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A Lei nº 13.245/2016 e as inovações no inquérito policial:

da relativização do sigilo e do caráter inquisitivo nas investigações criminais

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24/01/2016 às 09:42
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8. A nulidade dos elementos informativos

O inciso XXI do artigo 7º do Estatuto da OAB, preconiza que é direito do advogado “assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente ...”

A princípio, o inquérito policial apenas fornece elementos informativos, que se prestam para a formação da opinio delicti do órgão acusador. (STJ - HABEAS CORPUS HC 242686 SP 2012/0100690-5 (STJ).

Em uma investigação criminal, com exceção das provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, só serão são colhidos os elementos informativos, que não são tecnicamente provas, pois não são colhidos em instrução presidida por um magistrado e sob a égide dos princípios do contraditório e da ampla defesa, assim qualquer irregularidade da colheita de elementos informativos, não podem causar nulidade, pois como já decidiu reiteradamente o STJ e o STF “A prova para ser considerada idônea, de modo a conduzir a uma sentença condenatória não pode encontrar-se fundada exclusivamente nos elementos informativos do inquérito policial; antes, deverá ser produzida ou confirmada em juízo, sob pena de sua desconsideração, sobretudo quando estas se baseiam em provas orais, não ratificadas na instrução criminal, por terem sido desmentidas.  Precedentes do STF e STJ". Ordem concedida para que outra sentença seja proferida”. (STJ - HABEAS CORPUS HC 16079 RJ 2001/0022499-7 (STJ)).

A solução para produção de elementos informativos de forma irregular será a sua desconsideração ou a determinação da repetição da produção dos elementos investigatórios de forma regular, nunca a decretação da nulidade e nem a contaminação da ação penal subsequente.

Segundo Afrânio Jardim[5]

“A nulidade de algum ato do procedimento investigatório prévio jamais pode levar à nulidade do processo penal. Pode sim, se for a única prova a legitimar o exercício da ação penal, levar à extinção desta relação processual sem resolução do mérito, por falta de suporte probatório mínimo que legitime a acusação penal (condição da ação que chamávamos de “justa causa”)”.

Podemos concluir que a desobediência às formalidades legais na produção dos elementos informativos pode acarretar a ineficácia do ato em si (prisão em flagrante, por exemplo), mas entendo que, em regra, os vícios no inquérito não se projetam para ação penal que origina, exceto se tais vícios ocorrerem:

1.Nas provas que não podem ser mais repetidas. Exemplo: exame pericial.

2.Nas provas cautelares. Exemplo: busca e apreensão e interceptação telefônicas.

3.Nas provas antecipadas. Exemplo: provas ad perpetuam rei memoriam previstas no artigo 225 do CPP:  “Se qualquer testemunha houver de ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento”.

José Frederico Marques lecionava que:

“A nulidade, porém, só atingirá os efeitos coercitivos da medida cautelar, e nunca o valor informativo dos elementos colhidos no auto de flagrante. O Juiz pode “relaxar” a prisão do indiciado, em virtude da nulidade do respectivo auto de flagrante delito; todavia o Ministério Público, com base nesse flagrante, que foi anulado para efeito de restaurar a liberdade do indiciado, também poderá oferecer denúncia contra este. (Elementos, vol. I, 1997, p. 154)”.

O STF e o STJ ainda não enfrentaram o tema em consonância com a alteração promovida pela lei 13.245/2016, mas sempre defenderam que:

(STF) “É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, sendo o inquérito policial peça de natureza informativa, os vícios nele porventura encontrados não repercutem na ação penal (assim, nos HC no 62.745 e no 69.895, bem como no RHC no 66.428)”.[6]

(STJ) “Eventual nulidade ocorrida no inquérito policial não tem o condão de nulificar o processo, vez que aquele é peça meramente informativa, estabelecida sem o crivo do contraditório.”[7]


Notas

[1] LUCCA, José Carlos de. O necessário sigilo do inquérito policial. RT n. 699/429-30.

[2] RT no 522/396.

[3] RT no 689/439.

[4] No artigo “Consequência de eventual nulidade de algum ato probatório constante de procedimentos investigatórios de condutas delituosas”, publicado no https://www.facebook.com/afraniojardim/posts/557328701083093, acesso 18 de janeiro de 2016.

[5] No artigo “Consequência de eventual nulidade de algum ato probatório constante de procedimentos investigatórios de condutas delituosas”, publicado no https://www.facebook.com/afraniojardim/posts/557328701083093, acesso 18 de janeiro de 2016:

[6] JSTF no 211/310.

[7] RT no 729/495.

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Sobre o autor
Francisco Dirceu Barros

Procurador Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, Promotor de Justiça Criminal e Eleitoral durante 18 anos, Mestre em Direito, Especialista em Direito Penal e Processo Penal, ex-Professor universitário, Professor da EJE (Escola Judiciária Eleitoral) no curso de pós-graduação em Direito Eleitoral, Professor de dois cursos de pós-graduação em Direito Penal e Processo Penal, com vasta experiência em cursos preparatórios aos concursos do Ministério Público e Magistratura, lecionando as disciplinas de Direito Eleitoral, Direito Penal, Processo Penal, Legislação Especial e Direito Constitucional. Ex-comentarista da Rádio Justiça – STF, Colunista da Revista Prática Consulex, seção “Casos Práticos”. Colunista do Bloq AD (Atualidades do Direito). Membro do CNPG (Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público). Colaborador da Revista Jurídica Jus Navigandi. Colaborador da Revista Jurídica Jus Brasil. Colaborador da Revista Síntese de Penal e Processo Penal. Autor de diversos artigos em revistas especializadas. Escritor com 70 (setenta) livros lançados, entre eles: Direito Eleitoral, 14ª edição, Editora Método. Direito Penal - Parte Geral, prefácio: Fernando da Costa Tourinho Filho. Direito Penal – Parte Especial, prefácios de José Henrique Pierangeli, Rogério Greco e Júlio Fabbrini Mirabete. Direito Penal Interpretado pelo STF/STJ, 2ª Edição, Editora JH Mizuno. Recursos Eleitorais, 2ª Edição, Editora JH Mizuno. Direito Eleitoral Criminal, 1ª Edição, Tomos I e II. Editora Juruá, Manual do Júri-Teoria e Prática, 4ª Edição, Editora JH Mizuno. Manual de Prática Eleitoral, Editora JH Mizuno, Tratado Doutrinário de Direito Penal, Editora JH Mizuno. Participou da coordenação do livro “Acordo de Não Persecução Penal”, editora Juspodivm.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Francisco Dirceu. A Lei nº 13.245/2016 e as inovações no inquérito policial:: da relativização do sigilo e do caráter inquisitivo nas investigações criminais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4589, 24 jan. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45936. Acesso em: 8 mai. 2024.

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