Artigo Destaque dos editores

Os novos direitos

Exibindo página 1 de 3
01/01/2002 às 01:00
Leia nesta página:

Sumário:1) Introdução. 2) Breve Visão do Direito no Tempo. 3) As Alterações da Sociedade da Nossa Época. 4) A Ciência Jurídica Atual e os Novos Direitos. 5) O Direito Comunitário Europeu. 6) Soluções dos Novos Fatos com os Velhos Sistemas Jurídicos. 7) O Direito do Consumidor. 8) O Direito Ambiental. 9) O Biodireito. 10) O Direito de Informação e o de Proteção Especial a Certos Sujeitos. 11) Fundamentos de Validade das Normas Jurídicas. 12) A Eterna Questão Epistemológica. 13) Conclusões.


1. Introdução

O assunto, ora desenvolvido, é um breve estudo sobre alguns aspectos dos novos direitos, surgidos das enormes transformações do mundo, nestes últimos anos.

A nova realidade da vida, por si só, afirma a importância do tema, que vem sendo tratado desde a filosofia do direito até o estudo do conteúdo dos princípios e das regras concretas, constantes de normatização interna e acordos internacionais.

Os novos direitos objetivam assegurar a todos garantias antes não reconhecidas, dentro da indispensável convivência social, necessárias à sobrevivência da sociedade organizada.

Matéria ainda delicada, os novos direitos estão em formação, estabelecendo agora seus princípios próprios, delimitando seus objetos, construindo os respectivos regimes jurídicos.

Ao tratar da questão não se pode deixar de levantar, ainda que superficialmente, algumas ocorrências geradoras das novas situações jurídicas, da globalização à tecnologia, passando pelos novos estilos de vida.

Os operadores jurídicos do nosso tempo devem se preparar para a solução dos novos problemas, que serão cada vez mais constantes e aflitivos. É absolutamente inacreditável que alguns continuem a raciocinar com velhos esquemas jurídicos para a solução de problemas atuais. As regras, princípios e estruturas jurídicas, que muito nos serviram no passado, são hoje absolutamente impotentes para enfrentar as incríveis ocorrências contemporâneas.

Não se ousa aprofundar no tema mas, apenas, tratá-lo mais conjuntamente, levantando alguns questionamentos, verificando como as novas questões têm sido enfrentadas e oferecendo algumas conclusões. O presente trabalho terá obtido resultado suficiente se aguçar o interesse para o estudo da matéria e até a iniciativa de pesquisas sobre o assunto.


2. Breve Visão do Direito no Tempo

Os direitos sempre refletiram os estágios de desenvolvimento das sociedades. Desde as mais remotas eras, apoiados na filosofia, como base das idéias, os direitos revelam os estilos e as vidas das sociedades.

Da Legislação Mosaica, do Código de Hamurabi, do Direito Romano, do Alcorão, da Magna Carta, da Revolução Francesa e da obra jurídica de Napoleão chegamos até as codificações chamadas modernas. Destas codificações, o Código Civil Brasileiro de 1916 constitui, inclusive, um bom exemplo de técnica de elaboração jurídica.

Não obstante, o tempo traz consigo a obsolescência das leis frente ao progresso social. Nem mesmo os princípios, com a plasticidade característica e necessária à interpretação e atualização do direito, conseguem, muitas vezes, dar solução aos fatos, que modificam a vida e a economia dos povos.

A cosmogonia dos direitos apresentou sempre uma filosofia como idéia e uma base empírica nas diversas elaborações jurídicas, quando se convertem em leis as necessidades sociais.

Muito se tem dito e escrito sobre o atual e vertiginoso desenvolvimento tecnológico do mundo. As mudanças tecnológicas e sócio-culturais, sobretudo dos últimos quinze anos, demonstram a velocidade inacreditável das alterações sociais, que acompanham o correr contínuo da roda da nossa história. Presentemente constitui realidade quase tudo que, anteriormente, somente se podia ver nos livros ou filmes de ficção científica.

Estas transformações do mundo atual, em uma velocidade incrível, estão produzindo o que tem sido chamado de "novos direitos". Cabe ao Estado, através do direito interno e ao conjunto das Nações, pelos Tratados ou Convenções, regular coativamente novas condutas, frente a questões, muitas delas, até então nem pensadas.


3. As Alterações da Sociedade da Nossa Época

O espetacular desenvolvimento já mencionado tem trazido novos estilos de vida, de família e de trabalho; uma economia nova e conflitos políticos aparentemente paradoxais.

As estruturas políticas convencionais estão ultrapassadas e incapazes de enfrentar a complexidade deste novo momento histórico. O Estado-nação passou a ser frágil para enfrentar os acontecimentos internacionais, da economia à criminalidade.

Este novo momento exige que os governos sejam os mais simples e, ao mesmo tempo, os mais eficazes e democráticos. O Estado-nação está sendo espremido por pressões de toda ordem. Há necessidade de se transferir o poder político para mais perto dos cidadãos e, ao mesmo tempo, para organizações transnacionais, em um verdadeiro agir local, pensar global.

A concentração de populações nas cidades maiores e nas megalópoles, esvaziando o campo, criou conseqüências em todas as áreas, seja no aspecto social, no da saúde pública, no urbanístico, no criminal e muitos outros.

O Direito está sendo convocado a inventar novas formas políticas, em face de que o Estado-nação se tornou impotente para muitos fins.

Desequilíbrios históricos até então existentes, por exemplo, entre produtores e consumidores demandaram, como demandam, a intervenção de um Direito especial.

A idéia de que os seres humanos devem ter o domínio sobre a natureza, originária do Gênese, teve que ser alterada, pelos enormes danos que se produziu no Planeta, alguns talvez irreparáveis.

Da nova imagem da natureza resultou um novo pensar, que exige um novo modo de agir, uma integração da humanidade com a Terra.

Uma nova biologia desponta, com um potencial que ainda não se pode mensurar. A engenharia genética é uma realidade das mais palpitantes. No campo das Ciências Exatas está aí a geometria fractual - a geometria da natureza, cuja propriedade fundamental é a variação à partir de uma mesma base. Refere-se ela a sistemas complicados, como os dos corais, das montanhas e das nuvens, onde há uma riqueza multiforme a partir de bases iguais (tamanhos finitos com formas infinitas).

A mística da maternidade e da paternidade foram postas em cheque. O implante de embriões, o crescimento de bebês in vitro, a possibilidade da escolha do sexo dos filhos, da geração de gêmeos e da programação da inteligência e personalidade já é realidade.

Em 1900, Machado de Assis lançou, com Dom Casmurro a síndrome de Capitu: Bentinho era ou não o pai de Ezequiel?

Essa síndrome atinge uma boa parte da população, segundo dados constantemente divulgados em Simpósios de Genética e Ética. Este fato deriva-se, principalmente, das mudanças ocorridas no comportamento humano e na inobservância da ética nas relações interpessoais.

Como o direito não pode se confrontar com o progresso da ciência e, podendo-se hoje provar a paternidade, através da utilização de métodos científicos avançados, não há como prevalecer antiquadas presunções jurídicas, em confronto com uma realidade nova e o direito fundamental da pessoa humana. A dúvida posta no romance de Machado de Assis, hoje é facilmente esclarecida, com grandes probabilidades de acerto, através do exame do DNA.

À medida que a homossexualidade se torna mais aceitável socialmente, realizam-se casamentos entre pessoas do mesmo sexo. O direito civil já vem enfrentando a dificuldade de se regular, adequadamente, a situação do grande número de pessoas vivendo juntas, sem se importarem com o formalismo legal.

Atualmente, no Brasil, a Lei 8971/94 regula o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão e a Lei 9278/96 reconhece como unidade familiar a união estável. De outro lado, o projeto de lei 1.115/95, em tramitação no Congresso, cuida de uma possível união entre pessoas do mesmo sexo.

A eletrônica, os computadores e a rede de Internet se difundiram com rapidez inacreditável, reformatando os negócios, a produção e o trabalho.

A validade dos contratos virtuais e a autenticidade da assinatura digital são assuntos que estão na ordem do dia, assim como a criminalidade da informática.

O surgimento de canais de comunicação eficientes e rápidos tornou a informação um bem jurídico, dos mais essenciais, em cada Estado e em todo o mundo, frente à complexidade atual da vida.

Serviços de informações de toda ordem, com transmissão de dados, notícias, previsões financeiras, de tempo e outras se tornam indispensáveis para a produção econômica, para o comportamento privado e até para as atividades dos órgãos dos governos. Todos anseiam continuamente por mais e mais informações atualizadas.

A humanidade enfrenta uma revolução criativa das mais profundas e no campo do Direito talvez, por isso, teremos que reescrever os sistemas legais e rever a epistemologia jurídica.


4. A Ciência Jurídica Atual e os Novos Direitos

Norberto Bobbio levanta a questão dos novos direitos1, partindo dos direitos humanos e considerando o avanço da eletrônica, da química, da física, da biologia, da cibernética e de outros ramos do conhecimento científico.

Assim, para fins de estudos didáticos, têm sido elencadas cinco gerações de direitos representativas dos avanços sociais:

1ª) a categoria dos direitos individuais, que pressupõem a igualdade formal perante a lei e constituem garantia do cidadão, diante da força cada vez mais descomunal do Estado;

2ª) a categoria dos direitos sociais, que procura inserir o sujeito de direito no contexto social, representando um compromisso sócio-ideológico do Estado em busca da justiça social;

3ª) a geração dos direitos transindividuais, compreendendo os coletivos e difusos, abarcando a proteção do consumidor, meio ambiente e outros valores considerados importantes para a vida da sociedade;

4ª) a geração dos direitos do patrimônio genético, relacionados à biotecnologia e bioengenharia, tratando de questões relativas à vida;

5ª) os direitos dos sistemas informatizados e de comunicação, que fizeram inclusive romper a noção de fronteira entre países e, também, a noção de tempo, tirando-nos a consagrada idéia de presente e passado.

Bobbio mostra, na obra mencionada, que tem se acelerado o processo de multiplicação dos direitos, em face do aumento de bens para serem tutelados, do crescimento dos sujeitos de direito e pela ampliação da proteção jurídica de certos sujeitos como a criança, o doente, o velho, etc.

Se dos direitos individuais passou-se aos sociais, a titularidade de muitos foi também estendida aos grupos (extensão da capacidade processual de agir) ou atribuída a sujeitos diferentes do homem como os animais, a natureza, etc.

Esses direitos, que são um produto das lutas históricas, oferecem um aumento da complexidade jurídica e, por si, às vezes, como os princípios sócio-ideológicos (dispositivos programáticos) ou os transindividuais, são ainda vagos ou heterogêneos.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Os novos direitos estão carecendo de uma teoria geral, que defina seus caracteres, significado e extensão, dentro de uma considerável uniformidade. Cabe à doutrina e à jurisprudência utilizando, muitas vezes, apenas princípios constitucionais, explícitos ou implícitos e Declarações ou Tratados, definir o sentido e estabelecer os limites destes direitos. Naturalmente esta definição se fará sempre com respeito aos direitos fundamentais, a proteção à dignidade, a proteção da personalidade e outros princípios basilares.

Juristas, como José Alcebíades de Oliveira Júnior2 e outros, afirmam que a ciência jurídica como está articulada não possui condições de dar conta destes novos direitos. Toma este autor, como exemplo, os direitos sociais para afirmar que a força do trabalho é hoje muito menos importante para o desenvolvimento que o fenômeno da globalização econômica, o da internacionalização do capital, o da comunicação, ou da tecnologia e da informação. Por isso mesmo, trabalhadores, em todo o mundo, estão aceitando, indefesos, a redução de suas conquistas no campo da relação de trabalho.

Esta situação colocou em crise o direito dos Estados-nações e a economia assumiu o poder, exigindo uma regulação transnacional.


5. O Direito Comunitário Europeu

Nasceu, pelas razões mencionadas, um Direito Comunitário europeu, sistema jurídico peculiar, objetivando que a qualidade de Estado da União Européia se mantenha em harmonia, podendo o direito comunitário operar automaticamente, no interior de cada Estado componente da União3. É o aparecimento de um novo direito com autonomia, pelo objeto específico e princípios próprios.

Esta aplicação do Direito Comunitário é feita com eficácia direta e primazia absoluta. A maioria das Constituições dos membros da União Européia faz a previsão expressa do exercício de competência em favor das instituições comunitárias. Outras Constituições, como a de Portugal, Holanda e Irlanda, mencionam aceitação expressa dos atos oriundos das instituições comunitárias.

Qualquer que seja a sistemática o resultado final é o mesmo: eficácia e primazia das regras comunitárias. Os Estados componentes da União Européia assumem a obrigação de dar plena eficácia ao Direito Comunitário.

É o aparecimento de uma estrutura jurídica-política nova, de caráter supra nacional. A União Européia surpreende o pensamento jurídico de até então. As categorias do Direito Constitucional e da Teoria Geral do Estado seriam ainda capazes de responder ao problema do direito e da política?

A União Européia tem avançado e esta experiência revela a necessidade de se repensar conceitos clássicos como o de Soberania e de Poder Constituinte. A teoria constitucional da atualidade já tem que enfrentar estes problemas. Existe uma Constituição Européia? Há uma soberania popular européia? Quem é o titular do Poder Constituinte na Europa?

Além da criação da cidadania da União Européia, complementar à cidadania nacional oriunda do Estado nacional, reconhece-se pelo Direito Comunitário europeu:

I – o direito de livre circulação e residência no território da União, proibida qualquer discriminação em razão da nacionalidade;

II – o direito de participação política no lugar da residência (para eleição tanto municipal como para o Parlamento Europeu);

III – proteção do cidadão da União Européia mesmo fora de seu território;

IV – direito de dirigir-se às instituições européias por violação do direito comunitário; direito de petição ante o Parlamento Europeu e de reclamação perante o Defensor do Povo Europeu.


6. Soluções dos Novos Fatos com os Velhos Sistemas Jurídicos

Sabe-se que as normas jurídicas que compõem o ordenamento jurídico de cada Estado podem assumir a configuração de regras concretas ou princípios. Os princípios representam diretrizes fundamentais irradiando seus efeitos, servindo de elemento de integração e interpretação de todo o sistema jurídico.

Os princípios, apesar de fluidos e indeterminados, passam por um processo de concretização sucessiva, através de subprincípios mais específicos ou da descrição fechada das regras. Situam-se estes entre os valores e as regras jurídicas e pela natural insuficiência de concretização não permitem a subsunção ou enquadramento dos casos concretos.

Frente aos casos específicos os princípios atuam de forma diferente das normas concretas, sendo aplicado um deles, em função de seu peso maior em face das circunstâncias do caso. Segundo Daniel Sarmento há uma ponderação entre os princípios e não a opção pela aplicação de um deles, em detrimento do outro. É necessário verificar o peso assumido pelo princípio no caso concreto, para verificar em que medida cada qual cederá passagem a outro4.

Embora não se possa criar princípios do nada, o reconhecimento de princípios implícitos resulta de um trabalho da doutrina e jurisprudência em face das necessidades práticas (princípio da proporcionalidade, da supremacia do interesse público, da constitucionalidade das leis, etc.).

Temas como a responsabilidade indenizatória, antes reservados ao direito civil, expandiram para o domínio do direito público, do direito individual para um direito coletivo, pertencente a uma categoria de pessoas ou para a amplitude do direito difuso, em campos novos como o do direito ambiental, direito do consumidor e outros.

A responsabilidade do Estado, alçada para o campo do direito administrativo, desenvolveu-se dentro de um regime jurídico próprio, a partir dos trabalhos de Duguit. A atual Constituição, objetivando maior abrangência empregou o termo agente, assim se entendendo qualquer pessoa a serviço do Estado.

Não obstante, atividades específicas de prestação de serviços públicos estão submetidas ao Código do Consumidor. Permissionários ou concessionários e empresas estatais (sociedade de economia mista e empresa pública) também se submetem ao mencionado Código, quando ocorrer relação de consumo.

Apesar de adotada a responsabilidade do Estado através da modalidade do risco administrativo, excepcionalmente, em face dos danos nucleares, a responsabilização é pelo sistema do risco integral (CF, art. 21, XXIII, c).

Admitida está a indenização por incômodos capazes de gerar danos ao particular, quando o Poder Público, mesmo no exercício de atividade regular exercitada, está na obrigação de ressarcir prejuízos oriundos de sua atividade. Vejamos o seguinte acórdão:

"Ao Município é lícito, com vistas ao bem comum, alterar o nível das vias públicas, mas deve ressarcir ao particular pelos danos que a obra pública ocasionar em prédios já existentes, construídos sob licenciamento e regular aprovação da prefeitura" (TJRS, 1ª. Câm.., 25.3.80, RJTJRS 81/399).

Há, como se sabe, uma enorme distância entre a efetividade social da norma ou princípio e sua eficácia jurídica. No campo do direito há uma grande quantidade de normas ideais ou programáticas que ainda não têm resultado em mudanças na realidade prática da vida.

Enquanto os fatos exigem solução e a ciência jurídica não os alcançou, a jurisprudência e a doutrina nacional e a estrangeira estão propondo soluções no sentido de se dar eficácia aos princípios ou normas programáticas. Em muitos casos cabe à jurisprudência resolver casos concretos, diante da ausência de normas concretas específicas. Em outros, certos direitos da mesma categoria, pertencendo a sujeitos diferentes, podem entrar em conflito, devendo-se verificar qual deve preponderar.


7. O Direito do Consumidor

O Código de Defesa do Consumidor, atingindo um campo específico e com princípios próprios decorreu de expresso mandamento constitucional. Com efeito, a Constituição de 1988 abrigou a defesa do consumidor como direito e garantia fundamental (art. 5º, XXXII). Além disso, dentro de um compromisso sócio-ideológico, decorrente do embate entre o capitalismo e o socialismo, incluiu-se a defesa do consumidor dentre os princípios da ordem econômica, ao lado da liberdade de iniciativa (art. 170, V).

Implantou-se no sistema jurídico nacional, para o campo das relações de consumo, uma política nacional única e uniforme. Deste modo, os princípios e normas do Código de Defesa do Consumidor são de ordem pública e interesse social. Tanto suas regras como seus princípios são de aplicação indispensável nas relações de consumo, quer individuais, coletivas ou difusas.

Este Código atualizou o direito com a sociedade de consumo, com a produção em larga escala para atendimento das massas de consumidores. No dizer expressivo de Sérgio Cavalieri Filho a codificação consumerista produziu um corte horizontal em toda extensão da ordem jurídica, fazendo permear suas normas por todos os ramos do direito público ou privado5. O Código alcançou as relações de consumo onde quer que se encontrem e, ainda, como lei mais nova, prepondera sobre as anteriores.

Esta codificação ampliou também sua abrangência equiparando ao consumidor todas as pessoas expostas às práticas comerciais e todas as vítimas do acidente de consumo (CDC art. 17 e 29).

Evitando possíveis dúvidas, definiu as categorias do consumidor e do fornecedor através de conceitos próprios, estabelecendo claramente o princípio do risco do empreendimento ou da vinculação por atuação na sociedade, chamado de princípio da confiança pela doutrina alemã.

Além do princípio básico da vulnerabilidade, outros princípios específicos do Direito do Consumidor, constantes inclusive do respectivo Código, podem ser apontados: o princípio da transparência (art. 4º); o princípio do dever de informar (art. 30/31); o princípio da vinculação da oferta com efeito difuso e multiplicado (art. 35).

Destaque importante tem este princípio da vinculação da publicidade (CDC art. 6º, IV, art. 18, art. 20, 30, 35, 36, 37 e parágrafo único do art. 38). Com efeito, a publicidade, em nosso sistema jurídico, não é mais mera prática comercial e sim fonte de obrigação.

Os nossos tribunais têm aplicado os princípios do Direito do Consumidor como se pode ver do seguinte julgado:

"Código de Defesa do Consumidor – Aplicabilidade de seus princípios em face de normas tradicionais do Código Civil – Anulação de negócio jurídico por erro de fato – Inaplicabilidade dos arts. 1.097 e 1056 do Código Civil.

Direito do Consumidor. Pedido de anulação de negócio jurídico consistente em promessa de cessão de fração de terreno e promessa de compra e venda de benfeitorias. Alegação de erro de fato da promissária cessionária e promissária compradora, ao se seduzir com publicidade veiculada na televisão, quando desejosa de adquirir um imóvel para morar. Senhora aposentada, inexperiente, desassistida e hipossuficiente, que comprometeu todas as suas economias e, ainda assim, logo constatou sua impossibilidade de responder pelas parcelas vincendas e agravadas do negócio que firmara. Rigor da sentença ao aplicar à hipótese as normas tradicionais do Código Civil, não dando, a despeito de questionados, o devido relevo aos princípios norteadores do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078 de 11.09.90), mormente em se tratando de contrato firmado já sob sua vigência (em vigor a partir de 11.03.91). Reforma da sentença de primeiro grau, para ser julgado procedente o pedido" (TJRJ, Ap. 2.134/92, 7ª Câm. Cív., j. 6-8-1992, rel. Des. João Carlos Pestana de Aguiar Silva, RDC, 17:235).

Em matéria de prescrição e decadência o Código de Defesa do Consumidor inovou também os conceitos, até então aplicados. Haverá decadência sempre que se tratar de vício do produto ou serviço (30 ou 90 dias – art. 26). Prescrição haverá sempre que se tratar de dano causado pelo fato do produto ou serviço, ou seja, acidente de consumo (prazo único de cinco anos, art. 27 do CDC).

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Terezinha Schwenck

procuradora municipal em Ipatinga (MG), mestranda em Direito pela UGF

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SCHWENCK, Terezinha. Os novos direitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2566. Acesso em: 22 nov. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos