, fundamental. Não se tem como inferir de plano qual é o melhor prenome. Na verdade, o bom prenome será o que resguardar os interesses dos pais e dos filhos, mesmo porque a possibilidade de mudança baseada no ridículo não é de constatação aritmética, sendo conceito sujeito a inferências pessoais. Por isso, nem tudo que é ridículo para uma pessoa será para outra.

O prenome costuma também ser determinado por outros fatores. Certamente as tradições familiares, a vontade dos pais e a referência a sentimentos são pontos de partida muito comuns para a aposição de um nome. Além desses, fatores externos acabam sendo determinantes, como a consideração e respeito nutridos por amigos e o patriotismo.

Historicamente, todavia, a liberdade para a escolha do prenome era pelo menos dirigida. Enquanto unidos de forma indissociável Estado e Igreja, esta acabava por determinar o rumo das políticas estatais. Como recomendava a adoção dos nomes de seus santos e mártires, estes acabaram sendo os mais comuns em sua área de influência. Assim, ainda hoje, os prenomes mais comuns são os consagrados pela Igreja.

O Código de Direito Canônico, publicado em 1915, afirmava ser boa aos olhos de Deus a adoção de prenomes de santos e mártires. Partia-se de um postulado de afirmação, que não se repetiu com a publicação do código de 1983. Neste, parece que a Igreja tomou consciência da nova realidade em que não mais dita os rumos tomados pelo Estado. Sua postura é, pois, apenas de sugerir [81] que pais, padrinhos de batismo e sacerdotes não aponham nome que divirja do sentido cristão, como os alusivos a falsos deuses, a homens impudicos, obscenos etc.

Além do inscrito no Código Canônico, antes referenciado, cumpre informar que a Igreja retoma o tema por ocasião da edição de seu catecismo em 1993, apontando no cânon 2156 que "no batismo, o nome do Senhor santifica todo nome, e o cristão recebe seu nome na Igreja. Pode ser o nome de um santo, isto é, de um discípulo que viveu uma vida de fidelidade exemplar ao seu Senhor". Assim, os católicos entendem ser a aposição de um prenome referente a santificado forma de consagração do modelo cristão.

Dentro de um contexto de laicização, contudo, as recomendações da Igreja passam a ter um valor relativizado. Além disso, é dever do Estado desde 1870 – ano em que se editou a Lei nº 1.829 – regular e regulamentar os registros públicos e as questões sobre o nascimento e suas implicações jurídicas.

O Direito ao Nome, nos dias de hoje, insere-se em um contexto da democratização do Estado de Direito, onde se consubstanciam duas normas jurídicas fundamentais: a primeira referente à igualdade entre homem e mulher para os fins de dar nome aos filhos, pela qual a ordem do artigo 52 da Lei de Registros Públicos deve ser ponderada no caso concreto, já que não mais subsiste a noção de "chefe de família" [82], sucumbente à idéia de "poder familiar" [83]. A segunda situa-se no plano filial, no qual deixou de haver distinção entre filhos legítimos, ilegítimos e adotados. Todos passam a ter prerrogativa a um prenome escolhido pelos pais e ligado ao sobrenome destes.

Sendo o idioma oficial [84] do Brasil a Língua Portuguesa, esperar-se-ia a utilização do vernáculo na aposição dos prenomes, ressalvadas as situações em que os pais fossem estrangeiros.

Ainda que só o pai ou a mãe tenham raízes no estrangeiro, não é de se dizer sem propósito o emprego de um prenome que retome a história familiar, já que é prática consagrada a utilização de prenome que realce usos e costumes familiares.

O emprego do prenome estrangeiro, em outras hipóteses, restaria injustificado. Nada obstante, a prática não procede no sentido dessa assertiva, vide a enormidade de Willians, Washingtons, Michaels, que de estrangeiros não têm nada, a não ser pais com fixação no que vem de fora. De toda sorte não faz sentido um brasileiro, nascido no Brasil e de pais brasileiros, receber prenome estrangeiro, pois importa na desconsideração do vernáculo como meio oficial de comunicação entre os habitantes do território nacional por estrangeirismos [85] despropositados.

É importante se cuidar ainda nesse tópico dos casos do estrangeiro que ingressa no território nacional, mantendo seu prenome estrangeiro, e do que o altera. Nesse caso é preciso se atentar para o que preceitua o Estatuto do Estrangeiro, Lei nº 6.815 de 1980, sobretudo seu artigo 31, onde se lê que "o nome e a nacionalidade do estrangeiro, para o efeito de registro, serão os constantes do documento de viagem [86]." Assim sendo, o estrangeiro pode permanecer utilizando seu prenome original, respeitando os laços patrióticos e familiares.

Em outras situações, como as descritas no artigo 43 do Estatuto do Estrangeiro, exsurge a prerrogativa da troca do prenome. São hipóteses a autorizar a troca [87] de prenome as que se seguem: comprovação de erro, assunção de sentido ridículo ou pejorativo na língua portuguesa e a constatação da dificuldade de pronunciação ou compreensão.

Por evidente, a possibilidade de mudança do nome do estrangeiro que se anunciou, só merece prosperar nos casos em que este venha a fixar residência no Brasil, já que o objetivo da alteração é permitir que o estrangeiro possa ter sua convivência facilitada na comunidade brasileira, exercendo plenamente sua cidadania, afinal, em uma comunidade global, todos acabam sendo cidadãos do mundo.

Uma regra também importante no estudo do prenome diz respeito à sua formação no caso de gêmeos, preceitos que decorrem do anúncio do artigo 63 [88] da Lei nº 6.015/73. Nesse ponto importa dizer que, ao contrário de outras legislações, a Lei de Registros Públicos é analítica e pouco sintética, não deixando margem de discricionariedade para o Registrador.

Tal ponderação encontra respaldo na constatação de que essa lei contém regras bem definidas – regras em sentido estrito, espécie do gênero norma –, onde a aplicação de uma leva ao preterimento da outra, no exato sentir da máxima defendida por Dworkin [89]: o famigerado "tudo ou nada".

Do citado artigo 63 se depreende que no caso de gêmeos se declarará no assentamento de cada um a ordem de nascimento. Caso tenham iguais prenomes, estes deverão ser inscritos com duplo prenome ou nome completo diverso, para que o objetivo da distinção e identificação possa se consubstanciar.

A regra referida aos gêmeos também se destina às hipóteses de irmãos com iguais prenomes, conforme leitura do parágrafo único [90] do artigo em comento. Trata-se de solução jurídica para o problema da homonímia, inconveniente para o qual o Direito ainda não consegue dar solução satisfatória, não obstante a riqueza onomástica existente. Por certo não haveria prenomes absolutamente distintos para toda a população, o que não se diz de um grupamento familiar. Como não adotou o Poder Público "política limitativa" [91] nesta seara, o artigo 63 da Lei de Registros Públicos acaba funcionando como o garantidor da finalidade do nome; identificar.

Entendeu por bem, sim, que os membros de uma mesma família que tenham prenomes comuns deverão ter também uma parte absolutamente particular. Desta feita, ter-se-á prenomes compostos, decorrentes da imperatividade legal. A igualdade de um prenome deve ser acompanhada de outro "nome particular", ficando a encargo deste a função precípua do primeiro.

2.1.2 Sobrenome

O sobrenome, também chamado patronímico, apelido de família, é elemento a compor o nome civil que identifica a família a que pertence o indivíduo. Traz consigo a função de identificar o indivíduo no meio social, além de conduzir através dos tempos a reputação do grupo familiar.

As regras visando à proteção do sobrenome foram evoluindo ao longo dos tempos, experimentando maior importância no final do século XIX, quando o nome passa a ser entendido como Direito da Personalidade.

Em um primeiro momento o sobrenome não fora obrigatório. Esse imperativo surgiu com o maior adensamento da população, em que este desponta como um meio efetivo para evitar o problema da homonímia.

A noção de obrigatoriedade do apelido de família no Brasil se confunde com as tradições reinóis, trazidas pelos colonizadores portugueses, então afeitos à idéia de que a incorporação de sobrenomes importaria em demonstração de importância do grupo familiar, denotando bem-nascença.

Nos dias de hoje a obrigatoriedade é uma regra assente na Lei de Registros Públicos, corporificada no caput do artigo 55, onde a aposição do patronímico pode ser operada de ofício quando o autorizado à promoção da declaração de nascimento não manifesta sua opção por um dos possíveis sobrenomes. Esta afirmativa decorre da aquisição, ipso jure, do sobrenome dos pais pelos filhos, que se opera no nascimento com vida. Como a referida aquisição só se opera em relação ao sobrenome dos pais, é de se destacar o impedimento de que se aponha apelidos de família que sejam estranhos ao grupo familiar. Assim, pode-se concluir que o registro do patronímico tem eficácia declaratória, pois é vedado aos pais escolher apelidos de família que não os seus.

Como se pode perceber, a omissão dos autorizados à promoção do Registro Civil faz surgir para o registrador o poder/dever de apor ao registrando o sobrenome dos pais. Tal possibilidade, todavia, não aduz o dever de assentar todos os sobrenomes que os pais possuam. Esses apontamentos se fazem necessários, porque não há regra a impor a inserção de todos os patronímicos do pai e da mãe.

O registrador deve, por certo, observar os apelidos de família dos pais da criança nos casos em que a lei o autorize apor sobrenome de ofício. A lei é silente quanto à aposição de sobrenomes quando não forem conhecidos os apelidos de família dos pais da criança. Nesse caso, em prol do "melhor interesse do menor" [92] – em que sua proteção se afigura latente –, a Lei de Registros Públicos deve ser interpretada em um contexto de protetividade.

Afere-se, desta feita, que o registrador deve proceder a uma minuciosa averiguação, perquirindo qual apelido deve ser aposto ao registrando. Caso restem infrutíferas as diligências, o oficial deve providenciar um apelido de família para o nascido tendo em vista o bom-senso e os costumes do lugar.

A realidade brasileira, faticamente, ainda relata casos de menores abandonados. Nestas situações, em que não se sabe quem é o pai ou a mãe, não sabe onde nasceu a criança, impõe-se cuidado para a aposição do nome.

Quando se encontra um menor abandonado, normalmente, ele é levado à presença do juízo competente em matéria de criança e adolescente. A despeito de iniciar um procedimento de colocação em família substituta tendente à adoção, oficia ao cartório mais próximo do local do encontro da criança para a promoção do registro.

Tal ofício leva a uma indagação. Como se fazer este registro?

Considerando a lacuna legal sobre o assunto, é a tradição do local que determinará a aposição do nome. Curioso é notar a prevalência do uso de prenomes consagrados no catolicismo por ocasião da feitura do registro em comento, não obstante os mais de 135 anos de independência dos registros públicos no Brasil. Desta forma, o comum é se empregar o nome do Santo do Dia: Rafael no dia de "São Rafael", João no dia de "São João" etc. Os sobrenomes, também referência religiosa como regra, são Deus ou Jesus. Assim tem-se Rafael de Deus, João de Jesus, para se citar algumas possibilidades.

A par da influência religiosa citada, em que se usam Jesus e Deus como sobrenomes, também é comum o emprego de apelidos familiares como Souza e Silva, tendo em vista o caráter genérico destes.

As hipóteses de não-conhecimento do sobrenome dos pais se configuram nos casos de abandono. Tal situação, contudo, não deve ser sobrelevada por ocasião da feitura do registro. Não se deve fazer menção ao abandono experimentado, sob pena de se impor ao registrado o fardo do desamparo para toda a vida.

Nos casos em que não há omissão na aposição de sobrenomes, mas ao contrário, verdadeiro conflito positivo entre pai e mãe, ambos querendo ver seus laços familiares mantidos na prole, sem que se chegue a um consenso, o oficial não ultimará o registro. Neste caso, não existindo o consenso, e como não há mais o "chefe da família", tema já enfrentado, a decisão do litígio deve ser levada ao juízo com jurisdição atinente à matéria registral.

De há muito não mais se adota a regra da unidade nominal. Esta informava que todos os membros de uma família deveriam portar idênticos sobrenomes. A superação desta regra importa em maior liberdade para os pais, ou qualquer autorizado enumerado no artigo 52 da Lei de Registros Públicos, para aporem os apelidos familiares que entendam necessários ao registrando, deste que a escolha esteja adstrita aos patronímicos dos pais da criança.

Outra questão importante quanto ao estudo do sobrenome diz pertinência à sua limitação, certamente uma questão delicada. Tal assertiva exsurge em razão de entrarem em choque dois valores: de um lado o desejo dos pais de se verem espelhados nos filhos, atribuindo-lhes todos os seus patronímicos; do outro lado a necessidade de se resguardar a proporcionalidade, pela qual se afigura despropositada um sobrenome demasiadamente grande, pois sua função é individualizar, soando desnecessária a aposição de numerosos apelidos de família.

É preciso, pois, que se pondere os interesses no caso concreto, já que não há regras que limitam a quantidade de sobrenomes. Pode-se dizer, a contrário senso, existir regra da quantidade mínima, depreendida do anúncio do artigo 55 da Lei de Registros Públicos em seu caput, com o qual a aposição do sobrenome é imperativa, autorizando, inclusive, a colocação de ofício.

Questão interessante diz respeito à possibilidade de repetição de sobrenomes, operada pela justaposição de patronímicos de igual teor, como se vê no exemplo seguinte: "Guilherme Araújo e Araújo", ou ainda "Guilherme Araújo Araújo". A repetição não é proibida, salvo se se duplicar o sobrenome de um dos pais. O que se permite é a adoção de um apelido de família do pai e outro da mãe, ainda que comuns. Por isso o Guilherme, filho de Antônio José Araújo e Izabel Araújo de Siqueira pode ostentar o nome em que se configure a repetição do sobrenome do pai e da mãe.

Esta possibilidade, todavia, é afastada na hipótese de o Araújo portado pela mãe ter sido adotado por ocasião do casamento. Permite-se a repetição que privilegie os laços de família do pai e da mãe. Desta forma restaria vedada a justaposição do sobrenome do pai [93] pela via oblíqua.

Afora a não mais obrigatoriedade da aposição de todos os sobrenomes ostentados pelos pais da criança – imposição que como se viu chegou ao Brasil com as tradições reinóis –, o bom-senso acaba por ser também um limitador à aposição de apelidos de família.

A liberdade experimentada nos dias de hoje quanto à aposição de sobrenomes diverge, consoante Manuel Vilhena de Carvalho [94], da onomástica européia tradicional, pois nesta se impunha que o apelido de família do pai, "o mais importante dos genitores" [95], deveria estar mais próximo do prenome, em um "local de honra".

A noção de local de honra foi sendo alterada com o passar dos tempos. Assim passou-se a entender que o patronímico do pai deveria ocupar o último lugar. Tal mudança de paradigma decorreu da assunção de maior importância da tradição francesa e inglesa, onde era o último patronímico o transmitido à descendência. Assim, para que a linhagem familiar paterna restasse preservada, necessário se fez que se promovesse à inversão da ordem até então adotada.

Em outros Estados europeus, todavia, vigia regra pela qual a posição dos patronímicos dos pais variava conforme o sexo do filho. Precisamente em Portugal, a regra adotada apontava para a maior importância do sobrenome paterno, que, no sentido das tradições francesas e inglesas, passou a ser aposto em último lugar para que se o pudesse transmitir aos descendentes.

2.2 LEGITIMADOS À PROPOSITURA DO ATO REGISTRAL

Estatui o artigo 50 da Lei de Registros Públicos, em redação conferida pela Lei nº 9.053 de 1995, que "todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá ser dado a registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da residência dos pais, dentro do prazo de quinze dias, que será ampliado em até três meses para os lugares distantes mais de trinta quilômetros da sede do cartório."

Como se percebe, em regra o registro deve ser promovido nos quinze dias que sucedem ao nascimento, prazo que pode ser dilatado por até três meses se o local do nascimento distar mais de trinta quilômetros da sede do cartório com a circunscrição sobre o território em que se deu o nascimento.

Analisando o artigo colacionado em consonância com o artigo 52 do mesmo diploma, algumas proposições podem ser tracejadas. Estabelece-se, inicialmente que o artigo 52 anuncia as pessoas obrigadas à feitura da declaração de nascimento. Pela taxatividade do rol, e pela necessidade de sua interpretação à luz da Constituição, sobretudo seus incisos [96] I e II, em que resta evidenciada a prevalência da prerrogativa – obrigação na dicção legal – paterna sobre a materna, necessário se mostra uma detida análise do dispositivo. Observe-se, pois, a transcrição literal do artigo em comento:

São obrigados a fazer declaração de nascimento:

1º) o pai;

2º) em falta ou impedimento do pai, a mãe, sendo neste caso o prazo para declaração prorrogado por quarenta e cinco (45) dias;

3º) no impedimento de ambos, o parente mais próximo, sendo maior achando-se presente;

4º) em falta ou impedimento do parente referido no número anterior os administradores de hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem assistido o parto;

5º) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da mãe;

6º) finalmente, as pessoas (VETADO) encarregadas da guarda do menor.

§ 1° Quando o oficial tiver motivo para duvidar da declaração, poderá ir à casa do recém-nascido verificar a sua existência, ou exigir a atestação do médico ou parteira que tiver assistido o parto, ou o testemunho de duas pessoas que não forem os pais e tiverem visto o recém-nascido.

§ 2º Tratando-se de registro fora do prazo legal o oficial, em caso de dúvida, poderá requerer ao Juiz as providências que forem cabíveis para esclarecimento do fato.

O rol constante do artigo colacionado seria excludente, seguindo a prerrogativa de propositura do ato registral ordem de preferência expressa, onde a pessoa constante do inciso posterior só poderá exercê-la diante da inércia de quem a precede.

Tal questão afigura-se bastante clara, a não ser quanto ao caráter de exclusão que a lei parece informar também em relação aos genitores, exclusão que não merece subsistir à luz da Constituição de 1988, em que homens e mulheres foram alçados à condição da igualdade [97] formal.

Nos demais casos, todavia, não há que se levantar discussões, pois a clareza legal não vai de encontro ao preconizado no texto constitucional. Desta forma, deve o registrador estar absolutamente atendo à enumeração, sob pena de eivar de nulidade o ato praticado por si, incorrendo, inclusive, em responsabilidade civil, uma vez que o legitimado preterido pode pretender a modificação do que fora registrado.

Em matéria registral não existe ato anulável. Ou o ato é nulo ou é válido. Por essa razão esta disciplina comporta a subdivisão das nulidades em três modalidades: a exclusivamente formal é inerente ao ato registral, decorrendo tão-somente do descumprimento de regras imperativas que orientam o procedimento de registro; a mista alcança não só o ato registral, mas também o título causal, havendo vício de forma e de conteúdo. Nesta hipótese a declaração de nulidade alcança o ato registral e a relação jurídica de Direito Material; a oblíqua incide exclusivamente sobre o título causal, isto é, na relação fática que o registro relata. Não há que se falar em nulidade sobre o ato de registro, que é atingido de forma indireta em razão do vício apresentado na relação material.

A não-observância da ordem legal pode dar ensejo a questionamentos, como na declaração de nascimento feita pelo avô com o emprego de prenome diferente do pretendido pelos pais, registro efetuado no prazo reservado aos genitores de forma exclusiva.

Para que fiquemos na regra geral, tem-se que o genitor deve fazer declaração de nascimento em quinze dias, conforme anúncio do artigo 50. Passados os quinze dias assinalados – e pela literalidade do artigo 52, II –, a genitora teria mais quarenta e cinco dias para que promovesse à declaração.

Pelo exposto, dentro dos parâmetros regulares, os pais têm o prazo de sessenta dias para que façam a declaração de nascimento. Superado esse lapso, nada obsta a que os legitimados do inciso III – entre eles o citado avô – façam a declaração, empregando, inclusive, o prenome que melhor lhes aprouverem.

A questão a ensejar possível alteração surge em se considerando que a escolha do prenome é faculdade conferida aos pais. Já que a lei os enumera como preferentes para a feitura da declaração de nascimento, reservando um prazo para fazerem-na, não se afigura razoável que alguém, inicialmente preterido, sobreponha sua vontade a quem foi escolhido pelo legislador.

Ainda que a nulidade decorrente da não-observância do rol do artigo 52 da Lei de Registro não seja assunto debatido, talvez pela pouca ocorrência da hipótese, parece estar fora de dúvida que o legitimado preterido pode intentar ação pretendendo ver restabelecida a ordem consagrada pela lei, já que ao ato se impõe "agente capaz" [98], capacidade que, in casu, decorre de expressa locução legal.

O procedimento aventado acabaria sendo o único meio de que se poderia valer o legitimado preterido para estabelecer sua pretensão, já que definitividade do prenome é regra, devendo qualquer alteração, salvo as hipóteses previstas no artigo 56 da Lei de Registros Públicos, ser submetida à via judicial, impondo-se audiência do Ministério Público.

Tal procedimento, como se vê, importaria em um dispêndio para quem tinha a prerrogativa legal de apor o prenome originariamente e viu seu direito relegado. Assim, como a Lei de Registros impõe uma ordem de legitimação, e a atividade registral é vinculada pela própria essência, não pode o registrador deixar de observá-la.

A não-observação, mesmo à luz dos preceitos civilistas gerais [99], implicaria em responsabilidade civil, caracterizando ato ilícito, evidente pela ação contrária à lei. Desta forma, exsurgido restaria o dever de indenizar, pois, no caso de se ter assentado nome diferente do pretendido por quem tinha legitimidade de fazer, estar-se-ia diante de uma demanda necessária ativa [100], que imporia ao preterido procedimento judicial para ver restabelecida ordem assegurada por lei. Situações como esta não merecem subsistir dentro de um Estado Democrático, onde as instituições devem ser respeitadas, sobretudo em se considerando que a atividade do registrador é absolutamente adstrita à lei.

À luz do Código Civil se consegue aferir o dever de indenizar nas hipóteses de se relegar a ordem imposta pela Lei de Registros Públicos que implique contrariedade ao legitimado preterido. Esta consideração ganha ainda mais relevo ao se analisar os artigos 37, § 6º [101] e 236 da Constituição e o 22 da Lei nº 8.935/94, nos quais resta evidenciada a querença do legislador em impor o regime da responsabilidade civil, pessoal e objetiva, a notários e registradores. Desta feita estes responderão pelos danos causados por si e por seus prepostos [102] decorrentes de atospróprios [103], independentemente de culpa.

A objetividade da responsabilidade é imposta pela natureza pública da função exercida. Respondem, por isso, como se Estado fossem. Essa colocação se mostra razoável, pois os bônus da atividade trazem consigo ônus [104], neste caso serem responsabilizados como administração pública.

Segundo o professor Cavaliere Filho, "o dever que se contrapõe ao risco é o dever de segurança" [105]. Assim, notários e registradores, envoltos na Fé Pública delegada por lei, devem proporcionar segurança jurídica aos usuários dos serviços que prestam. A violação a este direito de segurança, justifica, pois, a obrigação de indenizar. Na hipótese colacionada, além da indenização o restabelecimento da ordem que a Lei Registral consagrou.

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Sobre o autor
Alessandro Marques de Siqueira

Mestrando em Direito Constitucional pela UNESA. Professor da Escola de Administração Judiciária do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Professor convidado da Pós-Graduação na Universidade Cândido Mendes em parceria com a Escola Superior de Advocacia da OAB/RJ na cidade de Petrópolis. Associado ao CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito. Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIQUEIRA, Alessandro Marques. Registro Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2901, 11 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19299. Acesso em: 18 abr. 2024.

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