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Vinculação e discricionariedade nos atos administrativos

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01/02/2001 às 00:00
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4. O Problema dos "conceitos jurídicos indeterminados"

Um ponto de controvérsia que se verifica no estudo do poder discricionário é o concernente à sua relação com os "conceitos jurídicos indeterminados" e, por conseguinte, ao estabelecimento de uma zona de livre apreciação no exercício da atividade administrativa e segundo os limites da lei.

José Eduardo Faria(41) define-os do seguinte modo (embora esteja se referindo o que denominamos termos):

"Os conceitos jurídicos indeterminados’ são expressões propositadamente vagas utilizadas pragmaticamente pelo legislador com a finalidade de propiciar o ajuste de certas normas a uma realidade cambiante ou ainda pouco conhecida; graças a esses conceitos, o intérprete pode adequar a legislação às condições sócio-econômicas, políticas e culturais que envolvem o caso concreto e condicionam a aplicação da lei".

Expressam e qualificam as necessidades públicas cuja satisfação representa o destino da administração pública. Tais como "utilidade pública", "urgência", "grave comoção", "relevância" etc.

A palavra é um veículo do pensamento que sofre com as limitações da linguagem. Ela é insuficiente, por si só, de revelar o conteúdo da lei, sendo imprescindível a ação do operador jurídico para lhe fixar o sentido e alcance de seu emprego em dado documento legal(42). Se o texto normativo não se confunde com a norma, embora aquele seja o ponto de partida deste, o conceito jurídico não se confunde com o termo empregado para designar um ou mais valores, um ou mais fatos da realidade social que se deseja juridicamente regular, pois o conceito é produto da reflexão que expressa uma suma de idéias sobre algo(43).

Dentro da concepção essencialista de língua, esta seria capaz de designar a realidade, delimitando com precisão o objeto que se descreve(44). Contraposta a tal entendimento, a concepção convencionalista vê a língua como: "(...) um sistema de signos, cuja relação com a realidade é estabelecida arbitrariamente pelos homens (...) o que deve ser levado em conta é o uso (social ou técnico) dos conceitos que podem variar de comunidade para comunidade (...)", consoante o critério vigente para designar a palavra na situação social concreta(45). Esta última tem um alcance prático mais satisfatório que a primeira, haja vista a dificuldade de se propor conceitos genéricos e universais que possam abranger todas os casos específicos(46). O sentido e o alcance da palavra, portanto, variará segundo a situação social na qual se insere e, bem como, o seu modo de emprego para descrevê-la ou modificá-la(47).

Por ser vago e impreciso, o termo indeterminado enseja o surgimento de conceitos diversos. Uns são conceitos empíricos, referindo-se a fatos, situações ou estados da natureza ou da realidade (ruído, dia, óbito, por exemplo); outros são conceitos valorativos, sendo exigido do hermeneuta jurídico a sua apreciação consoante as peculiaridades destes (conduta desonrosa, motivo torpe, segurança nacional, por exemplo)(48).

O sentido e o alcance do termo empregado é construído através da aplicação. Nenhum termo legal é claro per si, mas chega a objetividade quando há intervenção, do juiz ou do administrador. O velho brocardo in claris cessat interpretatio não pode mais ser aceito, pois a interpretação é fase anterior a toda formulação da norma jurídica e da norma de decisão, inclusive e principalmente na discricionariedade.

Carlos Maximiliano(49) levanta com nitidez a questão:

"Que é lei clara? É aquela cujo sentido é expresso pela letra do texto. Para saber se isto acontece, é força procurar e conhecer o sentido, isto é, interpretar. A verificação da clareza, portanto ao invés de dispensar a exegese implica-a, pressupõe o uso preliminar da mesma. Para se concluir que não existe atrás de um texto claro uma intenção efetiva e desnaturada por expressões impróprias, é necessário realizar prévio labor interpretativo".

Os conceitos jurídicos são conceitos convencionalistas, através dos quais o jurista procura estabelecer padrões de conduta para a sociedade. É impossível a lei tudo prever e tudo alcançar e, por isso, emprega quem a edita termos dotados da necessária fluidez, preservando a flexibilidade do sistema direito positivo perante a naturalmente instável realidade social. Será o labor interpretativo o veículo para dar vida e objetividade aos enunciados do direito positivo, que ganham maior certeza e segurança quando há a concretização normativa do texto legal.

Seu objeto é a significação atribuível a uma coisa, estado ou situação, e não a coisa, estado ou situação em si, nas palavras de Eros Roberto Grau(50). Essa significação precisa ter um mínimo de determinação e uniformidade para que ele tenha utilidade, ou seja, conceda e viabilize um mínimo de segurança e certeza na aplicação do direito(51). Do contrário, o conceito traz muito mais problemas do que soluções para as demandas jurídicas.

Não é o conceito jurídico indeterminado ou fluido. O termo do texto normativo é que será mais ou menos fluido, dependendo da dificuldade de seu desvelamento pela via interpretativa. Se o termo empregado pelo legislador é indeterminado, cabe ao aplicador do direito fixar seu sentido e alcance, determinando-o(52), pelo menos no caso concreto.

Os termos da lei podem ou não exigir maior trabalho do intérprete, mas este sempre existirá(53).

Pode haver, então, espaço para uma única solução justa, mesmo na interpretação e concretização do exposto no termo indeterminado da lei, se assim o caso concreto orientar. Só teremos discricionariedade quando o texto normativo se permitir duas ou mais soluções justas, e, conseqüentemente, abrindo espaço para a apreciação subjetiva do administrador. Mas, em todo e qualquer caso concreto, o "conceito jurídico indeterminado" se torna determinável:

"Pero al estar refiriéndose a supuestos concretos y no a vaguedades imprecisas o contradictorias, es claro que la aplicación de tales conceptos o la calificación de circunstancias concretas no admite más que una solución: o se da o no se da el concepto; o hay buena fe o na la hay; o el precio es justo o no lo es; o se ha faltado a la probidad o no se ha faltado. Tertium non datur. Esto es lo essencial del concepto jurídico indeterminado: la indeterminación del enunciado no se traduce en una indeterminación de las aplicaciones del mismo, las cuales sólo permitem una ‘unidad de solución justa’ en cada caso"(54).

Há grande dificuldade na descoberta da solução exata no direito(55), prevalecendo sim, um elenco de soluções corretas para o caso concreto(56). Essas opções não serão submetidas ao juízo de oportunidade do administrador, no campo do regime jurídico-administrativo. A ponderação dos termos legais, fluidos ou não, é subordinada ao juízo de juridicidade do administrador, que deve escolher a mais adequada para ordenamento jurídico e a mais conciliada com as exigências do caso concreto. O dever de eficiência na discricionariedade administrativa não se reduz ao juízo de oportunidade(57).

E como afirma Celso Luiz Moresco(58):

"(...) a utilização de termos elásticos ou imprecisos não é sinônimo de autorização para tomada de qualquer decisão ou seja, não significa que qualquer decisão tomada dentro de seus limites seja válida".

Nesse elenco de opções jurídicas, a escolha do administrador pode ou não ser alterada pelo Poder Judiciário. Se cabe ao órgão jurisdicional encerrar o processo de concretização normativa do texto legal, o juízo de juridicidade do juiz acaba por prevalecer sobre o juízo de juridicidade do administrador, se aquele constatar que a solução jurídica escolhida por este é rejeitada pelo ordenamento jurídico.

Com uma importante ressalva: a interpretação do texto legal nem sempre (ou quase) é suficiente para fixar a melhor solução para o caso concreto. Uma coisa é interpretar o texto legal, e outra, é interpretar o texto legal em conjunto com os elementos do caso concreto.

Ao controlar a concretização de textos normativos que utilizam termos fluidos ou indeterminados, deve o Poder Judiciário estabelecer zonas de definição em torno do conceito jurídico, quando ele inspirou uma providência administrativa.

Haverá uma zona de certeza positiva, que conterá as soluções juridicamente corretas e aceitáveis; uma zona de certeza negativa, que abrangerá as soluções juridicamente repelidas; e uma zona intermediária, cinzenta, entre a positiva e a negativa, composta pelas soluções que guardam controvérsias sobre sua viabilidade jurídica.

Quando provocado para apreciar um ato administrativo dotado de mérito, o órgão jurisdicional revisará o juízo de juridicidade empregado pelo administrador, somente apreciando o seu juízo de oportunidade quando imprescindível para a verificação de sua compatibilidade para com a ordem jurídica. Se o conceito jurídico baseado em termos fluidos é subordinado ao juízo de juridicidade do administrador, e este, necessariamente, submete-se à revisão judicial quando há indício de atentado à ordem jurídica, não pode o Poder Judiciário deixar de invalidar da discricionariedade se este for constatado.

O "conceito jurídico indeterminado" não pode ser enquadrado, por conseguinte, como fonte necessária do poder discricionário, ainda que este não esteja sujeito a um controle judicial pleno, por ser inviável ao Poder Judiciário declarar a inteira correção ou o total equívoco do comportamento administrativo(59). No caso dos "conceitos jurídicos indeterminados", há a plenitude do controle jurisdicional, "só esbarrando na fronteira da impossibilidade cognitiva de declarar se a aplicação foi correta ou equivocada"(60).

A complexidade do ato concreto e a diversidade de opiniões e pareceres constituem os limites que impedem ao julgador alterar a decisão administrativa, quando no exame da aplicação de "conceitos jurídicos indeterminados" pela administração pública. No exercício do dever-poder discricionário, a lei toma para si a demarcação das fronteiras proibidas à revisão judicial dos atos administrativos, que por sua vez, compreendem a "área de apreciação" do administrador.

Quando confrontado com a realidade fática, dispõe o administrador também de uma margem de liberdade intelectiva pois, afinal, ele também é um aplicador do direito. É admissível ao agente público produzir um ato portador de mérito em razão de ter sido adotado um comportamento administrativo aceitável para o caso concreto. Comportamento este que pode ser extraído do "conceito legal fluido", e, insusceptível de correção judicial, se a interpretação se mostrar insegura, ou seja, se o órgão jurisdicional não logrou êxito em retirar a solução escolhida pela administração pública da zona cinzenta de definição, ou verificar que ela permaneceu na sua zona positiva.

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Cabe ao Poder Judiciário verificar se houve a violação ao direito, devendo verificar se a administração pública ficou dentro do "campo significativo da aplicação" do conceito normativo vago ou se foi desconhecido. Deve ainda reconhecer se a decisão administrativa é incensurável e a ausência de direito subjetivo de terceiro ameaçado ilegalmente pelo comportamento administrativo adotado.

A discricionariedade administrativa é integrada tanto pelo juízo de oportunidade como pelo juízo de juridicidade. Afinal, se a discricionariedade é um processo jurídico de decisão, é impossível que seja constituído apenas pelo juízo de oportunidade. É na arbitrariedade que o juízo de juridicidade é ausente. Como bem leciona Themístocles Brandão Cavalcanti(61):

"O exercício dêsse poder é apenas um processo técnico para definir a interpretação da lei e a maneira mais adequada de aplicá-la. É uma parte e não a totalidade da ação administrativa ou política"

Todavia, somente após o esgotamento da interpretação fica aberto o espaço para a aplicação do juízo de oportunidade, para a apreciação política do caso concreto e a seleção das soluções jurídicas mais convenientes e oportunas. Discricionariedade e interpretação são duas noções distintas, mas não há apreciação de conveniência e oportunidade sem a antecedência da seleção e revelação da norma jurídico-administrativa aplicável ao caso concreto. Se considerarmos a interpretação como uma fase exterior à discricionariedade, estaremos admitindo que possa haver um processo de decisão no Estado de Direito onde o juízo de juridicidade está inteiramente ausente, impossibilitando a própria intervenção judicial na ação administrativa quando o ato administrativo portador de mérito contém vício que não se revela pelo que foi formalmente exteriorizado.

Por conseguinte, a discricionariedade administrativa é um processo cuja a primeira fase é justamente a interpretação. Se a interpretação não leva a segurança jurídica necessária sobre a solução aplicável ao caso concreto, permite-se ao administrador identifique e concretize as opções políticas do sistema de direito positivo através da apreciação da conveniência e oportunidade da medida administrativa requerida ou necessária. A norma jurídica também tem função e conteúdo políticos.

Não se pode negar que, na edição de uma lei pelo Congresso Nacional ou em sua concretização final mediante um ato administrativo portador de mérito, há apreciação política da realidade social. O sistema jurídico não é impermeável à influência do sistema político, desde que esta não comprometa dos processos funcionais do sistema de direito positivo. A discricionariedade é, sem sombra de dúvida, um canal de cognição que o sistema jurídico cria com o sistema político, através do qual o aplicador do direito positivo identifica as opções políticas da ordem jurídica e as confronta com a realidade social. Mas não cabe ao legislador ou ao administrador modificar os valores juridicizados pela Constituição através da discricionariedade. Compreender a ideologia da norma não é corrompê-la.

Tanto o juízo de juridicidade como o juízo de oportunidade têm conseqüências jurídicas, chegando inclusive a se mesclarem e, tornando prejudicial ao controle judicial da medida administrativa, a sua dissociação. A juridicidade e a oportunidade, no exercício do dever-poder discricionário pela administração pública, nem sempre apresentam fronteiras nítidas. Somente em ficção, podemos acreditar que, quando há diversidade e controvérsias na intelecção do direito positivo, a escolha do administrador não está direta e irremediavelmente ligada a sua apreciação política da realidade dos fatos jurídicos-administrativos.

Na discricionariedade administrativa, o juízo de oportunidade integra politicamente o regime jurídico-administrativo quando o juízo de juridicidade é insuficiente para revelar a melhor solução para o caso concreto. O administrado não pode esperar que a ciência do direito solucione controvérsias para que a administração pública exerça suas atribuições. Portanto, o controle judicial efetuado sobre esses elementos tem intensidade e natureza diferenciadas pois, "a discricionariedade ensejada pela fluidez significativa do pressuposto ou da finalidade da norma cingir-se-á sempre ao campo de insolúveis dúvidas sobre o cabimento dos conceitos utilizados pela regra de direito aplicado"(62).

A função administrativa não pode ser reduzida à mecânica tradução em ato de imperativos legais pois de outro modo, comprometer-se-ia a proteção e a garantia dos direitos individuais, a separação funcional do poder e o princípio da superioridade da lei material e formal em relação às outras funções estatais, sendo hoje impossível a sua total submissão ao controle jurisdicional. Administrador tímido é tão prejudicial quanto administrador arbitrário.

O órgão legislativo institui as diretivas da atividade administrativa através de comandos para os órgãos ou agentes da administração pública. São acrescentados aos limites naturais e lógicos que regulam a atividade administrativa as condições de aplicação da norma, estabelecendo uma ação, negativa ou positiva, da qual não se pode eximir a administração pública.

Inexiste no direito público, que rege a administração pública, o princípio da autonomia da vontade. Cabe ao agente público, dentro da parcela da sua competência, identificar na realidade as condições de fato previstas na norma administrativa, conforme a finalidade legal. Mas a vontade do administrador se torna relevante, por força de lei, na discricionariedade administrativa. A administração pública precisa de espaço, de instrumentos que assegurem a dinâmica e a iniciativa do administrador, desde que subordinados, evidentemente, aos princípios e regras do regime jurídico-administrativo.

O texto normativo aponta as situações de fato que compreenderão as condições de imputabilidade de qualquer ato à administração pública(63). Perante as condições de fato, competirá ao agente desenvolver de início, um processo interpretativo, circunscrito à liberdade que a lei lhe conferiu, defrontando-se com duas espécies terminológicas e conceituais: conceitos de significação definível e conceitos de significação exata indeterminada ou plurissubjetivos(64). Logo o Estado de Direito impõe um limite para a determinação dos conceitos utilizados na norma ao legislador, sob pena de se passar da norma abstrata à ordem individualizada(65).

Nesses "conceitos plurissubjetivos", a interpretação teria se mostrado falha para a revelação completa da melhor solução jurídica para a demanda da administração pública, fazendo-se necessário superar a insegurança da hermenêutica pela concessão e reconhecimento de força jurígena ao juízo de oportunidade do administrador. Assim não entende Almiro do Couto e Silva(66), pois apesar de que, na sua ótica, a impossibilidade da consolidação de um só entendimento junto aos "conceitos jurídicos indeterminados" inviabilize a apreciação jurisdicional, a matéria não deixaria de ser referente à juridicidade. Na sua visão, malgrado inexistir limites legais para a apreciação jurisdicional da aplicação correta dos "conceitos jurídicos indeterminados", existiria tal obstáculo, de ordem hermenêutica, para tanto.

No caso do poder discricionário, o controle jurisdicional de atos administrativos "está, a priori, limitado pela lei, a qual fixou desde logo as linhas dentro das quais poderá a autoridade administrativa livremente tomar suas decisões. Dentro daquele espaço, qualquer uma delas será juridicamente incensurável e inexaminável pela autoridade judiciária"(67). Para esse jurista, se a norma contiver conexão entre "conceito jurídico indeterminado" e poder discricionário, dever o intérprete separá-los e tratá-los de forma distinta(68).

Ao nosso ver, quando o Poder Judiciário se depara com a impossibilidade material de fixar a aplicação mais correta do "conceito jurídico indeterminado", é quase sempre impossível identificar a fronteira entre o juízo de oportunidade e o juízo de juridicidade, pois aí, houve justamente a perigosa mistura de ambos. Se o Poder Judiciário pudesse dissociar os elementos de juridicidade dos elementos de oportunidade na ação administrativa, haveria, sem sombra de dúvida, espaço para um controle total, sob a ótica da juridicidade. Aqui, o Poder Judiciário não pode se imiscuir na opção hermenêutica do Poder Executivo por lhe ser impossível fixar a opção mais correta, que afaste por completo e de modo inquestionável outros caminhos interpretativos, já que, do contrário, haveria a substituição do juízo de oportunidade administrativo por um indevido juízo de oportunidade jurisdicional que, como vimos, tem difícil existência no ordenamento jurídico dos países regidos pelo princípio da separação funcional do Poder.

Quando previstas de modo incontrastável as premissas de fato na norma, segue a administração na prática dos atos que estabelece diante da constatação daquelas(69). Se, ao invés, essas premissas são previstas em forma contrastável, será necessário que o agente estabeleça o conceito oriundo de uma das várias interpretações possíveis(70). A discricionariedade possibilita e garante, conseqüentemente, a aplicabilidade da norma jurídica.

O problema do poder discricionário também é um problema de interpretação(71). A norma jurídica impõe como dever a administração pública uma determinada atividade que este fica obrigado a realizar, sempre que no mundo das realidades um certo fato ou condições se verifiquem. Apresentam-se como conceitos, que podem pertencer ao mundo da realidade empírica, indubitavelmente individualizados, embora abstratos; ou no mundo da realidade contraposta, onde predomina a incerteza. Nesta, caberá ao agente administrativo fazer a subsunção dos fatos aos conceitos postos e interpretáveis, segundo o que estritamente a competência que ensejou a discricionariedade administrativa permitir.

Isso não significa dizer que o juízo de oportunidade possa prevalecer sobre o juízo de juridicidade. No Estado de Direito, os critérios de conveniência e oportunidade devem estar necessariamente submetidas à análise de sua compatibilidade para com o direito positivo. Se o órgão controlador, mesmo sendo de natureza jurisdicional, verifica que houve a violação ideológica da lei, nada impede, numa perspectiva dogmática, a invalidação judicial do ato administrativo portador de mérito. No caso do controle judicial da moralidade administrativa, por exemplo, a análise do órgão jurisdicional afere se o juízo de oportunidade empregado pelo administrador se ateve ou não ao cânone constitucional, perdendo o mérito sua imunidade, ao nosso ver(72).

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Sobre o autor
Vladimir da Rocha França

advogado em Natal (RN), professor da UFRN e da Universidade Potiguar, mestre em Direito Público pela Faculdade de Direito do Recife (UFPE), doutor em Direito do Estado pela PUC/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRANÇA, Vladimir Rocha. Vinculação e discricionariedade nos atos administrativos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 49, 1 fev. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/346. Acesso em: 19 abr. 2024.

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