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Direito à greve no serviço público civil e os novos desafios da assessoria jurídica sindical

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27/02/2014 às 16:50
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4.0 – Da necessidade de uma boa assessoria jurídica sindical:

Diante desse quadro cada vez mais complexo e conturbado, reforça-se a necessidade de uma boa assessoria e consultoria jurídica sindical.Lógico que não para definir os rumos a serem tomados por qualquer categoria, mas para esclarecer os reais riscos envolvidos em cada ato a ser empreendido, bem como analisar a viabilidadejurídica dos pleitos ou mesmo recomendar os procedimentos a serem adotados com vistas à produção de prova do preenchimento dos requisitos indispensáveis à legitimidade da deflagração de greve. Ou seja, advogados que, mais do que defender o sindicato perante o Judiciário, atuem profilaticamente, protegendo-o e aos respectivos seguidores de serem levados ao poder Judiciário.

Tudo isso de modo a salvaguardar tanto a entidade e respectivos diretores quanto àqueles que, acreditando na luta, venham a aderir aos seus movimentos. Do que se vislumbra ser extremamente temerário a qualquer sindicato constituir e/ou acionar um advogado somente para visar os atos constitutivos ou ante as intempéries da luta classista como, por exemplo, o corte do salário durante a ocorrência de greve e a promoção da defesa em procedimentos administrativos, dentre outros.

E, com o advento da Emenda Constitucional número 45/2004, em especial no que concerne ao instituto da repercussão geral, incluído no artigo 102, §3º da Lei Maior como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário perante o Supremo Tribunal Federal, sobretudo devido ao seu efeito multiplicador, a partir do qualo que for decidido com reconhecimento de repercussão geral aplicar-se-á a todos os processos idênticos, faz-se necessária uma assessoria capaz de identificar demandas que requeiram e permitam a atuação da entidade na condição de amicuscuriae.

Destarte, por exemplo, caso o STF posicione-se pela legalidade do desconto no vencimento de servidores públicos dos dias não trabalhados em virtude de greve, tal entendimento será obrigatoriamente aplicado a todos os casos relacionados à matéria, dificultando em muito a deflagração destas.Lógico que ressalvada a improvável hipótese de que uma lei posterior venha a dispor em contrário vedando o aludido desconto.

Portanto, nada mais natural supor que essa nova realidade acabará influenciando as formas de atuação das entidades representativas que cada vez mais serão impelidas a atuarem como amicuscuriae em processos com repercussão geral cujos efeitos reflitam sobre os interesses dos respectivos representados.

Sobre o referido instituto, de forma bastante didática, leciona Cavalcante[8] (2013; n.p.) que:

Amicus curiae é alguém que, mesmo sem ser parte, em razão de sua representatividade, é chamado ou se oferece para intervir em processo relevante com o objetivo de apresentar ao Tribunal a sua opinião sobre o debate que está sendo travado nos autos, fazendo com que a discussão seja amplificada e o órgão julgador possa ter mais elementos para decidir de forma legítima. 

Percebe-se então a necessidade de que os sindicatos, mais do que uma assessoria contenciosa e consultiva, mantenham uma com atuação proativa, identificando os temas que eventualmente sejam reconhecidos como de repercussão geral, comunicando aos assessorados com a análise dos possíveis efeitos futuros para que verifique a conveniência de pugnar pela intervenção no processo, sob pena de deixar indefesos aos representados cujos interesses e opiniões não serão defendidos e, consequentemente, não serão levados em conta quando da prolação da decisão.

Sempre tendo em mente que a partir do julgamento de agravo regimental na ADI 4.071 (Relator Ministro Menezes Direito, DJe de 16.10.2009), o STF firmou entendimento de que a admissão da intervenção de terceiros na qualidade de amicus curiae tem por limite a data de liberação do processo para a pauta e que quanto mais cedo se der o ingresso, em tese, maior será a possibilidade de intervir efetivamente no resultado da demanda. Reconhecendo-se que tal entendimento já foi mitigado em algumas oportunidades para permitir o ingresso tardio de entidades de caráter nacional.

Entretanto, apesar da miríade de centrais sindicais, confederações, federações, sindicatos, partidos políticos e associações de âmbito nacional existentes e atuantes no país, ainda não se verificou a iniciativa em massa de ingresso destes na condição de amicuscuriae nos processos comrepercussão geral já reconhecida, a exemplo do reiteradas vezes mencionado Tema nº 531, cujo deslinde poderá definir os rumos da atuação sindical representativa de servidores públicos nos próximos anos. Realidade que certamente será discutida e reconsiderada tão logo as categorias de servidores comecem a sofrer os efeitos das decisões de processos de cuja existência desconheciam e perante os quais os respectivos representantes permaneceram inertes, seja por quais motivos forem.


5.0 – Considerações finais:

Inequívoca, portanto, a necessidade de adequação da atuação dos sindicatos e associações representativas de servidores públicos, sobretudo no acompanhamento e intervenção dos processos perante o STF reconhecidos como de repercussão geral, uma vez que a inércia poderá trazer sérias consequências a todos os representados.

Nesse diapasão, torna-se cada vez mais indispensável a manutenção de uma boa assessoria jurídica. Mas não apenas para a atuação contenciosa e consultiva, mas,sobretudo, proativa. Capaz de identificar demandas que potencialmente sejam do interesse dos assessorados e capacitada para atuar caso tal mostre-se conveniente e oportuno. Assim, faz-se também necessária a adequação dos profissionais que atuam prestando tais serviços a sindicatos e associações à nova realidade, sobretudo no tocante à proatividade e atualização. Até porque a propositura legislativa correta, bem como a atuação adequada em processos de repercussão nacional, na mesma medida em que garantem visibilidade, prestando-se a demonstrar força, competência e diligência. Desta forma, no mínimo, abrindo portas de diálogo. Podendo inclusive ser o fator diferencial para o sucesso frente às demandas que se apresentem.

Assim, nesse contexto, de um lado impõe-se a justa e meritória referência ao Sindicato dos Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo e ao Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário no Estado de Sergipe, cujas sugestões apresentadas perante a Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, foram convertidas, respectivamente, nos Projetos de Lei nº 6775/2002 e 3670/2008 versando sobre o exercício de greve dos servidores públicos. Na mesma medida em que também se impõe a manifestação de estranheza, dada a relevância da matéria,de não haver nenhuma sugestão apresentada por entidade representativa de trabalhadores de âmbito nacional, notadamente as confederações e centrais sindicais, ou mesmo de âmbito regional como as federações. Realidade também repetida nos processos com repercussão geral perante o STF, onde ainda é insipiente a atuação das referidas entidades.

Por fim, mas longe de pretender esgotar a complexidade do tema, reitera-se que é cada vez mais urgente e necessário o investimento dos sindicatos e associações representativos de servidores públicos em assessorias jurídicas comprometidas e capacitadas para fazerem frente às novas demandas do sindicalismo moderno, sobretudo diante da crescente tendência de limitação, quando não a vedação, ao uso de recursos tradicionais do movimento classista, em especial o direito de greve.


APÊNDICE

Projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional sobre o direito de greve dos servidores públicos (atualizado até 01/02/2014).

·                    SENADO FEDERAL

Autoria

Data de apresentação

Link para acompanhamento

84/2007

Paulo Pain (PT)

08/03/2007

http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=80132

710/2011

Aloysio Nunes Ferreira (PSDB)

30/11/2011

http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=103493

120/2013

Lindbergh Farias (PT)

10/04/2013

http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=112209

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·                    CÂMARA DOS DEPUTADOS:

Autoria

Data de apresentação

Link para acompanhamento

4497/2001

Rita Camata(PMDB)

1704/2001

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=27779

5662/2001

Airton Cascavel (PPS)

01/11/2001

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=36171

6032/2002

Poder Executivo

17/01/2002

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=44188

6141/2002

Iara Bernardi (PT)

26/02/2002

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=44625

6668/2002

Elcione Barbalho (PMDB)

30/04/2002

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=50540

6775/2002

Sugestão do Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo

13/05/2002

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=51525

1950/2003

Eduardo Paes (PSDB)

10/09/2003

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=132481

981/2007

Regis de Oliveira

08/05/2007

http://www.camara.leg.br/sileg/Prop_lista.asp?Pagina=2&sigla=PL&Numero=&Ano=&Autor=&OrgaoOrigem=todos&Comissao=0&Situacao=&dtInicio=&dtFim=&Ass1=greve&co1=+AND+&Ass2=&co2=+AND+&Ass3=&Submit=Pesquisar&Relator=&pesqCompleta=1

3670/2008

Sugestão do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário no Estado de Sergipe

03/07/2008

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=403321

4276/2012

Arnaldo Faria de Sá (PTB)

07/08/2012

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=552612

4532/2012

Policarpo (PT)

11/10/2012

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=556888

Obs.: todos os projetos de lei da Câmara dos Deputados encontram-se apensados ao PL nº4497/2001.


Notas

[1] - CF/88, art. 37 omissis. VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica. (redação dada pela EC nº 19/1998)

[2] - Aeroviários devem manter 80% dos trabalhadores fora da greve – TST. Disponível em: http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/6694537 Acesso em 21/12/2013.

[3] - Aeronautas cancelam greve em todo o país. Disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/12/19/aeronautas-aceitam-acordo-e-decidem-cancelar-greve-em-todo-pais.htm Acesso em 21/12/2013.

[4] - Contenção nº 87/OIT, disponível em http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/conv_oit_87_dir_sindical.htm Acesso em 29/01/2014.

[5] - Publicada em 1993 pela OIT e Ministério do Trabalho em 1993 e disponível em: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/union_freedom/pub/principios_comite_liberdade_sindical_287.pdf Acesso em 29/01/2014.

[6] - BRASIL, Decreto nº 7.944, de 06 de março de 2013. Promulga a Convenção nº 151 e a Recomendação nº 159 da OIT sobre as relações de trabalho na Administração Pública. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D7944.htm Acesso em 29.01.2014.

[7] - STF – RE 693456 Relator Min. Dias Toffoli: disponível para acompanhamento em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4255687 Acesso em 08.12.2013.

[8] - CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Saiba mais sobre o amicuscuriae. Atualidades do Direito. Publicada em 28.mar.2013. Disponível em http://atualidadesdodireito.com.br/marciocavalcante/2013/03/28/96/ Acesso em 30.jan.2014.

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Sobre o autor
Ricardo dos Reis Tavares

Formado em Direito e em Pedagogia. Pós graduado em Direito, Políticas e Gestão em Segurança Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TAVARES, Ricardo Reis. Direito à greve no serviço público civil e os novos desafios da assessoria jurídica sindical. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3893, 27 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26799. Acesso em: 18 abr. 2024.

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