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Proposta de Emenda à Constituição nº 327/09: atribuição da competência penal à Justiça do Trabalho

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4 O Posicionamento dos Operadores do Direito do Trabalho da Comarca de Rio Verde/Goiás em Relação à PEC 327/2009.

Alguns profissionais atuantes na área do Direito do Trabalho, entre advogados, servidores da Justiça do Trabalho e Juízes do Trabalho foram questionados sobre alguns aspectos da Proposta de Emenda Constitucional 327/2009.

Perguntados sobre a eficiência e celeridade com que as Justiças Estadual e Federal têm desenvolvido a jurisdição Penal Trabalhista, 20% dos entrevistados consideraram sua atuação como péssima.  Outros 30% a consideraram ruim, 40% razoável e, apenas 10%, consideraram como ótima. Fica assim evidente a insatisfação dos profissionais com a atual competência das Justiças Federal e Estadual.

Sobre a importância de uma prestação jurisdicional Penal Trabalhista célere e eficaz para o avanço do País no que diz respeito à dignidade e qualidade do Trabalho, 90% dos questionados consideraram muito importante e 10% importante, sendo assim, unânimes em considerar a importância de um meio apropriado e eficiente no julgamento dos processos de natureza Penal Trabalhista. Nas palavras do Doutor Whatmann Barbosa Iglesias, Juiz do Trabalho do TRT[7] da 18ª Região:

“A questão da mudança de competência, é de uma parte, de natureza corporativa, (interesse da Justiça Comum em manter o poder de decidir, mesmo sendo incapaz de prestar um trabalho sequer razoável), como se pode verificar da análise da realidade atual”.

A grande maioria (90%) diz considerar a Justiça do Trabalho a mais adequada para a apreciação da matéria Penal Trabalhista. No que diz respeito à estrutura, as opiniões se dividem, sendo que 60% consideram que a Justiça Laboral já é suficientemente preparada para absorver a nova competência sem prejuízo da celeridade em sua prestação jurisdicional.

O Dr. Evandro Gomes Pereira, Diretor da Primeira Vara do Trabalho de Rio Verde/GO, adota posicionamento contrário à promulgação da PEC 327/2009, afirmando que:

“A atribuição da nova competência prejudicaria o principal objetivo da Justiça do Trabalho, que é a prestação célere e eficaz da prestação jurisdicional, visto que a Justiça do Trabalho já se encontra saturada pelo aumento em sua competência nos últimos anos, inclusive por força da EC 45/2009”.

Em relação aos Magistrados Trabalhistas, 80% dos questionados os consideraram preparados para o julgamento das ações de natureza penal, dizendo porém, ser importante que os juízes passem, antes, por cursos preparatórios, para possibilitar-lhes um conhecimento mais aprofundado sobre a matéria penal.


5 VIABILIDADE DA ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA PENAL À JUSTIÇA DO TRABALHO

5.1  Recursos Materiais e Humanos.

É notório que, quando da possível promulgação da PEC 327/2009, se farão necessários investimentos para possibilitar à Justiça do Trabalho a continuidade de seus serviços sem prejuízo de celeridade e eficiência. Com o aumento do número de demandas a receber, será imperioso a ampliação de estruturas físicas para o recebimento de Varas Penais Trabalhistas, caso assim seja feita a divisão administrativa. Será ainda necessário o treinamento de magistrados e servidores para lidarem com uma nova natureza processual, a qual possui procedimentos demasiadamente diversos dos quais estão acostumados a trabalhar no dia-a-dia em uma Vara do Trabalho.

Além disso, parece claro o surgimento da necessidade de contratação de novos servidores para ocuparem novos cargos nas referidas Varas, o que poderia acarretar a necessidade de realização de alguns certames de admissão pelos TRTs país afora.

Assim, é evidente o surgimento da necessidade de novas dotações orçamentárias à Justiça do Trabalho para o custeio dos gastos que a PEC 327/2009, após aprovada, trará.

5.2 A necessidade de preparação dos magistrados para atuar em uma nova área.

O processo trabalhista tem como um de seus mais fortes princípios o da proteção. Nas palavras de Delgado, (2007, p. 197-198):

[...] Informa este princípio que o Direito do Trabalho estrutura em seu interior, com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias, uma teia de proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o obreiro -, visando retificar (ou atenuar), no plano jurídico, o desequilíbrio inerente ao plano fático do contrato de trabalho.

Por outro lado, como norteador do processo penal, temos o princípio do in dubio pro reo[8]. Segundo Capez, (2010, p. 82), “se houver duas interpretações, deve-se optar pela mais benéfica; na dúvida, absolve-se o réu, por insuficiência de provas”.

É certo que os processos de natureza penal trabalhista terão, na maioria das vezes, o empregador como réu. Surge então a dúvida se seriam os juízes do trabalho, acostumados a decidir com base no princípio protetivo, suficientemente discernentes para, no momento de apreciar uma ação de natureza penal, se aterem aos princípios norteadores do processo penal, não havendo assim o risco de que se decida, em caso de dúvida, em favor do trabalhador, e pela condenação penal de um empregador, em discordância com o princípio do in dubio pro reo.

Gabriel Wedy, ex-presidente da AJUFE[9] adota o seguinte posicionamento:

[...]o juiz federal tem formação adequada para julgar esses crimes, pois desde o início da carreira estudam e trabalham com direito penal contribuindo com grande êxito no combate a impunidade no país, enquanto a formação do juiz do trabalho é diferente e está focada em outro tipo de demanda que nada tem haver com o direito penal. Os juízes do trabalho não são especializados em matéria criminal, é um grave erro transferir para eles o julgamento de ações desse tipo. (AJUFE. Wedy Defende na Câmara Inconstitucionalidade da PEC 327/2009. 03 out. 2011. Disponível em: <http://www.ajufe.org.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=4176:wedy-defende-na-camara-inconstitucionalidade-da-pec-3272009&catid=40:noticias>. Acesso em: 18 set. 2012).

Contudo, a carência de conhecimento dos magistrados trabalhistas na área penal, pode ser sanada por meio de cursos específicos para se nortearem de maneira diferenciada na decisão de processos penais, conforme a natureza destes exige, se livrando neste momento dos velhos hábitos adquiridos em anos de jurisdição cível trabalhista.

5.3 Principais Dificuldades Encontradas.

Após a análise do texto da Proposta de Emenda à Constituição 327/2009 e a oitiva de opiniões de profissionais atuantes na área do Direito do Trabalho, será feita, a seguir, uma perspectiva dos principais obstáculos e desafios que a possível aprovação da referida PEC trará ao sistema Judiciário Trabalhista.

Primeiramente nota-se a necessidade de uma destinação orçamentária para custeio de diversos gastos que deverão surgir com o aumento do número de demandas recebidas pela Justiça do Trabalho. Trata-se de ampliação de estruturas físicas, treinamento de pessoal para se relacionarem de forma adequada com a nova classe processual e ainda admissão de novos servidores para complementação do quadro funcional.

Há ainda que se falar na possibilidade já levantada de decisões sem a devida observância do princípio do in dubio pro reo, devido ao hábito dos juízes trabalhistas de decidir pautados pelo princípio protecionista. Contudo espera-se que, após um adequado treinamento, os magistrados estejam aptos a considerar o processo penal sob a égide garantista que lhe é peculiar e necessária.

Por fim, há de se considerar a possibilidade de uma sensível perda na celeridade habitual dos processos trabalhistas. Este problema deve ser corrigido com o tempo, através da ampliação da estrutura do judiciário trabalhista de forma geral, criação de varas especializadas para apreciação de processos penais trabalhistas e ampliação do quadro funcional.

5.2 Pontos Positivos Observados.

Por outro norte, são evidentes as vantagens que a aprovação da PEC 327/2009 trará para o ordenamento jurídico. Espera-se que os processos penais trabalhistas ao serem julgados na Justiça do Trabalho se desenvolvam de forma mais célere, com uma entrega da prestação jurisdicional mais eficaz através da efetiva aplicação das penas aos infratores, superando assim a atual morosidade com que estes processos são tratados. A demora no julgamento destas ações torna ineficaz a prestação jurisdicional tendo em vista a ocorrência comum de prescrição da pretensão punitiva do Estado, fator este, gerador de impunidade.

Devemos ainda considerar que a justiça do trabalho é a natural detentora da competência penal trabalhista, pelo simples fato de que é ramo especializado do judiciário destinado ao julgamento dos conflitos decorrentes da relação laboral. Assim, os magistrados trabalhistas estão intimamente habituados ao ambiente jurídico trabalhista, sendo conhecedores de tais relações, o que por certo os dará uma visão mais ampla de todo o contexto nas ações penais trabalhistas. Isto os possibilitará decidir de forma consciente e adequada em tais demandas.

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Todos esses avanços têm como finalidade precípua, em conjunto com a punição dos infratores dos crimes em comento, o caráter educativo da pena, visando assim a gradativa diminuição na prática dos crimes ligados à relação trabalhista.


6 CONCLUSÃO

Pela análise do atual contexto social brasileiro, percebe-se o quão grave é o problema dos crimes praticados no contexto da relação trabalhista em nosso país, mormente no que diz respeito ao trabalho em condições análogas às de escravo.

Os processos penais trabalhistas não têm recebido dos Judiciários Federal e Estadual o tratamento eficiente de que necessitam, clamando por uma solução que torne mais eficaz a jurisdição a eles referente e coloque fim à impunidade. A PEC 327/2009 traz a possível e provável solução para o problema, por meio da transferência da competência para julgamento de tais crimes para a Justiça do Trabalho.

Embora sejam previsíveis as dificuldades numa transição de tal magnitude para o judiciário, é possível vislumbrar formas de se contornar tais dificuldades. Com o necessário investimento e preparação de pessoal é certo que se conseguirá alcançar os objetivos propostos pela PEC 327/2009. Objetivos esses, aliás, de enorme importância para colocar fim às práticas que denigrem a imagem e honra do trabalhador brasileiro e destroem a vida de milhares deles.

Assim, aguarda-se ansiosamente pelo desenrolar da tramitação da PEC 327/2009 na torcida por sua aprovação.


Bibliografia:

AJUFE. Wedy Defende na Câmara Inconstitucionalidade da PEC 327/2009. Disponível em: <http://direito2.com/ajufe/2011/ago/3/wedy-defende-na-camara-inconstitucionalidade-da-pec-327-2009>. Acesso em 21 jul 2012.

ALENCAR, Marcos. Projeto quer dar competência criminal à justiça do trabalho. Trabalhismo em Debate, Disponível em: <http://www.trabalhismoemdebate.com.br/2009/03/projeto-quer-dar-competencia-criminal-a-justiça-do-trabalho/>.  Acesso em: 11 Dez 2011.

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BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. Disponível em:  <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em 05 Ago. 2012.

BRASIL. Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc45.htm>. Acesso em 17 Ago. 2012.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

CHISTORÁRO, Danilo Fernandes. PEC concede competência penal à Justiça do Trabalho. Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes. Disponível em: <http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2009032309261136&mode=print>  Acesso em: 21 jul 2012.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2007.

DELMANTO, C. et  al. Código Penal Comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2012.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

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Notas

[1] Organização Internacional do Trabalho.

[2] ‘A cabeça, ou parte superior de um artigo”. (CUNHA, Sérgio Sérvulo da, Dicionário Compacto do Direito – 7ª edição, Saraiva, 2008, p. 40).

[3] “Locução latina que designa a garantia constitucional do direito individual de locomoção ou permanência, turbado ou ameaçado por ilegalidade ou abuso de poder.” (ACQUAVIVA, Marcus Cláudio, Dicionário Básico de Direito Acquaviva – 5ª edição, Jurídica Brasileira, 2004, p. 151).

[4] Partido dos Trabalhadores – Rondônia.

[5] Partido Socialista Brasileiro – Mato Grosso.

[6] Partido Comunista do Brasil – São Paulo.

[7] Tribunal Regional do Trabalho.

[8] “Na dúvida julgue-se em favor do réu”. (CUNHA, Sérgio Sérvulo da, Dicionário Compacto do Direito – 7ª edição, Saraiva, 2008, p. 144).

[9] Associação dos Juízes Federais do Brasil.

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Sobre os autores
Rosângela de Paiva Leão Cabrera

Advogada, Graduada em Direito (Universidade de Rio Verde) e Ciências Contábeis (FESURV), Especialista em Direito Administrativo Contemporâneo (IDAG). Professora de Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho, Orientadora de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) do Instituto de Ensino Superior de Rio Verde – IESRIVER/Faculdade Objetivo

Wysller Morais Cabral

Advogado, Graduado em Direito (IESRIVER - Instituto de Ensino Superior de Rio Verde/Faculdade Objetivo).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CABRERA, Rosângela Paiva Leão ; CABRAL, Wysller Morais. Proposta de Emenda à Constituição nº 327/09: atribuição da competência penal à Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3593, 3 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24353. Acesso em: 27 abr. 2024.

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