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Meio ambiente laboral futebolístico e responsabilidade civil

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04/06/2012 às 14:15
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS: POR UMA NECESSÁRIA “LABORIZAÇÃO” E “HUMANIZAÇÃO” DO MUNDO FUTEBOLÍSTICO

Propugnamos, aqui, um ponto de vista que confira ênfase à dimensão constitucional do tema relativo à responsabilidade civil e o mundo do futebol, destacando a incongruência infraconstitucional que acarreta melhor condição social ao homem-consumidor e ao homem-torcedor, em detrimento do homem-trabalhador.

Essa inaceitável situação certamente viola o postulado da igualdade material e despreza a cláusula de crescente avanço socialda classe trabalhadora, ambos sedimentados na Carta Magna (CF, art. 3º, IV, art. 5º, caput e § 2º, e art. 7º, caput).

É preciso ter em conta, ainda, que a reflexão e o enfrentamento das diversas nuances aqui levantadas demandarão um sadio estreitamento das relações institucionais travadas entre o Judiciário Trabalhista e a Procuradoria do Trabalho, em prol da realização da justiça social, a configurar aquilo que recentíssima doutrina chama de “parceirização trabalhista”[35].

Propiciará, também, um poderoso incremento dessa inevitável transdisciplinariedade que tem sido uma marca da atual quadra da ciência jurídica, a exigir do operador do Direito um domínio cada vez amplo de conceitos e informações alheios ao específico rincão jurídico, hauridos, muitas vezes, de setores do conhecimento umbilicalmente ligados, por exemplo, à Sociologia, à Pscicologia e à própria Medicina.

No mais, cumpre afastar a conotação insistentemente lúdica emprestada ao atleta de futebol, passando a enxergá-lo também no papel social de trabalhador – apenas envolvido em uma dinâmica laborativa toda especial. Cumpre, pois, “laborizar” a atividade futebolística.

Além disso, também é necessário conferir condições mais humanas àqueles que trabalham nessa específica dimensão trabalhista, de forma a demandar tratamento mais consentâneo com o postulado da dignidade humana (CF, art. 1º, III).

Enfim, é preciso aproximar o homo ludens do homo faber.

Tudo sempre em vista da máxima efetividade da axiologia constitucional.


Notas

[1] Constituição Federal/1988, artigo 5º, XXIII: “a propriedade atenderá a sua função social”; Código Civil/2002, artigo 421: “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

[2]Podemos citar, como exemplo dessa assertiva, os seguintes artigos: CDC, artigo 7º, parágrafo único: “Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo”; CDC, artigo 12: “O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos”; CDC, artigo 14: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”; CDC, artigo 25, caput: “É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores”; CDC, artigo 25, § 1º: “Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores”; CDC, artigo 25, § 2º: “Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que realizou a incorporação”.

[3] Falamos “precipuamente” porque não desconhecemos que o torcedor, no perfil aqui destacado, também não deixa de ser uma espécie de consumidor.

[4] Constituição Federal, art. 7º, XXVIII: “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorre em dolo ou culpa”.

[5] TST, Súmula 331, item IV: “O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial”.

[6] “(...) a realização plena da dignidade humana, como quer o projeto constitucional em vigor, não se conforma com a setorização da tutela jurídica ou com a tipificação de situações previamente estipuladas, nas quais pudesse incidir o ordenamento. Não parece suficiente o mecanismo simplesmente repressivo, próprio do direito penal, de incidência normativa limitada aos momentos patológicos das relações jurídicas, no momento em que ocorre a violação do direito, sob a moldura de situações-tipo. A tutela da pessoa humana, além de superar a perspectiva setorial (direito público e direito privado), não se satisfaz com as técnicas ressarcitória e repressiva (binômio lesão-sanção), exigindo, ao reverso, instrumentos de proteção do homem, considerado em qualquer situação jurídica de que participe, contratual ou extracontratual, de direito público ou de direito privado. Assim é que, no caso brasileiro, em respeito ao texto constitucional, parece lícito considerar a personalidade não como um novo reduto de poder do indivíduo, no âmbito do qual seria exercido a sua titularidade, mas como valor máximo do ordenamento, modelador da autonomia privada, capaz de submeter toda a atividade econômica a novos critérios de validade. Nesta direção, não se trataria de enunciar um único direito subjetivo ou classificar múltiplos direitos da personalidade, senão, mais tecnicamente, de salvaguardar a pessoa humana em qualquer momento da atividade econômica, quer mediante os específicos direitos subjetivos (previstos pela Constituição e pelo legislador especial – saúde, imagem, nome etc), quer como inibidor de tutela jurídica de qualquer ato jurídico patrimonial ou extrapatrimonial que não atenda à realização da personalidade. (...) Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão do § 2º do art. 5º, no sentido de não exclusão de quaisquer direitos e garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, tomada como valor máximo pelo ordenamento” (TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3ª Edição, Rio de Janeiro : Renovar, 2004, p. 47-50).Essa extraordinária formulação teórica já está devidamente sedimentada na doutrina pátria. É o que se vê do Enunciado 74 da IV Jornada de Direito Civil (2006), assim gravado: “Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, inc. III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação”.

[7] “A Constituição da República estabelece um patamar mínimo de direitos do trabalhador, não impedindo que norma infraconstitucional introduza regras mais benéficas, conforme se depreende do seu art. 5º, § 2º e do art. 7º, caput. Assim, por óbvio, o art. 7º da CRFB, que constitui rol de direitos mínimos do trabalhador (conforme caput do mesmo artigo), não pode, em boa hermenêutica, ser interpretado como um limitador dos direitos deste, nem tampouco um rol de garantias do empregador, parte mais forte da relação” (PRITSCH, Cesar Zucatti. Responsabilidade Civil Decorrente de Acidente de Trabalho ou Doença Ocupacional. Revista LTr. nº 76, março/2012, p. 311-312).

[8]CC, art. 927, parágrafo único: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

[9] Sobre a importância jurídica e o raio de ação normativa do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, confira-se: MARANHÃO, Ney Stany Morais. Responsabilidade Civil Objetiva pelo Risco da Atividade: Uma Perspectiva Civil-Constitucional. São Paulo : GEN/Método, 2010.

[10] CF, art. 200: “Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: (...) VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho” (grifamos).

[11] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 13ª Edição. São Paulo : Saraiva, 2012, p. 77.

[12] “A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral” (ADI 3.540-MC, Relator: Ministro Celso de Mello, Plenário, julgamento em 01-09-2005, DJ de 03-02-2006) (grifamos).

[13]Fazendo esse fenomenal link entre Direito Ambiental e Direito do Trabalho, com penetrações na teoria da responsabilidade civil, confira-se, por todos: FELICIANO, Guilherme Guimarães. Saúde e Segurança no Trabalho: o Meio Ambiente do Trabalho e a Responsabilidade Civil Patronal. In: THOMÉ, CandyFlorencio; SCHWARZ, Rodrigo Garcia (organizadores). Direito Individual do Trabalho: Curso de Revisão e Atualização. Rio de Janeiro :Elsevier, 2011, p. 287-306; SCHINESTSCK, Clarissa Ribeiro. A Tutela da Saúde do Trabalhador e os Novos Rumos Traçados pelo Direito Ambiental do Trabalho. In: THOMÉ, CandyFlorencio; SCHWARZ, Rodrigo Garcia (organizadores). Direito Individual do Trabalho: Curso de Revisão e Atualização. Rio de Janeiro :Elsevier, 2011, p. 307-320.

[14] Esse risco naturalmente implicado, por sinal, é até expressamente reconhecido pelo próprio legislador, quando passou a exigir, da entidade de prática desportiva empregadora, a contratação, para os atletas profissionais, de seguro de vida e de acidentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos (Lei nº 9.615/1998, art. 45, caput, com redação dada pela Lei nº 12.395/2011). Cláusula semelhante também é verificada no direito italiano (Legge 23 marzo 1981, nº 91, articolo 8 – “assicurazionecontro i rischi”). Em sentido contrário, negando esse caráter imanente do risco em relação a atividades esportivas, afirma Hélder Gonçalves Dias Rodrigues que “a maioria das atividades humanas, senão todas, oferecem riscos. (...) Hodiernamente, apresenta maior risco do que as atividades desportivas o simples ‘circular’ pelos grandes centros (em razão da violência, do trânsito etc.). (...) Os riscos na atividade desportiva são aparentes, se presentes a técnica, responsabilidade e equipamentos adequados” (RODRIGUES, Hélder Gonçalves Dias. A Responsabilidade Civil e Criminal nas Atividades Desportivas. Campinas, SP : Servanda Editora, 2004, p. 189).

[15]Tencionando ofertar subsídios para a escorreita interpretação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, a doutrina lavrou o Enunciado n. 38 da I Jornada de Direito Civil (2002), texto fruto do debate travado entre diversos estudiosos e que se encontra assim redigido: “A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade”.

[16] Como leciona com inteira propriedade Alice Monteiro de Barros, “à semelhança do que ocorre com os artistas, a inatividade poderá ocasionar-lhes prejuízos irreparáveis em seu futuro profissional, porquanto sua promoção está em sua função direta de seu efetivo emprego; a inatividade forçada aqui é muito mais grave do que em outras profissões, considerando que a carreira profissional do desportista é muito curta. Logo, viola a obrigação contratual de propiciar trabalho ao atleta a conduta do dirigente do clube ou do técnico que implique exclusão sistemática do desportista das competições, sem qualquer fundamento desportivo, senão visível intenção de condená-lo ao ostracismo com todas as suas consequências. A desocupação arbitrária, vexatória e discriminatória autoriza a rescisão indireta do contrato, sem prejuízo do dano material e/ou moral daí advindos” (BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e Regulamentações Especiais de Trabalho. 5ª Edição. São Paulo : LTr, 2012, p. 125). A autora faz alusão a um interessante caso submetido ao Judiciário argentino, onde o famoso jogador Caniggia buscou, com êxito, o reconhecimento de rescisão indireta frente ao Club Atlético Boca Juniors, alcançando ainda o direito a indenização por danos morais pelo fato do clube mantê-lo injustificadamente inativo, com notório prejuízo à sua imagem. Anote-se que o jogador Adriano, apelidado de "Imperador", recentemente afirmou pretender acionar o Sport Clube Corinthians Paulista por possível prática de ostracismo. Fonte: Programa "Fantástico", Rede Globo, em entrevista exclusiva exibida em 22 de abril de 2012.

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[17] Para um estudo mais aprofundado a respeito do assédio e de suas terríveis consequências na saúde mental do trabalhador, confira-se: MARANHÃO, Ney Stany Morais. Dignidade Humana e Assédio Moral: A Delicada Questão da Saúde Mental do Trabalhador. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região. V. 44, nº 87, jul./dez./2011, p. 93-103.

[18] Segundo o art. 28 da Lei nº 9.615/1998, com redação dada pela Lei nº 12.395/2011, a concentração, dentre outras medidas previstas na lei, não pode ser superior a 3 (três) dias consecutivos por semana, desde que esteja programada qualquer partida, prova ou equivalente, amistosa ou oficial, devendo o atleta ficar à disposição do empregador por ocasião da realização de competição fora da localidade onde tenha sua sede.

[19] BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e Regulamentações Especiais de Trabalho. 5ª Edição. São Paulo : LTr, 2012, p. 96.

[20] A respeito, veja-se a seguinte decisão, publicada no portal do STJ em 08-05-2009: “STJ rejeita proibição de futebol profissional das 11h às 17h. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou o mandado de injunção impetrado pela Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenape) para proibir a realização, em todo o território nacional, de partidas de futebol no período das 11h às 17h, durante os meses de novembro, dezembro, janeiro e fevereiro. No mandado, a entidade sustentou que o Ministério do Trabalho e do Emprego, responsável pela regulamentação de todas as atividades e setores de trabalho, recusa-se a estabelecer regras especificas de proteção à saúde dos atletas profissionais de futebol, que continuam obrigados a jogar nesses horários críticos. Para a Fenape, a exposição ao calor intenso, principalmente no período do horário de verão, coloca em risco a saúde e a vida dos atletas. Previsto no artigo 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal, o mandado de injunção é concedido sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania. Segundo a relatora, ministra Laurita Vaz, a Lei n. 9.615/98 (Lei Pelé) impõe às entidades responsáveis pela administração do esporte profissional a observância de cuidados médicos e clínicos, bem como o oferecimento de condições necessárias à participação dos atletas nas competições. Além disso, o anexo 3 da Norma Reguladora n. 15 do Ministério do Trabalho e do Emprego já disciplina os limites de tolerância para exposição ao calor dos trabalhadores em geral. Para a ministra, não existe ausência de norma, mas um mero descontentamento da Federação com as que existem. Assim, por unanimidade, a Corte julgou o mandado de injunção extinto, sem resolução do mérito”. Fonte: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=91899&tmp.area_anterior=44&tmp.argumento_pesquisa=MI%20206> Acesso em: 19-04-2012. Pensamos que o tema, todavia, merece reflexão mais aprofundada.

[21] Exatamente esse é o conteúdo do Enunciado 447 da V Jornada de Direito Civil (8 a 10 de novembro de 2011).

[22]Lei n° 10.671/2003, art. 13-A, parágrafo único: “O não cumprimento das condições estabelecidas neste artigo implicará a impossibilidade de ingresso do torcedor ao recinto esportivo, ou, se for o caso, o seu afastamento imediato do recinto, sem prejuízo de outras sanções administrativas, civis ou penais eventualmente cabíveis”.

[23] “(...) os tradicionais filtros da reparação (culpa, nexo causal e dano) não apresentam mais, na prática jurisprudencial, o mesmo poder de contenção de outrora. Embora não tenha operado uma alteração expressa na dogmática da responsabilidade civil, o desenvolvimento do solidarismo jurídico implicou em uma mudança da postura do Poder Judiciário, que passou a flexibilizar os pressupostos técnicos do instituto de modo a proteger de modo mais intenso a vítima no âmbito das ação de indenização” (SCHREIBER, Anderson. O Futuro da Responsabilidade Civil: um Ensaio sobre as Tendências da Responsabilidade Civil Contemporânea. In: Responsabilidade Civil Contemporânea: em Homenagem a Sílvio de Salvo Venosa. RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; MAMEDE, Gladston; ROCHA, Maria Vital da (coordenadores). São Paulo : Atlas, 2011, p. 719).

[24]Por dano injusto há de se entender como aquele assim qualificado “tanto por haver sido injustamente causado como pelo fato de ser injusto que o suporte quem o sofreu” (HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade Pressuposta. Belo Horizonte : Del Rey, 2005, p. 354).

[25]Lei n° 10.671/2003, art. 14, ab initio: “Sem prejuízo do disposto nos arts. 12 a 14 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes (...)”.

[26]Lei n° 10.671/2003, art. 19:“As entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata o art. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do disposto neste capítulo”.

[27]Lei n° 10.671/2003, art. 3º: “Para todos os efeitos legais, equiparam-se a fornecedor, nos termos da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo”. Segundo Hélder Gonçalves Dias Rodrigues, “no que refere aos eventos desportivos propriamente ditos, se os participantes do evento tiveram ou não que pagar pela inscrição e possibilidade de participar do certame desportivo, certamente, em ocorrendo um dano, a responsabilidade da entidade promovente, no caso a administradora do desporto, será analisada com vistas às regras de prática da modalidade desportiva e, supletivamente, às gerais do Código Civil e (as especiais) do Código de Defesa do Consumidor, dependendo da origem do dano. Concluída pela responsabilidade da entidade desportiva promotora do evento, a mesma responderá até o limite constatado do dano material, moral e estético, sofridos pelas vítimas do evento danoso” (RODRIGUES, Hélder Gonçalves Dias. A Responsabilidade Civil e Criminal nas Atividades Desportivas. Campinas, SP : Servanda Editora, 2004, p. 234).

[28] A respeito, confira-se a seminal obra: HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade Pressuposta. Belo Horizonte : Del Rey, 2005.

[29] “(...) a análise dos artigos 3º, 14 e 19 do Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003) leva à conclusão de que o legislador preocupou-se na manutenção da incolumidade da vítima e de seu pleno ressarcimento, quando estabelece a responsabilidade dos clubes de futebol pelos danos ocasionados aos torcedores dentro do estádio, sendo esta responsabilidade definida de acordo com o mando de campo. Neste sentido, se há um dano ocasionado a um torcedor dentro do estádio de futebol, a entidade desportiva que detiver o mando de campo (estabelecido por meio da entidade organizadora do evento desportivo antes do início do campeonato) deverá indenizá-lo pelos danos, independentemente de existir aí uma causalidade direta entre a promoção do evento esportivo e o dano gerado. Busca-se a indenização dos danos por aquele que detém a maior e melhor capacidade de indenizar, portanto. Se for possível a identificação da causa do dano, no sentido de individualizar o agente (ou agentes) que com sua conduta o gerou, poderá o organizador exercitar o direito de regresso contra ele. “Ao invés de a vítima ter que provar que determinada pessoa, através de sua conduta, causou o dano que a afligiu, poderá contar com a presunção de causalidade, sendo suficiente que prove que sofreu um dano e que o dano foi consequência de determinada atividade realizada por um determinado grupo. (...) As relações internas dos membros do grupo serão resolvidas a posteriori (através do direito de regresso), mas o objetivo primordial da responsabilidade civil, qual seja, a compensação dos danos sofridos, deve ser efetivado prioritariamente” (MULHOLLAND, Caitlin Sampaio. A responsabilidade Civil por Presunção de Causalidade. Rio de Janeiro : GZ Editora, 2009, p. 223-225). Registre-se que recentemente o Supremo Tribunal Federal reafirmou a plena constitucionalidade de inúmeros dispositivos constantes do Estatuto do Torcedor, incluindo os preceitos que versam sobre responsabilidade civil (STF, ADI nº 2.937, julgamento em 23-02-2012).

[30]Marcos Fava destaca, com razão, que “o delineamento da competência material da Justiça do Trabalho decorre não mais da identificação dos sujeitos da relação, mas da própria estrutura contratual gênese: as que revelem relações de trabalho. Não se cuida, portanto, mais dos litígios entre empregados e empregadores – ou contratantes e contratados –, mas o assunto envolve todas as ações oriundas da relação de trabalho, mesmo que não haja, nos polos da composição processual, empregador e empregador – ou contratante e trabalhador” (FAVA, Marcos Neves. Competência da Justiça do Trabalho: para exorcizar o binômio fantasma empregado-empregador. In: LORENZETTI, Ari Pedro; SALES, Cleber Martins; AZEVEDO NETO, Platon Teixeira de (coordenadores). Direito e Processo do Trabalho na Atualidade. São Paulo : LTr, 2012, p. 296). Convalidando essa mesma linha de raciocínio, destacamos os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL ORIUNDO DE ASSÉDIO SEXUAL EM AMBIENTE DE TRABALHO. PRESTADORA DE SERVIÇOS QUE É DEMITIDA E RECONTRATADA POR DETERMINAÇÃO DO TOMADOR DE SERVIÇOS. RELAÇÃO DE TRABALHO CONFIGURADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA TRABALHISTA. - Compete à Justiça Trabalhista processar e julgar ações de indenização por danos morais decorrentes de assédio sexual praticado em ambiente de trabalho, onde as partes envolvidas estão em níveis hierárquicos diferentes, mesmo que se trate de vítima que trabalhe por meio de empresa terceirizadora de serviços e que a ação seja ajuizada contra a pessoa do superior hierárquico. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo da 1a Vara do Trabalho de Jundiaí, Estado de São Paulo” (STJ, Conflito de Competência n° 78.145⁄SP, Relatora: Ministra Nancy Andrigui, 2ª Seção, DJ 03-09-2007); “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA DO TRABALHO E JUSTIÇA FEDERAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INJÚRIA QUALIFICADA POR PRECONCEITO RACIAL SOFRIDA POR PRESTADOR (TERCEIRIZADO) DE SERVIÇOS DA CAIXA FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.1.- A expressão “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”, inscrita no art. 114, VI, da Constituição Federal, não restringe a competência da Justiça do Trabalho às ações ajuizadas pelo empregado contra o empregador, e vice-versa. Se o acidente ocorreu no âmbito de uma relação de trabalho, só a Justiça do Trabalho pode decidir se o tomador dos serviços responde pelos danos sofridos pelo prestador terceirizado." (AgRg no CC 82.432⁄BA, Rel. Min. ARI PARGENDLER, SEGUNDA SEÇÃO, DJ 8.11.07). 2.- No caso dos autos, embora a pretendida indenização por danos morais não decorra de ato ilícito praticado por empregado da Caixa Econômica Federal (empresa tomadora dos serviços), mas, por cliente da aludida instituição bancária, releva que no momento em que sofreu a ofensa, encontrava-se a autora prestando serviços nas dependências de uma de suas agências como trabalhadora terceirizada, tendo a petição inicial ainda, narrado circunstâncias típicas de relação laborativa atribuídas à Caixa, contra quem também foi movido o processo. 3.- Desse modo, a atração da competência da Justiça trabalhista se justifica, pois, a despeito da existência de duas relações subjacentes com naturezas jurídicas distintas: a primeira com a suposta ofensora (cliente da instituição financeira); e a segunda estabelecida diretamente com a CEF, enquanto tomadora dos serviços, vislumbra-se conexão imediata alegação de causalidade do dano sofrido com a prestação do serviço à aludida instituição financeira, havendo necessidade de que, a partir da análise da pretensão, tal como deduzida, se possa decidir, inclusive, sobre a permanência ou não da CEF no pólo passivo da demanda, avaliação que, pelas particularidades do caso, será melhor exercida pela Justiça do Trabalho e por ocasião de prolação de sentença quando se examinam todas as circunstâncias fático-probatórias do caso. 4.- Conflito de Competência conhecido, declarando-se a competência do Juízo da 2ª Vara do Trabalho de São Carlos⁄SP” (STJ, Conflito de Competência n° 97.458/SP, Relator: Ministro Sidnei Beneti, 2ª Seção, DJ 29-06-2011).

[31] “A consagração da dignidade humana como valor fundamental nas constituições do último século, associada à aplicação direta das normas constitucionais às relações privadas, veio exigir com força irresistível a ressarcibilidade, até então discutida, do dano extrapatrimonial” (SCHREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil: Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos. 2ª Edição, São Paulo : Atlas, 2009, p. 87).

[32] Consigne-se que a disposição contida no art. 217, § 1º, da Constituição Federal, ao aduzir que “o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei”, em nada pode servir de obstáculo ao exercício do direto fundamentalde ação por parte do atleta de futebol. Ora, tratando-se de cláusula que excepciona o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), decerto que sobre tal preceito há de recair interpretação necessariamente restritiva. Assim, há de se compreender que o curso forçado perante as instâncias da justiça desportiva somente pode concernir a matérias estrita e exclusivamente desportivas, ainda assim – limitou a Magna Carta – somente quando ligadas a aspectos relativos à disciplina e à própria competição em si. Desse modo, discussões de ordem trabalhista ou atinentes à saúde e segurança no trabalho poderão ser diretamente dirigidas ao Poder Judiciário, sem qualquer necessidade de prévio crivo perante a justiça desportiva. A respeito, confira-se o seguinte julgado: “Causas esportivas. Da competência da Justiça do Trabalho. Os Tribunais Esportivos são entidades com competência para resolver questões de ordem estritamente esportiva. A matéria em questão envolve direitos de natureza trabalhista, sendo, portanto, esta Justiça Especializada competente para dirimi-los. Incabível a alegação de violação do art. 217 da CF, por não abranger a hipótese prevista nos autos. Recurso de Revista não conhecido” (TST, RR-493704/1998, 2ª Turma, Relator: Ministro José Alberto Rossi, DJ 18-06-1999).

[33]Lei n° 9.615/1998, art. 42, § 3°:“O espectador pagante, por qualquer meio, de espetáculo ou evento desportivo equipara-se, para todos os efeitos legais, ao consumidor, nos termos do art. 2º da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990”.

[34]Lei n° 10.671/2003, art. 19:“As entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata o art. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do disposto neste capítulo”.

[35] “A parceirização jurisdicional trabalhista tem como escopo promover mudanças no relacionamento entre os magistrados do Poder Judiciário Trabalhista e os membros do Ministério Público do Trabalho, de molde a torná-los uma espécie de parceiros na busca da realização da justiça social, nos processos e ações judiciais moleculares, em que estes agentes políticos atuam em conjunto, em suas respectivas circunscrições/jurisdições, os primeiros, especialmente, nas Varas do Trabalho, e os segundos, nas Procuradorias do Trabalho nos Municípios ou ainda nas Procuradorias Regionais nas sedes das capitais brasileiras” (SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O Microssistema de Tutela Coletiva: Parceirização Trabalhista. São Paulo : LTr, 2012, p. 263). 

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Sobre o autor
Ney Maranhão

Professor Adjunto do Curso de Direito da Universidade Federal do Pará (Graduação e Pós-graduação). Doutor em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universidade de São Paulo - Largo São Francisco, com estágio de Doutorado-Sanduíche junto à Universidade de Massachusetts (Boston/EUA). Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela Universidade de Roma/La Sapienza (Itália). Mestre em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Pará. Ex-bolsista CAPES. Professor convidado do IPOG, do Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA) e da Universidade da Amazônia (UNAMA) (Pós-graduação). Professor convidado das Escolas Judiciais dos Tribunais Regionais do Trabalho da 2ª (SP), 4ª (RS), 7ª (CE), 8ª (PA/AP), 10ª (DF/TO), 11ª (AM/RR), 12ª (SC), 14ª (RO/AC), 15ª (Campinas/SP), 18ª (GO), 19ª (AL), 21ª (RN), 22ª (PI), 23ª (MT) e 24 ª (MS) Regiões. Membro do Instituto Goiano de Direito do Trabalho (IGT) e do Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (IPEATRA). Membro fundador do Conselho de Jovens Juristas/Instituto Silvio Meira (Titular da Cadeira de nº 11). Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito do Trabalho – RDT (São Paulo, Editora Revista dos Tribunais). Ex-Membro da Comissão Nacional de Efetividade da Execução Trabalhista (TST/CSJT). Membro do Comitê Gestor Nacional do Programa Trabalho Seguro (TST/CSJT). Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Macapá/AP (TRT da 8ª Região/PA-AP). Autor de diversos artigos em periódicos especializados. Autor, coautor e coordenador de diversas obras jurídicas. Subscritor de capítulos de livros publicados no Brasil, Espanha e Itália. Palestrante em eventos jurídicos. Tem experiência nas seguintes áreas: Teoria Geral do Direito do Trabalho, Direito Individual do Trabalho, Direito Coletivo do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, Direito Ambiental do Trabalho e Direito Internacional do Trabalho. Facebook: Ney Maranhão / Ney Maranhão II. Email: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARANHÃO, Ney. Meio ambiente laboral futebolístico e responsabilidade civil . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3260, 4 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21913. Acesso em: 27 abr. 2024.

Mais informações

Este texto representa a versão escrita de intervenção oral realizada pelo autor junto ao II Encontro Goiano de Direito Desportivo. O evento aconteceu na cidade de Goiânia (GO), entre os dias 9 e 10 de maio de 2012, sob a coordenação do nobre Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, do Tribunal Superior do Trabalho.

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