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Aspectos gerais e eficácia do mandado de injunção

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01/06/2003 às 00:00
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2 MANDADO DE INJUNÇÃO

Passa-se agora, ao estudo do mandado de injunção, lineando seus elementos e delimitando seu campo de atuação, como writ constitucional, no direito brasileiro.

2.1 Conceito

O Mandado de Injunção é inovação criada a partir da Constituição Federal de 1988, o qual encontra-se inserido na Magna Carta no artigo 5°, inciso LXXI, [7] sendo assim conceituado por Silva:

Assim, o mandado de injunção vem a se constituir em um instituto que tem por fim antecipar a regulamentação de determinadas diretrizes esparsamente consagradas pela norma constitucional, solicitadas judicialmente por necessidade concreta, desde que seja indispensável ao pleno exercício de direitos e liberdades previstas na Lei Maior, especialmente àquelas atinentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. (1993, p. 55)

Duarte define desta forma o remédio:

É medida processual especial, ação constitucional, que suscita o controle sobre atuação omissiva de órgãos de quaisquer Poderes, inclusive do próprio Judiciário, assegurando eficácia a direito público subjetivo emanado da Constituição, desde que "a falta de norma regulamentadora", como ali está expresso, "torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e á cidadania". (1991, p. 131)

Desta forma, é de perfeita inteligência que o mandado de injunção é o remédio constitucional que tem por objetivo satisfazer um direito, liberdade ou prerrogativa constitucional, inviabilizado por falta de regulamentação, ou seja, destina-se a suprir omissão legislativa, a qual obstaculiza a fruição plena de direito previsto na Constituição.

2.2 Origem

Muito se discute acerca da origem do mandado de injunção. Uma das correntes doutrinárias aponta a origem do writ para o direito anglo-americano, onde se aplicam o writ of injunction e o writ of mandamus. Oscar Rabasa apud Sidou permeia o injunction:

O writ of injunction é o mandamento que o autor solicita para efeito de que este impeça a execução de qualquer ato ilícito por um particular ou outra autoridade, indistintamente; e, nos juízos que versam sobre matéria constitucional, é o meio usual para que os tribunais, a instância da parte agravada, examine a constitucionalidade de leis ou atos da autoridade ou impeçam sua execução. (1992, p. 404)

A respeito do mandamus, Goodnow apud Sidou assevera:

(...) O mandamus é ordem escrita emanada de uma Corte de instância mais elevada para Corte de inferior instância ou para uma corporação, uma municipalidade ou um funcionário, obrigando a fazer aquilo que se nega a fazer. (1992, p. 405)

Na mesma esteira de pensamento, Ackel Filho sentencia: "O legislador constituinte inspirou-se induvidosamente no direito americano, dando, porém, características muito mais restritas e peculiares ao remédio, entre nós". (1988, p. 103)

Já o Senador Ruy Bacelar apud Saraiva, atenta para a origem genuinamente brasileira do remédio constitucional: "O certo é que o mandado de injunção surge, no direito brasileiro, com feições próprias que o distinguem de todas as outras garantias, seja no direito pátrio, seja em outras legislações". (1990, p. 80)

Sob outra ótica, Saraiva, encontra a origem do mandado de injunção no direito português:

É de se lamentar que, por erro de vernáculo, tenhamos que aturar os analistas do direito anglo-saxônico, quando, deveras, o nosso mandado de injunção tem origem lusitana (inconstitucionalidade por omissão) e jamais imiscuiu-se com qualquer instituto inglês, americano, alemão, ou de outra nacionalidade que não a portuguesa. (1990, p. 81)

Para Ferreira Filho, não há inspiração no direito alienígena para a criação do mandado de injunção:

Não se consegue identificar, no Direito comparado a fonte de inspiração do legislador constituinte, embora medidas com o mesmo nome possam ser encontradas, por exemplo, no Direito inglês e no Direito italiano. (1989, p. 275)

Face o exposto, nota-se que empilham-se as divergências dos doutrinadores com relação à origem do mandado de injunção, sem, no entanto, alcançar um consenso a respeito do tema. Há quem defenda a sua origem puramente no direito alienígena; há quem defenda sua origem exclusivamente nacional e há aqueles que pregam sua origem mista, ou seja, características nacionais e estrangeiras.

2.3 Pressupostos

São basicamente dois os pressupostos que autorizam a utilização do mandado de injunção no direito constitucional brasileiro: que o direito, liberdade ou prerrogativa esteja elencado na Constituição Federal e que este esteja impedido ou obstado de ser fruído por falta de norma que o regulamente. Assim entendem Tucci & Cruz:

Duas, pois, delineiam-se as condições específicas para o exercício da ação de mandado de injunção: de um lado, faz-se indispensável o fundamento direto na Carta Magna, e, de outro, exige-se a ausência de norma, a lacuna normativa. (1989, p. 154)

O mesmo pensamento é compartilhado por Velloso:

São dois, portanto, os requisitos viabilizadores do mandado de injunção: a) que se trate de um direito concedido pela Constituição, ou, mais precisamente, de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania; b) que esses direito se tornem ineficazes, inócuos, em razão de inexistência de norma regulamentadora. (1989, p. 23)

Ainda na mesma esteira, porém de forma mais aprofundada, apresentando mais um pressuposto, Duarte atenta para os seguintes pressupostos:

Segundo os termos em que se expressa no preceito constitucional, resulta que o mandado de injunção tem, como pressupostos: (a) direito subjetivo público proclamado pela Constituição, (b) relativamente a direitos e liberdades constitucionais ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, (c) cujo exercício se torne inviável pela falta de norma regulamentadora, mas (d) que configura uma situação de fato comprovada sem necessidade de outras provas. (1991, p. 134)

Chega-se, portanto à conclusão de que os pressupostos que autorizam a impetração do mandado de injunção são dois: a) o direito consagrado pela Constituição brasileira e b) que esse direito esteja senado impedido de fruição por falta de Lei que o regulamente.

2.4 Legitimação

O legitimidado ativo do mandado de injunção pode ser qualquer pessoa, sendo física ou jurídica, consoante afirmam Tucci & Cruz: "O legitimado para a impetração do mandado de injunção (legitimação ativa) tanto poderá ser pessoa física como jurídica". (1989, p. 157)

De maneira mais genérica, porém não menos eficiente, explica Sidou: "Ele é facultado a brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, representados por advogados". (1992, p. 418)

Para Maciel, até mesmo figuras despersonalizadas podem estar legitimadas para impetrar o remédio constitucional:

O mandado de injunção não exige – diferentemente da inconstitucionalidade por omissão – legitimação específica, qualificada. Qualquer um que tiver interesse jurídico pode prevalecer-se dele. Mesmo as figuras jurídicas ou aquelas figuras despersonalizadas, como o espólio, a herança jacente etc. (1989, p. 131)

Logo, conclui-se que o sujeito ativo do remédio constitucional é qualquer pessoa que tenha sua garantia constitucional obstaculizada por falta de norma que a regulamente, podendo ser esta pessoa física ou jurídica.

A legitimação passiva do mandado de injunção será a autoridade que impossibilitar o uso de direito, prerrogativa ou liberdade constitucional, via de regra um a autoridade ou órgão do poder público ou, podendo ser até mesmo, um particular, conforme assevera Sidou:

Em regra, o sujeito passivo do mandado de injunção é um órgão público, posto como é ao Poder Público que incumbe editar norma regulamentadora para tornar viável o exercício dos direitos exercidos na Constituição. É ele, em caráter privativo, quem regula a atividade constitucional, sem embargo do que o writ procede também contra particulares, não para fazerem a norma, mas por serem do exercício dela decorrente, a parte executante. (1992, p. 418)

Na mesma ótica, Francisco, de uma forma mais abrangente e menos específica, conclui:

Sob a perspectiva de sujeitos passivos, as pessoas, entidades ou órgãos que, por ação ou omissão, impossibilitem o "exercício de direitos, liberdades constitucionais e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. (1994, p. 79)

Para Maciel, a sujeição passiva do mandado assim se mostra:

No tocante à legitimação passiva, ela deve ser ampla. Qualquer órgão da administração direta ou indireta, inclusive de pessoas de direito privado(Banco do Brasil, CEF etc.), desde que estejam encarregados da elaboração da norma genérica, podem figurar na ação. (1989, p.131)

Esta corrente se reforça com a opinião de Tucci & Cruz:

Sua essência está na garantia do exercício de um direito consagrado na constituição, que não pode ser exercido direta e livremente por falta de medidas legislativas que torne aplicável o dispositivo que assegure o direito. Por isso, pode ser requerido para assegurar o exercício de direito a ser invocado perante particulares ou perante autoridades. (1989, p. 157)

Deste modo, infere-se ser o legitimado passivo do mandado de injunção todo aquele que impossibilita o exercício do direito constitucional de outrem, por falta de norma que o regulamente, seja uma autoridade, órgão público, ou até mesmo um particular.

2.5 Competência

A Lei estabelece com precisão a competência do mandado de injunção, podendo ser do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, q e 102, II, a, da Constituição Federal). [8]

O Superior Tribunal de Justiça pode ser competente, segundo Velloso:

Ao Superior Tribunal de Justiça compete processar e julgar, originariamente, o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta (...) (1989, p. 25)

Com relação à Justiça Eleitoral, a Constituição estabelece a regra de competência em seu art. 121, § 4º, inciso V. [9]

2.6 Rito

O rito a ser adotado no mandado de injunção, por afinidade ou analogia – visto que não há lei regulamentadora que especifique o procedimento – deverá ser, de acordo com a doutrina dominante, o do mandado de segurança. Há quem defenda o rito ordinário. Nesta esteira, assinala Velloso:

O procedimento a ser adotado é o do Código de Processo Civil, vale dizer, o ordinário, possibilitando-se ao interessado a produção de prova. Mas, se os fatos puderem ser comprovados de plano, nada impede a adoção do rito do mandado de segurança. (1989, p. 24)

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A mesma posição é adotada por Oliveira:

(...) para isso aplicando-se-lhes, analogicamente, um dos procedimentos judiciais hoje existentes, sendo o mais apropriado o rito processual do Mandado de Segurança, por ser este um instituto jurídico que guarda, com o mandado de injunção, afinidade de origem. (1988, p. 54)

Na mesma corrente de opinião, Meirelles assevera:

Não existe, presentemente, legislação específica para regrar o trâmite processual do mandado de injunção, o que nos leva a entender possível a aplicação analógica das normas pertinentes ao mandado de segurança, visto que este instituto guarda estreita semelhança com aqueleoutro. (1995, p. 174)

Neste aspecto, também Sidou entende ser o rito do mandado de segurança o mais adequado:

O mandado de injunção, processualmente, e como ação interdital que é, assemelha-se ao mandado de segurança. Por princípio de interpretação analógica externa, as regras e normas processuais desse podem e devem disciplinar o curso da ação do novo interdito, guardadas suas peculiaridades, até que lei específica seja editada. (1989, p. 458)

Portanto, não há dúvidas de que, faltando a norma que regulamenta o rito processual do mandado de injunção, entende a doutrina que é mais adequada a adoção do rito do mandado de segurança, considerando as semelhanças entre os dois instituto.

            7.Recursos

Poucos são os autores que tratam do assunto, carecendo de um maior cuidado. Porém, há contra a decisão denegatória do mandado de injunção, o recurso ordinário, conforme assinala Meirelles:

(...)presentemente, só se admite o recurso ordinário contra decisão denegatória do mandado de injunção (CF, art. 102, II, "a") [10], para o STF, quando a autoridade coatora for o Presidente da República, o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, as Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do TCU, de um dos Tribunais Superiores ou do próprio STF(...) (1995, p.179)

O mesmo autor atenta para a possibilidade do recurso extraordinário:

Independentemente do recurso contra decisão denegatória, a parte irresignada poderá interpor recurso extraordinário para o STF quando a decisão proferida em única ou última instância contrariar dispositivos da própria Constituição ou julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da mesma Constituição (art. 102, III, "a" e "c"). (1995, p. 179) [11].

Já Sidou alude para a possibilidade do agravo regimental e dos embargos: "Procedem, quer no STF, quer no STJ, os recursos de agravo regimental, de embargos de divergência, infringentes e de declaração, nos termos de seus Regimentos Internos". (1992, p.422)

Desta forma, conforme acima referido, os recursos a serem interpostos dependerão da instância na qual foi proferida a sentença e a autoridade coatora. Porém, o assunto ainda é nebuloso pois, como o mandado de injunção ainda não tem o seu procedimento definido por conta de Lei que o regulamente, são variadas as hipóteses de recursos a serem interpostos no remédio.

2.8 Diferenças entre mandado de injunção e ação direta de inconstitucionalidade por omissão

As diferenças entre os dois institutos merecem um capítulo à parte, posto que, à primeira vista, pode perecer que ambos possuem a mesma finalidade, ou semelhanças entre seus elementos. Porém, guardam entre si, diversas diferenças, o que é perfeitamente passível de verificação.

A inconstitucionalidade por omissão está prevista no art. 103, § 2° da Constituição Federal, [12] a qual constata a omissão legislativa e notifica o órgão competente para que supra essa deficiência legislativa no prazo estabelecido em lei.

Uma das diferenças entre os dois institutos é bem observada por Maciel, e é relativa à competência:

Ao Supremo Tribunal Federal cabe, com exclusividade, processar e julgar o pedido feito pelos órgãos ou pessoas legitimadas nos incisos I a IX do art. 103 quando se tratar de inconstitucionalidade por omissão(...) Quanto ao outro instituto – o mandado de injunção – tudo vai depender do órgão que estiver constitucionalmente ou legalmente encarregado de elaborar as normas(...)(1989, p. 127)

Portanto, há uma notável diferença entre o foro competente para o ajuizamento da ação de inconstitucionalidade por omissão – exclusivamente o Supremo Tribunal Federal – e o foro de competência para o ajuizamento do mandado de injunção, para este podendo ser qualquer dos tribunais previstos em lei, ficando na dependência de qual for a autoridade ou órgão encarregado de legislar acerca do caso concreto.

Outra diferença é assinalada por Bastos, relativo a sujeição ativa:

A ação de inconstitucionalidade por omissão só pode ser proposta pelas pessoas ou entidades arroladas no art.103 da Constituição Federal, enquanto o mandado de injunção pode ser ajuizado por qualquer pessoa que se sinta impedida de exercitar um direito constitucionalmente assegurado pela falta de norma regulamentadora que viabilize o exercício desse seu direito. (1998, p. 245)

Oliveira também observa acerca da legitimidade, atentando quanto ao Mandado de Injunção: "A essa garantia constitucional terá acesso qualquer cidadão, competindo ao Poder Judiciário emitir a regulamentação omitida". (1988, p. 59)

A sujeição ativa, na inconstitucionalidade por Omissão, é restrita, segundo ainda, Oliveira: "A legitimidade para a proposição foi delimitada a determinadas autoridades, órgãos ou entidades (exemplo: Presidente da República, Conselho Federal da OAB, Partido Político, Confederação de Sindicatos etc.)". (1988, p. 60)

Ante o exposto, notória é a distinção entre o sujeito ativo do mandado de injunção, a saber, qualquer pessoa que seja titular do direito obstaculizado, e o sujeito ativo da inconstitucionalidade por omissão, o qual é, restritivamente, determinadas autoridades, órgãos ou entidades, especificamente apontados em lei.

Relativamente aos efeitos da sentença, há uma distinção observada por Silva Filho:

O âmbito da inconstitucionalidade por omissão cinge-se à manutenção da ordem jurídica; coibir a inércia do Poder Público, figurada no descumprimento in abstracto (pois não há lesão a direito individual ou coletivo) de regra constitucional de proceder(...) Tem, por conseguinte, efeito erga omnes. (1991, p. 101)

Acentua, o mesmo autor, quanto ao mandado de injunção:

O âmbito de atuação do mandado de injunção circunscreve-se à proteção de direitos individuais ou coletivos. Por ele, o titular de uma situação jurídica concreta tem viabilizado o exercício de direito, liberdade ou prerrogativa que lhe fora obstado. Já que há lesão, tem efeito inter partes. Incidente somente entre as partes.(1991,p. 101)

Bastos ensina sob a mesma ótica: "Outra distinção é quanto aos efeitos da decisão proferida que, na ação de inconstitucionalidade por omissão, são erga omnes e, no mandado de injunção, são inter partes". (1998, p. 245)

Assim, tem-se que, no tocante aos efeitos da sentença, clara é a diferença entre os dois institutos, posto que, os efeitos da sentença do mandado de injunção têm efeito inter partes, por cuidar de caso concreto e lesão a direito constitucionalmente previsto, ao passo que, os efeitos da sentença da ação de inconstitucionalidade por omissão têm efeito erga omnes, pois trata-se de descumprimento in abstracto, sem referir-se a caso concreto de lesão a direito individual ou coletivo.

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Sobre o autor
Christian Machado da Luz

acadêmico de Direito em Santa Maria (RS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LUZ, Christian Machado. Aspectos gerais e eficácia do mandado de injunção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 66, 1 jun. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4169. Acesso em: 24 abr. 2024.

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