Artigo Destaque dos editores

Teoria dos princípios: a colisão entre direitos fundamentais

Exibindo página 2 de 2
26/12/2011 às 15:59
Leia nesta página:

4.Princípio da proporcionalidade

Para Ávila, a ponderação se realiza em três etapas: a primeira seria a "preparação da ponderação", na qual se analisam todos os elementos e argumentos de forma exaustiva; a segunda etapa é a da "realização da ponderação", pela qual se fundamenta a "relação estabelecida entre os elementos objeto de sopesamento"; e a última seria a da "reconstrução da ponderação", realizada "mediante a formulação de regras de relação, inclusive de primazia entre os elementos de sopesamento, com a pretensão de validade para além do caso." [44]

Robert Alexy, ao tratar do tema, afirma que esta é feita com a aplicação da "máxima da proporcionalidade", subdividindo-o em três "máximas parciais": adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. [45]

Para Alexy, meio idôneo ou adequado é aquele capaz de concretizar o direito fundamental. Logo, caso o meio utilizado não concretize, efetivamente, o direito fundamental, será inidôneo. Constitui-se uma análise da possibilidade fática. [46]

Humberto Ávila esclarece que:

"A adequação exige uma relação empírica entre o meio e o fim: o meio deve levar à realização do fim. Isso exige que o administrador utilize um meio cuja eficácia (e não o meio, ele próprio) possa contribuir para a promoção gradual do fim". [47]

Adverte, com efeito, Humberto Ávila que para que se compreenda essa relação entre meio e fim deve-se responder a três perguntas:

"O que significa meio adequado à realização do fim? Como deve ser analisada a relação de adequação? Qual deve ser a intensidade de controle das decisões adotadas pelo Poder Público?". [48]

Passando à análise da necessidade, verifica-se se a concretização do direito fundamental (P1) é a menos gravosa para o direito fundamental (P2). Portando, se houver meio menos gravoso para que se exercite o P1, não será necessário o que foi implementado. Trata-se, também, de verificação de possibilidades fáticas, conforme leciona Alexy.

Para Humberto Ávila, trata-se da "verificação da existência de meios que sejam alternativos àquele inicialmente escolhido". [49] Quer-se saber se há meios que possam realizar o direito fundamental, de maneira a restringir em menor intensidade o princípio afetado.

Nesta fase, se "estabelece si la importancia de satisfacer el principio opuesto". [50]

O terceiro passo é a análise da proporcionalidade em sentido estrito, como afirma Alexy, "mandamento de sopesamento propriamente dito" [51]. Nem sempre se chega a esta fase. Constitui-se numa análise jurídica.

Quanto mais alto é o grau do não cumprimento ou do prejuízo do princípio, tanto maior deve ser a importância do cumprimento do outro. Para sacrificar um princípio, o outro deve possuir maior peso, no caso concreto. "Finalmente, em la tercera etapa se establece si la importancia de satisfacer el segundo principio justifica el detrimento o la satisfacción del primer principio" [52].

Deve-se atribuir valores, pesos, importância, significado aos princípios. São três as etapas a se seguir nesta fase: analisa-se o grau de sacrifício ao princípio (baixo, médio, alto); bem como o grau de importância do outro princípio (baixo, médio, alto) e, por fim, verifica se a concretização de um compensa o sacrifício do outro.

Se o peso do primeiro é alto, deve-se sacrificar o segundo. Se a importância do segundo é alta, não se deverá privilegiar o primeiro. É um procedimento altamente racional, pelo qual se realiza um juízo racional sobre o sacrifício e a importância dos princípios. [53]

Na sistematização desta fase, Ávila, ao descrevê-la como a "comparação entre a importância de realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais", indaga: "O grau de importância da promoção do fim justifica o grau de restrição causada aos direitos fundamentais?". [54]

Na hipótese de resposta positiva para a pergunta feita, concluir-se-á que a restrição imposta a um dos princípios colidentes guarda proporcionalidade.


5.Conclusão

À vista do exposto, impende concluir-se que, em que pese a grande discussão doutrinária, a distinção entre princípio e regras está na esfera qualitativa, visto que aqueles são, segundo Dworkin, mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados, ao passo que as regras seriam satisfeitas na modalidade ou tudo ou nada.

Esta distinção tem essencial relevo nas hipóteses de aparente antinomia. Pelos ensinamentos de Alexy, deparando-se o aplicador do direito com eventual conflito entre regras, há de ser feita a análise a partir da subsunção do caso à hipótese normativa, considerando prevalecente aquela de maior grau ou cuja especialidade ou posterioridade seja observada.

No entanto, em se tratando de princípios em rota de colisão, adotar-se-á técnica diferenciada, optando-se pela aplicação do princípio da proporcionalidade, evidenciado pela adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.


Referências

ALEXY, Robert. Ponderacion, control de constitucionalidad y representacion. Disponível em: http://www.4shared.com/document/G_3gG-UM/Ponderacin_control_de_constitu.htm. acessado em 15 de Nov de 2010.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008.

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009.

BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito (O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil) Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE). Salvador, Instituto Baiano de Direito Público, n. 09, março/abril/maio 2007. Disponível na internet: HTTP://www.direitodoestado.com.br/rere.asp. Acessado em 18 de out. 2010.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da

Constituição. Coimbra: Almedina, 1998.

CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Juspodivm, 2008.

DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução e notas por Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

HOLTHE, Leo Van. Direito Constitucional. 5 ed. Salvador: Juspodivm, 2009.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direito Constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.


Notas

  1. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 38.
  2. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 117
  3. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 91.
  4. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 188 a 189
  5. Idem. p. 189
  6. HOLTHE, Leo Van. Direito Constitucional. 5 ed. Salvador: Juspodivm, 2009. p . 54
  7. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 203.
  8. CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Juspodivm, 2008. p. 144
  9. Idem. p. 144
  10. BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito (O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil) Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE). Salvador, Instituto Baiano de Direito Público, n. 09, março/abril/maio 2007. Disponível na internet: HTTP://www.direitodoestado.com.br/rere.asp. Acessado em 18 de out. 2010. p. 10.
  11. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 141.
  12. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 35 e 36.
  13. Idem. p. 38
  14. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998. p. 1035
  15. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 117
  16. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 203
  17. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 203
  18. ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 35 a 37.
  19. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução e notas por Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 39
  20. Idem. p. 40
  21. Idem. p. 40 a 42
  22. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 87 e 88. Quanto ao critério da generalidade, adverte Alexy que "Segundo esse critério, princípios são normas com grau de generalidade relativamente alto, enquanto o grau de generalidade das regras é relativamente baixo".
  23. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008 p. 89
  24. Idem. p. 90 e 91
  25. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p.205.
  26. autor destaca que "a doutrina costuma compilar uma enorme variedade de critérios para estabelecer a distinção entre princípios e regras. Por simplificação, é possível reduzir esses critérios a apenas três, que levam em conta: a) o conteúdo; b) a estrutura normativa; e c) o modo de aplicação. O primeiro deles é de natureza material e os outros dois são formais. Essas diferentes categorias não são complementares, nem tampouco são excludentes: elas levam em conta a realidade da utilização do termo ‘princípio’ no Direito de maneira geral. Nesse caso, como em outras situações da vida, afigura-se melhor lidar com a diversidade do que procurar estabelecer, por arbítrio ou convenção, um critério unívoco e reducionista."

  27. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 205 a 206.
  28. Idem. p. 206.
  29. Idem 207 e 208
  30. BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 206.
  31. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 109.
  32. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução e notas por Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 43.
  33. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 92.
  34. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 93 e 94.
  35. Idem p. 93.
  36. Idem. p. 93 e 94.
  37. SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direito Constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 518.
  38. José Afonso da Silva afirma em seu Curso de Direito Constitucional que os "Direitos fundamentais do homem constitui a expressão mais adequada a este estudo, porque, além de referir-se a princípios que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas.
  39. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 95
  40. Idem. p. 97
  41. Idem. p. 101.
  42. Idem p. 99.
  43. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 143.
  44. Idem p. 143.
  45. Idem. p. 144.
  46. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 116.
  47. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 118
  48. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 165
  49. Idem. p. 165
  50. Idem p. 170
  51. ALEXY, Robert. Ponderacion, control de constitucionalidad y representacion. Disponível em: http://www.4shared.com/document/G_3gG-UM/Ponderacin_control_de_constitu.htm. acessado em 15 de Nov de 2010
  52. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 120.
  53. ALEXY, Robert. Ponderacion, control de constitucionalidad y representacion. Disponível em: http://www.4shared.com/document/G_3gG-UM/Ponderacin_control_de_constitu.htm. acessado em 15 de Nov de 2010. p. 6.
  54. Idem p. 6
  55. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros. 2009. p. 174.
Assuntos relacionados
Sobre o autor
Jair Antonio Silva de Lima

Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Pós-graduando em Direito Público pela Uniderp. Pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci. Servidor do Ministério da Justiça. Pesquisador do Grupo de Pesquisa de Direitos Humanos e Cidadania da Universidade Federal da Bahia. Instrutor de Direitos Humanos do DPRF/MJ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Jair Antonio Silva. Teoria dos princípios: a colisão entre direitos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3099, 26 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20721. Acesso em: 17 mai. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos