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Judiciário como legislador: estudo de caso das portarias “toque de recolher”

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08/01/2013 às 15:59
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7 – Conclusão

Não cabe ao intérprete extrapolar os lindes do que emana do comando normativo supremo, no caso a Constituição Federal, para fazer com que suas ideias sejam as melhores e aplicá-las a uma dada sociedade. Isso importa dizer que as portarias “toque de recolher”, correspondem a um nada jurídico, pois emanada de autoridade que não detém competência legiferante, sendo inconstitucionais.

Os tratados internacionais dos quais o Brasil fazem parte e versam sobre Direitos Humanos, devem ser levados em conta na hora da interpretação, pois se não recepcionados como emenda constitucional, os mesmos estão hierarquicamente acima da legislação infraconstitucional.

À guisa de proposta, seria interessante o Procurador-Geral da República ajuizar uma ADI, para que o Supremo Tribunal, desse interpretação conforme quanto aos limites e possibilidades de magistrados em editar atos abstratos e genéricos para crianças e adolescentes, em especial os que tolhem a liberdade.

O espaço interpretativo possível, ou aberto, não enseja em arbítrio. Antes encontra limites e só se fundamenta com validade se ancorado na Constituição Federal.

Dessa forma, a Constituição é um texto único, más não comporta uma ideia única, ao contrário, é aberto a pluralidades, visando respeitar a dignidade da pessoa humana consoante Laurence Tribe e Michael Dorf. Assim, as portarias “toque de recolher” violam a liberdade, e por consequência a dignidade da pessoa humana.

E a hermenêutica não comporta um círculo fechado em si mesmo. Ao contrário, há um espaço aberto para superar entendimentos que se perderam no tempo, sempre num crescente valorativo, como ensina Gadamer.


 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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TRIBE, Laurence; DORF, Michael. Hermenêutica Constitucional. Trad. Amarílis de Sousa Birchal. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.


Notas

[1]< www.jornaldemocrata.com/index.php?option=com_content&view=article&id=433:toque-recolher&catid=55:miguelopolis-news>. Acesso em 29 jun. 2012.

[2] <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/busca.do>.  Acesso em 15  ago. 2012.

[3]  TJSP. HC nº 0112189-38.2011.8.26.0000, Rel. Desª. Maria Olívia Alves, Corte Especial, julgado em 22.08.2011.

[4] TJTO. Rel. Moura Filho Mandado de Segurança nº 5001539-06.2011.827.0000.  2ª Câmara Cível, julgado em 02/05/2012.

[5]  STJ. HC 207.720/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, julgado em 01/12/2011, DJe 23/02/2012

[6] Art.16  da lei 8.069: O Direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: I – ir, vir, estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais (..omissis); Art.18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tramento  desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor;Art.70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da crianaça e do adolescente. ; Art.149 Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará “...omisssi”§2º A s medidas adotadas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069Compilado.htm> Acesso em 12 de jun. de 2012.

[7] Art. 2º da CF:São Poderes da União independentes, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário; Art. 5º, XV , é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens. Art. 15 do ECA:  A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

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[8] Almeida, F.A. Juscoronelismo ou judicialização do cotidiano? O toque de recolher para menores em cidades do interior do Brasil: XIX Encontro Nacional do CONPEDI, 2010, Fortaleza, p. 1296-1311.

[9] Gadamer, H-G. Verdade e método I. Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Trad. Flávio Paulo  Meurer 11. ed : Vozes, Petrópolis, 2011.

[10] Tribe, L; Dorf, M. Hermenêutica Constitucional. Trad. Amarílis de Sousa Birchal. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

[11] Mendes, Gilmar Ferreira; Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 298.

[12] Piovesan, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7. ed: Saraiva, São Paulo , 2006, p. 345-466.

[13] STF.RE 80004/SE. Rel. Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 01/06.1977. DJ de 29.12.1977

[14] STF. RE 466.343, Rel. Min. Cezar Peluso, voto do Min. Gilmar Mendes, julgado em 31-2-2008, Plenário, DJE, de 5-6-2009.

[15] Brasil, Constituição Federal. 34ª ed – Brasília: Câmara dos Deputados, Câmara, 2011.

[16] Bonfim, S. Vinícius. Gadamer e a experiência hermenêutica. Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, nº 49, pág. 76, abr./jun. 2010.

[17] Ely, John. Hart. Democracia e Desconfiança Uma teoria do controle judicial de constitucionalidade. Trad. Juliana Lemos.  Martins Fontes, São Paulo, 2010, p. 76.

[18]    Mendes, Gilmar Ferreira., Coelho;.Inocêncio Mártires., Branco. Paulo Gustavo Gonet. Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais.  Brasília Jurídica, 2ª tiragem, Brasília, 2002, p. 127.

[19] Barroso, Luis Roberto Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Disponível<http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235066670174218181901.pdf > Acesso em 04 jul. de 2012.

[20]STJ.  HC 207.720/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, julgado em 01/12/2011, DJE 23/02/2012.

[21] STJ. REsp nº 1.046.030/RJ. Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 15-09-2009, DJE de 24-09-2009.

[22] TJTO. Rel. Moura Filho Mandado de Segurança nº 5001539-06.2011.827.0000, julgado em 02/05/2012, 2ª Câmara Cível.

[23] STJ. HC 207.720/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, julgado em 01/12/2011, DJE 23/02/2012.

[24] STF. RE 134.297, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 22-9-1995.

[25] Piovesan, pág. XXXI.

[26] Mendes, Gilmar Ferreira; Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 156.

[27] Canotilho, J.J.G.. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra, 2004,  p. 76.

[28] Gadamer. p. 432-433

[29] Ob, cit.

[30]  Gadamer,  p. 395.

[31] Tribe e Dorf, p.20.

[32] Tribe e Dord, p. 45.

[33] Osorio, Fabio Medina. Direitos Imanentes ao Devido Processo Legal sancionador na constituição de 1988. Constituição Federal Avanços, contribuições e modificações no professo democrático brasileiro. Org. Ives Gandra Martins e Francisco Rezek. São Paulo:Ed. RT:CEU – Centro de Extensão Universitária.2008.

[34] STF. MS 22.690, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17-4-1997, Plenário, DJ de 7-1-.2006.

[35] STF. HC 88473, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 03/06/2008, 1ª Turma, DJ de 05-09-2008.

[36] STF. HC 88639, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgado em 03/10/2006, 2ª Turma, DJ de 24-11-2006.

[37]  STF. HC 98518, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, julgado em 25-05-2010, publicado no DJE 10-06-2010

[38] Gadamer. p. 430.


ABSTRACT: The present study addresses the possibility of judges 1st degree, occupants of the sticks of childhood and youth or who does sometimes in the counties of sticks only, edit denominated ordinances "curfew", limiting the right ambulatory children and adolescents , fixing time for it to collect up to their homes. The expedition called the ordinances, that while administrative acts are actually eventually transmuted into laws considered in a broad sense, by being adequately generality, abstraction and impersonality own laws strictly. These acts will be collated with decisions made by state courts that have faced the issue and the Superior Court. So based on the doctrine of Hans-Georg Gadamer and Laurence Tribe and Michael Dorf anchored in case of similar cases issued by the Supreme Court, it will be argued that they are not applicable in the Brazilian because it violates the dignity of the human person to establish arbitrarily limits the freedom to go, come and stay to the end proposing an ADI that is filed to the Supreme Court on the issue manifests itself as providing interpretation.

KEYWORDS: curfew; freedom; legislature positive; negative legislator; child; teen

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Sobre o autor
Vick Aglantzakis

Servidor Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AGLANTZAKIS, Vick. Judiciário como legislador: estudo de caso das portarias “toque de recolher”. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3478, 8 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23396. Acesso em: 26 abr. 2024.

Mais informações

Artigo apresentado ao professor Pós-Doutor Ney Bello Filho, como conclusão da disciplina "Jurisdição e Interpretação" do curso de Mestrado em Direito Constitucional.

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