Motivo torpe e vingança:

institutos que não necessariamente se confundem

27/08/2014 às 14:21

Resumo:


  • A vingança é frequentemente citada como exemplo de motivação torpe em homicídios qualificados, mas sua caracterização como tal depende da análise do contexto específico de cada caso.

  • Enquanto a ética cristã ocidental tende a ver a vingança como desprezível, outras culturas, como a japonesa feudal, a consideravam um ato nobre relacionado à honra.

  • O Superior Tribunal de Justiça (STJ) destaca que a determinação do caráter torpe da vingança deve ser baseada nas peculiaridades do caso concreto, sem prejulgamentos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Vingança nem sempre é motivo torpe. Este artigo busca conceituar o institutos e estabelecer as diferenças.

Não raro vemos nas academias de Direito professores de Direito Penal utilizar a “vingança” como exemplo de motivação torpe no homicídio qualificado.

A palavra torpe, segundo o dicionário, diz respeito a algo asqueroso, repugnante, indigno, feio, depravrado, o que claramente não se confunde com a palavra vingança que significa atitude de quem se sente ofendido ou lesado por outrem e efetua contra ele uma ação mais ou menos equivalente.

Acontece que em nossa cultura ocidental, influenciada nitidamente pela ética cristã, a vingança é vista como algo desprezível (senso primitivo do justo), todavia, não se pode olvidar que nenhuma vingança é igual à outra e os motivos que levam as pessoas a se vingarem são os mais variados.

No passado feudal do Japão os Samurais utilizavam a vingança como um meio de manter a honra de sua família ou clã, através, inclusive, de assassinatos (katakiuchi). Tratava-se de um ato nobre e por mais que o “katakiuchi” hoje em dia seja perseguido, principalmente através de meios pacíficos, a vingança permanece uma parte importante da cultura japonesa.

Percebemos, com isso, que só podemos adjetivar a vingança como sendo algo repugnante ou não se analisarmos não só as crenças de quem as pratica, mas também o caso concreto de onde extrairemos os motivos que levaram o agente a se vingar.

Nesse sentido, o STJ afirmou no Informativo 452: “a verificação se a vingança constitui ou não motivo torpe deve ser feita com base nas peculiaridades de cada caso concreto, de modo que não se pode estabelecer um juízo a priori, positivo ou negativo”.

Na prática forense esbarramos, por diversas vezes, em situações onde o acusado realmente se vinga influenciado por uma motivação indiscutivelmente torpe, é o caso do agente que mata a testemunha porque ela teria testemunhado em juízo em seu desfavor, ou àquele que mata o próprio filho para se vingar da ex-mulher que o abandonou.

Todavia, não se pode confundir esse tipo de motivação a fim de vingar-se com a motivação do pai que mata o estuprador de sua filha, ou até mesmo do agente que, ainda que traficante, mata a pessoa que assassinou seu irmão. Afinal, o fato dele ser traficante em nada influência na motivação que o levou a querer se vingar. Trata-se de crimes distintos.

Percebe-se então que a vingança, embora seja presumidamente algo reprovável e repugnante, esta presunção é meramente relativa e os motivos que a enseja devem ser analisados à luz do caso concreto a fim de se extrair, de fato, os valores éticos, morais e culturais que influenciaram a atitude criminosa cometida pelo agente, sob pena de, por vezes, cometer injustiças qualificando um homicídio quando na verdade lhe tinha que ser aplicado uma atenuante ou uma causa de diminuição de pena (ex: homicídio privilegiado por relevante valor moral).

 

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Sobre o autor
Vinicius Rodrigues Arouck

Advogado Sócio do escritório Porciúncula Advocacia e Consultoria Jurídica.Advogado do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade de Brasília - UniCEUB.Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UniCEUB.Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal no Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP.Advogado membro da Comissão de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Distrito Federal. Membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/DF

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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