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A dimensão da garantia do acesso à justiça na jurisdição coletiva

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Notas

1..Conferir a linha evolutória traçada por José Eduardo Carreira Alvim, in Elementos de Teoria Geral do Processo, 6ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 1997, p.10 e ss..

2..Ressalvando-se, contudo, que desde a época da Roma antiga já havia um sistema jurisdicional, onde o poder de julgar era exercido, em última instância, pelos Imperadores.

3..A chamada tripartição dos poderes estatais foi proposta, ainda de forma embrionária, por Aristóteles, sendo desenvolvida e finalmente sistematizada por Montesquieu, e imortalizada em sua obra "De L`Esprit des Lois". (in OS PENSADORES – MONTESQUIEU [tradução sob supervisão da Editora Bertrand Brasil]. O Espírito das Leis, São Paulo: Nova Cultural, 1997). A propósito de tal evolução, é de se conferir BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição, 2ª edição, Rio de Janeiro: Saraiva, 1998, p. 161, nota nº 42.

4..Modernamente a doutrina processual vem entendendo não ser a lide um elemento essencial da jurisdição, mas acidental, na medida em que é possível a instauração de uma relação jurídico-processual independentemente da existência de contraposição de interesses. Nesse sentido, a questão assume contornos de maior relevância quando se discute a natureza da chamada "jurisdição voluntária". Acerca da controvérsia, bem como dos fundamentos adotados, veja-se FREITAS CÂMARA, Alexandre. Lições de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1998, p. 80 e ss. Lembre-se ainda que no direito pátrio foi Afrânio Silva Jardim um dos autores que primeiro se posicionou acerca do papel exercido pela lide na moderna estrutura jurisdicional. O mestre, de quem tive a honra de ser monitor ainda na Graduação da Faculdade de Direito da Uerj, sempre enfatizou ser a pretensão o real elemento necessário da jurisdição, e não a lide. Cf. a respeito JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Penal, 4ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 237 e ss..

5..Este princípio encontra-se consubstanciado nos artigos 2º, 128 e 262 do Código de Processo Civil, e é conhecido em doutrina como princípio dispositivo ou da demanda.

6..É em razão da substitutividade que se impede, em regra, exercitem as partes diretamente seus direitos quando os mesmos são violados ou ameaçados. A fim de reforçar ainda mais este postulado, o legislador houve por bem caracterizar como ilícito penal, tipificado no artigo 345 do Código Penal Brasileiro, esta conduta, que recebeu o nomen iuris de "exercício arbitrário das próprias razões".

7..Esta característica é responsável pelo importante papel exercido pelo Poder Judiciário no mecanismo de controle recíproco entre os Poderes da República, denominado "checks and balances".

8..Esta expressão era, e ainda é, freqüentemente utilizada por Paulo Cezar Pinheiro Carneiro em suas aulas na Graduação da Faculdade de Direito da Uerj. Apesar de aparentemente simples, consegue, com perfeição, definir o procedimento de suma relevância, mas que por vezes transcorre de forma imperceptível, onde o julgador concretiza, com eficácia inter partes ou erga omnes, dependendo do caso, o comando abstrato e genérico previsto pelo legislador.

9..A propósito, veja-se a minuciosa radiografia elaborada por Ada Pellegrini Grinover: "Todavia, é preciso reconhecer o grande descompasso entre a doutrina e a legislação de um lado, e a prática judiciária de outro. Ao extraordinário progresso científico da disciplina não correspondeu o aperfeiçoamento do aparelho judiciário e da administração da Justiça. A sobrecarga dos tribunais, a morosidade dos processos, seu custo, a burocratização da Justiça, certa complicação procedimental; a mentalidade do juiz, que deixa de fazer uso dos poderes que o Código lhe atribui; a falta de informação e de orientação para os detentores dos interesses em conflito; as deficiências do patrocínio gratuito, tudo leva à insuperável obstrução das vias de acesso à Justiça, e ao distanciamento cada vez maior entre o Judiciário e seus usuários". (GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas Tendências do Direito Processual, 2ª edição, São Paulo: Forense Universitária, 1990, p. 177).

10..Nesse sentido foi efetivada a chamada Reforma Processual, consubstanciada nas Leis nº 8.455/92, 8.950/94, 8.951/94, 8.952/94, 8.953/94, 9.139/95 e 9.756/98, entre outras. Registre-se que tramitam ainda no Congresso Nacional mais três Projetos de Reforma do Código de Processual Civil, identificados como Projetos 13, 14 e 15, disponíveis na Internet no "site" do Ministério da Justiça, em http://www.redegoverno.gov.br, consultado em 20 de novembro de 2000.

11..Esta Lei foi posteriormente alterada pelo Código de Defesa do Consumidor, que não só expandiu este instituto, como também fez a previsão da ação coletiva, enquanto instrumento hábil à defesa do direito individual homogêneo, o que será estudado no curso desta parte do trabalho.

12..Ada Pellegrini Grinover mais uma vez analisa com exatidão as falhas na conjuntura processual: "A análise macroscópica da sociedade contemporânea revela alguns dados extremamente preocupantes na administração da Justiça. Não última, certamente, é a verificação da existência de um número cada vez maior de conflitos de interesses, não adequadamente solucionados, ou nem mesmo submetidos à apreciação jurisdicional. De um lado, a sociedade de massa gera conflitos de natureza coletiva ou difusa, dificilmente tratáveis segundo os esquemas clássicos da processualística de caráter individualista; do outro lado, a lentidão e o custo do processo, a complicação e a burocracia da Justiça, afastam o detentor de interesses indevidamente considerados ‘menores’, contribuindo para aumentar a distância entre o cidadão e o Poder Público, exacerbando a litigiosidade latente e desacreditando a Justiça, com conseqüências sempre perigosas e freqüentemente desastrosas". (GRINOVER, Ada Pellegrini, op. cit.. p. 205/206).

13..Sustenta o autor que: "a problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites do acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa. Uma empreitada assim ambiciosa requer, antes de mais nada, uma nova postura mental. Deve-se pensar na ordem jurídica e nas respectivas instituições, pela perspectiva do consumidor, ou seja do destinatário das norma jurídicas, que é o povo, de sorte que o problema do acesso à Justiça traz à tona não apenas um programa de reforma como também um método de pensamento, como com acerto acentua Mauro Cappelletti". (WATANABE, Kazuo. Acesso à Justiça e Sociedade Moderna, in Participação e Processo, Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1988, p. 128).

14.."Acredito estejamos caminhando para o processo como instrumento político de participação. A democratização do Estado alçou o processo à condição de garantia constitucional; a democratização da sociedade fá-lo-á instrumento de atuação política. Não se cuida de retirar do processo sua feição de garantia constitucional, e sim fazê-lo ultrapassar os limites da tutela dos direitos individuais, como hoje conceituados. Cumpre proteger-se o indivíduo e as coletividades não só do agir contra legem do Estado e dos particulares, mas de atribuir a ambos o poder de provocar o agir do Estado e dos particulares no sentido de se efetivarem os objetivos politicamente definidos pela comunidade. Despe-se o processo de sua condição de meio para realização de direitos já formulados e transforma-se ele em instrumento de formulação e realização dos direitos. Misto de atividade criadora e aplicadora do direito, ao mesmo tempo". (CALMON DE PASSOS, J.J.. Democracia, participação e processo, in Participação e Processo, Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1988, p. 95).

15..Em uma de suas mais felizes passagens, pontifica o Mestre: "o recente despertar de interesse em torno do acesso efetivo à Justiça levou a três posições básicas, pelo menos nos países do mundo Ocidental. Tendo início em 1965, estes posicionamentos emergiram mais ou menos em seqüência cronológica. Podemos afirmar que a primeira solução para o acesso - a primeira ‘onda’ desse movimento novo - foi a assistência judiciária; a segunda dizia respeito às reformas tendentes a proporcionar representação jurídica para os interesses ‘difusos’, especialmente nas áreas da proteção ambiental e do consumidor; e o terceiro - e mais recente - é o que nos propomos a chamar simplesmente "enfoque de acesso à justiça" porque inclui os posicionamentos anteriores, mas vai muito além deles, representando, dessa forma, uma tentativa de atacar as barreiras ao acesso de modo mais articulado e compreensivo". (CAPPELLETTI, Mauro, GARTH, Bryant [tradução de Ellen Gracie Northfleet]. Acesso à Justiça, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1988, p. 31 e ss.).

16..BARROSO, Luis Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas, Rio de Janeiro: Renovar, 1990, p. 76 e ss..

17..A propósito, diz Cappelletti, "não é preciso ser sociólogo de profissão para reconhecer que a sociedade (poderemos usar a ambiciosa palavra: civilização?) na qual vivemos é uma sociedade ou civilização de produção em massa, de troca e de consumo de massa, bem como de conflitos ou conflitualidades de massa. (...) Daí deriva que também as situações de vida, que o Direito deve regular, são tornadas sempre mais complexas, enquanto por sua vez, a tutela jurisdicional – a Justiça será invocada não mais somente contra violações de caráter individual, mas sempre mais freqüente contra violações de caráter essencialmente coletivo, enquanto envolvem grupos, classes e coletividades. Trata-se, em outras palavras, de violações de massa". (CAPPELLETTI, Mauro. Formações Sociais e Interesses Coletivos Diante da Justiça Civil, in Revista de Processo, vol. 5, separata (sem indicação de tradutor).

18..Nesse sentido, Silva Pacheco afirma que, " após a Carta das Nações Unidas de 1945 e a Declaração Universal dos Direitos de 1948, vem crescentemente se concretizando a tendência de convenções internacionais e processos de integração global e regional, como incremento dos direitos sociais, econômicos, culturais, ecológicos, indispensáveis à dignidade e ao livre desenvolvimento da personalidade humana. A doutrina, cada vez mais intercomunicante, passou a focalizar novas nuances do fenômeno jurídico e os ordenamentos dos países inclusive do nosso, ampliaram a previsão de direitos, com o reconhecimento de todos eles, inclusive dos transindividuais, coletivos ou difuso e de direitos individuais homogêneos, além dos tradicionais. Para a sua defesa, tornou-se preciso permitir o acesso à justiça de legitimados autônomos, alargando, racionalmente, o campo da legitimidade, principalmente na esfera processual e, outrossim, dilatando o conceito de direito subjetivo, para abranger não só o direito que tenha um sujeito determinado como também o sujeito indeterminado, e, ademais, estendendo o próprio conceito de sujeito de direito. Se existem direitos difusos, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato, ou direitos coletivos, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas vinculadas por uma relação jurídica básica, há de se admitir, necessariamente, que exista quem os defenda. Assim, atualmente, pode-se pleitear a tutela jurisdicional, quando houver ameaça ou lesão a direito de qualquer natureza, quer seja direito subjetivo, no conceito tradicional, de interesse legitimamente protegido de sujeito determinado, quer seja de direito individual homogêneo, direito transindividual, coletivo ou difuso". (PACHECO, Silva. Evolução do Processo Civil brasileiro, 2ª edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 396/397).

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19...O próprio Cappelletti, no sentido do texto, registrou inúmeras vezes que "a concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos direitos difusos. O processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre essas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais". (CAPPELLETTI, Mauro, GARTH, Bryant [tradução de Ellen Gracie Northfleet]. Acesso à Justiça, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1988, p. 49).

20..Anote-se, contudo, que Mauro Cappelletti, no trabalho citado à nota nº 17, sustenta expressamente que o Parquet não seria a instituição mais adequada para essa tutela. Contudo, pensamos que o nobre jurista escreveu o texto voltado para as tradições ministeriais européias, onde a sociedade traz um nível de conscientização bem mais elevado que o nosso. Na verdade, a legitimação do Ministério Público para essa tutela do direito brasileiro justifica-se, principalmente, ante o caráter hipossuficiente de nossa sociedade, numa situação bastante semelhante àquela que faz o Promotor de Justiça ingressar nos autos de uma ação individual quando uma das partes é hipossuficiente, ou mesmo assumir seu pólo ativo, como se dá, v.g. em processo penal nas ações oriundas de crimes sexuais, e no processo civil, através da propositura da ação civil ex delicto, embora quanto a este último exemplo pese grande dissenso doutrinário, que não será aqui abordado por fugir aos limites de nossa proposta.

21..Confira-se a pesquisa em CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Acesso à Justiça: juizados especiais cíveis e ação civil pública, tese de cátedra em Teoria Geral do Processo apresentada à Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Forense, 1999.

22...CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. op. cit., p. 55 e ss..

23...Remetemos o leitor à teoria da ponderação de interesses, da qual falamos no capítulo primeiro desta parte. Para maiores esclarecimentos sobre o tema, consulte-se SARMENTO, Daniel. A Ponderação de Interesses na Constituição Federal, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000.

24...Sobre essa questão específica, consulte-se Kazuo Watanabe, in GRINOVER, Ada Pellegrini et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado, 6ª edição, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 706.

25...Não podemos deixar de registrar o diagnóstico, dotado de verdadeira precisão cirúrgica, elaborado por Ada Pellegrini Grinover acerca da magistratura brasileira: "O esquema burocrático e verticalizado da magistratura brasileira, a inexistência de controles externos, o próprio método de recrutamento dos juízes, a inocorrência até pouco tempo atrás, de cursos de aperfeiçoamento e especialização para os membros do Judiciário, o distanciamento dos julgadores, que tem reflexos até mesmo na linguagem, tudo isto tem levado, no curso dos tempos, ao excessivo corporativismo dos juízes, encastelados em posições de gabinete que pouco ou nada têm a ver com a realidade de uma sociedade em transformação. Eis a razão pela qual nem todos os magistrados têm se demonstrado sensíveis aos desafios criados pelos novos tempos e nem todos têm sabido dar as necessárias respostas a conflitos diversos dos tradicionais, a serem solucionados por instrumentos processuais antes inexistentes, esboçados pela Constituição de 1988 e, em alguns casos, por leis ainda recentes. Acresça-se a isto a dificuldade de adaptação a uma ordem jurídica profundamente inovadora, traçada pela Constituição, a demandar do juiz a postura de árbitro de controvérsias de dimensões sociais e políticas; e ter-se-á a medida da grande dificuldade de entrosamento entre a mentalidade do juiz brasileiro e as novas funções que institucionalmente se lhe demandam. Não é de admirar, portanto, se as primeiras decisões dos tribunais brasileiros – inclusive do Supremo Tribunal Federal – sobre os novos instrumentos processuais-constitucionais, como o mandado de injunção e o mandado de segurança coletivo, têm freqüentemente correspondido a tornar letra morta a própria norma constitucional. Nem é de estranhar que na solução de conflitos coletivos os juízes nem sempre tenham sabido corresponder ao papel que deles se esperava. Algum tempo haverá de passar, antes que a mentalidade do juiz brasileiro se adapte à nova ordem constitucional, que representou uma verdadeira ruptura em relação ao recente passado político e institucional do país. Aliás, não é somente a postura do juiz que tem se erigido em obstáculo para a plena e imediata efetividade da Constituição. Muitos são os interesses que esta contrariou e significativos os esforços de seus titulares para atenuar o impacto das novas disposições. Por sua vez, a mentalidade conservadora, bastante difusa, também resulta em tendência ao imobilismo. E a preguiça mental, que leva a interpretar princípios e regras como se nada de fundamental houvesse mudado, constitui-se em outra circunstância que embaraça a plena eficácia das recentes disposições. Como reverter esse quadro?" (Grinover, Ada Pellegrini. O Processo em Evolução, 2ª edição, São Paulo: Forense Universitária, 1998, p. 25).

26...Até mesmo porque "não basta haver Judiciário; é necessário haver Judiciário que decida. Não basta haver decisão judicial; é necessário haver decisão judicial justa. Não basta haver decisão judicial justa; é necessário que o povo tenha acesso à decisão judicial justa. O acesso à decisão judicial constitui importante questão política. Não há verdadeiro Estado Democrático de Direito quando o cidadão não consegue, por inúmeras razões, provocar a tutela jurisdicional". (CLÈVE, Clèmerson Merlin. Temas de Direito Constitucional e da Teoria do Direito, São Paulo: Acadêmica, 1993, p. 50/51).

27...PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 96-A, DE 1992, de autoria do Deputado Hélio Bicudo, com relatório da Deputada Zulaiê Cobra que Introduz modificações na estrutura do Poder Judiciário, disponível na Internet, em http://www.amperj.org.br, inclusive com as complementações inseridas pela própria relatora, em outubro de 1999, e pelos destaques apresentados, conforme última versão disponibilizada em maio de 2000.

28...Do texto do relatório, transcrevemos o seguinte excerto que demonstra, à toda evidência, a preocupação do Poder Legislativo com os rumos do Poder Judiciário e principalmente com a questão do acesso à justiça: "Há unanimidade nesta Comissão quanto aos objetivos de nossos trabalhos. Pretendemos todos encontrar soluções para o atual estado de decadência em que se encontra o Poder Judiciário brasileiro, que se revela principalmente na demora da entrega da prestação jurisdicional, no acúmulo de recursos nos tribunais superiores e na dificuldade de acesso do cidadão à justiça. Queremos, portanto, uma justiça célere, sem olvidar a segurança jurídica. Buscamos um Judiciário forte e independente, imprescindível no Estado Democrático de Direito, sem esquecer o controle social dessa Instituição. Estamos certos, portanto, de que o consenso só será alcançado com o encontro de vontades visando a um fim comum".

29...Toda a problemática da Reforma do Poder Judiciário vem sendo enfrentada por diversos autores nacionais. Contudo, profícua, e sobretudo equilibrada, abordagem pode ser vista em recente obra de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, na qual colhemos o seguinte excerto: "É imperioso, portanto, que se discuta o problema do aperfeiçoamento, sempre possível e, por vezes, como agora, necessário, do sistema judiciário, mas com a necessária elevação e, sobretudo, a perfeita consciência de que se está tangendo as fibras mais profundas e sagradas do tecido social, sobre a trama das quais repousa a maravilhosa mas ainda jovem e frágil experiência humana de individualidade, de liberdade e de responsabilidade que são, em suma, o espírito da civilização ocidental. Cuidado para que se não ponha em risco o todo a pretexto de sanar uma parte, pois concessões ao retrocesso costumam cobrar um alto preço: a tirania, a violência, o terror e até a perda do legado civilizatório e o retorno à barbárie. Observados esses limites, todo o esforço, enfim, deve ser envidado para que se possa promover uma reforma da Justiça, que seja mais que uma reforma do Judiciário, para afastar, além da pesada carga de trabalho que vem suportando e lhe está minando a qualidade e a credibilidade, todos esses acabrunhantes problemas que o afligem e que o impedem de ser célere, barato, útil e, tantas vezes, de ser justo, pois só com uma Justiça forte e independente é possível alcançar-se e manter-se o ideal de liberdade em qualquer organização política". (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. O Sistema Judiciário Brasileiro e a Reforma do Estado, São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999, pág. 106).

30...É a seguinte a nova redação do artigo 103-A da Constituição Federal, de acordo com os termos do Projeto: "Seção II-A - DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTICA

Art. 103-A. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de treze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta anos de idade, com mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo(...)

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I – zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

II – zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou assinar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

III – receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a perda do cargo, recomendar a remoção, determinar a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;

IV – representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade;

V – rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano;

VI – elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa (...)".

31...Esses instrumentos são citados apenas para ilustrar a necessidade de se implementar uma mentalidade mais voltada aos direitos coletivos. Especificamente quanto aos juizados especiais, veja-se RODRIGUES, Geisa de Assis. Juizados Especiais Cíveis e Ações Coletivas, Rio de Janeiro: Forense, 1997. Quanto à arbitragem, a questão é delicada, já que de um lado há dispositivo expresso vedando, de forma genérica, sua utilização compulsória (artigo 51, inciso VII do C.D.C.) nas relações de consumo, e, por outro, a Lei da Arbitragem dispõe, em seu artigo 4º, § 2º, que "nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula". Nesta hipótese, a fim de evitar um conflito de normas, vem se optando pela tentativa de coadunar ambos os diplomas, de forma que, a Lei de Arbitragem, sendo mais recente, teria excepcionado a regra geral do C.D.C.. Assim sendo, seria possível a utilização de cláusula compromissória apenas nos contratos de adesão, e mesmo assim, se obedecidas as formalidades impostas pelo dispositivo legal.

32...Nessa perspectiva leciona Ada Pellegrini Grinover: "A tutela jurisdicional dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos representa, neste final de milênio, uma das conquistas mais expressivas do Direito brasileiro. Colocados a meio caminho entre os interesses públicos e os privados, próprios de uma sociedade de massa e resultado de conflitos de massa, carregados de relevância política e capazes de transformar conceitos jurídicos estratificados, os interesses transindividuais têm uma clara dimensão social e configuram nova categoria política e jurídica". (GRINOVER, Ada Pellegrini. A Ação Civil Pública Refém do Autoritarismo, in Revista de Processo, vol. 96, p. 28/36, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999).

33...DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986.

34...Até mesmo porque, como salienta Ovídio Batista, "não há mais lugar à concepção prviatística do processo, tão ao gosto dos civilistas, ainda que a demanda envolva um conflito exclusivamente de direito privado". (SILVA, Ovídio Batista da. GOMES, Fabio Luiz. Teoria Geral do Processo Civil, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 41).

35...A propósito, Rodolfo de Camargo Mancuso elenca as seguintes vantagens do incremento da jurisdição coletiva: "i) permite o tratamento processual unitário da matéria controvertida, o que constitui a técnica adequada nas demandas que envolvem interesses metaindividuais, pela própria natureza indivisível deste; ii) previne a pulverização dos conflitos de massa em múltiplas ações individuais, as quais tumultuam o ambiente judiciário, retardam a prestação jurisdicional, e, ao cabo, levam ao descrédito social no Poder Judiciário; iii) evita o paroxismo das decisões qualitativamente diversas sobre um mesmo assunto, ocorrência incompatível com a garantia constitucional da isonomia, a qual deve se estender à norma judicada, e não apenas restringir-se à norma legislada; iv) oferece um parâmetro judicial apriorístico, útil para o equacionamento ou mesmo a prevenção de conflitos plurissubjetivos, como aqueles que contrapõem contribuintes e Fisco; aposentados e Previdência Social; poupadores e sistema bancário; servidores públicos e Estado; consumidores e fornecedores; v) viabilizar a uniformização da jurisprudência, permitindo uma resposta judiciária homogênea, cuja eficácia se expande ao longo da extensão e compreensão do interesse metaindividual considerado, estabelecendo, assim, um confiável parâmetro judiciário para as demandas assemelhadas". (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência Jurisprudencial e Súmula Vinculante, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 366).

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Sobre o autor
Humberto Dalla Bernardina de Pinho

promotor de Justiça no Estado do Rio de Janeiro, professor de Direito da UERJ, doutor em Direito

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINHO, Humberto Dalla Bernardina. A dimensão da garantia do acesso à justiça na jurisdição coletiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2790. Acesso em: 30 abr. 2024.

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