A redução da maioridade penal à luz da Constituição Federal de 1988

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Apresenta um estudo baseado na discussão da redução da maioridade penal à luz da CF de 1988, identificando as diferentes opiniões relacionadas à redução da maioridade penal, analisa a possibilidade de reduzir a maioridade penal sem ferir a CF/1988.

RESUMO

O presente trabalho apresenta um estudo baseado na discussão da redução da maioridade penal à luz da Constituição Federal de 1988. Nesses termos, almeja como objetivo geral analisar a redução da maioridade penal; aliado a isso, traça como objetivos específicos: conhecer a fundamentação legal que trata da inimputabilidade penal, identificar os diferentes posicionamentos relacionados à redução da maioridade penal e discutir a possibilidade de redução da maioridade penal sem ferir a Constituição Federal de 1988. Desse modo, pretende-se compreender o conceito de imputabilidade, bem como os critérios para a aferição da inimputabilidade, as causas que excluem a imputabilidade, incluindo alguns aspectos da menoridade, verificar o tempo da maioridade, e a par disso conhecer parte da evolução histórica da inimputabilidade penal na legislação brasileira. Nesse sentido, busca-se trazer à baila os diferentes posicionamentos a respeito da redução da maioridade penal, tanto os argumentos favoráveis quanto os contrários. Por fim, será apresentada a discussão da referida redução de acordo com a Constituição Federal de 1988, com base no artigo 228, se este se trata de cláusula pétrea ou norma de política criminal, passível de emenda constitucional. O presente trabalho justifica-se pela necessidade de estudar o referido tema, tendo em vista sua relevância no cenário político e social do país.

Palavras-chave: Imputabilidade. Redução da Maioridade. Constituição Federal de 1988.

  1. IMPUTABILIDADE
  1. CONCEITO

Em um primeiro momento, é conveniente e oportuno conceituar o termo imputabilidade, segundo Masson (2008) o Código Penal Brasileiro optou por seguir a tendência da maioria das legislações modernas, e preferiu não definir a imputabilidade, tratou tão somente de elencar as hipóteses da sua não incidência, ou seja, os casos de inimputabilidade penal, previstos no art. 26, caput, art.27 e art. 28, §1º.

Seguindo essa linha de raciocínio, é imperioso trazer à baila, o que diz o Código Penal a respeito da inimputabilidade:

“Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

Em linhas gerais, para compreender o sentido e o alcance do texto legal, faz-se necessário complementar o entendimento do aludido artigo com a seguinte definição de imputabilidade:

Pode ser definida como o conjunto de condições pessoais de sanidade e maturidade que dão ao agente a capacidade de lhe ser juridicamente imputada a prática de um ato punível. Caso o agente não apresente esse conjunto de condições pessoais, ele é inimputável”. (MACEDO, 2008, p. 173).

Nesse diapasão, é conveniente e oportuno ponderar que:

Imputabilidade é sinônimo de atribuidade. Imputar é atribuir algo a alguém. Quando se diz que determinado fato é imputável a certa pessoa, está-se atribuindo a essa pessoa ter sido a causa eficiente e voluntária desse mesmo fato. Mais ainda: está-se afirmando ser essa pessoa, no plano jurídico, responsável pelo fato e, consequentemente, passível de sofrer efeitos, decorrentes dessa responsabilidade, previstos pelo ordenamento vigente.  Pode, entretanto, a imputabilidade estar referida não ao fato, mas diretamente ao agente. Nesta última hipótese, significa aptidão para ser culpável. Quando se afirma que certa pessoa é imputável, está-se dizendo que ser ela dotada de capacidade para ser um agente penalmente responsável. Ambos os sentidos em exame são usuais e interessam particularmente ao direito penal. (TOLEDO, p. 312-313, 2008).           

No entendimento de Capez (2011) o agente deve ter condições físicas, psicológicas, morais e psíquicas de saber que está praticando um ilícito penal, o referido autor ainda assevera que, os atributos não são somente esses, além da capacidade de entender os seus atos, o agente deve ter o devido controle sobre sua vontade, o que quer dizer que, o imputável não é somente aquele que tem capacidade intelectual sobre o que significa sua conduta, é necessário ainda que tenha o comando de sua vontade de acordo com esse entendimento.

A par desse juízo, Capez (2011) complementa que a imputabilidade penal depende de dois elementos, a saber, o intelectivo e o volitivo. O primeiro diz respeito à integridade biopsíquica, que se expressa na perfeita saúde mental e consente ao indivíduo a capacidade de compreender o caráter ilícito do fato. Já o elemento volitivo se refere ao domínio da vontade, é a capacidade que o agente possui de controlar e comandar seus impulsos acerca da compreensão do caráter ilícito do fato, determinando-se de acordo com essa compreensão.

Para Nucci (2011) essas características citadas anteriormente, desenvolvem o binômio necessário para a constituição das condições pessoais do imputável que consiste em sanidade mental e maturidade. Com esse raciocínio, se o agente não possui a habilidade de entender a diferença entre o certo e o errado, não poderá ajustar-se por tal compreensão e terminará vez ou outra praticando um fato típico e antijurídico, sem que possa ser repreendido, ou seja, sem que possa suportar o juízo de culpabilidade.

Nessa esteira o ilustre Capez (2011) leciona que estes dois elementos devem obrigatoriamente andar juntos, pois na falta de um deles, o sujeito será tratado como inimputável, além disso, Welzel apud Capez (2011) ensina que a capacidade de culpabilidade apresenta dois elementos específicos: um “cognoscivo” e outro “volitivo”, ou seja, a capacidade de compreender o injusto e a determinação da vontade são elementos que em conjunto constituem a capacidade de culpabilidade.

Com isso, torna-se de curial importância diferenciar o termo imputabilidade de capacidade, segundo Capez (2011) esta última é uma expressão ampla que compreende tanto a possibilidade de entendimento e vontade, como também a aptidão para praticar atos na órbita processual, já a imputabilidade por sua vez, é a capacidade no âmbito penal. Nesse sentido, tanto a capacidade penal quanto a processual somente são adquiridas quando o indivíduo atinge 18 anos de idade.

No mesmo sentido, Capez (2011) ainda diferencia o termo imputabilidade do dolo e da responsabilidade. Em se tratando do dolo, este compreende a vontade e a capacidade de entender essa vontade; já a responsabilidade é a aptidão do indivíduo para ser punido por seus atos, exigindo três requisitos distintos: a imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa.

Com esse entendimento, o agente pode ser imputável, mas não responsável pelo injusto praticado, quando não tiver a possibilidade de conhecimento do ilícito penal ou quando for inexigível a conduta diversa.

Ainda no campo da responsabilidade, Nucci (2011) ensina que anteriormente à Reforma de 1984 a antiga Parte Geral do Código Penal, classificava o Título III como “Da Responsabilidade”, que em sua opinião, tal entendimento merecia ser alterado, tendo em vista que, a imputabilidade é a capacidade de ser culpável enquanto que, a culpabilidade reside no juízo de reprovação social que pode ser realizado ao imputável, nesses termos, a responsabilidade é decorrência da culpabilidade, que em linhas gerais, é a relação existente entre o autor do fato ilícito e o Estado, onde aquele merece ser punido em razão de ter cometido um delito. A par disso, os referidos conceitos não se confundem, mas encontram-se intimamente ligados.

Assim, Nucci (2011) afirma que o inimputável não comete crime, mas pode ser sancionado penalmente, quando lhe é aplicado medida de segurança, esta por sua vez, se baseia no juízo de periculosidade, diferentemente da culpabilidade. Assim, se o autor de um fato típico e antijurídico não possuir pleno entendimento do que faz, não merece ser considerado criminoso, embora possa ser reprimido por meio de medida especial cuja finalidade é fundamentalmente terapêutica.

1.2 CRITÉRIOS PARA A AFERIÇÃO DA INIMPUTABILIDADE

Primeiramente, é de bom alvitre analisar qual o momento adequado para se constatar a imputabilidade, Nucci (2011) por sua vez afirma que, no Brasil em vez de se permitir a verificação da maturidade em cada caso concreto, o legislador optou pelo critério cronológico, isto é, o agente deverá contar com mais de 18 anos. Cabe ressaltar que, ao atingir a maioridade, presume-se que o indivíduo é imputável, entretanto, Masson (2008) esclarece que esta presunção é relativa (iuris tantum), pois admite prova em contrário.

Nesse diapasão, Masson (2008) complementa que o art. 26 do Código Penal é muito claro no sentido de afirmar que a imputabilidade deve ser considerada ao tempo da ação ou da omissão, ou seja, no instante da conduta; além do mais, qualquer alteração posterior, produz efeitos somente processuais.

Já em relação aos critérios de aferição da imputabilidade, na síntese de Castelo Branco (2011) existem três sistemas utilizados para esse fim, quais sejam: o biológico, o psicológico e o biopsicológico. O primeiro avalia apenas aspectos puramente biológicos, a exemplo disso, busca examinar se a pessoa possui desenvolvimento mental retardado. O critério psicológico tem por finalidade avaliar se o indivíduo possui ou não capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Já o critério biopsicológico consiste na junção dos dois critérios anteriores.

Para Nucci (2011) os critérios acima alinhavados dizem respeito à higidez mental, no que concerne ao critério biológico, este quando adotado restritivamente, faz com que o juiz fique absolutamente dependente do laudo pericial, nessa esteira, Masson (2008) acrescenta que, se o perito constatar um problema mental, o magistrado nada poderá fazer de modo que, a inimputabilidade terá presunção absoluta (iuris et de iure).

Já para Capez (2011) quando se constata a doença mental ou desenvolvimento mental incompleto, o agente será considerado inimputável, independentemente de qualquer verificação acerca da retirada ou não da capacidade de entendimento e autodeterminação causada pela anomalia.

Nessa esteira, Capez (2011) assevera que foi adotado o critério biológico a título de exceção quando o agente for menor de 18 anos (art. 27), nesses casos, o desenvolvimento mental incompleto presume a incapacidade de entendimento e vontade, não obstante existirem casos em que o menor entende perfeitamente o caráter criminoso do seu ato, mas a lei presume que ele não sabe o que faz, acatando consubstancialmente o critério biológico para essa hipótese.

Em relação ao critério psicológico, Nucci (2011) afirma que, quando aceito exclusivamente, outorga-se ao juiz uma posição de destaque, podendo o magistrado apreciar a imputabilidade com ampla arbitrariedade. Para Capez (2011) o referido sistema contempla somente o momento da prática do crime, e que se fosse adotado unicamente, poderia levar a exclusão da imputabilidade do agente quando este praticasse o fato delituoso compelido totalmente pela emoção, hipótese não vislumbrada em lei como causa dirimente.

Na opinião de Masson (2008) o critério biopsicológico a seu turno, conjuga a atuação do magistrado e do perito, este se detém na questão biológica, enquanto aquele se preocupa com a psicológica. Nesses termos, Nucci (2011) leciona que este é o sistema adotado pelo Código Penal, conforme depreende-se do art. 26 do referido diploma legal, além de constituir também o sistema adotado por outras legislações, a exemplo disso, a espanhola.

  1. CAUSAS QUE EXCLUEM A IMPUTABILIDADE

A título de conhecimento e com vistas a dirimir eventuais dúvidas, cumpre assinalar quais as hipóteses de inimputabilidade contempladas pelo diploma penal pátrio:

Segundo Castelo Branco (2011) as causas da inimputabilidade se resumem em quatro hipóteses, a saber:

  1. Doença mental: é caracterizada pela perturbação mental capaz de importar na capacidade de compreender o caráter ilícito do fato. Ex.: psicose, esquizofrenia, etc.
  2. Desenvolvimento mental incompleto: é o desenvolvimento que ainda não se aperfeiçoou, seja por causa da idade do agente, seja por falta de convívio social. Ex.: menores de 18 anos e silvícolas.
  3. Desenvolvimento mental retardado: caracteriza-se pelo atraso na idade mental cronológica do indivíduo. Ex.: oligofrênicos.
  4. Embriaguez completa por caso fortuito ou força maior: também conhecida como acidental, que pode ser completa ou incompleta, se for completa, isenta de pena. Se incompleta, não isenta, mas diminui a pena de 1/3 a 2/3.
  1. A MENORIDADE

Na opinião de Nucci (2011) para os menores de 18 anos o Código Penal Brasileiro adotou o critério biológico para a verificação da menoridade, isto é, instituiu uma presunção absoluta de que o menor não possui condições de entender o caráter ilícito do que pratica ou até mesmo determinar-se de acordo com esse entendimento, não se admitindo assim prova em contrário.

A Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça preceitua que, a prova da menoridade deve ser feita por qualquer documento hábil, ou seja, para verificar a menoridade, não se exige a certidão de nascimento como documento exclusivo.

O tratamento dispensado para tais pessoas independe do nível de escolaridade, de inteligência ou desenvolvimento mental, de toda sorte, os menores são considerados inimputáveis; contudo, sabe-se que muitos menores infratores possuem o perfeito entendimento do que praticam, e em muitas das ocasiões, agem de modo violento e não raras vezes com requintes de crueldade.

Em consonância com o acatado, Nucci (2011) explica que o desenvolvimento mental segue a evolução da sociedade, assim, é natural que o indivíduo compreenda os eventos naturais da vida mais precocemente.

Nesse contexto, é importante observar o disposto no art. 27 do Código Penal:

“Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”.

Cumpre salientar que, o diploma penal está se referindo à Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, mais conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, que chamou para si a incumbência de regular a responsabilidade do menor infrator quando autor de infrações penais, prevendo medidas adaptadas à gravidade do fato, bem como à idade do agente.

Ainda com relação à idade limite para se estabelecer a imputabilidade, Mirabete e Fabbrini (2011) advertem que o patamar adotado pelo Brasil é consagrado por vários países, como a Áustria, Dinamarca, Finlândia, França, Colômbia, México, Peru, Uruguai, Equador, Tailândia, Noruega, Holanda, Cuba, Venezuela, etc. Contudo, há países que determinam a idade de 17 anos como a Grécia, Nova Zelândia, Federação Malásia; há também aqueles que seguiram a idade de 16 anos como a Argentina, Birmânia, Filipinas, Espanha, Bélgica, Israel; porém, há aqueles que adotaram a idade de 15 anos quais sejam Índia, Honduras, Egito, Síria, Paraguai, Iraque, Guatemala, Líbano; já a Alemanha e o Haiti determinaram a imputabilidade a partir dos 14 anos; já a Inglaterra optou pelos 10 anos de idade.

Com esse raciocínio, importa esclarecer, que “algumas nações, porém ampliam o limite até 21 anos (Suécia, Chile, Ilhas Salomão etc). Entretanto, há países em que funcionam tribunais especiais (correcionais), aplicando-os sanções diversas das utilizadas em caso de criminosos adultos”. (MIRABETE e FABBRINI, 2011, p. 202).

  1. TEMPO DA MAIORIDADE

De acordo com Nucci (2011) existem três correntes que buscam explicar o marco temporal do início da maioridade penal aos 18 anos. A primeira corrente aduz que o indivíduo é imputável a partir do primeiro momento do dia do seu aniversário, a segunda assevera que é a partir da exata hora em que nasceu o agente do dia do seu aniversário; e a terceira que aduz, ser o ultimo instante do dia do aniversário.

Nesses termos, Nucci (2011) explica que, a primeira corrente é sem dúvida a predominante, tendo em vista que, a lei civil é o diploma responsável por determinar a idade das pessoas, desse modo, torna-se inconcebível que alguém tenha atingido 18 anos pela legislação civil e ainda não os tenha pela legislação penal, assim, segundo Mirabete e Fabbrini (2011) é considerado imputável o indivíduo que comete o fato típico nos primeiros instantes em que completa 18 anos.

Nesse sentido, convém analisar:

O art. 10 do Código Penal determina que o dia do começo (no caso, o do nascimento) seja incluído no cômputo do prazo e o art. 27 dispõe que é inimputável quem é menor de 18 anos, e não pode se considerar menor de 18 anos quem está completando essa idade, pois uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo. (MIRABETE e FABBRINI, 2011, p. 203).

Ainda com a mesma inteligência:

“O momento para apreciar a imputabilidade, conforme a regra geral prevista no art. 4º, que é, é o da ação ou da omissão, não sendo imputável o agente se o resultado ocorrer após ter completado 18 anos, quando praticou a conduta antes do 18º aniversário. Mesmo nessa hipótese, jamais poderá ser responsabilizado penalmente pelo fato. Nos crimes permanentes, porém, embora o agente tenha 17 anos no dia do início da conduta (sequestro, extorsão mediante sequestro etc), torna-se penalmente imputável se completa 18 anos antes de cessar a permanência, ou seja, enquanto não cessada a consumação, que se prolonga no tempo em decorrência da ação do agente”. (MIRABETE e FABBRINI, 2011, p. 203).

  1. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INIMPUTABILIDADE PENAL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

De acordo com Segundo (2009) quando D. João VI e sua corte chegaram ao Brasil em 1808, este país era regido pelas Ordenações Filipinas, estas por sua vez, entraram em vigor em Portugal a partir de 1603 e no Brasil vigoraram até 1830, quando foi implementado o Código Penal do Império. Naquela época, os ditames da Igreja Católica eram primordiais, de modo que seus primados foram ampliados à seara jurídica, em virtude disso, o Direito Canônico comandava a jurisdição do Estado, de modo que pela Igreja Católica a idade da razão era alcançada quando o indivíduo chegava aos 07 anos de idade, todavia, como o Estado não se apartava da Igreja, esse marco foi estabelecido para caracterizar a responsabilidade penal.

Assim, Melo (2000) leciona que nesse período, as crianças eram submetidas a punições muito severas que não se distanciava do que acontecia com os adultos, embora eximidos, em qualquer caso, da pena de morte como bem explica Segundo (2009); em contrapartida, quando se tratava de indivíduos com idade entre dezesseis e vinte e um anos poderiam, a depender da situação, serem condenados à pena de morte.

Posteriormente, Macedo (2008) ensina que, a primeira codificação penal brasileira foi o Código Criminal do Império, que foi promulgado em dezembro de 1830, nessa fase, em se tratando da imputabilidade penal, era adotado o critério do “discernimento”, caso o indivíduo contasse com idade maior de quatorze anos, esse requisito era presumido, e quando menor, deveria ser comprovado.

Já em 1890, surgiu entre nós o Código Republicano, substituindo o Código Criminal do Império, este de acordo com Segundo (2009), adotou um critério biopsicológico quando optou pela aferição da maioridade baseada no discernimento, já o Código Republicano escolheu a idade de 09 anos para que o indivíduo fosse considerado imputável.

Nesse ínterim, Macedo (2008) explica que o Código Republicano foi demasiadamente criticado, sofrendo incontáveis alterações, tanto na classificação dos delitos, quanto na intensidade das penas. Desse modo, em 1932 surgia a Consolidação das Leis Penais, onde fora estabelecido que não poderia ser considerado criminoso o indivíduo menor de 14 anos.

Assim, o do Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940 sancionou um novo Código Penal, que entrou em vigor no dia 1º de janeiro de 1942, este por sua vez, conforme Macedo (2008) adotou um método diverso da Consolidação das Leis Penais, de modo que tratou de excluir do seu rol as contravenções penais, que passaram a figurar em legislação autônoma, e sobretudo, fixou a imputabilidade em 18 anos, mantendo a atenuante genérica para os maiores de 18 e menores de 21 anos.

Ainda com o mesmo raciocínio, Macedo (2008) acrescenta que o Código Penal de 1940 não se preocupou em trazer outro dispositivo que cuidasse da idade do agente, e expôs ainda um trecho da Exposição de Motivos que assim reza:

“Não cuida o projeto dos imaturos (menos de 18 anos), senão para declará-los inteira e irrestritamente fora do direito penal (art.23), sujeitos apenas à pedagogia corretiva de legislação especial”. 

O Código Penal de 1940 vigora até os dias atuais, sendo que a Parte Geral foi alterada pela Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984 e a Parte Especial segundo Macedo (2008) continua essencialmente como a redação original de 1940, entretanto com algumas modificações geradas ao longo do tempo.

Macedo (2008) acrescenta que em 1969, foi promulgado pela Junta Militar um novo Código Penal, com pretensão de entrar em vigor em 1970, neste havia a previsão do critério biopsicológico para aferição da imputabilidade, sendo assim versava a Exposição de Motivos:

17. O limite da imputabilidade foi mantido, como regra geral, nos dezoito anos. Excepcionalmente, pode ser declarado imputável o menor de dezesseis a dezoito anos, se revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e governar a própria conduta.

O referido Código tinha o intuito de alterar o sistema do Direito Penal, ocorre que, suas pretensões eram inadequadas para o contexto social da época, razão pela qual, não chegou a ter vigência. A par disso, em 1970 entrou em vigor o Código Penal Militar, para Macedo (2008) este diploma contemplou o critério do discernimento para designar a faixa etária de 16 a 18 anos, in verbis:

Art. 50. O menor de dezoito anos é inimputável, salvo se, já tendo completado dezesseis anos revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acôrdo com êste entendimento. Neste caso, a pena aplicável é diminuída de um têrço até a metade.

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Seguindo essa linha de raciocínio, o artigo 51 trouxe o critério de imputabilidade por equiparação, senão vejamos:

Art. 51. Equiparam-se aos maiores de dezoito anos, ainda que não tenham atingido essa idade:

a) os militares;

b) os convocados, os que apresentam a incorporação e que, dispensados temporariamente desta, deixam de se apresentar, decorrido o prazo de licenciamento;

c) os alunos de colégios ou outros estabelecimentos de ensino, sob direção e disciplina militares, que já tenham completado dezessete anos.

           

Nesse diapasão, Macedo (2008) esclarece que estes dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, vez que a Carta Maior determina a imputabilidade dos menores de 18 anos no seu art. 228, caput. Ainda com esse entendimento, a ilustre autora explica que, com a Reforma do Código Penal em 1984, houve uma alteração em relação à terminologia, o termo “irresponsáveis” contido no Código Penal de 1940, foi substituído pelo termo “inimputáveis”.

Cumpre ressaltar que, a previsão da menoridade também encontrou guarida legislação específica, motivo pelo qual torna-se apropriado traçar alguns comentários acerca desses diplomas, tendo em vista sua importância histórica na legislação do menor.

A par dessa inteligência, surge então o primeiro Código de Menores (1927), mais conhecido como Código Mello Mattos, Melo (2000) explica que, denominado corpo de leis visava assistir os menores com um forte traço protecionista, que refletia em um controle irrestrito a essas crianças e jovens, traço que se fez acentuado no que tange a população pobre. Foi nesse contexto que se consolidou a figura do menor, como indivíduo marginalizado, perigoso e diferente das outras crianças.

Com esse novo passo, a norma tratou do princípio da situação irregular, de acordo com Segundo (2009) o referido diploma não fez distinção entre menor carente e menor delinquente, fazendo nascer a suposição de que o crime nasce da pobreza, com esse enfoque, a  referida legislação tinha o objetivo de tutelar o menor, com a ideia de “criminalizar” a pobreza.

Em 1964 foi estabelecida a Política Nacional de Bem Estar do Menor, por meio da Lei nº 4.513, onde ficou instituída uma gestão centralizada e vertical, no entendimento de Segundo (2009), esta iniciativa fundamentou-se em padrões uniformes de atenção direta, implementados por órgãos executores em nível nacional e estadual, aquele denominado como FUNABEM (Fundação Nacional de Bem Estar do Menor), e em nível de estado, FEBEM (Fundação Estadual de Bem Estar do Menor).

Surge entre nós o Código de Menores de 1979, que de uma vez por todas, positiva a situação irregular. Para Melo (2000) determinado diploma consagrou e positivou a Teoria da Situação Irregular, onde o menor seria tutelado e não julgado, o fato é que este sujeito geralmente pertencia à classe menos favorecida da sociedade, nesse contexto é que surgia a maior parte das arbitrariedades, a essa altura, não se distinguia quem era abandonado dos que eram verdadeiramente delinquentes, decerto que, a internação se dava por período indeterminado.

Diante dessa problemática, Oliveira (2010) ressalta a importância da Convenção sobre direitos da criança e do adolescente aprovada pela ONU em 1989, assinada pelo Brasil em 1990, nesse mesmo ano foi consolidado no nosso país o Estatuto da Criança e do Adolescente por meio da Lei nº 8.069/90, substituindo assim o Código de Menores.

Nesse contexto, na opinião de Macedo (2008) denominado Estatuto tratou de dividir os menores em crianças (até 12 anos incompletos), sujeitos à medidas de proteção, previstas no artigo 98; e adolescentes (dos 12 aos 18 anos incompletos), sujeitos à medidas socioeducativas disciplinadas no artigo 112.

Nesse ínterim, é de curial importância tecer alguns comentários acerca desse diploma legal que disciplina os direitos das crianças e adolescentes, quando estes figurarem como autores de atos infracionais.

Convém trazer à tona a definição de ato infracional, nos termos do art. 103 da Lei nº 8.069/1990, in verbis:

“Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal”.

Imperioso ressaltar o que diz o art. 105 do ECA a respeito dos atos infracionais cometidos por crianças, este aduz que, nessa hipótese serão aplicadas as medidas previstas no art. 101, a saber:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras as seguintes medidas:

I- encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II- orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III- matricula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV- inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;

V- requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI- inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII- acolhimento institucional;

VIII- inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX- colocação em família substituta.

Quando se tratar de adolescentes praticando ato infracional, necessário trazer à baila o que preceitua o art. 112, in verbis:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I- advertência;

II- obrigação de reparar o dano;

III- prestação de serviços à comunidade;

IV- liberdade assistida;

V- inserção em regime de semiliberdade;

VI- internação em estabelecimento educacional;

VII- qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

O Estatuto da Criança e do Adolescente além de dispor a respeito de medidas aplicáveis às crianças e adolescentes quando autores de atos infracionais, estabelece também direitos e garantias jamais asseverados em diplomas anteriores, com vistas a efetivar e obedecer aos ditames constitucionais, desse modo, o art. 3º do aludido diploma, assim reza:

Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Em consonância com o acatado, a Constituição Federal de 1988 prevê expressamente a Doutrina da Proteção Integral, rompendo com o paradigma da Situação Irregular que imperava no Código de Menores, dessa forma, as crianças e os jovens passaram a dispor de proteção adequada, direitos e garantias jamais asseverados em toda a história da legislação brasileira, conforme se expõe:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à conveniência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Nessa tônica, Muller (2011) alerta para a importância do referido artigo por se tratar de direitos e fundamentais, de onde se extrai a ideia de limitação aos arbítrios do Poder Público e daqueles que atuam em seu nome, com o fito de efetivar o princípio da dignidade da pessoa humana, um dos pilares que sustenta a nossa República.

O dispositivo em comento além de assegurar o princípio da Prioridade Absoluta, também dispõe sobre o princípio da Proteção Integral à criança e ao adolescente que para Oliveira (2010) remete ao fato de denominados sujeitos necessitarem de atenção especial, levando em consideração sua condição de ser em desenvolvimento, o que para o referido autor, justifica a inimputabilidade penal dos menores de 18 anos.

1.7A INIMPUTABILIDADE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Assim, preceitua o art. 228 da Constituição Federal de 1988, in verbis: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”. Essa determinação encontra-se repetida no art. 27 do Código Penal e no art. 104 da Lei n° 8.069/90, denominado Estatuto da Criança e do Adolescente.

No ordenamento jurídico brasileiro a idade para a imputabilidade penal já se encontra devidamente fixada, ocorre que, na lição de Macedo (2008) existem projetos de emenda constitucional tramitando no Congresso Nacional visando à redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos, continuando a suspeita se essa atitude resolveria o problema da violência e insegurança da população.

De outra face, Macedo (2008) aduz que a mencionada redução ainda é questionada, tendo em vista a possibilidade de contrariar acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário, ou até mesmo colocar o país na mão inversa das nações contemporâneas.

De sorte que, o referido mandamento constitucional, qual seja, o artigo 228 tem sido alvo de inúmeros debates acerca de sua natureza. Parte dos estudiosos do Direito se manifesta no sentido de afirmar que se trata de uma garantia fundamental. Em contrapartida, há quem se levante no intuito de asseverar que o mandamento em questão é uma regra de política criminal, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 é classificada como formal.

Assim, é de grande relevo explicar como se dá a referida classificação. Quanto ao conteúdo, a constituição pode ser classificada tanto em sentido material quanto formal, assim, Lenza (2009) leciona que materialmente constitucional será aquele texto que trouxer em sua essência as normas fundamentais e estruturais do Estado, a organização de seus órgãos, os direitos e garantias fundamentais. Quanto ao sentido formal, o referido autor assevera que, será aquela constituição que elege como critério o processo de sua formação, e não o conteúdo de suas normas. Dessa forma, qualquer regra nela contida terá status constitucional. Por esse motivo, a Constituição Federal de 1988 é considerada formal.

Aliado a isso, a localização do art. 228 no texto constitucional é um ponto relevante, pois convém explicar que, a Constituição Federal de 1988 optou por assegurar expressamente Direitos e Garantias Fundamentais, e de acordo com alguns entendimentos, denominados direitos não se encontram tão somente no art. 5º da Lei Fundamental, eles se encontram espalhados por todo o diploma, sempre que o seu teor importar em direitos inerentes a dignidade da pessoa humana, senão vejamos:

“Art. 5º. (...)

§2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”

Dessa opinião participa Rangel (2010), que considera os denominados direitos como de caráter inalienável, em razão de se mostrarem como condição essencial ao pleno desenvolvimento da personalidade humana. Concordando com esse entendimento, Macedo (2008) leciona que a limitação legal que evita que a criança e o adolescente sejam submetidos a um processo criminal comum, possui natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias previstas no art. 5º do texto da Carta Maior.

Dessa feita, a Constituição Federal de 1988 tratou de dispensar um tratamento diferenciado a essas garantias, quando dispôs em seu art. 60, §4º, IV, que é absolutamente vedada à deliberação de emenda que tenha por objeto a abolição de direitos e garantias individuais.

  1. DIFERENTES POSICIONAMENTOS A RESPEITO DA REDUÇÃO

A sociedade brasileira tem convivido com intermináveis debates acerca da redução da maioridade penal. É de bom alvitre reconhecer, que esta discussão ganhou espaço em todas as áreas do conhecimento, mais precisamente na seara do direito. É com esse entendimento que se torna imperativo trazer à baila, os mais diferentes posicionamentos a respeito da natureza jurídica do dispositivo constitucional que determina a inimputabilidade dos menores de 18 anos.

2.1       ARGUMENTOS FAVORÁVEIS A REDUÇÃO

De acordo com Masson (2008), os adeptos desta posição acreditam que uma emenda constitucional seria uma medida suficientemente capaz de reduzir a maioridade penal, em razão de não ser cláusula pétrea, mas sim uma norma constitucional inserida no capítulo inerente a família, a criança, ao adolescente e ao idoso.

Alguns partidários dessa corrente argumentam que os chefes de facções criminosas se aproveitam de adolescentes infratores para a consumação de ilícitos penais, tendo em vista o tratamento diferenciado que lhes é dispensado, assim afirmam Oliveira e Funes (2008).

Para Greco (2011) apesar de a maioridade penal estar contida no texto constitucional, nada impede que havendo vontade política, esta seja reduzida, tendo em vista que o aludido art.228 não se encontra entre os dispositivos considerados irreformáveis, não se adaptando ao rol de cláusulas pétreas, dessa forma, o autor alerta que a única implicação prática da inserção da inimputabilidade penal no texto da Carta Maior, é que somente mediante um procedimento qualificado de emenda, poderá ocorrer a redução da maioridade penal, tornando-se impraticável essa redução por meio de lei ordinária.

Na opinião de Nucci (2011) os jovens da atualidade não são os mesmos do início do século, razão pela qual, torna-se desnecessário tratá-los como pessoas que não têm noção do caráter ilícito do que fazem ou deixam de fazer, por isso, a redução é uma imposição natural, podendo ocorrer igualmente como em outros países, o estabelecimento de uma separação no local de cumprimento de pena para os maiores de 18 anos e para os menores que forem considerados imputáveis.

Nesse caso, o melhor a se fazer na opinião do autor supramencionado seria a adoção de um critério misto, não somente cronológico, da mesma forma que se verifica a sanidade do indivíduo por meio de perícia, necessitaria ser feito o mesmo quanto aos maiores de 14 ou 16 anos, caso considerados aptos a entender o ilícito, deveriam ser declarados imputáveis, ainda que tivessem tratamento diferenciado e em jurisdição específica.

           

2.2       ARGUMENTOS CONTRÁRIOS A REDUÇÃO

Segundo Masson (2008) os defensores desta posição acreditam que a redução da maioridade penal somente seria possível com o advento de uma nova Constituição Federal, oriunda do Poder Constituinte Originário, tendo em vista tratar-se de cláusula pétrea implícita concernente ao direito fundamental do menor de 18 anos, que não pode ser julgado, processado e condenado pela Justiça Comum.

Na lição de Mirabete e Fabbrini (2011) não se pode negar que atualmente um jovem de 16 a 17 anos, independente do seio social, tenha amplo conhecimento do mundo que o cerca, bem como condições de discernir acerca da ilicitude de seus atos, todavia, na opinião dos autores, reduzir a maioridade penal constituiria um retrocesso para a política penal e penitenciária brasileiras, além de promover a “promiscuidade” dos jovens com delinquentes contumazes. Os autores acima mencionados acreditam que:

“O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, aliás, instrumentos potencialmente eficazes para impedir a prática reiterada de atos ilícitos por pessoas com menos de 18 anos, sem os inconvenientes mencionados”. (MIRABETE e FABBRINI, 2011, p. 202).

Nesse diapasão Mirabete e Fabbrini (2011) relembram o disposto no Código Penal de 1969, que adotou o critério biopsicológico para aferição de imputabilidade, caso o menor entre dezesseis e dezoito anos manifestasse suficiente desenvolvimento psíquico para entender o ilícito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento, seria possível a imposição de pena. Ocorre que, na vacatio legis do novel diploma, o legislador novamente elevou o limite para 18 anos, mediante o apelo da magistratura de menores e de grande parte de estudiosos, que argumentaram sobre as diversas dificuldades que seriam enfrentadas para aferir a capacidade de culpa destes menores, tendo em vista ser necessário uma perícia sofisticada e difícil praticabilidade.

Nessa esteira, Toledo (2008) admite que não existe indicação de que a idade de dezoito anos seja um marco exato para o começo da capacidade de compreender o injusto e de autodeterminar-se, trata-se de um limite de tolerância, aconselhado pelo Seminário Europeu de Assistência Social das Nações Unidas, de 1949, em Paris, a prova disso é que, grande parte dos países, adotam esse critério com pequenas variações para mais ou para menos.

Na opinião de Toledo (2008) a idade limite de 18 anos possui razão de ser, pois no seu entendimento, ninguém nasce sabendo das regras precisas de um comportamento lícito, por esse motivo, o renomado autor admite que o crime é um fenômeno cultural, dessa forma vejamos:

Aquilo que seria absolutamente normal em uma ilha deserta, para um indivíduo isolado (apanhar frutas de qualquer árvore, apossar-se de tudo que lhe aprouvesse, destruir o que se lhe apresentasse como hostil ou desagradável, etc.), pode ser um grave crime na vida em sociedade. Ora, a criança é um ser inicialmente ilhado. Precisa ver e aprender para que possa “bem comportar-se” no interior da comunidade que brevemente irá impor-lhe desde a forma correta de mastigar, de vestir-se, até o modo de comportar-se perante as coisas e as pessoas. É, na verdade, um duro aprendizado esse de ter que conter apetites e impulsos naturais diante de certas regras ou normas de conduta impostas de fora. E não se deve esquecer que até mesmo os santos sucumbiram, por vezes no curso desse aprendizado, como nos revela Santo Agostinho no relato do furto das peras. Que dizer dos milhares de pequenos seres (a imensa maioria) não tão bem dotados ou predestinados? Não é nada fácil abandonar o mundo mágico e livre da infância para, passando pela puberdade, transformar-se no “homem razoável”(...) (TOLEDO, p. 320, 2008). 

A par desse pensamento, Glueck apud Toledo (2008) alerta que de acordo com investigações psiquiátricas e criminológicas, as primeiras manifestações de conduta antissocial na infância não são fruto de aprendizado, se constatam naturalmente, de fato, o que precisa ser aprendido é o comportamento não-delinquente.

Segundo o grande criminólogo e pesquisador americano, a criança não-socializada, não-domada, não-instruída, recorre à mentira, à fraude, ao subterfúgio, à cólera, ao ódio, ao furto, à agressão, ao ataque, e a outras formas de comportamento, nas suas primeiras tentativas de auto-expressão. Assim, a formação de um caráter amoldado ao respeito à lei é um processo difícil. Não é outra, aliás, senão essa, a missão reservada à educação da criança, o que exige, como é óbvio, muita paciência e algum tempo. (GLUECK apud TOLEDO, p. 321, 2008).

Importa alinhavar que Toledo (2008) justifica seu posicionamento com base nos ideais acima mencionados, sob o argumento de que o menor deve ser tratado de modo especial, mediante legislação especial. Caso essa legislação esteja carecendo de atualização ou apresentando deficiências, o ideal é buscar aprimorá-la e não necessariamente reduzirem-se os limites de idade penal, tendo em vista as reconhecidas falhas do sistema penitenciário.

3.         DISCUSSÃO DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL DE ACORDO COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

3.1       ARTIGO 228 COMO CLÁUSULA PÉTREA

De acordo com Moraes (2007) o legislador constituinte de 1988, classificou a nossa Carta Política como uma Constituição rígida, uma vez que previu a possibilidade de alteração das normas constitucionais por meio de um processo legislativo especial e mais dificultoso que o ordinário, consolidando assim a ideia de supremacia da ordem constitucional.

Nesse sentido, Moraes (2007) explica que o Congresso Nacional, no exercício do Poder Constituinte derivado reformador, submete-se a limitações constitucionais. As limitações expressas materiais desaguam no núcleo intangível da Constituição Federal, mais conhecido doutrinariamente como “cláusulas pétreas”. Assim, cumpre alinhavar o conceito de cláusula pétrea:

Denomina-se cláusula pétrea o dispositivo que impõe a irremovibilidade de determinados preceitos, os quais constituem o núcleo irreformável da Constituição. Jamais um princípio que se constitui em cláusula pétrea poderá ser abolido, nem mesmo por Emenda Constitucional. A cláusula pétrea é intocável. (MACEDO, 2008, p. 187).

Com essa compreensão, é de curial importância refletir nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, quando aduz que:

Tais cláusulas de garantia traduzem, em verdade, um esforço do constituinte para assegurar a integridade da constituição, obstando a que eventuais reformas provoquem a destruição, o enfraquecimento ou impliquem profunda mudança de identidade, pois a constituição contribui para a continuidade da ordem jurídica fundamental, à medida que impede a efetivação do término do Estado de Direito democrático, sob a forma da legalidade, evitando-se que o constituinte derivado suspenda ou mesmo suprima a própria constituição. (MENDES apud MORAES, p. 639, 2007).

A par desse raciocínio, é válido transcrever o que reza a nossa Carta Política de 1988:

Art. 60. (...)

§4º. Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

(...)

IV- os direitos e garantias individuais.

Como bem explica Moreira (2011) a idade penal mínima prevista no art. 228 da Constituição Federal de 1988 configura-se no ordenamento jurídico brasileiro como cláusula pétrea, em razão de sua vinculação com o princípio da dignidade da pessoa humana, além de ser um direito fundamental proveniente da Convenção das Nações Unidas de Direito da Criança, da qual o Brasil é signatário, diante disso, trata-se de um direito com status de intangibilidade.

Nessa esteira Moreira (2011) acredita que a idade penal mínima estabelecida no marco de 18 anos de idade, é um direito fundamental, como também uma garantia contra o próprio Estado, com vistas a proteger a criança e o adolescente contra qualquer violação ao seu direito à liberdade. Com esse entendimento, o aludido autor conclui que, a redução da maioridade penal para dezesseis anos ou menos, como exemplo de controle social não é legítima.

Moreira (2011) acredita que a redução da maioridade penal não se encaixa como uma solução para a criminalidade infantil, pelo contrário, o referido autor assevera que se faz necessário reformular o Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como investir na preparação de uma legislação capaz de regular a execução penal das medidas sócio educativas, além disso, seria de bom alvitre melhorar a educação pública e reduzir a desigualdade social, com essas medidas, o autor afirma que a criminalidade infanto-juvenil diminuiria em números significativos.

De acordo com Ferreira (2007) o dispositivo ora em análise, qual seja o artigo 228 da Constituição Cidadã propõe uma exceção ao jus puniendi do Estado referente aos menores de 18 (dezoito) anos de idade. Trata-se de um impedimento imposto ao Estado, para que este não interfira na esfera individual desses indivíduos, com o objetivo de restringir a liberdade física e patrimonial, além de compeli-los a se absterem de determinadas condutas (normas penais típicas) no arcabouço jurídico.

Nessa tônica, Ferreira (2007) assevera que o art. 228 da Constituição Federal de 1988 se trata de uma liberdade individual pertencente aos adolescentes, e que deriva do direito básico à liberdade, por isso, é um direito fundamental, considerado imutável, não podendo ser objeto de emenda constitucional como pretendem alguns legisladores pátrios.

Desse entendimento compartilha Jesus apud Toscano (2007), o referido autor afirma que a maioridade penal é considerada cláusula pétrea, não podendo ser alterada por Emenda Constitucional, somente por meio do Poder Constituinte Originário, ou seja, com a mudança da Constituição.

De outra sorte, Pereira (2011)acrescenta que alguns estudiosos defendem que a reforma do artigo 228 da Carta Política não violaria o direito individual ali elencado, tendo em vista que, “o direito individual” não deixaria de existir, o que ocorreria seria a alteração do fator idade, vez que o termo inicial da maioridade penal se distingue do instituto da maioridade penal.

Para melhor elucidar o tema, é de curial importância analisar a ADI 2024/DF, cujo Relator foi o Ministro Sepúlveda Pertence que nessa oportunidade, frisou:

[...] As limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, §4º da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege. (PERTENCE apud PEREIRA, 2011).

A par disso, Pereira (2011) observou que, para a Suprema Corte, a norma material não pode ser atacada mediante emenda constitucional, mas a literalidade da norma material não pode ser considerada intangível, tendo em vista que o “núcleo essencial dos princípios e institutos” permanece resguardado pela Constituição Federal de 1988.

Corroborando com esse entendimento, é que Lenza (2009) assevera ser “perfeitamente possível” a redução da idade penal de 18 para 16 anos, tendo em vista que, o que não se admite é a proposta de emenda constitucional (PEC) tendente a “abolir” direito e garantia individual, não significa conforme já interpretou o STF, que a matéria não possa ser modificada. O mencionado autor ainda explica que:

“Reduzindo a maioridade penal de 18 para 16 anos, o direito à inimputabilidade, visto como garantia fundamental, não deixará de existir”. (LENZA, p.872, 2009).

Conforme bem explica Lenza (2009), com a evolução da sociedade, uma pessoa com 16 anos de idade possui total consciência de suas atitudes, a prova disso é que exerce o direito de votar, além de poder propor ação popular, nessa conjuntura, é válido afirmar que o limite de 16 anos já está sendo adotado, e fundamenta-se no exercício dos direitos de cidadania, bem como na razoabilidade e maturidade do ser humano.

3.2       ARTIGO 228 COMO REGRA DE POLÍTICA CRIMINAL

Importa por oportuno trazer à baila o entendimento de Zaffaroni et al (2011) a respeito de política criminal:

A expressão política criminal é empregada desde o século XVIII em vários sentidos, mas com sua difusão foi perdendo conteúdo semântico. Em geral predomina um conceito que lhe concede a função de estabelecer como devem ser configuradas a legislação e a jurisprudência, para prover uma proteção mais eficaz da sociedade. O pensamento positivista a considerava um saber útil ao legislador, no sentido de que seria a arte de adaptar às exigências de cada povo as propostas da sociologia criminal para a defesa preventiva e repressiva. A partir de um ângulo diferente, o direito penal liberal – para o qual o direito penal derivava da razão e a criminologia era o direito penal filosófico – considerou-se uma doutrina da prática legislativa. Hoje costuma-se considerá-la um saber que igualmente têm importância para a dogmática jurídico-penal, ou seja, é comum afirmar-se que não se trata de um saber destinado apenas a legisladores, mas também a intérpretes e a juízes, pois para o pensamento penal dominante a política criminal não é – como para Liszt – um saber empírico baseado na criminologia e na penologia (e ao qual o direito penal deve por limites), mas sim está inserida no direito penal e não confrontada com este.  ( ZAFFARONI, p. 274, 2011).

Em se tratando da relação existente entre a política criminal e a legislação penal, Zaffaroni e Pierangeli (2009) afirmam que:

Toda norma jurídica surge de uma decisão politica. Toda norma jurídica traduz uma decisão política. A decisão política dá origem à norma jurídica, mas isto não implica que a norma jurídica fique submetida absolutamente à decisão política. Ninguém pode argumentar que a norma não traduz adequadamente a decisão política, para defender que está proibido o que a ordem jurídica não proíbe, mesmo que esta tenha sido a vontade do legislador. A norma é filha da decisão política, leva sua bagagem genética, mas o cordão umbilical entre a decisão político-penal e a norma, é cortado pelo princípio da legalidade, ao menos no que concerne à extensão punitiva.

(ZAFFARONI e PIERANGELI, p. 119, 2009).

                                                                                                 

Importa esclarecer que, não necessariamente os adeptos desta corrente são obrigatoriamente a favor da redução da maioridade penal. Nessa circunstância, Bitencourt (2009) acrescenta que:

Razões de política criminal levaram o legislador a optar presunção absoluta de inimputabilidade do menor de 18 anos. Aliás, a Exposição de Motivos do Código Penal de 1940, que adotava essa orientação, justificava afirmando: “Os que preconizam a redução do limite, sob a justificativa da criminalidade crescente, que a cada dia recruta maior número de menores, não consideram a circunstância de que o menor, ser ainda incompleto, é naturalmente antissocial na medida em que não é socializado ou instruído. O reajustamento do processo de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal”. Por isso, os menores de dezoito anos, autores de infrações penais, terão suas “responsabilidades” reguladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA-, que prevê as medidas adequadas à gravidade dos fatos e à idade do menor infrator (Lei n. 8069/90). Nessa faixa etária os menores precisam, como seres em formação, mais de educação, de formação, e não de prisão ou de encarceramento, que representa a universidade do crime, onde é impossível alguém sair melhor do que entrou. A experiência do cárcere transforma um simples batedor de carteira em um grande marginal. (BITENCOURT, 2009, p. 381).

O aludido autor ainda afirma que, a redução da maioridade penal para os dezesseis anos, acarretará a explosão da capacidade das penitenciárias que já se encontram superlotadas, como resultado disso, teremos somente bandidos mais jovens e delinquindo por mais tempo; além do que, esses menores farão o aprimoramento no delito no interior das unidades prisionais.

Seguindo a lição de Bittencourt (2009) este informa que o Código Penal da Espanha, com vigência desde 1996, constitui-se em um dos Códigos Penais Europeus mais contemporâneos, elevou a idade do menor de dezesseis para dezoito anos.

Diante disso, o autor acima referido, traz uma possibilidade para se abrandar o furor punitivo, nem a responsabilidade do Código Penal, nem as medidas terapêuticas do ECA, mas em contrapartida, propõe-se uma elevação da restrição da liberdade, nas suas palavras uma “responsabilidade penal diminuída”, com resultados diferenciados, onde as sanções ocorreriam em estabelecimentos penais de outra modalidade, com tratamento adequado e presença obrigatória de psicólogos, psiquiatras, terapeutas e assistentes sociais.

Com esse tratamento, o autor ainda explica que o menor infrator terá oportunidade de receber educação e preparação para a entrada no mercado de trabalho, e nesses moldes, poder-se-ia acolher a elevação das medidas socioeducativas, chegando ao máximo de 5 anos para as infrações comuns e até sete anos para os denominados crimes hediondos e equiparados.

No ensinamento de Machado (2010) não se desvendou uma nova culpabilidade para os atuais inimputáveis que fosse capaz de modificar a legislação, sobre o assunto, vejamos:

“Será tarefa da Criminologia mostrar quais instrumentos de educação e controle social podem ser aqui aplicados, sendo certo que o Direito Penal não é o meio idôneo para disciplinar e socializar crianças”. (ROXIN apud MACHADO, 2010, p. 262).

Com esse raciocínio Machado (2010) afirma que, grande parte dos crimes são perpetrados por indivíduos com idades entre 14 e 16 anos, fato que independe da maioridade ser elevada ou não, demonstrando que esses agentes são menos suscetíveis a intimidação, consequentemente, comprova-se que os adolescentes são menos acessíveis a norma no momento do fato.

Machado (2010) analisa que a maior parte dos comportamentos reprováveis pela lei executados por adolescentes fica impune, não obstante haver uma legislação destinada a estes jovens que é o Estatuto da Criança e do Adolescente, além disso, pela experiência brasileira, não mais se acredita nas medidas socioeducativas, nem mesmo na eficácia da correção dos estabelecimentos. O autor ainda faz um alerta para a consciência social, onde esta se acostumou em considerar parte das infrações cometidas por adolescentes como brincadeiras, de modo que acaba por desestabilizar a confiança dos cidadãos na vigência dos valores tutelados pela norma penal.

Com esse entendimento Machado (2010) acredita diante essas constatações ditas por ele como “empíricas e racionais”, estas são possíveis por conta das contribuições oriundas do sistema funcional político-criminal, tendo em vista a sua capacidade de absorver conhecimentos e experimentações de outras ciências, relacionando-se com a Criminologia no que concerne a redução da idade penal.

Nesse ínterim, Andrade Filho (2007) complementa que, o teor do aludido art. 228 se encontra no texto constitucional por escolha do legislador constituinte, de modo que, poderia perfeitamente estar contido na legislação infraconstitucional, ou seja, poderia adentrar no mundo jurídico por meio de lei ordinária ou complementar, a par disso, o denominado autor afirma ainda que, o art. 228 é norma constitucional somente por estar disposto na Constituição.

De outra face, segundo Andrade Filho (2007) a Constituição Federal de 1988 tratou de lançar mão de normas de Política Criminal consideradas pela doutrina como princípios destinados a reforma ou transformação da legislação criminal e dos órgãos responsáveis por sua implementação. Por essa razão, normas deste cunho são passíveis de alteração conforme a evolução da sociedade.

Na opinião de Andrade Filho (2007), é perceptível que nos dias atuais os menores de 18 anos, comumente os maiores de 16 anos, praticam diversos tipos de infrações penais, diga-se de passagem, com requintes de crueldade, demonstrando integral capacidade de entenderem o caráter ilícito do que estão cometendo. Sendo assim, seria incumbência do legislador infraconstitucional adaptar o marco inicial para a maioridade penal, sem necessidade de alteração da Constituição Federal de 1988. Pois, não se pode “engessar” o sistema repressivo do País, além disso, é tarefa do Direito acompanhar a evolução da sociedade, não sendo possível que se empreste o manto da cláusula pétrea ao termo inicial de 18 anos.

Concordando com esse posicionamento é que Nucci (2011) afirma que, pela primeira vez, foi inserida na Constituição Federal, matéria perceptivelmente relacionada com a legislação ordinária, o ilustre autor ainda assevera que sendo assim, a única via de se “contornar” essa circunstância seria reduzir a maioridade penal através de emenda constitucional, “algo perfeitamente possível”, tendo em vista a localização do referido dispositivo, pois se o constituinte quisesse poderia ter inserido o denominado assunto no rol dos direitos e garantias fundamentais (art. 5º). Cabe acrescentar ainda que, o doutrinador mencionado não concorda com a tese de que há direitos e garantias humanas fundamentais soltas em trechos da Constituição Federal de 1988.

Corroborando com esse entendimento, Andrade Filho (2007) aduz que a clássica doutrina considera que a maioridade penal foi tratada no capítulo VII da Constituição de 1988 somente por opção do constituinte, desse modo, o fato de não se encontrar no rol dos Direitos e Garantias Fundamentais (art. 5º) não se caracteriza como uma garantia individual; acrescenta ainda o autor que, também não se trata de uma norma material porque não se trata de determinação supra estatal, ou seja, encontra-se na Constituição somente por mero critério de seleção do legislador.

Nucci (2011) também aduz que a maioridade penal além de não se tratar de direito fundamental em sentido material, (e a respeito disso, o autor pondera que não há entendimento integral que reconheça esse posicionamento), também não o é em sentido formal.

Nesse sentido, é válido levar em consideração, os motivos que levaram o legislador constituinte a adotar a idade de 18 (anos) para que uma pessoa possa ser considerada imputável. Nucci (2011) explica que a escolha do legislador se deu por motivos puramente biológicos, ou seja, a lei penal criou uma presunção absoluta acerca da idade de 18 anos, sob o argumento de que nessa faixa etária o indivíduo possui desenvolvimento mental incompleto, e sendo assim, não tem condições de compreender o caráter ilícito do que faz, ou capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Na opinião de Nucci (2011), os menores com 16 ou 17 anos, na prática, já têm plenas condições de compreender o caráter ilícito do que praticam, haja vista que, o desenvolvimento mental acompanha a evolução dos tempos, fato que torna a pessoa mais precocemente preparada para compreender os fatos da vida. Nesse raciocínio, o autor faz um alerta no sentido de informar que, não será essa modificação que combaterá a criminalidade, e que essa não seria a solução para o problema da grande prática delitiva no país, embora considere recomendável que isso seja feito, com vistas a adequar a legislação à realidade do país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Aventar a redução da maioridade penal requer um minucioso estudo desprovido de toda sorte de influências. É necessário antes de tudo, analisar o arcabouço jurídico no qual se fundamenta o instituto da maioridade, bem como suas razões e critérios de adoção.

No presente estudo, pretendeu-se registrar e entender o instituto da menoridade em todos os seus aspectos, além de arrolar os principais pontos de embate no que se refere à redução da maioridade penal à luz da Constituição Federal de 1988. O que se pode observar é que, essa altercação ainda está longe de ter um fim, tendo em vista que os argumentos favoráveis e contrários à redução são extremamente fortes e persuasivos, necessitando de uma apurada exegese do legislador, afim de que se possa de uma vez por todas, determinar o verdadeiro sentido e alcance da norma constitucional consubstanciada no art. 228.

Nesse ínterim, é de curial importância alinhavar que, esta análise não aspirou esgotar o referido tema, ou tão somente apontar uma solução para a criminalidade infanto-juvenil recorrente no país, objetivou, sobretudo, destacar e estudar os diferentes posicionamentos atinentes à redução, afim de retirar-lhes o que se tem de melhor, para enfim sobrepor à realidade da sociedade brasileira.

Constatou-se que, os autores mencionados em sua maioria, independente de serem favoráveis a redução ou não, reconheceram que o jovem da atualidade não pode ser comparado àquele do início do século em virtude do progresso da sociedade, assim como, grande parte dos estudiosos reconheceram que o Estatuto da Criança e do Adolescente necessita ser reformulado, seja para aplicar medidas mais extensas, como, por exemplo, aumentar a internação, seja para aplicar medidas mais educativas, o fato é que,  de acordo com os relatos, observa-se que o ECA  não está sendo o meio mais eficaz, para se ressocializar os menores.

Foi possível identificar que, cada posicionamento adotado e exposto nesse modesto estudo, carece ser ponderado, tendo em vista apresentar pontos valiosos e de grande importância para o entendimento do instituto da maioridade penal, pois possibilitam vislumbrar que, a solução para a diminuição da violência no país não se resume na redução da maioridade, trata-se de uma realidade que vai além do que os estudos podem demonstrar, pois é necessária a implantação de políticas públicas, educação de melhor qualidade, redução das desigualdades sociais e dentro dos estabelecimentos de menores, acompanhamentos com educadores, psicólogos, assistentes sociais e etc.

A redução da maioridade penal é medida que se impõe, tão somente para adequar a realidade do país aos ditames da evolução da sociedade, pois um dado preocupante que se verifica é que, o adolescente de hoje não mais se intimida com a norma, tendo em vista saber que, possui um instrumento de proteção capaz de abrandar o furor punitivo do Estado e por vezes, isentá-lo de responsabilidade, fazendo com que o Direito deixe de cumprir com sua tarefa primordial que é acompanhar a desenvolvimento da sociedade.

Outro ponto importante a ser registrado, é que não necessariamente os autores que acreditam que o art. 228 é cláusula pétrea são contrários à redução, como também, aqueles que afirmam que o art. 228 é regra de política criminal, são por força, a favor da redução. Ou seja, trata-se de um tema, ainda bastante melindroso e controverso.

Convém destacar que, o presente trabalho não ambicionou responder qual a natureza jurídica do dispositivo em comento, até porque, será tarefa do Supremo Tribunal Federal conceder esse veredicto. Foi proposto como problema de pesquisa contrapor a seguinte indagação: qual a possibilidade de reduzir a maioridade penal sem ferir a Constituição Federal de 1988?

            O que se constatou é que, independente de ser considerado como regra de política criminal ou cláusula pétrea, o art. 228 poderá ser modificado por meio de uma emenda constitucional, havendo vontade política para tanto. Caso o aludido artigo seja direito e garantia fundamental, a idade penal poderá ser modificada porque o que é vedado pela ordem constitucional é a emenda tendente a “abolir” direitos e garantias fundamentais.

            Dessa feita, tem-se por concluída esta tarefa acreditando que a Corte Suprema na figura de guardiã da Constituição, necessita se manifestar a respeito do tema, com o intuito de oferecer uma resposta definitiva para toda a coletividade, tendo em vista que existe uma grande inquietação por parte da sociedade quando se observa pelos telejornais a quantidade de crimes bárbaros cometidos por adolescentes, onde muitas vezes terminam em impunidade.

REFERÊNCIAS

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Sobre a autora
Suyeme Rochelly Silva de Araújo Barboza

Bacharel em Direito pela Faculdade Estácio Atual da Amazônia, em Boa Vista/Roraima.<br>Pós-graduanda em Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade Estácio Atual da Amazônia, em Boa Vista/Roraima.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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