A desconsideração da personalidade jurídica e o Novo Código de Processo Civil

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O presente artigo visa analisar os aspectos processuais da aplicação da desconsideração da personalidade dentro dos processos em andamento na vigência do atual Código de Processo Civil, bem como será processado com o advento do NCPC.

Resumo: O presente artigo visa analisar os aspectos processuais da aplicação da desconsideração da personalidade dentro dos processos em andamento na vigência do atual Código de Processo Civil (CPC), bem como será processado com o advento do Novo Código de Processo Civil (NCPC), levando em consideração a grande divergência doutrinária e jurisprudencial quando o assunto é a aplicação do instituto.

Palavras-chave: Desconsideração da Personalidade Jurídica. Direito Processual. Novo Código de Processo Civil. Aspectos Processuais.


INTRODUÇÃO

Com o advento do NCPC, muito se tem debatido acerca das mudanças ocorrerá no contexto jurídico acerca da desconsideração da personalidade jurídica.

No presente artigo, será analisado aspectos processuais instituto dentro do atual caderno processual brasileiro bem como a forma em que será tratado o instituto dentro do NCPC, haja vista que existe uma grande divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da sua aplicação dentro do ordenamento processual em vigor.

Para uma melhor compreensão sobre a pesquisa do presente trabalho, importante discorrer acerca de desconsideração da personalidade jurídica em sua forma tradicional.


Da autonomia patrimonial

O princípio da autonomia patrimonial é de significante importância quando se trata sobre direito civil e comercial no que tange a separação do bens da pessoa jurídica, importante discorrer acerca da sua relevância e conceituação, eis que trata sobre a limitação da responsabilidade existente entre a pessoa jurídica e seus sócios instituidores. [5]

Tal princípio possui amparo legal no art. 1.024 do CC/02, in verbis: “os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais.”[6]

O Código de Processo Civil em seu art. 596, deve ser analisado conjuntamente com o artigo supra citado, eis que dispõe “os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade senão nos casos previstos em lei; o sócio, demandado pelo pagamento da dívida, tem direito a exigir que sejam primeiro excutidos os bens da sociedade.”[7]

Conforme se pode extrair do conceito do princípio autonomia patrimonial, como regra, os bens da própria pessoa jurídica e não de seus sócios deverão responder por suas dívidas, tendo em vista que com o seu nascimento e personalização, ganha aptidão para exercer os atos da vida civil, não misturando os bens dos membros instituidores com a sociedade.

Ocorre que diante deste princípio, sócios maliciosos se utilizam da separação patrimonial para fraudar os seus credores, utilizando-se para isso, da personalidade jurídica existente na empresa.[8]

Fabio Ulhoa Coelho leciona que:

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica não é uma teoria contrária à personalização das sociedades empresárias e à sua autonomia em relação aos sócios. Ao contrário, seu objetivo é preservar o instituto, coibindo práticas fraudulentas e abusivas que dele se utilizam.

A indisfarçável preocupação dos estudiosos do assunto diz respeito à reafirmação do princípio da autonomia. Os pressupostos da desconsideração são a pertinência, a validade e a importância das regras que limitam, ao montante investido, a responsabilidade dos sócios por eventuais perdas nos insucessos da empresa, regras que, derivadas do princípio da autonomia patrimonial, servem de estimuladoras da exploração de atividades econômicas, com o cálculo do risco.[9]

Desta forma, depreende-se que a personalidade que adquiri a sociedade empresária se baseia no princípio da autonomia patrimonial, que se constitui na separação dos bens da pessoa jurídica e de seus sócios instituidores.

Como demonstrado, muitos sócios se utilizam desta prerrogativa legal para fraudar negócios com terceiros vindo a ocasionar-lhes prejuízos, e assim, se depara o poder judiciário com a previsão legal da desconsideração da personalidade jurídica, devendo ser demonstrada a sua previsão legal e aplicabilidade dentro dos diversos ramos do direito, eis que a desconsideração não vai contra a ideia de personalização, muito pelo contrário, ela visa coibir o mau uso da pessoa jurídica que venha ocasionar danos a outrem.

O princípio da autonomia patrimonial bem como o da personalização das sociedades empresárias, no que se refere a responsabilidade patrimonial dos sócios não poderá ser deixada de lado quando se tratar da atividade econômica. [10]

Desta forma, a desconsideração deverá ser tratada como uma aplicação excepcional, não se justificando a aplicação do instituto somente pela insatisfação do crédito devido a um credor, necessário ficar demonstrada a indevida utilização da sociedade empresária.[11]

Diante da existência da autonomia patrimonial existente, não se deve atingir os bens dos sócios apenas para satisfação do crédito do credor, pois, a lei lhe garante a inviolabilidade de seus bens desde que não se utilize da pessoa jurídica para fraudar terceiros de boa-fé.

Ultrapassado o concepção sobre o princípio da autonomia patrimonial e a personalização das sociedades empresárias, pode-se avançar para um novo estágio apresentar o conceito e aplicação da desconsideração da personalidade jurídica dentro do ordenamento jurídico brasileiro.


DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Por desconsideração da personalidade jurídica, pode-se entender como a suspensão da personalidade da sociedade nos casos em que ficar comprovado fraude, abuso ou desvio de função. A sua finalidade é satisfazer o débito devido ao terceiro lesado com os patrimônios dos sócios, que passam a ter responsabilidade pela dívida da sociedade tendo em vista que esta foi utilizada como mecanismo para lesar outrem. [12]

Importante lembrar que não existe ato ilícito para ocorrer a perda da autonomia patrimonial para se atingir bens dos sócios, eis que a princípio a pessoa jurídica está dentro das regularidades para seu funcionamento, devendo assim, a parte ao pleitear o instituto da desconsideração da personalidade jurídica demonstrar o abuso de direito.[13]

Ricardo Negrão assevera que “[...] os atos cometidos abusivamente pelos sócios, na administração da sociedade, podem acarretar o superamento da personalidade jurídica com o fim exclusivo de atingir patrimônio dos sócios envolvidos.”[14]

Acerca da desconsideração da personalidade jurídica, disciplina Carlos Roberto Gonçalves que:

Permite tal teoria que o juiz, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere o princípio de que as pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros e os efeitos dessa autonomia, para atingir e vincular os bens particulares dos sócios à satisfação das dívidas da sociedade (lifting de corporate veil, ou seja, erguendo-se o véu da personalidade jurídica).[15]

Diante o exposto, denota-se diante do conceito de desconsideração da personalidade jurídica que o instituto é utilizado para satisfazer o crédito de terceiro lesado pelo mau uso da sociedade empresária, necessário demonstrar a ocorrência de fraudes, abusos de direitos, etc.

Vale lembrar que não pode ser confundido o abuso de direito com ato ilício, tendo em vista que o primeiro não existe a violação ao direito do autor e no segundo fica caracterizado pela vontade dos sócios de fraudar e lesar o direito de outrem.

Importante salientar ainda que a desconsideração da personalidade jurídica não visa anular a personalidade da sociedade, ela é apenas tornada ineficaz para determinados atos, eis que todas as outras relações existentes com aquela pessoa jurídica não são abaladas, não devendo ser confundido assim a desconsideração com a despersonalização.[16]

No mesmo sentido, acerca das diferenciação das terminologias, Pablo Stolze Gagliano assevera que: [...] despersonalização, que traduz a própria extinção da personalidade jurídica, e o termo desconsideração, que se refere apenas ao seu superamento episódico, em função de fraude, abuso ou desvio de finalidade.[17]

Desta forma, como demostrado, há necessidade de se cuidar com as terminologias apresentadas diante a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, tendo em vista que neste caso, não há a sua extinção, apenas é levantado o seu véu protetivo e atingido os bens dos sócios na relação jurídica específica, sendo que as outras relações existentes não são atingidas pelo o instituto, e quando se trada de despersonalização existe a paralização e com consequência a extinção da pessoa jurídica.

Superada as informações preliminares acerca da desconsideração da personalidade jurídica, plausível apresentar como ocorre a sua aplicabilidade dentro do ramo do direito civil no qual é tratado pela doutrina como aplicação correta ou teoria maior.

A aplicação correta ou teoria maior, deve ser encarada como a regra matriz da desconsideração da personalidade jurídica dentro do ordenamento jurídico brasileiro, eis que só é possível a sua aplicação a partir do momento em que ficar demonstrado o abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de personalidade ou confusão patrimonial. [18]

O art. 50 do CC/02 dispõe:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Ocorre que os pressupostos apresentados dentro da teoria maior, a desconsideração da personalidade jurídica divide-se ainda em objetiva e subjetiva.

Na objetiva o pressuposto necessário para se autorizar a desconsideração da personalidade jurídica depende apenas da comprovação do pressuposto da confusão patrimonial. Já na subjetiva, a doutrina entende que poderá ocorrer na hipóteses em que ficar comprovada o desvio de finalidade e fraude.[19]

Fabio Ulhoa Coelho diz que “[...] pela formulação subjetiva, os elementos autorizadores da desconsideração são a fraude e o abuso de direito; pela objetiva, a confusão patrimonial. A importância dessa diferença está ligada à facilitação da prova em juízo.”[20]

Concluindo a ideia após apresentada a forma de atuação da desconsideração da personalidade jurídica, Fabio Ulhoa Coelho finaliza dizendo que:

Em suma, entendo que a formulação subjetiva da teoria da desconsideração deve ser adotada como o critério para circunscrever a moldura de situações em que cabe aplicá-la, ou seja, ela é a mais ajustada à teoria da desconsideração. A formulação objetiva, por sua vez, deve auxiliar na facilitação da prova pelo demandante. Quer dizer, deve-se presumir a fraude na manipulação da autonomia patrimonial da pessoa jurídica se demonstrada a confusão entre os patrimônios dela e de um ou mais de seus integrantes, mas não se deve deixar de desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade, somente porque o demandado demonstrou ser inexistente qualquer tipo de confusão patrimonial, se caracterizada, por outro modo, a fraude.[21]

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Desta maneira, conclui-se que a desconsideração da personalidade jurídica dentro o Código Civil é denominada aplicação correta, também conhecida como teoria maior. Para a invocação do instituto se faz necessário ficar demonstrado o abuso de direito, caracterizado pela confusão patrimonial ou desvio de finalidade e fraude. O primeiro pressuposto é denominado pela doutrina de objetivo, já o segundo de subjetivo.

Por fim, finaliza-se a demonstração da aplicação da teoria maior, deve-se seguir, demonstrando em seguida como ocorre dentro a sua aplicabilidade na prática dentro do Poder Judiciário.


APLICAÇÃO PROCESSUAL DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA COM A VIGÊNCIA DO ATUAL CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973.

No que diz respeito a forma que ocorre a desconsideração da personalidade jurídica no atual sistema processual brasileiro ela pode ocorrer por meio de uma ação cognitiva própria e específica, que neste caso vai respeitar o princípio constitucional do devido processo legal, ou incidentalmente durante a demanda processual em que se identificou presentes os atos que autorizam a sua aplicação. Pode-se dizer ainda que é possível a sua aplicabilidade dentro de uma lide específica, no caso do processo que já está em andamento, necessitando só a demonstração dos requisitos para a superação do véu protetivo da personalidade jurídica. [22]

Sobre os aspectos processuais da desconsideração da personalidade jurídica, Fabio Ulho Coelho denota que:

O pressuposto inafastável da desconsideração é o uso fraudulento ou abusivo da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, únicas situações em que a personalização das sociedades empresárias deve ser abstraída para fins de coibição dos ilícitos por ela ocultados. Ora, se assim é, o juiz não pode desconsiderar a separação entre a pessoa jurídica e seus integrantes senão por meio de ação judicial própria, de caráter cognitivo, movida pelo credor da sociedade contra os sócios ou seus controladores. Nessa ação, o credor deverá demonstrar a presença do pressuposto fraudulento.

(...)

Note-se que descabe a desconsideração operada por simples despacho judicial no processo de execução de sentença. Quer dizer, se o credor obtém em juízo a condenação da sociedade (e só dela) e, ao promover a execução, constata o uso fraudulento da sua personalização, frustrando seu direito reconhecido em juízo, ele não possui ainda título executivo contra o responsável pela fraude. Deverá então acioná-lo para conseguir o título. Não é correto o juiz, na execução, simplesmente determinar a penhora de bens do sócio ou administrador, transferindo para eventuais embargos de terceiro a discussão sobre a fraude, porque isso significa uma inversão do ônus probatório.[23]

Nessa perspectiva, os doutrinadores que adotam a ideia de que a desconsideração a personalidade jurídica não pode ocorrer por decisão do juiz em processo de execução, entendem que deve ocorrer a invocação do instituto por processo autônomo ou ainda por um incidente processual no qual será citado os sócios para se defenderem, respeitando o princípio constitucional do devido processo legal, sob pena de se violar o contraditório e a ampla defesa.

Em contrapartida a ideia da necessidade de se propor uma ação autônoma para se discutir acerca da desconsideração da personalidade jurídica, leciona André Luiz Santana da Cruz Ramos que:

Não obstante seja desnecessária ação autônoma, é imprescindível que a decisão que decreta a desconsideração da personalidade jurídica seja fundamentada, uma vez que se trata de medida excepcional que depende da comprovação de requisitos legais específicos.[24]

E mais, já decidiu a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial número 332.763:

A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Verificados os pressupostos de sua incidência, poderá o Juiz, incidentemente no próprio processo de execução (singular ou coletivo), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens particulares de seus sócios, de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros. [25]

Desta forma, a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica muito embora não seja o entendimento de alguns doutrinadores, pode ocorrer dentro do próprio processo de execução por decisão fundamentada do juiz, conforme já se decidiu pelo Superior Tribunal de Justiça.


ASPECTOS PROCESSUAIS DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DENTRO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

O NCPC trouxe algumas inovações quando o assunto diz respeito a desconsideração da personalidade jurídica, pacificando alguns entendimentos jurisprudencial e doutrinário.

Acerca do incidente de desconsideração da personalidade jurídica leciona Flávio Tartuce que “[...] o Novo Código de Processo Civil passa a tratar de um incidente de desconsideração da personalidade jurídica, regulamentando, no plano instrumental, as regras materiais existentes em vários diplomas de relevo, o que vem em boa hora.”[26]

O NCPC legisla acerca de como deve ocorrer o processamento da desconsideração da personalidade jurídica em seu Título III, Capítulo IV que trata acerca da intervenção de terceiros e do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, conforme arts. 133 a 137 do NCPC, in verbis:

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

§ 1o O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.

§ 2o Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.

Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

§ 1o A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas.

§ 2o Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.

§ 3o A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese do § 2o.

§ 4o O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.

Art. 136. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória.

Parágrafo único. Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo interno.

Art. 137. Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.[27]

No NCPC será necessário instaurar um incidente processual para se analisar a possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica atendendo os princípios constitucionais do devido processo legal e do contraditório. O que já é defendido por alguns doutrinadores hoje em dia, citando-se os sócios para se defenderem no prazo legal de 15 (quinze) dias, na forma do art. 135 do NCPC.

Entretanto se a parte na petição inicial em qualquer processo, seja ele na fase de conhecimento ou de expropriação de bens, já requerer a aplicação do instituto não será necessário se instaurar o incidente, apenas será citado os sócios para se defenderem.

O legislador trata ainda o sócio como parte que deve responder com todos os seus bens no caso de responsabilidade patrimonial, na forma do art. 790, VII, do NCPC “[...] são sujeitos à execução os bens: VII - do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica.”[28]

Sobre a forma em que o responsável pela sociedade empresária será tratado no NCPC, necessário traçar os ensinamentos de Flávio Tartuce:

Dessa forma, devem ser tratados como partes e não como terceiros, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica. Tanto isso é verdade que o novo art. 790, inciso VII, do Código de Processo Civil passou a enunciar que, nas situações de desconsideração da personalidade jurídica, ficam sujeitos à execução os bens do responsável.[29]

O NCPC reconhece a possibilidade daquela pessoa que não for parte no processo sofrer ameaça sobre bens que possua ou tenha direitos incompatível com o ato pelo qual ocorreu a restrição pode interpor embargos de terceiro, legitimando para tanto aqueles que sofrerem constrição judicial decorrente de desconsideração da personalidade jurídica, conforme o art. 674, § 2°, do NCPC que expõe:

Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.

[...]

§ 2o Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos:

[...]

III - quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte.[30]

Sobre a legitimidade de quem sofrer restrições de seus bens por força da desconsideração da personalidade jurídica, suplementado a ideia que o responsável será tratado como parte no processo executório, Flávio Tartuce lembra que:

Suplementarmente, o art. 674 do Novo Código de Processo Civil define como legitimado para opor embargos de terceiros aquele que, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo. Ademais, conforme o § 2º, inciso III, do mesmo artigo, considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos de terceiro, quem sofrer constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte. Somente nessas hipóteses fáticas os embargos de terceiro são cabíveis.[31]

A importância desta mudança é fundamental, tendo em vista que acaba unificando o entendimento anterior dos tribunais de que em caso de haver a desconsideração da personalidade jurídica em processo executório caberia embargos à execução.[32]

Deste modo, tendo o legislador trazendo o dispositivo que caberá embargos de terceiro, se afasta as dúvidas existentes neste ponto no campo prático jurídico. [33]

Fortalecendo a ideia, Flávio Tartuce disciplina que “[...] esclareça-se, por oportuno, que o incidente afasta todo esse debate, pois a defesa do sócio ou administrador se dará dentro do procedimento instituído e não mais em sede de embargos do devedor, com contraditório diferido.”[34]

Outro dispositivo de suma importância instituído no NCPC, diz que poderá o sócio responsabilidade pela dívida da pessoa jurídica solicitar que se executem todos os bens da sociedade empresária para, depois, executar os seus. O mesmo dispositivo expressa no § 3° que poderá o sócio executar a sociedade empresária nos mesmos autos, conforme art. 795, in verbis:

Art. 795. Os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, senão nos casos previstos em lei.

§ 1o O sócio réu, quando responsável pelo pagamento da dívida da sociedade, tem o direito de exigir que primeiro sejam excutidos os bens da sociedade.

§ 2o Incumbe ao sócio que alegar o benefício do § 1o nomear quantos bens da sociedade situados na mesma comarca, livres e desembargados, bastem para pagar o débito.

§ 3o O sócio que pagar a dívida poderá executar a sociedade nos autos do mesmo processo.

§ 4o Para a desconsideração da personalidade jurídica é obrigatória a observância do incidente previsto neste Código.[35]

Vale salientar que o NCPC prevê a responsabilidade patrimonial dos sócios administradores em sobre o qual recai da responsabilidade nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, sendo que estes podem exigir que se executem todos os bens da sociedade empresária, indicando-os, para posteriormente executar os seus bens.

O NCPC em seu art. 1062 também dispõe que ”[...] o incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais.[36]

Ainda sobre a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica no juizados especiais, Flávio Tartuce disciplina que:

Também em boa hora o novo art. 1.062 do CPC/2015 passa a prever que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais. Como o incidente não traz grandes complexidades, não haveria qualquer óbice para a sua incidência nesses processos, constituindo-se em um importante mecanismo que afasta a má-fé e pune os maus sócios e administradores.[37]

Assim, conforme demonstrado, o NCOC prevê a possibilidade a da aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica dentro dos juizados especiais.

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Sobre os autores
Marisa Schmitt Siqueira Mendes

Mestranda do Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI, Linha de pesquisa Hermenêutica e Principiologia Constitucional; Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES

Mayke Éricson Furtado

Pós-Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho; Pós-Graduando em Direito Empresarial; Professor de curso preparatório para OAB do grupo OAB Social. Advogado da OAB/SC 46.422; Corretor de Imóveis CRECI 20851; e-mail: [email protected]. Linkedin: https://www.linkedin.com/in/mayke-furtado-1333b612b/

Informações sobre o texto

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