Breves notas sobre a PEC 171/1993:imputabilidade penal do maior de dezesseis anos e seus reflexos na ordem jurídica brasileira

01/05/2015 às 19:50
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A Proposta de Emenda à Constituição nº. 171, apresentada originalmente em 19 de agosto de 1993, pelo Deputado Federal BENEDITO DOMINGOS, que tem por ementa "Altera a redação do art. 228 da Constituição Federal (imputabilidade penal do maior de dezesseis a

A Proposta de Emenda à Constituição nº. 171, apresentada originalmente em 19 de agosto de 1993, pelo Deputado Federal BENEDITO DOMINGOS, que tem por ementa "Altera a redação do art. 228 da Constituição Federal (imputabilidade penal do maior de dezesseis anos) é um dos temas mais discutidos este ano em nosso País.

A PEC, que já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados, agora espera a análise pela Comissão Especial da mesma Casa, e somente após isso irá para a deliberação do Plenário da Câmara, onde precisará ser aprovada por, no mínimo, três quintos do número total de Deputados Federais, cuja votação dar-se-á e dois turnos, com interstício de pelo menos cinco sessões entre um turno e outro. Só então, caso seja aprovada, será encaminhada ao Senado Federal, onde deverá ser aprovada na CCJC e pelo Plenário, com o mesmo quórum interstício de votação na Câmara. Caso a Proposta seja aprovada sem alterações, vai direto para a promulgação pelo Congresso Nacional.

Não bastasse isso, e toda a controvérsia que está em torno da discussão da proposta no âmbito do Legislativo Federal, há um Mandado de Segurança, de número 33.556 no Supremo Tribunal Federal, impetrado pelo Deputado Federal LUIZ GIONILSON PINHEIRO BORGES em face da Mesa da Câmara dos Deputados, visando obstar a tramitação e a deliberação da PEC 171/1993. Em decisão liminar, o Relator do MS, Ministro Dias Toffoli, indeferiu a medida cautelar, assim a ação constitucional terá todo o seu trâmite comum até se chegar a uma decisão final.

Tal tema - o da imputabilidade penal do maior de dezesseis anos - tem sido debatido e discutido por setores da sociedade brasileira, mormente pelos juristas do país, com opiniões conflitante a respeito de se considerar ou não o artigo 228 da Constituição da República como cláusula pétrea, ou seja, insuscetível de alteração (Cf. Art. 60§ 4º,IV), por se tratar de direito e garantia fundamental ao indivíduo.

A par da importantíssima - e obrigatória - discussão Constitucional, a EC 171/1993, caso promulgada pelo Congresso Nacional, trará significativas alterações na ordem infraconstitucional. Dentre elas, analisamos brevemente duas questões: a habilitação para direção veicular e a capacidade civil.

Em primeiro lugar, é certo que o artigo 140 do Código de Trânsito Brasileiro impõe os requisitos que os candidatos a habilitação veicular devem obedecer:

"Art. 140. A habilitação para conduzir veículo automotor e elétrico será apurada por meio de exames que deverão ser realizados junto ao órgão ou entidade executivos do Estado ou do Distrito Federal, do domicílio ou residência do candidato, ou na sede estadual ou distrital do próprio órgão, devendo o condutor preencher os seguintes requisitos:

I – ser penalmente imputável;

II – saber ler e escrever;

III – possuir Carteira de Identidade ou equivalente".

Para o tema ora discutido, somente nos ateremos ao inciso I – “ser penalmente imputável”. Sabemos que" imputabilidade penal é o conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a prática de um fato punível "(JESUS, Damásio de. 1999, p. 467).

De acordo com Mirabete,"há imputabilidade quando o sujeito é capaz de compreender a ilicitude de sua conduta e agir de acordo com esse entendimento. Só é reprovável a conduta se o sujeito tem certo grau de capacidade psíquica que lhe permita compreender a antijuridicidade do fato e também de adequar essa conduta a sua consciência. Quem não tem essa capacidade de entendimento e de determinação é inimputável, eliminando-se a culpabilidade."(MIRABETE, Julio Fabbrini. 2000, p. 210)

Ciente de tão rico e importante fundamento, é que o legislador do Código de Trânsito prescreveu como requisito para a obtenção de habilitação veicular a imputabilidade penal, o que nos leva à Constituição da República e ao Código Penal:

"Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial"(Constituição Federal).

"Art. 27. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial"(Código Penal).

Concluímos, assim, que a idade para habilitação veicula está intimamente ligada à idade estabelecida para a imputabilidade penal. E, se realmente, o texto constitucional for alterado, passando a estabelecer a idade de dezesseis anos para a imputabilidade penal, logo também a idade mínima para a habilitação passará para dezesseis anos, além de uma mais que certa inconstitucionalidade do art. 27 doCódigo Penal.

Isso nos leva a um Projeto de Lei (nº. 571/2011), apresentado pelo Deputado WLADIMIR COSTA em 2011, que ainda encontra-se em trâmite, onde tal projeto legislativo propõe, em suma, alterar o Código de Trânsito Brasileiro com o fim de adicionar uma permissão para dirigir ao emancipado civil:

"O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º. Esta lei tem por finalidade alterar a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro, para autorizar o maior de 16 anos, desde que emancipado, a obter habilitação de motorista.

Art. 2º. O inciso I do art. 140 e o art. 291 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro, passam a vigorar com as seguintes redações:

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“Art. 140...

I – ser penalmente imputável ou emancipado, nos termos da lei civil;” (NR)

...

“Art. 291. Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste Código, aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código Processual Penal, se este Capítulo não dispuser de modo diverso, bem como Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, no que couber, e o Estatuto da Criança e do Adolescente, aos maiores de 16 e menores de 18 anos, emancipados nos termos da lei civil.” (NR)

Art. 3º. Esta lei entrará em vigor na data da sua publicação".

Mas isso, é evidente, não resolverá todos os problemas decorrentes da promulgação da PEC. Se o indivíduo pode ser penalmente responsabilizado e, por conta disso, obter permissão para dirigir, então haverá uma enorme incompatibilidade entre osCódigo Penal e de Trânsito para como o Código Civil, que ainda trata os menores de dezoito e maiores de dezesseis anos como relativamente incapazes para o exercício de atos da vida civil."

Bem em verdade, tal Projeto de Lei mais traz problemas do que os resolve, os quais, ante uma provável promulgação da PEC 171 serão extirpados. Mas novos surgirão, em especial a incompatibilidade que haverá entre a idade para a imputabilidade penal e a idade para a capacidade civil.

De acordo com o Código Civil, art. I, os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos são relativamente incapaz para atos da vida civil, e se aprovada, a PEC trará uma grande incompatibilidade entre a ordem civil e a penal e do trânsito. De um lado, o indivíduo poderá obter sua habilitação veicular e responder criminalmente pelos atos praticados, mas por outro, não poderá por exemplo trabalhar (artigo , inciso XXXIII da CF), e exercer inúmeros atos da vida civil, para os quais deverá estar assistido pelo responsável legal.

Assim, concluímos que tal Projeto de Emenda Constitucional trará uma significativa mudança em nossa ordem jurídica, com forte repercussão no dia a dia dos brasileiros, motivo que nos leva a defender, reiterando o que já muito se tem dito, a necessidade de um amplo debate do Congresso Nacional com todos os setores da sociedade brasileira, antes de decidir sobre o projeto em questão, posto que a Constituição não deve simplesmente ser mudada, mas sim melhorada para atender aos anseios de todos os brasileiros.

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