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Tratamento da imunidade do livro eletrônico pelo Supremo Tribunal Federal: por uma mudança necessária

18/01/2013 às 14:46
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Em um momento que grande parte dos livros, jornais e revistas já se encontram disponíveis em versões eletrônicas, o STF ainda não reconhece a imunidade dos livros eletrônicos, em real incongruência com a realidade atual e com o desiderato da norma constitucional.

Resumo: Este artigo procura apresentar o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da imunidade dos livros eletrônicos, propondo mudança ao atual posicionamento da corte.

Palavras-chave: JURISPRUDÊNCIA; STF; IMUNIDADE; LIVRO  


A imunidade dos livros eletrônicos não vem sendo tratada de forma adequada pela jurisprudência de nossa corte maior que, muitas vezes, conceitua o livro eletrônico como um software e, outras tantas, não o trata como livro pra fins de desoneração[1]. Pois bem, passemos à análise de algumas decisões que refletem o pensamento do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria.

O entendimento do Supremo Tribunal Federal, de há muito, é pacífico em relação à possibilidade de interpretação ampliativa das imunidades tributárias, com escopo em assegurar os valores que são os vetores axiológicos justificadores da desoneração. Nesse sentido é o vetusto precedente da Corte:

IMUNIDADE TRIBUTARIA. LIVRO. CONSTITUIÇÃO, ART. 19, INC. III, ALINEA 'D'. EM SE TRATANDO DE NORMA CONSTITUCIONAL RELATIVA AS IMUNIDADES TRIBUTARIAS GENERICAS, ADMITE-SE A INTERPRETAÇÃO AMPLA, DE MODO A TRANSPARECEREM OS PRINCÍPIOS E POSTULADOS NELA CONSAGRADO. O LIVRO, COMO OBJETO DA IMUNIDADE TRIBUTARIA, NÃO É APENAS O PRODUTO ACABADO, MAS O CONJUNTO DE SERVIÇOS QUE O REALIZA, DESDE A REDAÇÃO, ATÉ A REVISÃO DE OBRA, SEM RESTRIÇÃO DOS VALORES QUE O FORMAM E QUE A CONSTITUIÇÃO PROTEGE (RE nº. 102.141-1, Rel. p/ Ac. Min. Carlos Madeira, 2ª Turma, 18/10/1985).

Nessa linha de pensamento, a jurisprudência do Supremo caminhou para reconhecer diversos materiais como abrangidos pela imunidade, tais como a lista telefônica, as apostilas e manuais técnicos e o álbum de figurinhas, dentre outros:

TRIBUTÁRIO. MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. EXIGÊNCIA DE IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS (ISS) SOBRE A EDITORAÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, PRODUÇÃO INDUSTRIAL E DISTRIBUIÇÃO DE LISTAS TELEFONICAS. INQUINADA OFENSA AO ART. 19, III, D, DA CARTA DE 1969. Orientação jurisprudencial do STF, no sentido de que não estão excluídas da imunidade constitucional as publicações "que cuidam de informações genéricas ou especificas, sem caráter noticioso, discursivo, literário, poético ou filosófico, mas de inegável utilidade pública, como e o caso das listas telefônicas". Recurso provido. (RE 134.071, 1ªT., rel. Min. Ilmar Galvão, 30-10-1992). No mesmo sentido: RE 101.441, RE 199.183, RE 116.510 e RE 130.012.

IMUNIDADE - IMPOSTOS - LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E PAPEL DESTINADO À IMPRESSÃO - APOSTILAS. O preceito da alínea "d" do inciso VI do artigo 150 da Carta da República alcança as chamadas apostilas, veículo de transmissão de cultura simplificado.(RE 183.403, 2ªT., rel. Min. Marco Aurélio, 07-11-2000).

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ART. 150, VI, "D" DA CF/88. "ÁLBUM DE FIGURINHAS". ADMISSIBILIDADE. 1. A imunidade tributária sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão tem por escopo evitar embaraços ao exercício da liberdade de expressão intelectual, artística, científica e de comunicação, bem como facilitar o acesso da população à cultura, à informação e à educação. 2. O Constituinte, ao instituir esta benesse, não fez ressalvas quanto ao valor artístico ou didático, à relevância das informações divulgadas ou à qualidade cultural de uma publicação. 3. Não cabe ao aplicador da norma constitucional em tela afastar este benefício fiscal instituído para proteger direito tão importante ao exercício da democracia, por força de um juízo subjetivo acerca da qualidade cultural ou do valor pedagógico de uma publicação destinada ao público infanto-juvenil. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido.(RE 221.239, 2ªT., rel. Min. Ellen Gracie, 06-08-2004). No mesmo sentido: RE 179.893 e RE 339.124.

Ainda em consonância com o entendimento anterior, alguns insumos passaram a ser analisados pelo STF, que alargou a abrangência da imunidade em estudo. Na verdade, atualmente, o Supremo tem estendido a imunidade tributária dos livros, jornais e periódicos aos insumos utilizados na sua feitura, desde que sejam assimiláveis ao papel, como o papel fotográfico, da película destinada a dar resistência à capa de livros, do papel telefoto, dos filmes fotográficos, sensibilizados, não impressionados, para imagens monocromáticas, e do papel fotográfico para fotocomposição por laser, de imediato consumo no processo industrial de impressão[2].

Por outro lado, outros insumos que, embora utilizados na fabricação de livros, jornais e periódicos, não são considerados imunes pelo STF. É o caso da tinta (RE 324.600), das tiras plásticas para amarração de jornais (RE 208.638), dos serviços de composição gráfica necessários à confecção do produto final (RE 230.782), dos encartes de propaganda (RE 213.094) e dos serviços de transporte e distribuição de jornais (RE 116.607).

Tal entendimento levou à produção da Súmula nº. 657 pelo Supremo Tribunal Federal, que dispõe:

“A imunidade prevista no artigo 150, VI, “d”, da CF abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à publicação de jornais e periódicos”.

Como vimos, a citada súmula foi editada para fixar os insumos que poderiam ser equiparados ao papel para fins de imunidade. É com base nesse entendimento sumulado que o Supremo Tribunal Federal tem se manifestado pela inexistência de imunidade dos livros eletrônicos. Aqui nos parece claramente que as decisões da nossa corte maior têm tratado a questão de forma equivocada, confundindo a essência dos produtos que são objeto da lide, aplicando indistintamente mencionada súmula a situações que não guardam relação com os precedentes que a originaram.

Desta forma, aplicando o entendimento da mencionada súmula, o STF tem decidido monocraticamente a questão, não reconhecendo a imunidade. Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 220.503-1

PROCED.: RIO DE JANEIRO

RELATOR : MIN. CEZAR PELUSO

AGTE.: ESTADO DO RIO DE JANEIRO

ADV.: PGE-RJ - ARTHUR JOSÉ FAVERET CAVALCANTI

AGDA.: EDITORA NOVA FRONTEIRA S/A

ADVDOS.: DEBORAH BARRETO MENDES E OUTROS

DECISÃO: 1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, na instância de origem, indeferiu processamento de recurso extraordinário contra acórdão que reconheceu a imunidade tributária de dicionário eletrônico, contido em software. Sustenta o recorrente, com base no art. 102, III, a, violação ao art. 150, IV, d, da Constituição Federal. 2. Consistente o recurso. O acórdão recorrido está em desconformidade com a orientação sumulada desta Corte, no sentido de que a imunidade prevista no art. 150, VI, d, da Carta Magna, não alcança todos os insumos usados na impressão de livros, jornais e periódicos, mas tão somente os filmes e papéis tidos por necessários à sua publicação, tais como o papel fotográfico, inclusive o destinado a fotocomposição por laser, os filmes fotográficos, sensibilizados, não impressionados, para imagens monocromáticas, e o papel para telefoto (súmula 657). 3. Isto posto, invocando o art. 544, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei nº 9.756/98 e pela Lei nº 8.950/94, acolho o agravo, para, desde logo, conhecer do recurso extraordinário e lhe dar provimento, para indeferir a segurança. Custas ex-lege. Publique-se. Int.. Brasília, 09 de setembro 2004. Ministro CEZAR PELUSO Relator.

RE 416579/RJ – RIO DE JANEIRO

RECURSOEXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. Joaquim Barbosa

Julgamento: 17/12/2009

Partes

RECTE.(S)           : UNIÃO

PROC.(A/S)(ES)      : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

RECDO.(A/S)         : NOVA LENTE EDITORA LTDA

ADV.(A/S)           : MARIA CAROLA GUDIN

DECISÃO:Trata-se de recurso extraordinário (art. 102, III, a da Constituição) interposto de acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região que considerou imune à tributação operações com livros eletrônicos, gravados em compact discs – read only memory (CD-ROM). Sustenta-se, em síntese, violação do art. 150, VI, d da Constituição. A orientação firmada por esta Corte interpreta o art. 150, VI, d da Constituição de forma a restringir a salvaguarda constitucional aos estritos contornos dos objetos protegidos: livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. Assim, embora a salvaguarda possa abranger diversas etapas do processo de elaboração e circulação do material protegido (RE 102.141 - RTJ 116/268), bem como comporte ampla interpretação a densidade do objeto (imunidade de álbum de figurinhas – cromos autocolantes - RE 221.239, rel. min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJ de 06.08.2004 e das listas telefônicas - RE 101.441, rel. min. Sydney Sanches, Pleno, DJ de 19.08.1988), a imunidade não abrange elementos que fujam à estrita classificação como livros, jornais ou periódicos ou o papel destinado à sua impressão (cf. a interpretação conversa da Súmula 657/STF). Nesse sentido, não há proteção constitucional à prestação de serviços de composição gráfica (RE 229.703, rel. min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ de 17.05.2002), às capas duras auto-encadernáveis utilizadas na distribuição de obras para o fim de incrementar a venda de jornais (RE 325.334-AgR, rel. min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 19.09.2003), à tinta para impressão de livros, jornais, revistas e periódicos (RE 265.025, rel. min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ de 21.09.2001), às peças de reposição (RE 238.570 - RTJ 171/356 – cf., ainda o RE 230.782, rel. min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 10.11.2000) ou à importação de bens para montagem de parque gráfico (AI 530.911-AgR, rel. min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 31.03.2006). Dado que o suporte físico que funciona como mídia (“cd-rom”) não se confunde e não pode ser assimilado ao papel, o acórdão recorrido contrariou a orientação fixada por esta Corte (cf., e.g., o AI 530.958, rel. min. Cezar Peluso, decisão monocrática, DJ de 31.03.2005 e o RE 497.028, rel. min. Eros Grau, decisão monocrática, DJe 223 de 26.11.2009). Ante o exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para denegar a segurança. Sem honorários (Súmula 512/STF). Publique-se. Brasília, 17 de dezembro de 2009. Ministro JOAQUIM BARBOSA Relator.

RE 276213/SP – SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. Joaquim Barbosa

Julgamento: 17/12/2009

Partes

RECTE.              : ESTADO DE SÃO PAULO

PROC.(A/S)(ES)      : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO

RECDO.(A/S)         : SOCIEDADE DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL - EDIÇÕES LOYOLA E OUTRO(A/S)

ADV.(A/S)           : NASSARALLA SCHAHIN FILHO E OUTRO(A/S)

DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário (art. 102, III, a da Constituição) interposto de acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que considerou imune à tributação operações com livros eletrônicos, gravados em compact discs – read only memory (CD-ROM). Sustenta-se, em síntese, violação do art. 150, VI, d da Constituição.

A orientação firmada por esta Corte interpreta o art. 150, VI, d da Constituição de forma a restringir a salvaguarda constitucional aos estritos contornos dos objetos protegidos: livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. Assim, embora a salvaguarda possa abranger diversas etapas do processo de elaboração e circulação do material protegido (RE 102.141 - RTJ 116/268), bem como comporte ampla interpretação a densidade do objeto (imunidade de álbum de figurinhas – cromos autocolantes - RE 221.239, rel. min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJ de 06.08.2004 e das listas telefônicas - RE 101.441, rel. min. Sydney Sanches, Pleno, DJ de 19.08.1988), a imunidade não abrange elementos que fujam à estrita classificação como livros, jornais ou periódicos ou o papel destinado à sua impressão (cf. a interpretação conversa da Súmula 657/STF). Nesse sentido, não há proteção constitucional à prestação de serviços de composição gráfica (RE 229.703, rel. min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ de 17.05.2002), às capas duras auto-encadernáveis utilizadas na distribuição de obras para o fim de incrementar a venda de jornais (RE 325.334-AgR, rel. min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 19.09.2003), à tinta para impressão de livros, jornais, revistas e periódicos (RE 265.025, rel. min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ de 21.09.2001), às peças de reposição (RE 238.570 - RTJ 171/356 – cf., ainda o RE 230.782, rel. min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 10.11.2000) ou à importação de bens para montagem de parque gráfico (AI 530.911-AgR, rel. min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 31.03.2006). Dado que o suporte físico que funciona como mídia (“cd-rom”) não se confunde e não pode ser assimilado ao papel, o acórdão recorrido contrariou a orientação fixada por esta Corte (cf., e.g., o AI 530.958, rel. min. Cezar Peluso, decisão monocrática, DJ de 31.03.2005 e o RE 497.028, rel. min. Eros Grau, decisão monocrática, DJe 223 de 26.11.2009). Ante o exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para denegar a segurança. Sem honorários (Súmula 512/STF). Publique-se. Brasília, 17 de dezembro de 2009. Ministro JOAQUIM BARBOSA Relator.

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal mostra que a jurisprudência da corte se mantém neste sentido:

RE 330817/RJ – Rio de Janeiro

Recurso Extraordinário

Relator(a): Min. Dias Toffoli

Julgamento: 04/02/2010

Partes

RECTE.(S)           : ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PROC.(A/S)(ES)      : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RECDO.(A/S)         : ELFEZ EDIÇÃO COMERCIO E SERVIÇOS LTDA

ADV.(A/S)           : FÉLIX SOIBELMAN

DECISÃO

Vistos.

Estado do Rio de Janeiro interpõe recurso extraordinário, com fundamento na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado:“Duplo Grau de Jurisdição.Mandado de Segurança. Imunidade concernente ao ICMS. Art. 150, VI, ‘d’, da Constituição Federal. Comercialização da Enciclopédia Jurídica eletrônica por processamento de dados, com pertinência exclusiva ao seu conteúdo cultural – software. Livros, jornais e periódicos são todos os impressos ou gravados, por quaisquer processos tecnológicos, que transmitem aquelas idéias, informações, comentários, narrações reais ou fictícias sobre todos os interesses humanos, por meio de caracteres alfabéticos ou por imagens e, ainda, por signos. A limitação do poder de tributar encontra respaldo e inspiração no princípio no Tax on Knowledgs. Sentença que se mantém em duplo grau obrigatório de jurisdição” (fl. 94). Alega o recorrente contrariedade ao artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal. Contra-arrazoado (fls. 112 a 137), o recurso extraordinário (fls. 98 a 109) foi admitido (fls. 143 a 145). Opina o Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto, “pelo desprovimento do recurso” (fls. 160 a 164). Decido. Anote-se, inicialmente, que o acórdão recorrido foi publicado em 15/9/2000, conforme expresso na certidão de folha 96, não sendo exigível a demonstração da existência de repercussão geral das questões constitucionais trazidas no recurso extraordinário, conforme decidido na Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 664.567/RS, Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 6/9/07. A irresignação merece prosperar, haja vista que a jurisprudência da Corte é no sentido de que a imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal, conferida a livros, jornais e periódicos, não abrange outros insumos que não os compreendidos na acepção da expressão “papel destinado a sua impressão”. Sobre o tema, anote-se: “Tributário. Imunidade conferida pelo art. 150, VI, "d" da Constituição. Impossibilidade de ser estendida a outros insumos não compreendidos no significado da expressão ‘papel destinado à sua impressão’. Precedentes do Tribunal. - Incabível a condenação em honorários advocatícios na ação de mandado de segurança, nos termos da Súmula 512/STF. Agravos regimentais desprovidos” (RE nº 324.600/SP-AgR, Primeira Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 25/10/02). “ISS. Imunidade. Serviços de confecção de fotolitos. Art. 150, VI, "d", da Constituição. - Esta Corte já firmou o entendimento (a título exemplificativo, nos RREE 190.761, 174.476, 203.859, 204.234, 178.863) de que apenas os materiais relacionados com o papel - assim, papel fotográfico, inclusive para fotocomposição por laser, filmes fotográficos, sensibilizados, não impressionados, para imagens monocromáticas e papel para telefoto - estão abrangidos pela imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, "d", da Constituição. - No caso, trata-se de prestação de serviços de composição gráfica (confecção de fotolitos) (fls. 103) pela recorrida a editoras, razão por que o acórdão recorrido, por ter essa atividade como abrangida pela referida imunidade, e, portanto, ser ela imune ao ISS, divergiu da jurisprudência desta Corte. Nesse sentido, em caso análogo ao presente, o decidido por esta 1ª Turma no RE 230.782. Recurso extraordinário conhecido e provido” (RE nº 229.703/SP Primeira Turma, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 17/2/02). “Recurso extraordinário inadmitido. 2. Imunidade tributária. Art. 150, VI, d, da Constituição Federal. 3. A jurisprudência da Corte é no sentido de que apenas os materiais relacionados com o papel estão abrangidos por essa imunidade tributária. 4.Agravo regimental a que se nega provimento” (AI nº 307.932/SP-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Néri da Silveira, DJ de 31/8/01).

No mesmo sentido, as seguintes decisões monocráticas proferidas em processos em que a matéria discutida é especificamente a imunidade tributária incidente sobre livros eletrônicos (CD-ROM): RE nº 416.579/RJ, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJ RE nº 282.387/RJ, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 8/6/06 e AI nº 530.958/GO, Relator o Ministro Cezar Peluso, DJ de 31/3/05. Ante o exposto, nos termos do artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, conheço do recurso extraordinário e lhe dou provimento para denegar a segurança. Sem condenação em honorários, nos termos da Súmula nº 512/STF. Custas ex lege.

Publique-se.

Brasília, 4 de fevereiro de 2010. 

Ministro DIAS TOFFOLI

Relator

Em contrapartida, outros tribunais têm reconhecido a imunidade aos livros eletrônicos:

CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. CD - ROM. LIVROS IMPRESSOS EM PAPEL, OU EM CD - ROM, SÃO ALCANÇADOS PELA IMUNIDADE DA ALÍNEA "D" DO INCISO VI DO ART. 150 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A PORTARIA MF 181/89 - NA QUAL SE PRETENDE AMPARADO O ATO IMPUGNADO - NÃO DETERMINA A INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO E IPI SOBRE DISQUETES, CD - ROM, NOS QUAIS TENHA SIDO IMPRESSO LIVROS, JORNAIS OU PERIÓDICOS. REMESSA NECESSÁRIA IMPROVIDA.(REO 9802028738, Rel. Desembargador Federal ROGERIO VIEIRA DE CARVALHO, TRF2 - QUARTA TURMA, DJ de 18/03/1999)[3]

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. JORNAL. CD-ROM. 1. O fato de o jornal não ser feito de papel, mas veiculado em CD-ROM, não é óbice ao reconhecimento da imunidade do artigo 150, VI, d, da CF, porquanto isto não o desnatura como um dos meios de informação protegidos contra a tributação. 2. Interpretação sistemática e teleológica do texto constitucional, segundo a qual a imunidade visa a dar efetividade aos princípios da livre manifestação de pensamento, de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, de acesso à informação e aos meios necessários para tal, o que deságua, em última análise, no direito de educação, que deve ser fomentado pelo Estado visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho, havendo liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber (art. 5º, IV, IX, XIV, 205, 206, II, etc.). 3. Apelo e remessa oficial improvidos.(AC 199804010908885, JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, TRF4 - SEGUNDA TURMA, 25/10/2000)

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. LIVROS ELETRÔNICOS E ACESSÓRIOS. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E EVOLUTIVA. POSSIBILIDADE. 1. Na hipótese dos autos, a imunidade assume a roupagem do tipo objetiva, pois atribui a benesse a determinados bens, considerados relevantes pelo legislador constituinte. 2. O preceito prestigia diversos valores, tais como a liberdade de comunicação e de manifestação do pensamento; a expressão da atividade intelectual, artística e científica e o acesso e difusão da cultura e da educação. 3. Conquanto a imunidade tributária constitua exceção à regra jurídica de tributação, não nos parece razoável atribuir-lhe interpretação exclusivamente léxica, em detrimento das demais regras de hermenêutica e do "espírito da lei" exprimido no comando constitucional. 4. Hodiernamente, o vocábulo "livro" não se restringe à convencional coleção de folhas de papel, cortadas, dobradas e unidas em cadernos. 5. Interpretar restritivamente o art. 150, VI, "d" da Constituição, atendo-se à mera literalidade do texto e olvidando-se da evolução do contexto social em que ela se insere, implicaria inequívoca negativa de vigência ao comando constitucional. 6. A melhor opção é a interpretação teleológica, buscando aferir a real finalidade da norma, de molde a conferir-lhe a máxima efetividade, privilegiando, assim, aqueles valores implicitamente contemplados pelo constituinte. 7. Dentre as modernas técnicas de hermenêutica, também aplicáveis às normas constitucionais, destaca-se a interpretação evolutiva, segundo a qual o intérprete deve adequar a concepção da norma à realidade vivenciada. 8. Os livros são veículos de difusão de informação, cultura e educação, independentemente do suporte que ostentem ou da matéria prima utilizada na sua confecção e, como tal, fazem jus à imunidade postulada. Precedente desta E. Corte: Turma Suplementar da Segunda Seção, ED na AC n.º 2001.61.00.020336-6, j. 11.10.2007, DJU 05.11.2007, p. 648. 9. A alegação de que a percepção do D. Juízo a quo ingressa no campo político não merece acolhida, haja vista que interpretar um dispositivo legal é exercício de atividade tipicamente jurisdicional. 10. Não há que se falar, de outro lado, em aplicação de analogia para ampliar as hipóteses de imunidade, mas tão-somente da adoção de regras universalmente aceitas de hermenêutica, a fim de alcançar o verdadeiro sentido da norma constitucional. 11. Apelação e remessa oficial improvidas. (AMS  200061040052814, JUIZA CONSUELO YOSHIDA, TRF3 - SEXTA TURMA, 03/11/2008)

IMUNIDADE. LIVROS. "QUICKITIONARY". CF/88, ART. 150, INC. VI, ALÍNEA "D". Hoje, o livro ainda é conhecido por ser impresso e ter como suporte material o papel. Rapidamente, porém, o suporte material vem sendo substituído por componentes eletrônicos, cada vez mais sofisticados, de modo que, em breve, o papel será tão primitivo, quanto são hoje a pele de animal, a madeira e a pedra. A imunidade, assim, não se limita ao livro como objeto, mas transcende a sua materialidade, atingindo o próprio valor imanente ao seu conceito. A Constituição não tornou imune a impostos o livro-objeto, mas o livro-valor. E o valor do livro está justamente em ser um instrumento do saber, do ensino, da cultura, da pesquisa, da divulgação de idéias e difusão de ideais, e meio de manifestação do pensamento e da própria personalidade do ser humano. É por tudo isso que representa, que o livro está imune a impostos, e não porque apresenta o formato de algumas centenas de folhas impressas e encadernadas. Diante disso, qualquer suporte físico, não importa a aparência que tenha, desde que revele os valores que são imanentes ao livro, é livro, e como livro, estará imune a impostos, por força do art. 150, VI, "d", da Constituição. O denominado "quickitionary", embora não se apresente no formato tradicional do livro, tem conteúdo de livro e desempenha exclusivamente a função de um livro. Não há razão alguma para que seja excluído da imunidade que a Constituição reserva para o livro, pois tudo que desempenha a função de livro, afastados os preconceitos, só pode ser livro. (APELREEX 200670080016850, VILSON DARÓS, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, 19/05/2009)

CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO - IPI E II - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA - ART. 150, VI, "D" DA CF/88 - MATERIAL DIDÁTICO DESTINADO AO ENSINO DA LÍNGUA INGLESA EM FORMATO CD-ROM, CD ÁUDIO, FITAS DE VÍDEO, FITAS CASSETE - POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO A imunidade, como regra de estrutura contida no texto da Constituição Federal, estabelece, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações específicas e determinadas. O disposto no artigo 150, inciso VI, alínea "d", da Constituição Federal se revela aplicável, uma vez que novos mecanismos de divulgação e propagação da cultura e informação de multimídia, como o CD-ROM, aos denominados livros, jornais e periódicos eletrônicos. são alcançados pela imunidade. A norma que prevê a imunidade visa facilitar a difusão das informações e cultura, garantindo a liberdade de comunicação e pensamento, alcançando os vídeos, fitas cassetes, CD-ROM, aos denominados livros, jornais e periódicos eletrônicos., pois o legislador apresentou esta intenção na regra no dispositivo constitucional. Apelação provida. (AMS 200161000221230, JUIZ NERY JUNIOR, TRF3 - TERCEIRA TURMA, 27/10/2009)

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Em um momento que grande parte dos livros, jornais e revistas já se encontram disponíveis em versões eletrônicas e as editoras já promoveram uma corrida tecnológica para se readequarem a esta nova mídia, o STF (que, aliás, também caminha nesta trilha, aprimorando seus serviços eletrônicos, notadamente através da internet) ainda não reconhece a imunidade dos livros eletrônicos em real incongruência com a realidade atual e com o desiderato da norma constitucional.

Parece-nos que o STF tem confundido a questão da abrangência do conceito de livro em sua substancialidade para fins de imunidade tributária com problema de insumo que ensejaria a aplicação da famigerada súmula 657. Tal posicionamento de nossa corte mostra-se contraditório com os precedentes da casa que demonstram os valores que são albergados pela imunidade em estudo, conforme comprovam as decisões adrede apresentadas.

Além disso, restringir a imunidade ao papel cuja produção ocasiona sério danos ambientais e crivar com tributo aquela produção em formato eletrônico que desonera a natureza e pluraliza a cultura é algo totalmente ilógico, incongruente, caminhando de encontro às necessidades do planeta e da humanidade.

A leitura do dispositivo constitucional indica-nos que os livros, jornais e periódicos são imunes aos impostos. A conjunção aditiva “e” acrescenta um insumo como imune, qual seja o papel. No entanto, este insumo não limita o termo livro, de forma que somente os livros em papel sejam imunes. Ao contrário, o termo papel traduz o único insumo imune. Dentro desta ideia é que se desenvolveram os precedentes do STF que originaram a Súmula 657, estendendo a desoneração a outros insumos que se equiparariam ao papel. Conforme visto, é com fundamento neste raciocínio que o STF tem negado a desoneração aos livros eletrônicos. Portanto, salta aos olhos que a questão do conceito de livro para fins de imunidade não fora apreciada pelo Supremo.

Entendemos que é dado o momento para revisão do posicionamento do Supremo Tribunal Federal, devendo analisar a questão do livro eletrônico não como um insumo, ensejando a aplicação da Súmula 657; mas sim sob o prisma do alcance do conceito de livro para fins da imunidade inscrita na alínea d, do inciso VI, do artigo 150 da Constituição Federal.

Importante registrar que o Supremo, através do Plenário Virtual, reconheceu a repercussão geral do tema[4]. Desta forma, esperamos que a questão posta seja apreciada pelo plenário da corte, analisando-se o tema sob o prisma aqui proposto, em detrimento da aplicação cartesiana da súmula 657.

Saliente-se que a evolução jurisprudencial que se propõe coaduna-se com o próprio entendimento do STF, ao estabelecer os valores que são fundantes da imunidade em debate, conforme se observou nas decisões acima expostas.


Notas

[1] Expressando esta confusão é característico o julgamento realizado no RE nº. 285870.

[2] Nesse sentido: RE 174.897, RE 204.234, RE 174.476, RE 225.960, RE 203.859, RE 392.221.

[3] Em seu voto, o Desembargador Federal Relator destacou: “o CD-ROM, o disquete, assim como o papel, que apresentam um livro, um jornal, um periódico, acabado, sem dúvida alguma, é alcançado pelo referido dispositivo constitucional. Um livro gravado em disquete não deixa de ser um livro só por esta circunstância. Um periódico gravado em CD-ROM não perde a sua condição de periódico, pelo só fato da gravação em CD. O jornal que leio, via internet, jornal é. Ou não? Os livros da Lex - Jurisprudência do  Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais têm sido editados em CD-ROM. Deixam de ser livros, só por isto?”. 

[4] RE nº. 595.676/RJ. Decisão pela existência de repercussão geral (19/03/2010). Plenário Virtual: O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencidos os Ministros Joaquim Barbosa e Cezar Peluso. Não se manifestou a Ministra Cármen Lúcia.  


ABSTRACT: This article seeks to present the understanding of the Supreme Court regarding the immunity of electronic books, proposing changes to the current position of the court.

KEYWORDS: JURISPRUDENCE; STF; IMMUNITY; BOOK

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Felício

Procurador da Fazenda Nacional. Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo - USP. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Gama Filho - UGF. Especialista em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera - UNIDERP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FELÍCIO, Carlos Eduardo. Tratamento da imunidade do livro eletrônico pelo Supremo Tribunal Federal: por uma mudança necessária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3488, 18 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23488. Acesso em: 19 dez. 2024.

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