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A Lei de Responsabilidade Fiscal em linhas gerais

Resumo:


  • A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) visa promover uma gestão fiscal responsável, exigindo transparência e planejamento na administração das receitas e despesas públicas, e é aplicável a todos os entes federativos do Brasil.

  • O artigo 42 da LRF impõe restrições à assunção de despesas nos últimos meses de mandato de um gestor público, visando prevenir que o sucessor herde obrigações financeiras sem o devido lastro financeiro.

  • A LRF também estabelece mecanismos de controle social, permitindo que a sociedade acompanhe e entenda as contas públicas, e promove a transparência por meio de audiências públicas e acesso às contas do Executivo.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

1)Lei de Responsabilidade Fiscal (L.R.F): Caracteres pontuais e suporte fático.

A L.R.F traz uma mudança institucional e cultural na gestão do dinheiro da sociedade. Através da introdução da restrição orçamentária na legislação pátria, rompe-se o liame da história político-administrativa da nação não se aceitando mais o convívio com administradores irresponsáveis, que em qualquer nível de governo, ao anematizarem suas administrações de hoje, eivam as futuras com mais impostos, menos investimentos ou mais inflação.

A L.R.F coíbe a postura danosa de gestores que gerenciam cofres públicos gastando mais do que arrecadam, deixando dívidas para seus sucessores e assumindo compromissos que sabem, de aviso prévio, não poderão adimplir. Portanto, o aumento de gastos deve estar coligado e diretamente proporcional a uma fonte de financiamento correlata.

A L.R.F é a Lei Complementar nº101, de 04/05/2000, que disciplina os arts.163 e 169 da Carta Política e objetiva ditar normas de finanças públicas voltadas para responsabilidade da gestão fiscal. È assim, o cuidado na arrecadação das receitas e na realização das despesas públicas, donde se imputa ao administrador a conduta transparente e planejada.

O texto legal é aplicável a todos os entes da federação. Tratando-se de uma Lei Complementar de caráter nacional. O dispositivo em tela sofreu influências externas e internas que basilaram seu suporte fático, observa-se a influência externa na adoção de práticas de gestão fiscal bem sucedidas em outro ordenamentos jurídicos ou até mesmo organismos internacionais. Exemplifica-se isto com o código de boas práticas para transparência fiscal influenciado pelo Fundo Monetário Internacional, ou com regras singularizadas extraídas das lições dos Estados Unidos e da Nova Zelândia. Dos americanos a L.R.F adotou a limitação de empenho (sequestration) e a compensação (pay as you go), mecanismos oriundos de uma lei chamada Budget Enforcement Act (BEA – 1990). Da Nova Zelândia veio o modelo de transparência que determina a publicação de diversos relatórios fiscais simplificados e enseja a participação da sociedade através do controle social. A legislação específica da Nova Zelândia foi o Fiscal Responsability Act (1994). Internamente, a L.R.F coaduna com as reformas constitucionais, especialmente as emendas constitucionais da reforma administrativa (EC nº19) e da reforma previdenciária (EC nº20).


2) A operacionalidade da L.R.F e seu art.42.

A L.R.F estabelece algumas restrições de final de mandato, com o objetivo de evitar que o futuro gestor assuma o ente estatal (União, Estado ou Município) desequilibrado financeiramente, tratando assim de forma específica da assunção de compromisso sem lastro financeiro, no final de mandato. A mais dura dessas restrições encontra-se no artigo 42, que dispõe sobre a obrigação de despesa contraída nos últimos meses de mandato, onde cada vez que se fazer uma despesa nova deverá ser feito um fluxo financeiro, envolvendo a receita e os encargos e despesas compromissadas a pagar até o final do exercício.

Um débito contraído fora desses oito meses, sem que haja disponibilidade financeira, vai passar para a gestão seguinte e sem ser alcançado pelo dispositivo. Mas se o débito foi oriundo de despesa contraída nos oito últimos meses, despesas de final de mandato – sem que tenha sido deixado dinheiro em caixa para pagar – estará descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal e vai ser alcançado também pela Lei de Crimes Fiscais.


3)A atitude do gestor.

O gestor que está iniciando o mandato deve fazer um triagem em relação aos restos a pagar. Fazer uma distinção entre aqueles que derivam de despesa processada e despesas não processadas, verificar a possibilidade de baixa de restos a pagar, verificar a confiabilidade daqueles que estão processados, se realmente aquele bem ingressou, se aquele serviço foi prestado, e aí, sim, ter a convicção daquilo que vai se pagar. Outra providência importante é fazer uma análise das despesas contraídas nos oito últimos meses da gestão passada e toda aquela despesa que tenha sido contraída sem ter sido deixado saldo financeiro em caixa. Encaminhar denúncia aos Órgãos competentes (Tribunais de Contas e Ministério Público), uma vez aquela despesa não poderia ter sido realizada. O gestor passado é quem vai ser responsabilizado por ela, inclusive podendo ser alcançado pela Lei de Crimes Fiscais.


4)As despesas irrelevantes.

O parágrafo 3º do artigo 16 da L.R.F exonera o gestor da necessidade de, ao criar ou aumentar despesa resultante da criação, expansão ou aperfeiçoamento da ação governamental, realizar o impacto orçamentário-financeiro e também de emitir declaração de compatibilidade da nova despesa com as peças orçamentárias, caso essa nova despesa seja considerada irrelevante.

O critério utilizado para conceituar despesa irrelevante é aquele estabelecido na Lei de Diretrizes Orçamentárias de cada ente. No entanto, a título de exemplo, a LDO da União para o ano de 2001 (Lei nº9.995 27/07/2000) assim dispõe:

Art. 73 – Para efeito do artigo 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal:

II – Entende-se como despesas irrelevantes para fins do § 3º, aquelas cujo valor não ultrapasse, para bens e serviços, os limites do inciso I e II do artigo 24 da Lei 8.666/93.

O critério utilizado pela União serve apenas como parâmetro para a aplicação nos Estados e Municípios, no entanto, as Leis de Diretrizes Orçamentárias desses entes é que vão estabelecer seus critério próprios.


5)O conselho de gestão fiscal.

O conselho de gestão fiscal é um conselho da mais alta relevância para a implantação da L.R.F. É responsável pela harmonização de procedimentos e tem, entre outros, o intuito de ser um grande fórum institucional permanente de discussão sobre questões referentes à Lei. Nesse aspecto, as principais atribuições do conselho são as seguintes:

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- Harmonização e coordenação entre os entes da Federação;

- Disseminação de práticas que resultem em maior eficiência na alocação e execução do gasto público, na arrecadação de receitas, no controle do endividamento e na transparência da gestão fiscal;

- Adoção de normas de consolidação da contas públicas, padronização das prestações de contas e dos relatórios e demonstrativos de gestão fiscal de que trata esta Lei Complementar, normas e padrões mais simples para os pequenos Municípios, bem como necessários ao controle social;

- Divulgação de análises, estudos e diagnósticos.

- Instituir formas de premiação e reconhecimento público aos titulares de Poder que alcançarem resultados meritórios em suas políticas de desenvolvimento social, conjugados com a prática de uma gestão fiscal pautada pelas normas da L.R.F.


6)A L.R.F versus as obras inacabadas.

A L.R.F criou restrições para inclusão de novos projetos na Lei Orçamentária Anual (LOA) e de créditos adicionais, sem aqueles projetos que se encontram em andamento estejam sendo adequadamente atendidos e as despesas de conservação do patrimônio também assim estejam, conforme dispuser a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Essa regra se encontra no artigo 45 da L.R.F. Perceba-se que não se trata de só poder incluir novos projetos depois de concluídos os em andamento.

Na realidade a restrição, ou requisito, é que aqueles projetos que se encontram em andamento, estejam sendo atendidos, ou seja, o seu cronograma de execução venha sendo cumprido.

Sem dúvida nenhuma, trata-se de medida moralizadora e salutar que impedirá a inclusão de novos projetos quando outros tenham sido paralisados.


7)O controle social.

Um dos pilares da L.R.F é a transparência. A transparência buscada pela lei tem por objetivo permitir à sociedade conhecer e compreender as contas públicas. Logo, não basta a simples divulgação de dados. Essa transparência buscada pela lei não deve ser confundida com mera divulgação de informações. É preciso que essas informações sejam compreendidas pela sociedade e, portanto, devem ser dadas em linguagem clara, objetiva, sem maiores dificuldades.

A transparência buscada pela lei tem por objetivo permitir um controle social mais efetivo, partindo do pressuposto de que, conhecendo a situação das contas públicas, o cidadão terá muito mais condições de cobrar, exigir, fiscalizar. Com esse objetivo, a própria lei estabelece alguns instrumentos importantes para incrementar o controle social.

O primeiro desses instrumentos consta do parágrafo único do artigo 48 da lei que assegura a participação popular e a realização de audiências públicas durante os processos de elaboração e discussão dos planos, Leis de Diretrizes Orçamentárias e orçamento. Logo, a participação popular e a realização de audiências públicas deverão ser incentivadas.

Um outro instrumento é o constante do artigo 49 que estabelece a obrigação de as contas apresentadas pelo chefe do Poder Executivo ficarem disponíveis durante todo o exercício, tanto no respectivo Poder Legislativo quanto no órgão técnico responsável por sua elaboração.

Qualquer cidadão ou instituição da sociedade pode consultar e ter acesso às contas do Chefe do Executivo. Durante todo o exercício essas contas deverão estar disponibilizadas.

Outro instrumento para o incremento do controle social é o contido no artigo 9º, parágrafo 4º da L.R.F que estabelece que até o final dos meses de maio, setembro e fevereiro o Poder Executivo demonstrará e avaliará o cumprimento das metas fiscais de cada quadrimestre, em audiência pública, na comissão referida no parágrafo 1º do artigo 166 da Constituição ou equivalente nas Casas Legislativas estaduais e municipais; ou seja, o Poder Executivo vai até o Poder Legislativo demonstrar e avaliar o cumprimento de metas fiscais de cada um dos quadrimestres.


8.Bibliografia

CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE (CFC). Lei de Responsabilidade Fiscal LRFácil – Guia Contábil da lei de Responsabilidade Fiscal. Brasília: CFC, 2000.

FIGUEIRÊDO, Carlos Maurício Cabral. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. Recife: Nossa Livraria, 2000.

GIAMBIAGI, Fábio e ALÉM, Ana Cláudia. Finanças Públicas, Teoria e Prática. 2 tiragem. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

KOHAMA, Hélio. Contabilidade Pública. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1993.

MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Responsabilidade Fiscal. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

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Sobre os autores
Aldem Johnston Barbosa Araújo

Advogado em Mello Pimentel Advocacia. Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE; Autor do livro "Processo Administrativo e o Novo CPC - Impactos da Aplicação Supletiva e Subsidiária" publicado pela Editora Juruá; Articulista em sites, revistas jurídicas e periódicos nacionais; Especialista em Direito Público.

Adelgício de Barros Correia Sobrinho

Professor universitário, Mestre em Direito Público pela FDR/UFPE e professor da Faculdade Estácio do Recife.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Aldem Johnston Barbosa ; CORREIA SOBRINHO, Adelgício Barros. A Lei de Responsabilidade Fiscal em linhas gerais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2522. Acesso em: 26 dez. 2024.

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