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Considerações acerca da aplicação da teoria da imprevisão nos contratos de leasing indexados ao dólar

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26/08/2011 às 14:17
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2. DO CONTRATO DE LEASING

2.1 GENERELIDADES ACERCA DO CONTRATO DE leasing

O Termo leasing é o particípio substantivado do verbo na língua inglesa to lease que no vernáculo significa alugar, arrendar.

Pereira (2005, p. 238) assim traduz a expressão:

Em tradução literal seria "locação", e conceitualmente a compreende na verdade. Ao mesmo passo aproxima-se da "venda". Seria, então, uma espécie de "locação-venda" (locatio mixta cum venditione), mas merece considerações especiais que ora atraem as normas da venda, ora conduzem-no para a órbita da locação (Kaufen oder Miete) (sic) [grifo do autor].

Embora o meio jurídico nacional admita a expressão arrendamento mercantil, não muito adequado ao conteúdo do instituto, o termo leasing consagrou-se na doutrina e na jurisprudência pátrias, com conteúdo e compreensão perfeitamente conhecidos.

2.1.1 Origens e Conceito

Como berço gerador do contrato de leasing aponta-se o ordenamento jurídico norte americano. A contar do ano de 1920 surgiram, nos Estados Unidos da América, empresas que se dedicavam ao renting, modalidade de locação na qual havia obrigação de prestar assistência técnica e manutenção por conta do locador, embora sem opção de compra, tratando-se de contrato mercantil com finalidade especulativa (MANCUSO, 1978).

Continua o autor relatando que em 1941, pelo lend and lease act, aprovado pelo congresso norte americano, permitiu-se que o país emprestasse equipamentos bélicos aos aliados, que poderiam, ao final, ser devolvidos ou adquiridos. Em 1952, também naquele país, a indústria de gêneros alimentícios passou a alugar equipamentos para fornecer a mercadoria para o exército. Experiências fundamentais para o surgimento do leasing clássico.

O instituto encontra escopo no ordenamento jurídico francês, onde recebe o nome de crédit bail, ou empréstimo-locação. Na Itália é denominado préstito locativo; na Bélgica, location financement; na Inglaterra, hire purchase.

Em sua veste mais comum, trata-se do contrato onde um agente, pretendendo utilizar coisa móvel ou imóvel, faz com que instituição financeira ou especializada o adquira, alugando-o posteriormente a ele por prazo certo, facultando-lhe ao final a opção entre a aquisição ou devolução do bem.

Assim conceitua Venosa (2005, p. 587): "Em estreita síntese, significa contrato de locação com opção de compra pelo locatário. Participam do negócio o locador ou arrendador (lessor) e o locatário ou arrendatário (lessee)" (sic).

Acentua o doutrinador acima que a principal característica dessa modalidade contratual é a possibilidade de o arrendatário adquirir o bem pelo valor residual previamente determinado, devolvê-lo ou renovar o contrato.

O arrendatário deve ser considerado, na maioria das vezes, consumidor final, mormente levando-se em conta que o contrato é de adesão, protegido, portanto, pelo Código de Defesa do Consumidor.

Rizzardo (2000, p. 21) elenca aspectos integrantes do conceito do contrato em tela:

a) operação de financiamento a médio ou longo prazo; b) locação de bens móveis ou imóveis; c) participação de um intermediário financeiro, que intervém entre o produtor do bem objeto da avença e a empresa ou interessado que dele necessita; d) a aquisição pelo intermediário junto ao produtor e a cessão em locação ao arrendatário; e) a retenção do direito de propriedade pelo arrendador; f) a obrigação do arrendatário em pagar ao intermediário financeiro um determinado número de prestações periódicas, por conta do valor global; g) a importância global paga pelo arrendatário alcança cifra superior ao custo dos bens; h) os bens, ao final do contrato, podem ser transferidos, a título oneroso, do domínio do intermediário financeiro à empresa arrendatária, desde que esta expresse a opção de compra mediante o pagamento de um custo residual.

Pelo contrato de leasing o arrendatário recebe o bem do arrendador, ao qual este adquire se já não for seu proprietário, cedendo-lhe o uso e gozo, como uma locação tradicional. Diferencia-se da locação já que nesta o locador tem o objeto em propriedade ou posse direta, no leasing o arrendador pode ser o proprietário ou não do objeto (PEREIRA, 2005).

As operações de leasing encontram respaldo legal através da na Lei 6.099, de 12 de dezembro de 1974, alterada pela Lei n.º 7.132, de 26 de outubro de 1983, que em seu primeiro artigo assim dispõe:

Art 1º O tratamento tributário das operações de arrendamento mercantil reger-se-á pelas disposições desta Lei.

Parágrafo único - Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta.

O Conselho Monetário Nacional, através da Resolução n.º 2.309, de 28 de outubro de 1996, disciplinou e consolidou as normas relativas às operações de arrendamento mercantil, trazendo em seu bojo os elementos indispensáveis a avença.

Art. 7º Os contratos de arrendamento mercantil devem ser formalizados por instrumento público ou particular, devendo conter, no mínimo, as especificações abaixo relacionadas:

I - a descrição dos bens que constituem o objeto do contrato, com todas as características que permitam sua perfeita identificação;

II - o prazo de arrendamento;

III - o valor das contraprestações ou a fórmula de cálculo das contraprestações, bem como o critério para seu reajuste;

IV - a forma de pagamento das contraprestações por períodos determinados, não superiores a 1 (um) semestre, salvo no caso de operações que beneficiem atividades rurais, quando o pagamento pode ser fixado por períodos não superiores a 1 (um) ano;

V - as condições para o exercício por parte da arrendatária do direito de optar pela renovação do contrato, pela devolução dos bens ou pela aquisição dos bens arrendados;

VI - a concessão à arrendatária de opção de compra dos bens arrendados, devendo ser estabelecido o preço para seu exercício ou critério utilizável na sua fixação;

VII - as despesas e os encargos adicionais, inclusive despesas de assistência técnica, manutenção e serviços inerentes à operacionalidade dos bens arrendados, admitindo-se, ainda, para o arrendamento mercantil financeiro:

a) a previsão de a arrendatária pagar valor residual garantido em qualquer momento durante a vigência do contrato, não caracterizando o pagamento do valor residual garantido o exercício da opção de compra;

b) o reajuste do preço estabelecido para a opção de compra e o valor residual garantido;

VIII - as condições para eventual substituição dos bens arrendados, inclusive na ocorrência de sinistro, por outros da mesma natureza, que melhor atendam às conveniências da arrendatária, devendo a substituição ser formalizada por intermédio de aditivo contratual;

IX - as demais responsabilidades que vierem a ser convencionadas, em decorrência de:

a) uso indevido ou impróprio dos bens arrendados;

b) seguro previsto para cobertura de risco dos bens arrendados;

c) danos causados a terceiros pelo uso dos bens;

d) ônus advindos de vícios dos bens arrendados;

X - a faculdade de a arrendadora vistoriar os bens objeto de arrendamento e de exigir da arrendatária a adoção de providências indispensáveis à preservação da integridade dos referidos bens;

XI - as obrigações da arrendatária, nas hipóteses de inadimplemento, destruição, perecimento ou desaparecimento dos bens arrendados;

XII - a faculdade de a arrendatária transferir a terceiros no País, desde que haja anuência expressa da entidade arrendadora, os seus direitos e obrigações decorrentes do contrato, com ou sem co-responsabilidade solidária.

Rizzardo (2000, p. 20): "é a figura em exame uma alternativa de financiamento para aquisição de qualquer tipo de veículo, máquina ou equipamento de fabricação nacional ou estrangeira, novo ou usado, incluindo, também financiamento de imóveis".

Continua o autor explicando que de acordo com os princípios fundamentais do instituto, define-se o mesmo como operação financeira realizada por uma empresa arrendadora, constituída e atuando sob controle do Banco Central do Brasil, tendo por objeto o arrendamento de bens móveis ou imóveis, adquiridos junto a terceiros, para fins de uso próprio da arrendatária.

Nessa seara, a referida resolução do Conselho Monetário Nacional prevê quatro formas de cálculo das prestações dos contratos de leasing, quais sejam: a) a contratação de valores pré-fixados em moeda nacional; b) a indexação baseada na taxa referencial ─ TR; c) a indexação com base na taxa básica financeira ─ TBF; d) a equivalência em moeda estrangeira. Tendo previsto quatro modalidades de contratação no âmbito do arrendamento mercantil, a referida normatização promulgada pelo CMN salvaguardou a possibilidade de os consumidores exercerem suas prerrogativas de escolha, potencializando suas convicções de firmar tal ou qual modalidade contratual, segundo suas expectativas legítimas decorrentes de suas ponderações sobre a viabilidade da comutatividade ou do risco.

Quanto à natureza jurídica, cuida-se de contrato bilateral, sinalagmático, oneroso, comutativo, por tempo determinado, de execução diferida e intuitu personae, conforme entendimento de Venosa (2005, p. 589):

Intuitivo ser bilateral e sinalagmático, porque contém obrigações de ambos os contratantes. Oneroso, porque demanda prestações correlatas de vantagem e sacrifício entre os sujeitos. Consensual, como costuma sustentar a doutrina, porque não exige forma determinada, embora o escrito sirva para prová-lo. É contrato de execução diferida, porque oferece a tríplice escolha a final, conforme acentuado. É contrato pessoal, porque os contraentes têm em mira a figura recíproca da outra parte, mormente a arrendatária, somente podendo contratar leasing entre nós, em princípio, quem a lei autorizar.

Prolonga o autor na classificação dizendo que o contrato de leasing é considerado típico, em virtude do disciplinamento esculpido na lei 6.099 de 1974, mesmo que sob o aspecto tributário. Apesar de ser considerado consensual, o artigo 5º desta lei, exige, sob pena de nulidade do negócio, a inclusão de prazo, preço, opção de compra, o que afasta a modalidade verbal.

Art 5º Os contratos de arrendamento mercantil conterão as seguintes disposições: a) prazo do contrato; b) valor de cada contraprestação por períodos determinados, não superiores a um semestre; c) opção de compra ou renovação de contrato, como faculdade do arrendatário; d) preço para opção de compra ou critério para sua fixação, quando for estipulada esta cláusula.

Na ótica do arrendador, o leasing é um contrato de fruição, que lhe proporciona frutos. Para o arrendatário, é um contrato de utilização, embora exista a possibilidade de aquisição da propriedade, ao final da avença, pelo denominado valor residual.

2.1.2 Espécies

Adotando o entendimento de Rizzardo (2000) o contrato de leasing apresenta-se sob quatro formas distintas assim consideradas: leasing operacional, financeiro, contratado com o próprio vendedor, contratado com empresas integrantes do mesmo grupo financeiro.

2.1.2.1 Do Leasing Operacional

Essa modalidade, também conhecida como renting, expressa uma locação de instrumentos ou material, com cláusula de prestação de serviços, prevendo a opção de compra e a possibilidade de rescisão a qualquer tempo, desde que manifestada esta intenção com uma antecedência mínima razoável, em geral fixada em trinta dias.

Nesta senda, destaca Pereira (2005) que nessa forma contratual o arrendador é o proprietário do bem objeto do contrato.

Nesse contexto, sobressaem os seguintes aspectos: O arrendador é o fabricante ou o importador do instrumento; A duração do contrato prolonga-se pelo tempo de necessidade de uso imposto de acordo como a atividade que se desenvolve, não excedendo noventa dias; Não há interveniência de empresa ou instituição financeira; O locador assume os riscos acarretados pelo equipamento; Prescinde-se da opção de compra; o mesmo instrumentário pode ser locado por diversas vezes e a locatários diversos; É rescindível a convenção pelo locatário a qualquer tempo (RIZZARDO, 2000).

Encontra disciplina legal no artigo 6º da Resolução n.º 2.309 do Conselho Monetário Nacional, a saber:

Art. 6º Considera-se arrendamento mercantil operacional a modalidade em que:

I- as contraprestações a serem pagas pela arrendatária contemplem o custo de arrendamento do bem e os serviços inerentes à sua colocação à disposição da arrendatária, não podendo o total dos pagamentos da espécie ultrapassar 75% (setenta e cinco por cento) do custo do bem arrendado;

II- as despesas de manutenção, assistência técnica e serviços correlatos à operacionalidade do bem arrendado sejam de responsabilidade da arrendadora ou da arrendatária;

III - o preço para o exercício da opção de compra seja o valor de mercado do bem arrendado.

Parágrafo único. As operações de que trata este artigo são privativas dos bancos múltiplos com carteira de arrendamento mercantil e das sociedades de arrendamento mercantil.

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O tratamento jurídico e tributário previsto na Lei 6.099, de 1974, se estende também ao leasing operacional, em consonância com o artigo 1º, parágrafo único da Resolução 2.309: "As operações previstas neste artigo podem ser dos tipos financeiro e operacional".

2.1.2.2 Do Leasing Financeiro ou Bancário

Na hipótese de o arrendador não ser o proprietário do bem, nem mesmo comerciar no ramo, mas o adquire e repassa ao arrendatário configura a modalidade do leasing financeiro, onde o arrendador pode operar com capital próprio ou financiar a operação junto a uma instituição financeira, conjugando o leasing com o contrato de compra e venda e o de mútuo.

Neste caso, surgem três partes distintas na avença: o arrendador, quem fornece o bem; o creditador, o que fornece os recursos financeiros; o arrendatário, quem recebe e do bem se utiliza (PEREIRA, 2005).

Rizzardo (2000, p. 43) assim descreve o leasing financeiro:

É o leasing financeiro, ou o financial lease, ou, ainda, o full payout lease, que é o leasing propriamente dito, o leasing puro que, por estar mais ligado a departamento de bancos, é também conhecido como leasing bancário. Tem como característica identificadora e mais saliente o financiamento que faz o locador. Ou seja, o fabricante ou importador não figuram como locadores. Há uma empresa que desempenha este papel, a cuja finalidade ela se dedica. Ocorre a aquisição de equipamento pela empresa de leasing, que contrata o arrendamento com o interessado.

A principal distinção com a forma operacional, ou renting, está no acentuado caráter de locação que domina nesta espécie, sem haver necessidade de cláusula de opção de compra, e com possibilidade de rescisão a qualquer tempo. Já no leasing financeiro predomina o sentido de financiamento, surge a figura do terceiro intermediário, posição esta geralmente exercida por instituições bancárias.

Encontra disciplina legal no artigo 5º da Resolução n.º 2.309 do Conselho Monetário Nacional, a saber:

Art. 5º Considera-se arrendamento mercantil financeiro a modalidade em que:

I - as contraprestações e demais pagamentos previstos no contrato, devidos pela arrendatária, sejam normalmente suficientes para que a arrendadora recupere o custo do bem arrendado durante o prazo contratual da operação e, adicionalmente, obtenha um retorno sobre os recursos investidos;

II - as despesas de manutenção, assistência técnica e serviços correlatos à operacionalidade do bem arrendado sejam de responsabilidade da arrendatária;

III - o preço para o exercício da opção de compra seja livremente pactuado, podendo ser, inclusive, o valor de mercado do bem arrendado.

Relativo ao prazo Rizzardo (2000, p. 45): "O contrato se alonga por um prazo previamente determinado, que poderá ser no mínimo de dois anos para bens de vida útil igual ou inferior a cinco anos; ou de três anos, para bens de maior duração".

Continua relatando que o valor do aluguel é arbitrado em vista do custo do objeto, não sendo levado em consideração o valor residual que dele resta, quando expira o prazo do arrendamento. Tem por objeto qualquer bem, não se responsabilizando a firma promovente na prestação de serviços de assistência técnica, de recuperação ou reparos de peças.

Como destaca Diniz (2003) há possibilidade de compra ou renovação do contrato em favor do arrendatário, com previsão do preço ou critério para sua fixação. A responsabilidade decorrente do status de propriedade permanece com a locadora. O valor do investimento, bem como a remuneração do capital investido feitos pela locadora, deverão ser absorvidos totalmente pelo aluguel.

2.1.2.3 Do Leasing Contratado com o Próprio Vendedor

Conhecido também como lease back, ou leasing de retro (em francês, cession bail), encontra respaldo na lei 6.099 de 1974, em seu 9º artigo:

Art. 9º - As operações de arrendamento mercantil contratadas com o próprio vendedor do bem ou com pessoas jurídicas a ele vinculadas, mediante quaisquer das relações previstas no art. 2º desta Lei, poderão também ser realizadas por instituições financeiras expressamente autorizadas pelo Conselho Monetário Nacional, que estabelecerá as condições para a realização das operações previstas neste artigo.

Parágrafo único - Nos casos deste artigo, o prejuízo decorrente da venda do bem não será dedutível na determinação do lucro real.

Venosa (2005) descreve essa modalidade como o instrumento de obtenção de capital pelas empresas, funciona como o arrendamento clássico, mas prescinde da figura do fornecedor, uma vez que o bem objeto do contrato já pertence ao locatário.

Continua relatando que o locatário é quem vende o bem ao locador, para depois tomá-lo em leasing. O negócio é privativo, entre nós, das instituições financeiras. O instituto contém, portanto, uma tradição ficta do bem locado. Afasta-se, pois, da modalidade tradicional.

Os artigos 12 e 13 da Resolução 2.309 do Conselho Monetário Nacional descrevem quais entidades podem participar dessa modalidade contratual:

Art. 12. É permitida a realização de operações de arrendamento mercantil com pessoas físicas e jurídicas, na qualidade de arrendatárias.

Art. 13. As operações de arrendamento mercantil contratadas com o próprio vendedor do bem ou com pessoas a ele coligadas ou interdependentes somente podem ser contratadas na modalidade de arrendamento mercantil financeiro, aplicando-se a elas as mesmas condições fixadas neste Regulamento.

§1º As operações de que trata este artigo somente podem ser realizadas com pessoas jurídicas, na condição de arrendatárias.

§2º Os bancos múltiplos com carteira de investimento, de desenvolvimento e/ou de crédito imobiliário, os bancos de investimento, os bancos de desenvolvimento, as caixas econômicas e as sociedades de crédito imobiliário também podem realizar as operações previstas neste artigo.

Destaca Rizzardo (2000) que nos essenciais fins financeiros, os bancos de desenvolvimento não se distinguem dos de investimento; os primeiros são entidades públicas, e os segundos, privados. A denominação de banco de desenvolvimento não pode ser usada por entidades privadas para as quais se reservou o restritivo de investimento.

Operacionaliza-se pela transferência do equipamento ou do imóvel. A entidade adquirente paga o valor do bem, deixando-o em poder do antigo proprietário, que se transmuda em arrendatário, do qual recebe periodicamente valores, em face da nova relação que se travou.

Vê-se, pois, que o objetivo é munir a empresa de numerário para investir em outro ramo, ou no reaparelhamento de seu instrumentário, ou na edificação de novos compartimentos. Posteriormente, findo o prazo do contrato, há faculdade de sua renovação, ou de recuperação da propriedade do equipamento pelo preço residual, isto é, descontado o conjunto das prestações adimplidas a título de locação. Finalidade, em última análise, visa a dar capacidade financeira à vendedora (RIZZARDO, 2000).

2.1.2.4 Do Leasing Contratado com Empresas Integrantes do mesmo Grupo Financeiro

Outrora denominado como self lease, é o leasing consigo mesmo ou formado entre empresas integrantes do mesmo grupo financeiro, mantém-se no âmbito das empresas coligadas. Uma arrenda ou loca à outra determinado bem, com opção de compra (RIZZARDO, 2000).

Para fins legais, a Resolução 2.309 do Conselho Monetário Nacional, determinou as pessoas consideradas coligas ou interdependentes:

Art. 27. Para os fins do art. 2º, parágrafo 1º, da Lei nº 6.099, de 12.09.74, e deste Regulamento, considera-se coligada ou interdependente a pessoa:

I - em que a entidade arrendadora participe, direta ou indiretamente, com 10% (dez por cento) ou mais do capital;

II - em que administradores da entidade arrendadora, seus cônjuges e respectivos parentes até o 2º (segundo) grau participem, em conjunto ou isoladamente, com 10% (dez por cento) ou mais do capital, direta ou indiretamente;

III - em que acionistas com 10% (dez por cento) ou mais do capital da entidade arrendadora participem com 10% (dez por cento) ou mais do capital, direta ou indiretamente;

IV - que participar com 10% (dez por cento) ou mais do capital da entidade arrendadora, direta ou indiretamente;

V - cujos administradores, seus cônjuges e respectivos parentes até o segundo grau participem, em conjunto ou isoladamente, com 10% (dez por cento) ou mais do capital da entidade arrendadora, direta ou indiretamente;

VI - cujos sócios, quotistas ou acionistas com 10% (dez por cento) ou mais do capital participem também do capital da entidade arrendadora com 10% (dez por cento) ou mais de seu capital, direta ou indiretamente;

VII - cujos administradores, no todo ou em parte, sejam os mesmos da entidade arrendadora.

A lei 6.099 de 1974 veda o tratamento tributário diferenciado a esta modalidade contratual: "Art 2º. Não terá o tratamento previsto nesta Lei o arrendamento de bens contratado entre pessoas jurídicas direta ou indiretamente coligadas ou interdependentes, assim como o contratado com o próprio fabricante".

Como já visto a Resolução 2.309 do Conselho Monetário Nacional, através de seu artigo 28, veda, peremptoriamente, a contratação de arrendamento mercantil com pessoas físicas ou jurídicas coligadas ou interdependentes, a saber:

Art. 28. Às sociedades de arrendamento mercantil e às instituições financeiras citadas no art. 13 deste Regulamento é vedada a contratação de operações de arrendamento mercantil com:

I - pessoas físicas e jurídicas coligadas ou interdependentes;

II - administradores da entidade e seus respectivos cônjuges e parentes até o segundo grau;

III - o próprio fabricante do bem arrendado.

A razão das medidas é evitar que alguns grupos financeiros, para contornar o excesso de imobilização, usem o self lease e fujam da tributação.

2.2 DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS QUE ENVOLVEM OS CONTRAENTES DO LEASING

Essa modalidade contratual impõe, às partes celebrantes, obrigações específicas para a perfectibilização da avença.

Cuidando-se de utilização de coisa alheia, o contrato de leasing deve conter a estipulação do preço do arrendamento e a periodicidade de pagamento. Além da obrigação de pagar o preço periódico ao arrendador, o arrendatário tem a obrigação de conservar e proteger o bem que pertence a outrem, salvo o desgaste normal de uso. Com isso, deve informar ao arrendador eventuais turbações ou perda da posse, sob pena de responder por perdas e danos (VENOSA, 2005).

Ressalta o autor que o possuidor direto também responderá pelas infrações administrativas e transgressões civis e penais que praticar em razão do bem. Neste contexto, é lícito exigir do possuidor direto o seguro da coisa arrendada.

Destaca-se, por oportuno, a obrigação do arrendador em pagar o valor residual do bem, se assim desejar adquiri-lo. O valor residual estabelecido é por vezes simbólico, inferior ao preço de mercado. O estabelecimento de um valor residual é característica do leasing financeiro. Nessa cláusula, as partes fixam, desde logo, o valor que o bem deverá ter no final do período de arrendamento. Essa estipulação recebeu o nome no meio financeiro de valor residual garantido ─ VRG. Esse valor não se mistura com o valor real do bem utilizado após, que poderá ser maior ou menor que o valor residual garantido e não altera o contratado (PEREIRA, 2005).

Quanto a antecipação do valor residual garantido, divergem a doutrina e a jurisprudência. Predomina o entendimento que a referida antecipação descaracteriza o contrato de leasing, tornando o negócio um simples contrato de financiamento.

No entender de Rizzardo (2000), o contrato de leasing contém as seguintes relações obrigacionais que são componentes de sua natureza, e que formam a sua estrutura jurídica.

Primeiramente o autor destaca a promessa sinalagmática de locação, considerando que a partir da assinatura do contrato, aparece a promessa de locação, estabelecida dentro de uma relação de reciprocidade e concomitância de direito e obrigações, já que a empresa se compromete a locar o bem e o locatário em arrendá-lo.

Em segundo lugar elege a relação de mandato especial já que a locadora ou arrendadora é a mandante, isto é, ela confere poderes, conquanto tacitamente, à locatária, que passa a ser mandatária. Os poderes são de representação quanto à conferência do material adquirido, ao exame de suas características técnicas e qualidade. Não cabe a empresa de leasing aprovar o equipamento, compete-lhe apenas a aquisição ou financiamento. Dessa forma, serão os profissionais da locatária que examinarão o bem e concluirão no tocante à aprovação. Nesta seara, o mandato configura-se justamente no aspecto de a locatária encontrar autorizada a aceitar ou não a coisa, e a gestionar para garantir os seus requisitos técnicos junto ao fornecedor.

Prossegue o autor ressaltando a relação obrigacional de locação, tendo em vista que de um lado o locador entrega o bem, comprometendo-se a respeitar a relação jurídica firmada, e de outra parte o locatário compromete-se se servir da coisa alugada para as suas finalidades convencionadas, e a conservá-la na sua integralidade, fazendo uso dos meios legais contra qualquer ofensa de terceiro, e pagando os valores estipulados nos prazos avençados.

Destaca-se, outrossim, o compromisso unilateral de venda, justamente porque vem embutida a promessa de venda no contrato, ou a possibilidade de opção de compra, obrigando-se o locador em vender o bem por valor já estipulado, desde que queira o locatário adquirir.

Por fim, acrescenta-se a possibilidade de compra e venda, considerando que a opção de compra é inerente a esta espécie contratual. Aplicam-se as normas referentes ao contrato de compra e venda, ditadas pelo Código Civil Brasileiro, de modo que os riscos da coisa correm por conta do vendedor até o momento da tradição, exceto no lease back, em razão do não deslocamento do bem.

2.3 O contrato de leasing no código de defesa do consumidor

O artigo 3º, da Lei 8.078 de 11 de setembro de 1990 define o conceito de fornecedor, incluindo nestes os de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária. Deixa, portanto, bem claro o interesse do legislador em incluir os usuários de serviços de tais instituições na defesa legal do Código de Defesa do Consumidor, a saber:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Analisando o parágrafo segundo do dispositivo de lei acima, verifica-se o que seja serviço, mesmo que de modo amplo. Dessa forma, é sempre atividade que seja fornecida no mercado de consumo mediante remuneração. Assim considerando, é perfeitamente admissível a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de leasing. Ressalte-se que a legislação do consumidor veda a prática abusiva nos contratos de crédito e similares (COSTA, 2007).

Continua o autor refletindo que se o contrato de leasing é considerado de adesão, a Lei 8.078 de 1980, dispõe em capítulo específico sobre essa modalidade contratual. Portanto, os contratos de leasing, especificamente, estão duplamente amparados pelo Código de Defesa do Consumidor, como se depreende do artigo 54 da referida lei.

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. 

§1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato.

§2° Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que a alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2° do artigo anterior.

§3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.

§4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

Tecendo considerações sobre a expressa menção às atividades bancárias como abrangidas pelo regime do Código do Consumidor, Alvim(1995, p. 40) realça:

[...] tal opção de política legislativa revela a preocupação de não se dar azo a divergente exegese, que pudesse vir a excluir do conceito geral atividades de grande movimentação de consumo, como as relacionadas, notadamente os bancos e as seguradoras, sejam públicos ou privados.

Cumpre destacar que a jurisprudência pátria diverge quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos de leasing, minoritário entendimento o considera como mercantil. Para a maior parte da doutrina e jurisprudência não resta dúvida que a referida legislação deve ser aplicado nessa modalidade contratual, seja por efeito de seu artigo 4º, seja por tratar-se de contrato de adesão.

2.4 EXTINÇÃO

O fim natural de toda a modalidade contratual é seu cumprimento, razão pela qual decorrido o prazo fixado, esvai-se o conteúdo contratual.

Porém há formas outras que também acarretam a extinção do contrato de leasing, a começar pela morte das partes, se pessoas físicas, em razão de ser intuitu personae, salvo menção expressa no pacto. Se pessoa jurídica, aplica-se a mesma regra uma vez extinta a empresa (GONÇALVES, 2005).

A rescisão do contrato, por inadimplemento de qualquer das partes, dependerá de intervenção judicial, através de sentença prolatada por um juiz competente, salvo quando as partes houverem por bem resili-lo.

Quanto à intervenção judicial no contrato de leasing, oportunamente será abordado este importante aspecto, de forma objetiva.

A perda, destruição ou deterioração da coisa é também causa de extinção do contrato por desaparecimento do objeto, salvo cobertura de seguro.

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Sobre a autora
Mariane Domingues Moreira

Graduada em Direito pela Universidade da região da Camapanha Conciliadora do Juizado Especial Federal da 4ª Região

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA, Mariane Domingues. Considerações acerca da aplicação da teoria da imprevisão nos contratos de leasing indexados ao dólar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2977, 26 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19851. Acesso em: 26 abr. 2024.

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