Lava Jato: como fica a situação jurídica dos empregados das prestadoras de serviços à Petrobras?

11/03/2015 às 13:13
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Os empregados não podem sofrer as consequencias dos atos ilícitos praticados na administração das empresas que os contrataram.

A crise desencadeada pela Operação Lava Jato sugere uma questão importante. Como ficará a situação dos empregados das empresas que foram envolvidas no esquema de corrupção e que estão impedidas de prestar serviços à Petrobras e que correm o risco de ser penhoradas ou de falir em razão de ter que pagar os danos que causaram aos acionistas da petrolífera e à União?

Os empregados não assumem o risco da atividade econômica (art. 3º, da CLT). Nem podem ser criminalmente imputados pelos atos praticados pelos diretores das empresas com as quais celebraram contratos de trabalho. Portanto, os direitos trabalhistas dos empregados das prestadoras de serviços da Petrobras não podem ser cassados ou ignorados pela Justiça do Trabalho.

Trabalhar numa prestadora de serviços não é ato ilícito, nem acarreta a nulidade do contrato de trabalho. Ademais, a ilicitude da atividade não exclui por si só a atribuição de direitos aos empregados como decidiu o TST há algum tempo:

“A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu os efeitos jurídicos do contrato de trabalho celebrado para coleta de apostas em "jogo de bicho". Por unanimidade de votos, os ministros julgaram que, apesar de o contrato de trabalho ser nulo em razão da ilicitude do objeto (coleta de apostas), não há como se negar a produção de todos os efeitos trabalhistas, sob pena de premiar-se o contraventor em prejuízo do trabalhador.”

http://www.conjur.com.br/2002-dez-09/tst_reconhece_direitos_atividade_jogo_bicho

A jurisprudência consolidada pelo TST possibilita a responsabilização subsidiária do tomador dos serviços caso o prestador de serviços seja inidôneo ou tenha se tornado incapaz de arcar com os direitos de seus empregadores. A súmula  331 do TST é absolutamente clara e resolverá satisfatoriamente os conflitos trabalhistas envolvendo os empregados indiretamente afetados pela Lava Jato:

“CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). 

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). 

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. 

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. 

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral."

Se as empresas que prestaram ou prestam serviços à Petrobras não puderem pagar as verbas rescisórias (e outros direitos trabalhistas) aos seus empregados, a Petrobras poderá ser condenada como devedora subsidiária em razão de ser a tomadora do serviço. A empresa deverá, entretanto, ser colocada no pólo passivo, cabendo ao empregador o ônus de provar que a Petrobras se beneficiou do trabalho que ele realizou.

A Lava Jato evidencia que, por razões alheias às vontades dos empregados prejudicados, ocorreu uma colusão criminosa entre alguns diretores da Petrobras e os donos/administradores das empresas prestadoras de serviço. Este fato poderá ser levado em consideração quando do julgamento das demandas, para se atribuir à Petrobras (em razão dos ilícitos que em seu nome foram cometidos) a responsabilidade solidária pelos direitos trabalhistas dos empregados afetados. O raciocínio aplicável neste episódio seria semelhante àquele utilizado pelo TRT/SP num caso em que eu tive a honra de defender o trabalhador prejudicado:

“EMENTA: SINDICATO. FRAUDE NA HOMOLOGAÇÃO. CONLUIO COM EMPRESAS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA QUANTO ÀS VERBAS SONEGADAS. Provada a mancomunação com o patronato e a participação do sindicato profissional na fraude ocorrida na solenidade homologatória ocorrida em sua sede, e tratando-se a entidade de classe, do órgão que por obrigação constitucional e legal deve atuar na defesa de seus representados, há de responder pelos danos ocasionados ao trabalhador, a teor do disposto nos artigos 513 da CLT e 942 do novel Código Civil: “Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.” (grifamos). Recurso obreiro provido para condenar o sindicato como responsável solidário quanto às verbas rescisórias, com expedição de ofícios denunciadores face ao desvirtuamento do papel da entidade de classe.” (TRT/SP, 4ª Turma, processo : 01818007920095020384, Relator Desembargador  RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS, Acórdão nº 20110425701 )

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Os empregados das prestadoras de serviço não podem ser prejudicados por ilícitos cometidos pelos envolvidos na Lava Jato. Mas a empresa em cujo nome os ilícitos foram praticados (a Petrobras) pode, sem dúvida alguma, ser considerada solidariamente responsável pelo dano causado aos empregados indiretamente afetados pela operação da PF. 

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

advogado em Osasco (SP)

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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