Concepção de constituição adotada por Ferdinand Lassale, Carl Schmitt e Hans Kelsen

03/08/2014 às 06:43

Resumo:


  • Lassale vê a Constituição como a soma dos fatores reais de poder dentro de uma sociedade, onde a Constituição escrita só terá validade se refletir esses fatores.

  • Carl Schmitt define Constituição como a decisão política fundamental de uma unidade política, diferenciando-a das leis constitucionais que não pertencem a essa decisão fundamental.

  • Hans Kelsen apresenta a Constituição em um sentido jurídico, como uma norma superior que dá fundamento de validade às demais normas do ordenamento jurídico, destacando-se pela sua posição hierárquica e não pelo seu conteúdo.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Não existe um conceito absoluto e imutável de Constituição, quando relacionado à noção de lei fundamental. A sua definição deve ser obtida a partir da análise de cada lei fundamental e dos valores por ela considerados como fundamentais.

CONCEPÇÃO DE CONSTITUIÇÃO ADOTADA POR FERDINAND LASSALE, CARL SCHMITT E HANS KELSEN.

  

Sumário: 1. Introdução. 2. Constituição sob o prisma sociológico, político e jurídico. 3. Conclusão. 4. Referências Bibliográficas.

 

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por escopo traçar uma síntese acerca da concepção de constituição que adotaram os renomados juristas Ferdinand Lassale, Carl Schmitt e Hans Kelsen.

2.  CONSTITUIÇÃO SOB O PRISMA SOCIOLÓGICO, POLÍTICO E JURÍDICO.

A Constituição, dotada de Supremacia, é fundamento de validade de todo ordenamento jurídico. Considerada a Lei Fundamental/Maior de um Estado, cuida da organização de seus componentes fundamentais: conjunto de normas jurídicas que dispõe sobre a organização, estrutura, forma do Estado, sistema de governo, direitos e deveres fundamentais e correspondentes garantias individuais, a forma de aquisição e o funcionamento do poder, fundamentos dos direitos econômicos, sociais e culturais, ou seja, assuntos considerados relevantes para uma determinada sociedade, em determinado tempo.

Não existe um conceito absoluto e imutável de Constituição, quando relacionado à noção de lei fundamental. A sua definição deve ser obtida a partir da análise de cada lei fundamental e dos valores por ela considerados como fundamentais.

Canotilho a conceitua da seguinte forma: “Constituição é a ordenação sistemática e racional da comunidade política, através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os limites do poder político.” (CANOTILHO, 1997, p. 52).

Diversas são as formas para se entender a essência ou conceito de uma Constituição, podendo ser sociológica, política ou jurídica.

Num sentido sociológico ou realista, Ferdinand Lassale, em seu livro “O que é uma Constituição?”, diz que Constituição é a “soma dos fatores reais de poder” que predominam em uma comunidade. Assim são suas palavras:

Colhem-se estes fatores reais de poder, registram-se em uma folha de papel, se lhes dá a expressão escrita e, a partir desse momento, incorporados a um papel, já não são simples fatores reais do poder, mas que se erigiram em direito, em instituições jurídicas, e quem atentar contra eles atentará contra a lei e será castigado. (LASSALE, 2002, p. 48). 

Para Lassale existem em uma sociedade duas Constituições, uma real, que corresponde a “soma dos fatores reais do poder”, e uma escrita, que somente terá validade se ajustar-se à Constituição real.

Lassale aponta, ainda, a necessidade da Constituição ser “o reflexo das forças sociais que estruturam e determinam o poder”, ou seja, do comportamento do povo. Composição do que realmente o povo necessita e deseja, correndo o risco de encontrar-se apenas uma folha de papel: "De nada serve o que se escreve numa folha de papel se não se ajusta à realidade, aos fatores reais e efetivos do poder.” (LASSALE, 2002, p. 68).

Portanto, deve haver relação entre o documento escrito e as forças determinantes do poder para termos uma Constituição.

Já para o jurista Carl Schmitt, autor da obra “Teoria da Constituição”, num sentido político, é a decisão política fundamental, ou seja, tudo aquilo que não é decisão política fundamental não é Constituição, é Lei Constitucional. Nesse contexto, ele faz uma diferenciação entre Constituição e Lei Constitucional.

Enquanto que a Constituição é a decisão política fundamental, tudo que se refere aos direitos fundamentais, à organização, exercício, competência e separação dos poderes; a Lei Constitucional são as demais normas presentes em uma Constituição que não se referem à decisão política fundamental.

Para Schmitt a Constituição é ato proveniente de um poder soberano (unidade política) que dita à ordem social, a política e a jurídica. O direito só se manifesta se provir de uma deliberação de caráter pessoal:

A Constituição em sentido positivo surge mediante um ato do poder constituinte. (...) Este ato constitui a forma e modo da unidade política, cuja existência é anterior. Não é, pois, que a unidade política surja porque se haja ‘dado uma Constituição’. A Constituição em sentido positivo contém somente a determinação consciente da concreta forma de conjunto pela qual se pronuncia ou decide a unidade política. (SCHMITT, 1932, p. 24).

E continua: “A essência da Constituição não está contida numa lei ou numa norma. No fundo de toda normatização reside uma decisão política do titular do poder constituinte, quer dizer, do Povo na Democracia e do Monarca na Monarquia autêntica”. (SCHMITT, 1932, p.27).

Hans Kelsen, criador da teoria pura do direito e precursor do positivismo jurídico, atribuiu a Constituição um sentido jurídico. De acordo com sua interpretação, é lei juridicamente superior, norma pura, puro dever ser, desprendida de qualquer aspiração sociológica, valorativa ou política.

Ele atribui à Constituição dois sentidos: lógico-jurídico e jurídico-positivo. No primeiro sentido, Kelsen diz que a Constituição tem seu fundamento de validade na norma hipotética fundamental que sustenta e dá validade a todo o ordenamento jurídico; no segundo sentido, a Constituição seria o fundamento de validade de todo ordenamento infraconstitucional, ou seja, uma norma de hierarquia inferior buscando seu suporte de validade na norma imediatamente superior até chegar à Constituição.

De acordo com Kelsen: “O fundamento de validade de uma norma apenas pode ser a validade de outra norma, [...], designada como norma superior”. (KELSEN, 1974, p. 267).

3. CONCLUSÃO

 Para Ferdinand Lassale, num sentido sociológico, a Constituição é a soma dos fatores reais de poder que predominam em uma comunidade. É a composição do que realmente o povo necessita e deseja, devendo haver relação entre o documento escrito e as forças determinantes do poder para existir uma Constituição.  Na visão de Carl Schmitt, a Constituição é a decisão política fundamental, é ato proveniente de um poder soberano que dita à ordem social, a política e a jurídica. Já Hans Kelsen, atribuiu a Constituição um sentido jurídico; lei hierarquicamente superior em relação às outras normas, não importando o conteúdo, mas simplesmente a forma como é escalonada.

 

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 4ª ed. rev. amp. e atual.RJ:Renovar, 2000.
 

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Editora Almedina, 1997.

LASSALE, Ferdinand. O que é uma Constituição; trad. Hiltomar Martins Oliveira. Belo Horizonte: Ed. Líder, 2002.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 11. ed.rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora. Método, 2007.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2001.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. 3. ed. Coimbra: Armênio Amado, 1974.

SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. Tradução de Alfredo Gallego Anabitarte. Madrid: Revista de Drecho Privado, 1932.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

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Sobre o autor
Roberto Carlos Sobral Santos

Advogado desde 1996, com passagem pelo Departamento Jurídico do Banco do Brasil S.A no cargo de advogado entre 1998 a 2006. Procurador da Fazenda Nacional desde 2006. Pós-Graduado em Direito Constitucional em nível de Especialização.

Informações sobre o texto

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