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Aplicação da coisa julgada material e da preclusão: semelhança quanto ao objeto das questões decididas e resistência diferenciada frente à lei nova processual

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14/02/2013 às 09:15
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IV – CONCLUSÃO

Em objetivas linhas, a respeito da atuação semelhante da coisa julgada material e da preclusão, a conclusão paupável é a de que, à luz da lógica aplicada para a coisa julgada, diante das similitudes dos institutos quanto à imutabilidade das quaestios enfrentadas no processo (reconhecida desde Chiovenda), descabe se falar em preclusão de motivos; sendo coisa diversa, e aí sim viabilizada pelo ordenamento jurídico (com exceção de decisum de natureza precária, em tutela de urgência), a imutabilidade da parte dispositiva das decisões interlocutórias quando da incidência sobre elas do fenômeno preclusivo.

Cogita-se, pois, aqui de aplicação próxima dos préstimos do art. 469, I do CPC, ao registrar que os motivos não se tornam imutáveis, mesmo que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva do decisum.

Já a respeito do segundo tema proposto – a resistência da preclusão e da coisa julgada material frente à entrada em vigor de novel legislação adjetiva – podemos concluir que parece haver sim resistência diferenciada frente à lei nova, conforme estudo de Chermont de Miranda – sendo fixado que somente a preclusão poderia ser desconstituída a partir de uma inovação legal que viesse a modificar o teor dos normativos sobre os quais se assentou a decisão judicial tomada.

No entanto, restou também fundamentado que, em nome da segurança jurídica e mesmo da efetividade da prestação jurisdicional – macro-princípios processuais nesse ponto em nada colidentes – tão somente em matéria de ordem pública, pela sua gravidade/repercussão suprapartes, poder-se-ia admitir a viabilidade de o magistrado proferir nova decisão interlocutória, diferente da primeira (já preclusa), em face da posterior modificação do texto da lei – como se dá, v.g., com a competência absoluta. Já em relação à lei de cunho meramente interpretativo, que é uma manifestação do legislador não tanto a declarar errada a interpretação anterior que vinha sendo feita, mas vetar que esta se faça, parece que aqui é feita uma clara opção pelo legislador, a ser seguida do momento em que tornada pública em diante (efeitos ex nunc) – razão pela qual não ousaríamos concluir pela resistência diferenciada, sendo razoável defendermos, também nesse cenário, a imutabilidade da decisão preclusa.


REFERÊNCIAS DOUTRINÁRIAS

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RUBIN, Fernando. A aplicação processual do instituto da prescrição in Revista Dialética de Direito Processual n° 105 (2011): 9/25.

RUBIN, Fernando. A preclusão na dinâmica do processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.

RUBIN, Fernando. A preclusão, a coisa julgada e a eficácia preclusiva da coisa julgada: interpretações em torno do art. 474 do CPC in Revista Dialética de Direito Processual n° 109 (2012): 36/47.

SATTA, Salvatore. Diritto processuale civile. 2ª ed. Padova: CEDAM, 1950.

SCARPINELLA BUENO, Cássio. Curso sistematizado de direito processual civil – Procedimento comum, Vol. 2, Tomo I. São Paulo: Saraiva, 2010, 3ª ed.

TESORIERE, Giovanni. Contributo allo studio delle preclusioni nel processo civile. Padova: CEDAM, 1983.

THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 38ª ed. V. I. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

TUCCI, Rogério Lauria. “Juiz natural. Competência recursal, preclusão pro iudicato. Violação de literal disposição de lei e ação rescisória” in Revista dos Tribunais n° 838 (2005): 133/148.


Notas

[1] Trataremos, assim, de maneira mais aprofundada e atualizada de questões originariamente abordadas em: RUBIN, Fernando. A preclusão na dinâmica do processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p.  79/85, especialmente.

[2] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual.  São Paulo: Malheiros, 2007, 2ª ed., p. 153/180.

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[3] CHIOVENDA, Giuseppe. “Cosa giudicata e preclusione” in Rivista Italiana per le scienze giuridiche n° 11 (1933): 3/53.

[4] CARNELUTTI, Francesco. Lezioni di diritto processuale civile. Vol. 4. Padova: CEDAM, 1933, p. 433.

[5] NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 36ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 519.

[6] ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil – Processo de conhecimento. São Paulo: Atlas, 2012, 2ª vol, p. 276.

[7] RUBIN, Fernando. A preclusão, a coisa julgada e a eficácia preclusiva da coisa julgada: interpretações em torno do art. 474 do CPC in Revista Dialética de Direito Processual n° 109 (2012): 36/47.

[8]  SCARPINELLA BUENO, Cássio. Curso sistematizado de direito processual civil – Procedimento comum, Vol. 2, Tomo I. São Paulo: Saraiva, 2010, 3ª ed. p. 418.

[9] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado. São Paulo: RT, 2011. 3ª ed. p. 449.

[10] THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 38ª ed. V. I. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 526/535.

[11] TUCCI, Rogério Lauria. “Juiz natural. Competência recursal, preclusão pro iudicato. Violação de literal disposição de lei e ação rescisória” in Revista dos Tribunais n° 838 (2005): 133/148.

[12] CHERMONT DE MIRANDA, Vicente. “Preclusão e coisa julgada” in Revista Forense n° 85 (1941): 419/420.

[13] “(...) Pertanto (lo abbiamo visto) come la finalità della preclusione si esaurisce colla chiusura del processo, così gli effeti della preclusione non eccedono i confini di questo. Mentre la cosa giudicata, che ha per fine la intangibilità della situazione delle parti in relazione al bene della vita che fu oggetto della domanda e della pronuncia, spinge i suoi effetti indefinitamente nel futuro. Ma la differenza si manifesta ancora in un aspetto di somma importanza, sebbene d’infrequente applicazione, ed è quello della diversa resistenza che la preclusione e la cosa giudicata oppongono al sopravvenire d’una legge nuova avente effetto retroattivo, come ad es. una legge interpretativa (...) Più coerente dal punto di vista logico, ma più sostanzialmente errata mi sembra l’opinione di Federico Cammeo. Il Cammeo argomenta dall’analogia fra la cosa giudicata e la preclusione; dal fatto che anche la preclusione ‘dà certezza alle facoltà giuridiche delle parti’ e che ‘essa sarebbe inoppugnabile sotto l’impero della legge interpretata’ anche se la questione fosse stata malamente decisa” (CHIOVENDA, Giuseppe. “Cosa giudicata e preclusione” in Rivista Italiana per le scienze giuridiche n° 11 (1933): 3/53. Especialmente p. 46).

[14] Daí o acolhimento de suas ideias por boa parte da doutrina italiana, cite-se: ANDRIOLLI, Virgilio. “Preclusione (diritto processuale civile)” in Novíssimo Digesto Italiano, XIII. Napoli: Utet, p. 567/570.

[15] D’ONOFRIO, Paolo. “Legge interpretativa e preclusione” in Rivista di Diritto Processuale Civile n° 10 (1933): 233/239.

[16] GRINOVER, Ada Pellegrini; CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 97/99.

[17] THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 38ª ed. V. I. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 18/19.

[18] LACERDA, Galeno. O novo direito processual civil e os feitos pendentes. Rio de Janeiro: Forense, 1974, p. 13.

[19] Explica-nos Galeno Lacerda que o CPC de 1973 mostra-se muito conciso em matéria de direito transitório: “limita-se a reproduzir, no art. 1211, o velho preceito, cuja origem remonta à Ordenança Francesa de 1363, de que a lei nova se aplica desde logo aos processos pendentes” (LACERDA, Galeno. O novo direito processual civil e os feitos pendentes. Rio de Janeiro: Forense, 1974, p. 11).

[20] Esse também é o entendimento de Tesoriere quando da análise da crítica de D’Onofrio ao posicionamento de Chiovenda em face da resistência da preclusão à lei nova (interpretativa), in verbis: “Per quanto concerne i rapporti tra preclusione e legge interpretativa sopravvenuta, D’Onofrio, condividendo l’ indirizzo espresso da Cass. 23 febbraio 1932, prende posizione contro la tesi sostenuta da Chiovenda: la legge interpretativa sopravvenuta non può incidere sulla preclusione formatasi nel corso del processo, perché anche questa reppresenta una certezza giuridica di pari natura di quella contenuta nel giudicato” (TESORIERE, Giovanni. Contributo allo studio delle preclusioni nel processo civile. Padova: CEDAM, 1983, p. 43).

[21] GIANNICO, Maurício. A preclusão no direito processual civil brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 106.

[22] RUBIN, Fernando. A aplicação processual do instituto da prescrição in Revista Dialética de Direito Processual n° 105 (2011): 9/25.

[23] LACERDA, Galeno. O novo direito processual civil e os feitos pendentes. Rio de Janeiro: Forense, 1974, p. 17/18.

[24] SATTA, Salvatore. Diritto processuale civile. 2ª ed. Padova: CEDAM, 1950. p. 164.

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Sobre o autor
Fernando Rubin

Advogado do Escritório de Direito Social, Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica. Mestre em processo civil pela UFRGS. Professor da Graduação e Pós-graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – UNIRITTER, Laureate International Universities. Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul – CETRA/Imed. Professor colaborador da Escola Superior da Advocacia – ESA/RS. Instrutor Lex Magister São Paulo. Professor convidado de cursos de Pós graduação latu sensu. Articulista de revistas especializadas em processo civil, previdenciário e trabalhista. Parecerista.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RUBIN, Fernando. Aplicação da coisa julgada material e da preclusão: semelhança quanto ao objeto das questões decididas e resistência diferenciada frente à lei nova processual . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3515, 14 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23716. Acesso em: 26 abr. 2024.

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