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A função social e a inoponibilidade da exceptio non adimpleti contractus nos contratos públicos

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na atual conjectura, onde, para celebrar-se um contrato que atenda uma finalidade pública, não se demonstra mais justificável, após todo processo licitatório - mesmo quando inexigível ou dispensado por lei -, planejamento, previsão orçamentária, empenho, fiscalização, etc., a Administração Pública sustar sua contraprestação e exigir que o particular suporte sozinho por um determinado prazo a execução do contrato.

Ainda que recaia sobre o particular (pessoa física ou jurídica) a responsabilidade de não comprometer um serviço, obra pública ou fornecimento, tocando-se neste ponto a submissão ao princípio da continuidade, não há como retirar da Administração Pública – titular do serviço, bem ou obra -, salvo em situações excepcionais já previstas em lei, sua própria culpa quando escusa-se de cumprir sua prestação sem uma cabal fundamentação, ou seja, sem invocar a qualquer sombra o interesse público. Situação que deve autorizar de logo o particular a buscar o judiciário sem ser necessário suportar sozinho os ricos e ônus, posto que não pode rescindir unilateralmente o contrato, especialmente naqueles de prestação continuada.

A própria noção de interesse público não pode mais ser considerada absoluta, um remédio para todos os males dos gestores públicos, visto que a Constituição Federal estabelece garantias individuais que só podem ser restringidas por ela própria ou por um processo de ponderação de princípios diante de uma colisão de interesses, ou seja, ainda que se prevaleça o público, o privado não pode ser totalmente tolhido.        

Portanto, conclui-se que a inoponibilidade da Exceptio Non Adimpleti Contractus não encontra compatibilidade com a função social na medida que é aplicada de forma desmoderada.

Dada a importância dos objetos: serviços e obras públicas essenciais, o contrato administrativo típico, desde que se observe a razoabilidade e a proporcionalidade, deve permanecer com privilégios com fulcro na persecução do bem social, observando-se as garantias individuais. Porém, não há como sustentar tal vantagem perante os contratos da administração atípicos em relação à função social, pois há evidente afrontamento aos princípios norteadores dos contratos de direito privado, reforçando-se com o argumento de que os objetos dos contratos atípicos encontrarem-se amplamente no comércio e não são regidos pelo princípio da continuidade.

Outrossim, a rescisão unilateral do contrato por parte da Administração Pública com a necessária instauração de um processo administrativo, como vem exigindo a jurisprudência, aponta-se como um medida justa para se evitar abusos, pois, nem sempre a decisão de resolver o contrato antecipadamente, invocando a exceção e em seguida a rescisão unilateral, estaria realmente revestida de interesses públicos primários imaculados.


REFERÊNCIAS

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MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do direito administrativo. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007.

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SANTOS, Dennys Carneiro Rocha dos. Contrato administrativo e a aplicação da exceção do contrato não cumprido. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2242, 21 ago. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/13368>. Acesso em: 23 fev. 2012.


Nota

[1] Tendo em vista a presença da Administração, percebeu-se que nem todos os preceitos de teoria do contrato privado aplicavam-se ao contrato administrativo. Os aspectos que fugiam daquela teoria foram então denominados de cláusulas derrogatórias e exorbitantes do direito comum. Nessa expressão, direito comum significava sobretudo o direito civil; o termo “derrogatórias” expressava que tais cláusulas aboliam ou deixavam de lado preceitos vigentes para o contrato privado; o vocábulo “exorbitantes” significava que excediam ou se desviavam do direito privado. Com o tempo a expressão foi reduzida para cláusulas exorbitantes e se consagrou como tal, designando as notas características do contrato administrativo, os aspectos essenciais do seu regime jurídico (MEDAUAR, 2009, p.219).

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Sobre o autor
Luiz Gustavo de Oliveira Ramos

Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela FaSe, Faculdade Estácio de Sergipe, 2013, Aracaju (SE). Especialista em Docência no Ensino Superior pela FaSe, 2009. Graduado em Direito pela FaSe, 2011. Graduado em Sistemas de Informação pela UNIT, Universidade Tiradentes, 2005, Aracaju (SE).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Luiz Gustavo Oliveira. A função social e a inoponibilidade da exceptio non adimpleti contractus nos contratos públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3779, 5 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25678. Acesso em: 27 abr. 2024.

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