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A defesa no processo de execução e no cumprimento de sentença

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3. OBJEÇÃO AOS ATOS EXECUTIVOS

Não sendo atribuído efeito suspensivo à defesa apresentada ou sendo desacolhidos dos Embargos à Execução ou a Impugnação ao Cumprimento de Sentença, será dado início à realização dos atos executivos, assim considerados os procedimentos de constrição e expropriação patrimonial do devedor para a satisfação do quantum debeatur.

O início destes atos ocorre por meio da penhora, através da qual se opera a constrição dos bens do Executado bastantes para suprir o débito exeqüendo, tornando-os indisponíveis e depositando-os até a efetivação dos procedimentos expropriatórios ou da remição pelo devedor com o pagamento da dívida.

Em passo seguinte à efetivação da penhora, designar-se-á a competente hasta pública que comportará duas praças para a alienação judicial dos bens penhorados, sendo facultado ao credor proceder à alienação particular por sua conta, a adjudicação para si de tais bens ou a constituição de usufruto em seu favor até a satisfação de seu crédito.

Entretanto, caso algum destes atos estejam maculados por eventuais vícios ou não sejam realizados em estrita observância dos ditames legais a eles inerentes, poderão ser intentadas medidas tendentes a fulminá-los.

Diante disto, observa-se que, mesmo após o início da efetivação dos atos executivos, o devedor ainda poderá lançar mão de outros instrumentos de defesa com a finalidade de assegurar a lisura da execução e o acautelamento dos direitos que lhe são normativamente atribuídos.

3.1. Embargos à Penhora

Para que seja realizada a penhora de forma válida, o alvo da constrição deverá recair sobre os bens livres e desembaraçados integrantes do patrimônio do devedor.

Além disso, a realização do ato deve obedecer a todas as formalidades previstas em lei, especialmente no que tange à lavratura do auto respectivo e ao depósito dos bens penhorados.

Observando o descumprimento destas determinações legais, mormente quanto à existência de fatos impeditivos do ato constritivo em voga, o Executado poderá pleitear a sua desconstituição por meio de Embargos à Penhora, no qual poderá argüir a ausência ou nulidade da intimação, a impenhorabilidade do bem[7], a ausência de sua titularidade sobre a coisa de que é mero possuidor ou a ausência dos requisitos legais capazes de tornar nula a diligência.

Embora não haja disposição legal expressa acerca desta modalidade de embargos, esta é amplamente reconhecida pela doutrina, conforme evidencial o ensinamento inserido na obra do mestre Araken de Assis, ao preceituar que:

“Como o direito pátrio não distingue, no objeto dos embargos, a oposição de mérito e a oposição aos atos executivos, disciplinando-as em ações autônomas, o STJ reconheceu a admissibilidade dos embargos, nessas situações, tangente a aspectos formais.”[8].

No mesmo passo caminha a remansosa jurisprudência, que atribui pleno conhecimento a tal modalidade de oposição aos atos constritivos emanados da execução, como bem ilustram os julgados a seguir transcritos:

"EMBARGOS À PENHORA. IMÓVEL BEM DE FAMÍLIA. Deferimento, nos autos da execução, de expedição de mandado de constatação, para verificação da possibilidade de desmembramento do imóvel penhorado, sem descaracterizá-lo, de forma a possibilitar a penhora da parte desmembrada. Sentença proferida antes da conclusão da referida constatação. Cerceamento de defesa caracterizado. Sentença anulada, para que outra seja proferida, levando em consideração o auto de constatação. Apelo provido."[9].

“Embargos à penhora. Sentença que rejeitou liminarmente os referidos embargos, por reputá-los intempestivos. Descabimento. O caso dos autos não se trata de embargos do devedor, mas de simples insurgência da executada embargante contra a penhora de maquinário de sua propriedade. Inaplicabilidade do prazo previsto no art. 738 do Código de Processo Civil. Embargos à penhora opostos logo após a constrição do referido maquinário. Tempestividade reconhecida. Sentença reformada. Recurso provido.”[10].

Entretanto, é relevante frisar que estes embargos somente poderão ser manejados quando o ato constritivo não houver sido efetivado continuamente à citação, visto que, nesta hipótese, os vícios que eventualmente maculem a penhora deverão constituir matéria de defesa nos embargos do devedor, sob pena de preclusão da matéria.

Destarte, acolhendo as razões dispostas pelo Embargante, o juiz declarará a nulidade da penhora, determinando a baixa de todas as restrições dela eventualmente advindas e a realização de nova constrição sobre outros bens; ou, rechaçando os fundamentos esposados, sustentará a manutenção do ato e, por se tratar de decisão interlocutória, poderá ser impugnada por meio do recurso de Agravo na forma instrumental.

3.2. Impugnação à Avaliação

Efetivada a penhora e julgadas todas as questões eventualmente sobre ela incidentes, passa-se à avaliação dos bens penhorados para a correta e adequada aferição do valor destes.

Esta avaliação, via de regra, é realizada por um Oficial de Justiça Avaliador, sendo que, na impossibilidade deste por quaisquer limitações de ordem técnica ou mercadológica, o juiz nomeará um perito que procederá com tal análise, salvo nos casos em que o Exeqüente concordar com o valor atribuído aos bens pelo Executado ou o bem penhorado contar com cotação na Bolsa de Valores, hipóteses nas quais serão considerados os valores objeto da concordância ou da cotação.

Ao efetuar este ato, o avaliador deve proceder com independência, considerando os critérios objetivos e subjetivos da coisa examinada para obter a valoração mais próxima possível do mercado.

Todavia, sendo constatado algum erro ou o dolo do avaliador na valoração dos bens penhorados, bem como se houver fundada dúvida quanto ao valor atribuído ou este tenha sofrido alterações após a avaliação, tanto o Executado como o Exeqüente poderão contestar o ato avaliativo por meio de Impugnação à Avaliação, com escopo na prescrição normativa emanada do artigo 683, do Código de Processo Civil.

Com isso, ao apreciar esta impugnação, o juiz poderá determinar a realização de nova avaliação caso acolha os fundamentos ventilados pelas partes ou, se rejeitá-los, homologará a avaliação efetuada de iniciará a efetivação dos atos expropriatórios, pontuando que em face desta decisão poderá ser tirado o competente recurso de Agravo por instrumento.

3.3. Embargos à Arrematação ou à Adjudicação

Com a validação da penhora e da avaliação realizadas, inicia-se a implementação dos atos expropriatórios tendentes à efetiva satisfação do débito exeqüendo, compreendidos por adjudicação, alienação pública ou particular e constituição de usufruto.

‘A adjudicação consiste na tomada dos bens penhorados pelo próprio Exeqüente para satisfazer o seu crédito, sendo que, em caso de o valor dos bens penhorados for inferior ao débito, a execução prosseguirá pelo saldo restante; mas, sendo superior, o Exeqüente deverá efetuar a restituição do excedente ao Executado.

Quanto à alienação, esta compreende a venda do bem a terceiros por iniciativa do próprio Exeqüente ou por meio de leilão em hasta pública, no qual o objeto da penhora poderá ser arrematado pelo maior lance obtido, desde que não seja considerado como vil.

Já no tocante à constituição de usufruto, sua função será a utilização do bem pelo Exeqüente durante o tempo necessário à satisfação do seu crédito, com a posterior restituição ao Executado, desde que requerido pelo credor e o juiz entender que seja a medida menos gravosa ao devedor e hábil ao adimplemento do quantum debeatur.

Nesta toada, da mesma forma que ocorre nos atos antecedentes, o Executado também poderá se opor à efetivação da arrematação ou da adjudicação por meio de Embargos, também conhecidos como Embargos de Segunda Fase[11], desde que a pretensão esteja fundada na nulidade da execução ou em alguma causa extintiva da obrigação em que esta se embasou, como, por exemplo.

Por óbvio, esta modalidade de defesa somente é cabível nas execuções por quantia, uma vez que, como é cediço, somente nestas é que pode ocorrer

Além disso, a arrematação também poderá ser desconstituída se ocorrer alguma das seguintes hipóteses:

- Por vício de nulidade;

- Se não for pago o preço ou se não for prestada a caução;

- Quando o arrematante provar, nos 5 (cinco) dias seguintes, a existência de ônus real ou de gravame (art. 686, inciso V) não mencionado no edital;

- A requerimento do arrematante, na hipótese de embargos à arrematação (art. 746, §§ 1º e 2º);

- Quando realizada por preço vil;

- Quando o senhorio direto, o credor com garantia real ou aquele com penhora anteriormente averbada, que não seja de qualquer modo parte na execução, não tenham sido cientificado, por qualquer modo idôneo e com pelo menos 10 (dez) dias de antecedência, da execução.

A oposição destes Embargos à Adjudicação ou à Arrematação obedecerá ao prazo de 05 (cinco) dias da data do ato impugnado, mas antes da assinatura da respectiva Carta.

Em sede decisória, caminhando no sentido de acolhimento dos Embargos, o juiz poderá tornar sem efeito a arrematação ou a adjudicação e determinar novo praceamento do bem ou a remoção da constrição, conforme o caso.

Contudo, na hipótese de seu entendimento enveredar por trilha diversa, o juiz rejeitará os Embargos e a expropriação subsistirá, culminando na extinção da execução ou no prosseguimento desta em relação a eventual débito remanescente, caso o valor arrecadado não seja suficiente para satisfazer o crédito do Exeqüente, bem como na restituição da quantia sobressalente da execução em relação ao débito exeqüendo.

3.4. A Defesa do Terceiro Prejudicado

Durante a efetivação dos atos executivos, existe também a possibilidade de as constrições e expropriações patrimoniais trazidas a efeito atingirem, de forma indevida, bens pertencentes a terceiros alheios à relação jurídica inserida na demanda executiva, sejam estes senhores ou apenas possuidores.

Esta é a hipótese que se observa, por exemplo, na realização dos atos executivos sobre o patrimônio de algum dos seguintes sujeitos:

- Proprietário de bem confiado à posse do Executado, a qualquer título;

- Titular de crédito com garantia real sobre bem do Executado;

- Credor beneficiário de penhora anteriormente averbada;

- Um dos cônjuges sobre execução promovida em face do outro, salvo nos casos de dívida comum;

- Condômino, salvo nos casos de dívida comum;

- Nu-proprietário em relação ao bem cedido em usufruto na execução movida em face do usufrutuário.

Além disso, também vale pontuar que são equiparados aos terceiros o cônjuge que defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua meação; bem como a parte que, embora figure na demanda, defenda bens que, por sua natureza ou forma de aquisição não possam ser atingidos pela apreensão judicial.

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Nestas hipóteses, o terceiro atingido indevidamente pelos atos executivos também disporá do meio próprio para a defesa do seu patrimônio, com a demonstração em Juízo da inexistência de liame jurídico entre o(s) bem(ns) atingido(s) e o débito exeqüendo ou da impossibilidade de constrição, por meio da oposição de Embargos de Terceiro, nos moldes dos artigos 1.046 e seguintes do Código de Processo Civil.


4. AÇÕES PREJUDICIAIS À EXECUÇÃO E AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

Além das espécies próprias de defesa no processo de execução e no cumprimento de sentença explicitadas anteriormente, existem também determinadas ações que podem, de forma reflexa ou imprópria, constituírem um meio de defesa do executado.

Sob este enfoque, observa-se a ação declaratória de inexigibilidade de débito ou de inexistência de relação jurídica, a qual poderá ser manejada com o objetivo de declarar a insubsistência de um débito ou de um liame obrigacional emanado de um título executivo.

Uma vez julgado procedente o pedido formulado nestas demandas, caso já iniciada a execução do título fulminado, a demanda executiva deverá ser extinta pela perda superveniente do objeto.

Em passo seguinte, também se observa a mesma hipótese no caso da ação anulatória proposta no sentido de desconstituir o título em virtude de algum vício que o permeie por alguma espécie de nulidade ou anulabilidade, como ocorre, por exemplo, naqueles emitidos com o consentimento viciado.

Com isso, decretada a anulação do título executivo embasador da ação de execução, também resta evidente que não haverá outro desfecho possível senão a sua extinção.

Já no tocante ao cumprimento de sentença, a primeira demanda capaz de obstar o seu prosseguimento é a ação rescisória proposta no sentido de rescindir a decisão que constituiu o título judicial exeqüendo.

Neste caso, sendo julgado procedente o pleito rescisório, a decorrência lógica será a extinção da fase executiva desencadeada pelo decisum rescindido.

No mesmo passo, também se observará a querela nullitatis insanabilis proposta com o objetivo de anular a demanda que gerou o título executivo judicial em virtude de nulidade insanável que macule o processo, consubstanciada, por exemplo, na citação efetivada com inobservância dos requisitos legais essenciais à sua validade.

Deste modo, a procedência do pedido resultará na anulação de todo o processado no feito impugnado, razão pela qual a sua decisão final será desconstituída e, por decorrência lógica, a fase executiva será fulminada.

Portanto, resta evidenciado que, além das modalidades próprias de defesa do executado na ação de execução e no cumprimento de sentença, também é possível observar a preservação do direito que lhe acolhe por meio de ações autônomas que, tramitando paralelamente à demanda executiva, poderão rechaçá-la face ao seu caráter prejudicial sobre o título exeqüendo.


CONCLUSÃO

À vista de todo o discurso ventilado ao longo do presente trabalho, foi possível observar que, embora o processo de execução e o cumprimento de sentença tenham um trâmite notavelmente mais encurtado em relação às demais espécies processuais, posto que seu único objetivo é compelir o devedor a adimplir com uma obrigação previamente constituída e dotada de executividade, é disponibilizada ao Executado uma grande gama de modalidades defensivas para que se evite a prática de atos executivos abusivos ou permeados por ilegalidade.

Com isso, restou demonstrado que, além das espécies clássicas de defesa previstas no Diploma Processual Civil (Embargos do Devedor e Impugnação ao Cumprimento de Sentença), a doutrina nos mostra que também há a possibilidade de objeção a todos os atos executivos praticados no processo, tais como a penhora, a avaliação, a arrematação e a adjudicação.

Destarte, está evidenciado que mesmo no processo de execução e no cumprimento de sentença observa-se a presença do contraditório e da ampla defesa, corolários constitucionais irradiados do devido processo legal, que devem ser respeitados ainda que o objetivo do feito resida exclusivamente na execução de uma obrigação revestida por liquidez, certeza e exigibilidade imediata.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, 7ª ed.

BELTRAME, José Alonso. Dos Embargos do Devedor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, 3ª ed.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2009, v. 4, 3ª ed.

NEGRÃO, Theotonio; GOUVÊA, José R. F.; BONDIOLI, Luis G. A.; FONSECA, João F. N. da. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São Paulo: Saraiva, 2012, 44ª ed.

NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa M. de A. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, 10ª ed.


Notas

[1] in “Instituições de Direito Processual Civil”, p. 31.

[2] Vide o artigo 585, do Código de Processo Civil.

[3] De acordo com a Súmula n° 279, do Superior Tribunal de Justiça, “é cabível execução de título extrajudicial contra a Fazenda Pública”.

[4] O artigo 475-N, do Código de Processo Civil traz em seu bojo o rol dos títulos executivos judiciais.

[5] Nesta hipótese, observa-se a intimação na pessoa do patrono do devedor ou na própria pessoa deste caso não esteja assistido por advogado, ao invés da citação própria do processo de execução.

[6] Vide o artigo 475-L, do Código de Processo Civil.

[7] São considerados impenhoráveis, sem prejuízo de outros emanados da legislação extravagante, os bens dispostos no artigo 649, do Código de Processo Civil; o bem de família, previsto na Lei n° 8.009/90; as verbas oriundas de constituição de renda; os bens gravados com cláusula de impenhorabilidade por ato inter vivos ou causa mortis e os bens particulares de um dos cônjuges em face da execução promovida em face do outro, desde que aquele não haja concorrido para a constituição da dívida. Entretanto, existem hipóteses em que esta impenhorabilidade pode ser mitigada, como ocorre, por exemplo, no pagamento de dívidas propter rem ou oriundas de prestação de alimentos.

[8] in “Manual do Processo de Execução”, p. 1125.

[9] TJSP. 24ª Câmara de Direito Privado. Apelação nº 0002999-19.2009.8.26.0063. Relator: Desembargador Salles Vieira. Julgado em 26/06/2013. Publicado no DJe em 05/07/2013.

[10] TJSP. 13ª Câmara de Direito Privado. Apelação nº 0121733-31.2008.8.26.0008. Relator: Desembargador Francisco Giaquinto. Julgado em 26/06/2013. Publicado no DJe em 27/06/2013.

[11] in “Dos Embargos do Devedor”, p. 227.

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Sobre os autores
Marco Antônio Passanezi

Advogado em São Paulo/SP. Pós-Graduado em Direito Processual Civil - Universidade Nove de Julho/SP. Formação Executiva em Técnicas Legislativas e Redação Normativa - Universidade Nove de Julho/SP. Bacharel em Direito - Universidade Nove de Julho/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PASSANEZI, Marco Antônio ; SÍGOLI, Diego et al. A defesa no processo de execução e no cumprimento de sentença. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3825, 21 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26212. Acesso em: 19 abr. 2024.

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