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O acesso à justiça

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01/11/2002 às 00:00
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CAPÍTULO VII: A MAGNA CARTA

Já a Magna Charta Libertarum, outorgada pelo Rei João Sem Terra, em 1215, se bem interpretado o seu item 40, chega-se ao entendimento de que o acesso à Justiça, já, ali, foi estabelecido, nos seguintes termos:

"Não venderemos, nem recusaremos, nem protelaremos o direito de qualquer pessoa a obter justiça".

Disse a Magna Carta: Não venderemos o direito de qualquer pessoa a obter Justiça.

O acesso à Justiça, impõe que a Justiça justa não venda o direito. A venda do direito é a mais torpe forma de impedir o acesso à justiça. Entenda-se, desde a Magna Carta de 1215, ao decidir-se a causa, prejudicando as partes, negando o direito às partes, por questões subjetivas e pessoais, ou por subserviência ao Estado, veda-se o acesso à justiça.

Disse a Magna Carta: "Não recusaremos o direito de qualquer pessoa obter Justiça".

Recusar Justiça é outra forma de violação do acesso à Justiça, porque desmoraliza a democracia e violenta a cidadania.

Recusa-se, Justiça, ao se negar o julgamento do mérito da causa, ao se negar o julgamento do direito substantivo, prendendo-se aos excessivos formalismos processuais oriundos de uma interpretação literal e baseada exclusivamente no texto da lei, em vez de se buscar a única interpretação correta existente no ordenamento jurídico.

Disse a Magna Carta: não protelaremos o direito de qualquer pessoa.

Protelar o direito de qualquer pessoa, desde 1215, com a Magna Carta, é negar acesso à Justiça.

Protela-se o direito, nega-se acesso à justiça, protelando-se a decisão. É a aética justiça tardia. São os embargos de gaveta. É a não decisão em tempo hábil, reparando o direito ofendido ou, preventivamente, impedindo a violação do direito. É a aética justiça para o rico e a outra aética justiça para o pobre.


CONCLUSÃO

Como o regime político, desejado pelo Constituinte de 1988 para o Brasil, é de um Estado Democrático de Direito, cujo fundamento é a soberania do povo e como soberano é o povo participativo, conforme princípio fundamental expresso no artigo 1º, da Constituição, e não se podendo conceber Estado Democrático de Direito, sem tutela efetiva de direitos fundamentais, e, tendo esse Estado Democrático de Direito como fundamentos entre outros, a cidadania e a dignidade da pessoa humana, sendo um dos objetivos fundamentais desse Estado Democrático de Direito (artigo 3º, I, construir uma sociedade livre, justa e solidária), e, também, porque o artigo 4º, II, da Constituição estabelece que "A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais, pela prevalência dos direitos humanos", a única leitura que se pode fazer do artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República Federativa do Brasil, é que acesso à justiça, é acesso à justiça material, efetiva, concreta, porque também, acesso à justiça na interpretação principiológica da Constituição, é a realização do objetivo principal do Estado Democrático de Direito: a concretude dos direitos fundamentais, a garantia dos direitos dos governados.

Presidente Hiram Souza Marques, a convocação que Vossa Excelência nos fez, aos advogados de Rondônia, para na 8ª Conferência dos Advogados, refletir sobre Cidadania, Democracia e Justiça, evoca-nos um passado muito distante, quando o eminente Presidente Raimundo Faoro – um dos vultos maiores de toda a História da Ordem dos Advogados do Brasil, convocava a classe dos advogados para a 8ª Conferência Nacional, em 1978, sob o tema "Estado de Direito": "Será necessário – dizia o grande Presidente, que os advogados, ao espelhar a consciência jurídica do País, reflitam sobre a realidade presente e ofereçam a contribuição de sua inteligência para ordenar, sob o império da lei, as instituições abaladas em profunda crise de legitimidade".


REFERÊNCIAS BILBIOGRÁFICAS

AFONSO, Elza Maria Miranda. O Positivismo na Epistemologia Jurídica de Hans Kelsen. Belo Horizonte: FDUFMG, 1984. 312 p.

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Processo Constitucional. São Paulo: Forense, 1984. 408 p.

BOBBIO, Norberto. A Era do Direito. Rio de Janeiro: Editora Campos, 1992.

217 p. Tradução de Carlos Nelson Coutinho.

DIAS, Maria Tereza Fonseca; GUSTIN, Miracy Barbosa de Souza. Curso de Iniciação à Pesquisa Jurídica e à Elaboração de Projetos – (Re) pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática. Belo Horizonte: FDUFMG/NIEPE, 2001. 199p.

PIOVESAN, Flávia C. O Direito Internacional dos Direitos Humanos e a Redefinição da Cidadania no Brasil – Justiça e Democracia. São Paulo: Revista dos Tribunais, Vol. 02/111, 1996.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1998. 863 p.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.

ESPANHA. Constituição Espanhola, 1978.

ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA DO NORTE. Convenção Americana sobre os Direitos Humanos.


NOTAS

1. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 15 ed. revista. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 222/223.

2. AFONSO, Elza Maria Miranda. O Positivismo na Epistemologia Jurídica de Hans Kelsen. Tese de Doutorado. Minas Gerais: FDUFMG. 1984. p. 256

3. op. cit., p. 257

4. Ibidem, p. 257

5. Ibidem, p. 260

6. BOBBIO, Norberto. A Era do Direito, Editora Campos. 1992. p. 24/25

7. PIOVESAN, Flávia C. O Direito Internacional dos Direitos Humanos e a Redefinição da Cidadania no Brasil – Justiça e Democracia. Vol. 02/111. São Paulo: RT. 1996.

8. BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Processo Constitucional. Ed. São Paulo: Editora Forense, 1984, p. 362/363.

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Sobre o autor
Arquilau de Paula

advogado em Rondônia

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULA, Arquilau. O acesso à justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3401. Acesso em: 19 abr. 2024.

Mais informações

Texto baseado em palestra proferida na 8ª Conferência dos Advogados de Rondônia, em 19 de setembro de 2002.

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