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O princípio da igualdade e suas modalidades

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21/05/2016 às 10:13
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3  AS CLASSIFICAÇÕES DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE

 Na doutrina em geral, os conceitos mais correntes são de duas ordens. A primeira agrupa duas espécies de igualdade, a saber, o par conceitual de igualdade formal e igualdade material[1]. O segundo conjunto de conceitos transita dentro da análise da funcionalidade do princípio em suas respectivas modalidades "perante a lei", "na lei", e "na aplicação da lei"[2]

 Essa classificação, esquema de minha autoria, não deve levar ninguém a crer num sistema compactado em diversos segmentos uniformemente aceito pelos juristas. Os doutrinadores não estão em total acordo no uso dessa série de conceitos.  Um determinado sentido que algum conceito possa adquirir para um autor, para outro poderá ter um diferente. É possível encontrar na literatura especializada, dois, três ou mais significados diferentes concedidos à um mesmo conceito. Se para um autor a igualdade material é sinônimo de igualdade na lei, para outro somente a igualdade de cunho formal é na lei; acrescente-se também não ser nada fácil identificar quais conceitos os autores estão realmente a definir e fazer uso, vez que volta e meia estabelecem relações de equivalências entre as terminologias.

Os significados que os conceitos possam adquirir dependerão, em última instância, do modo pelos quais serão definidos no conjunto da projeção da ordem interna da análise na realidade estudada. Eis a razão do porquê as noções utilizadas pelos estudiosos não serem sempre compreendidas do mesmo modo. Não obstante os diferentes aparatos conceituais que cada estudioso adote, sua fabricação e usos não podem ser deixadas ao bel prazer de cada um, como se o arbítrio do próprio investigador fosse critério metodológico. Se não podemos reivindicar a unanimidade entre os autores, resta, ainda, a cada um carregar consigo a responsabilidade de se ater a coerência interna de suas exposições, por menor que esta coerência seja; também não se pode abdicar do sentido das palavras imbricada nas terminologias. Quando, para prenunciar por meio de exemplo, é feito uso da definição igualdade material, exige-se que por material se entenda material em algum determinado sentido, em distinção de formal em um outro. 

 Por último, existe a problemática que ocorre quando a terminologia conceitual se encontrar positivada ou difundida nas decisões jurídicas. Não que seja vedado essa interpenetração, pois se fosse, os estudos jurídicos perderiam boa parte de sua razão de ser. Contudo, o problema nasce a partir do momento em que a expressão jurídica positivada passa, na prática jurídica, por uma mudança de interpretação de modo que adquire um novo significado dificilmente compatível com sentidos lato ou estrito das palavras que compõem a terminologia. A consequência disso é tanto uma confusão quanto uma imprecisão do aparato analítico e descritivo das ciências jurídicas.

 Pedro Lenza (2014) compreende que o sentido de igualdade inscrito no caput do artigo 5º da Constituição Federal (Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza) é aquele modalmente formal, o qual ainda é qualificado de aparente. Como a expressão "perante a lei" está registrada no dispositivo constitucional, deduz-se que ela é equivalente ao sentido formal da igualdade. Ora, que o autor conceba o sentido da norma legal a equivalendo a um conceito, isto é, a terminologia formal de “perante a lei”, na situação em que a própria norma faz uso deste próprio conceito, à medida que se equivalem, ambas ficam indefinidas.  Mas isso não parece ser um grande problema; para quê exaurirmos nossas energias na procura de descobrir qual seja o sentido de uma igualdade formal, ou perante a lei -tanto faz-, se ela nem sequer é tão importante? Melhor é que se procure, "principalmente, a igualdade material uma vez que a lei deverá tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades" (LENZA, 2014, p. 1072). 

 Conforme o exposto, parece já ser possível esboçar a rede de definições de Lenza. A igualdade formal identifica, somente e nada mais, que a igualdade independente de quaisquer desigualdades que possam existir; enquanto que a igualdade material reconheceria as diferenças realmente presente entre os indivíduos. Ao primeiro tipo não se prevê a possibilidade de conceder tratamentos distintos, porém no caso do segundo tipo já se dispõe sobre tratamentos diferenciados. Por que não equacionar esta igualdade de cunho material como um princípio da desigualdade, é algo que escapa minha razão.

 Prossegue, todavia, o autor: "Isso porque, no Estado Social ativo, efetivador dos direitos humanos, imagina-se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa daquela apenas formalizada perante a lei"(LENZA, 2014, p. 1072,)

   A palavra "aparente" é rica de significados. Porém, quando vem acompanhada da palavra "real", formando entre os termos um elo de oposição, aparente é aquilo que parece ser algo, mas não o é. A igualdade formal aparenta ser uma igualdade, mas esta só existe realmente em seu sentido material. As palavras do autor aparentam indicar que não defende tal extremismo, que concede a igualdade material somente maior importância e realidade. Mas, mesmo assim, não deixam de ser aparência; não precisando bem os seus conceitos, crendo-se tão evidente que tratamentos desiguais não podem corresponder à outra coisa senão igualdade, não sobrou ao autor, ao chamar uma igualdade de real e a outra de aparente, que o caminho de amenizar o abismo que implantou.

 Pergunta-se: se a igualdade formal é aparente, e a material real, porque na Constituição está registrado a primeira? Incompetência do constituinte? Ou será gozação sua em preferir terminologias que enganam e executam pegadinhas? Talvez o vacilo esteja no leigo, incapaz de ler a entrelinhas. Seja qual for a razão, o sentido material- entenda-se real- será sempre um mistério a se descobrir. Pedro Lenza, para não ser acusado de sectarismo, compartilha um pouco do segredo. Elenca uma lista de dispositivos constitucionais que, como ele diz, encarregam-se em aprofundar a regra da isonomia material[3]. Lemos, no rol elencado, a presença do artigo 5º, I, da Constituição Federal: homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição. Mas a igualdade material não é a que reconhece as diferenças, prescrevendo tratamentos proporcionais a estas? Homens e mulheres não são seres distintos? Logo, não deveríamos tratá-los diferente? Nunca o caminho para iluminação foi tão abusadamente contraditório.

 Pedro Lenza nos deixa em uma situação de grande dificuldade de compreender o princípio da Igualdade. Todavia, dois pontos problemáticos vêm à tona: um em torno das terminologias usadas e o outro sobre a extensão do princípio.

 Alexandre de Moraes (2014), se não segue o viés de usar a dualidade conceitual de material e formal, adentra no estudo das esferas as quais o princípio da igualdade se direciona: 

"O princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao interprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razões de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social (MORAES, 2014 , p. 35)

 As palavras do autor são claras. Aqueles que produzem as normas, o legislador e o próprio executivo- e dou bravo ao autor em elencar o executivo no ato da produção de norma, enquanto que uma parte da literatura não cita senão o poder legislativo- não poderão prescindir da regra da igualdade, só podendo prescrever tratamentos diferenciados em situações específicas, como se fossem casos excepcionais. Mas não só a produção das normas deve orientar-se pelo princípio, mas também o intérprete deverá aplicar os dispositivos normativos de forma isonômica. 

 Alexandre de Moraes expõe explicitamente que tratamentos desiguais não estão vedados, mas que ocorrerão dentro de limites. A discriminação não poderá ser arbitrária, precisa se justificar pela razoabilidade, pela proporcionalidade e pela finalidade que busca, sem escapar das fronteiras da Constituição. 

  Marcelo Novelino (2013) explica claramente seu esquema de relações conceituais, explicitando-a de modo a conquistar coerência lógica interna da qual nenhum estudo jurídico[4] pode se isentar, apesar da falta de unanimidade no entendimento que os doutrinadores e teóricos manifestam em torno dos conceitos em voga. O autor deixa explícito a problemática em torno da fórmula "perante a lei". De início, vigorando até meados do século passado, a célebre expressão implicava naquilo que o sentido literal de suas palavras evidencia, isto é, igualdade na aplicação do Direito, com força vinculante aos órgãos do administrativo e do judiciário.  Foi somente mais recentemente que se passou a interpretar a fórmula como uma igualdade que se deve vigorar efetivamente na produção do Direito, direcionando-se, portanto, ao legislador.

Guilherme Peña de Moraes (2014) tem algo a nos oferecer quanto a uma razoável conceituação divisional entre igualdade formal e igualdade material. Será na primeira modalidade quando a igualdade se destinar a produção e aplicação das regras jurídicas, enquanto que será de cunho material a igualdade que efetiva perante bens da vida.

 Para Peña de Moraes (2014, p.574)  " a igualdade formal, também denominada igualdade civil ou jurídica, expressa a produção, interpretação e aplicação igualitária das normas jurídicas, com vistas a impossibilitar diferenciações de tratamento que se revelem arbitrárias, sob a forma de discriminações (vantagem) ou  privilégios (desvantagens) "   As modalidades "perante a lei" e "Na lei" são atribuídas, pelo autor, como "modus operandi" da igualdade de tipo formal, distinguindo-se de outros autores, que costumam atribuir à primeira modulação (perante lei) a qualidade de tipo material. Logo, a igualdade formal direciona-se tanto para a produção de normas, cuja responsabilidade pertence ao legislador, quanto à ao aplicador do direito, que Peña de Moraes (2014) entende como condizente da terminologia perante a lei

há a divisão entre princípio da igualdade na lei e princípio da igualdade perante a lei, na medida em que aquela define que a produção das regras jurídicas não pode consubstanciar desequiparações não autorizadas pela ordem constitucional, destinada precisamente aos órgãos legislativos, ao passo que esta determina que aplicação das regras jurídicas deve ser realizada em consonância com o estatuído pelas mesmas, ainda que resulte em desigualdades dirigidas principalmente aos órgãos judiciais (MORAES, 2014, p. 102)

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   Para o autor, o princípio se efetiva, de um lado, na lei, ou seja, no momento de produção da lei, quando então o legislador deverá atentar-se de preservar a vigência do mandado de igualdade no conteúdo legal, e, do outro lado, "perante a lei" o que significa afirmar que a aplicação da lei por parte dos órgãos judiciais não poderá prescindir da parcimônia da igualdade. 

 Para Peña de Moraes, a igualdade material se substancia na igualdade efetiva perante os bens da vida humana. Três são os modos de implementação dela, todos conforme o regime constitucional ser de natureza liberal, social e democrática.

Os primeiros, imanentes aos ordenamentos jurídicos franco-germânicos, são consagrados em normas que proíbem pratica de discriminação baseados em critérios de origem, raça, sexo, cor e idade, como, por exemplo as preceituadas no Preâmbulo da Constituição Francesa e no art. 3º, nº 3, da Constituição alemã

Os segundos, inerentes aos ordenamentos jurídicos nórdico-escandinavos, consignados em normas que obrigam à prestação de benefícios e serviços que ( ) às necessidades básicas da pessoa humana, a fim de protegê-las de determinados riscos que se encontra exposta, como, por exemplo, as prescritas nos Princípios Básicos da Constituição sueca, e norma art. 110 da Constituição norueguesa

Os terceiros, intrínsecos ao ordenamento jurídico norte-americano, são consubstanciados em normas que permitem a realização de ações afirmativas, como, por exemplo, as previstas no Executive Order nº 10925/63

 Apesar de nos fornecer informações dos três grandes modelos da pratica da igualdade material, Peña de Moraes não deixa claro a qual modalidade de igualdade cada uma se direciona. E se cabe aos órgãos do judiciário e do legislativo receber a igualdade formal, o que dizer a respeito da modalidade matéria? O autor também não menciona uma palavra sequer de qualquer interação entre as duas, e, portanto, não se enxerga a perspectiva das possíveis consequências jurídicas provenientes de uma articulação

 Para José Afonso da Silva (2009), tem sido habitual das Constituições a tendência de primar pela igualdade em seu sentido jurídico formal, registrado e consagrado na terminologia "Igualdade perante a lei" ou mesmo "a igualdade em direitos".

A afirmação do art. 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão cunhou o princípio de que homens nascem e permanecem iguais em direito. Mas aí firmara igualdade jurídico-formal no plano político, de caráter puramente negativo, visando a abolir os privilégios, isenções pessoais e regalias de classe. Esse tipo de igualdade gerou as desigualdades econômicas, porque fundada "numa visão individualista do homem, membro de uma sociedade liberal relativamente homogênea (SILVA, 2009, p.214)

 Como a  igualdade gerou a desigualdade econômica não se explica por esta proposição do autor, que acredita fielmente que a menção a noções de individualismos e sociedades liberais torna mais crível o paradoxo; Só mais adiante o autor explica-se: no momento em que os mandamentos da igualdade foram adotados, mais precisamente no século XVIII, o alvo dos ataques foi as desigualdades provenientes do regime feudal, sem que com o novo regime seguinte ficassem bloqueadas as desigualdades materiais (Econômicas). Como meio de complementar o princípio formal da igualdade e de obter equalização dos desiguais, é que foram proferidos os direitos sociais substancias, adotados na Constituição Federal atual no rol de seu art. 7º. 

 Para Canotilho (1998), ser igual perante a lei pode significar, ou bem a igualdade na aplicação, ou bem a igualdade quanto a criação do Direito. O primeiro dos sentidos possíveis é traduzido "tradicionalmente", como a exigência de igualdade na aplicação do Direito. Trata-se de uma das dimensões básicas do princípio da igualdade constitucional, com relevância na aplicação das leis pelos órgãos da administração e pelos tribunais. Por sua vez, o segundo sentido possível direciona o princípio em questão ao "próprio legislador, vinculando-o à criação de um direito igual para todos os cidadãos"(CANOTILHO, 1998, p.389).

   Entretanto, enquanto que no caso da igual aplicação da lei não há mais nenhuma ulterior indagação, pois, partindo da lei posta nada há de conjecturar sobre a qualidade de igual que está já vigente na lei, o mesmo não se manifesta da discussão da igualdade relativa à criação do Direito, vez que é incontornável que se pergunte o que é criação de direito igual

 Ainda conforme o jurista português, o Direito, para ser igual, não pode prescindir do postulado de racionalidade prática que lhe é imanente: "Para todos os indivíduos com as mesmas características devem prever-se, através da lei, iguais situações ou resultados jurídicos"(CANOTILHO, 1998, 389). Conquanto seja um postulado de universalidade, a igualdade que se tem às mãos é a de cunho formal, geral e vazia, aberto para toda e qualquer determinação quanto ao conteúdo discriminatório. Por sua vez, a igualdade em sentido material preenche exatamente esse interior oco do conceito formal, delimitando os contornos dos critérios a serem adotados diante das situações concretas.

 O artigo 13 da constituição portuguesa, que consagra o princípio da igualdade, não se restringe ao sentido meramente formal. Desse dispositivo "exige-se uma igualdade material, devendo tratar por 'igual o que é igual e desigualmente o que é desigual'" (CANOTILHO, 1998, p 390). A igualdade material pressupõe conteúdo relacional tripolar, pois exige igualdade entre dois indivíduos com relação a determinada característica ou circunstância. Porém, mesmo a fórmula da igualdade material está aleijada de "critério material de um juízo de valor sobre a relação de igualdade (ou desigualdade). A questão pode colocar-se nestes termos: o que é que nos leva a afirmar que uma lei trata dois indivíduos de uma forma igualmente justa? Qual o critério de valoração para a relação de igualdade?"  (CANOTILHO,1998, p 390)

Por mais que para muitos Canotilho seja uma grande referência quando o assunto é Direito Constitucional, porque devo me ater com todo meu foco ao que é relevante, ou seja, objetividade do que é tratado, não posso abster-me de analisar criticamente o que ele escreve:

  • A primeira crítica direciona-se a concepção da igualdade na aplicação da lei. Não excedo em expectativas esperar que um grande estudioso ao escrever sobre algum determinado assunto conheça as discussões em torno, com seus dissensos e consensos. Uma das grandes problemáticas, sobretudo desde Hans Kelsen, quando se trata da terminologia da igualdade na aplicação, é saber se o que se está em discussão é proveniente de um princípio independente ou mera consequência da natureza da norma, questão que o jurista português deixa em suspenso, não a tocando senão de leve, sem que se retire nenhuma consequência proveitosa.
  • Afirmar, a começo de conversa, que a igualdade se identifica, em um primeiro plano, com igualdade na aplicação do Direito, para, em seguida, afirmar que também se direciona ao processo de produção de Direito, ou seja, vale como mandamento ao legislador, exige uma explicação que justifique como se saltou de um plano ao outro, exigência que o autor não cumpre
  • Afirma, ainda, que o princípio da igualdade material implicaria ao 'igual o que é igual e desigualmente o que é desigual". Porém, se é essa a definição de igualdade material, na medida que a igualdade de cunho formal dita a ordem de igual tratamento para iguais, qualquer dualismo entre as duas noções não faria nenhum sentido, dissipada, portanto, qualquer relação que se supusesse. Visualize-se o seguinte: O grupo X possue "A" em comum, enquanto que os indivíduos do grupo Y possuem em comum "B". X é desigual em relação a Y no que toca "A" ser diferente de B. Todavia, entre os membros do grupo X "A" é a marca de sua igualdade. Logo, os ditos "desiguais" da sentença só se desigualam em relação a outros, pois entre si são iguais e, portanto, receptivos da fórmula formal da igualdade. Se a ordem da igualdade na modalidade formal exige que se trate igualmente os iguais, um tratamento Alfa será dado ao grupo X, em razão de "A" e um tratamento Beta ao grupo Y, em função de "B". Tratamentos distintos, é verdade, mas não passaria de dois tratamentos radicados na ideia de igualdade formal. Não é este o postulado indicador de que "para todos os indivíduos com as mesmas características devem prever-se, através da lei, iguais situações ou resultados jurídicos reconhecendo um conjunto de várias porções iguais"? Que não haja um, mas uma quantidade proporcional ao número de variações encontradas, está subtendido de sua definição.

 À guisa de sinterização, é possível lastrear três maneiras distintas de categorizar o princípio jurídico da igualdade de forma bifurca.

 Uma delas concebe a igualdade formal como instituto captado genericamente, que traduz uma igualdade límpida e sem detalhes diferenciadores, enquanto que a igualdade material abrangeria as desigualdades reais que se apresentam na realidade. À essa concepção vale a crítica de Kelsen (1996) de que essa noção de igualdade material equivale a um princípio das diferenças e desigualdades.

 A segunda é a que se encontra bem descrita por Canotilho (1998). Igualdade formal seria o instituto que prescreveria previsões de iguais situações e resultados para indivíduos iguais, isto é, com mesmas características, enquanto que o instituto de igualdade material profere tratar igual o que é igual e desigualmente o que é desigual. Porém, elas não são necessariamente institutos autônomos, sejam complementares, sejam opostos, não sendo uma senão a consequência lógica derivada da outra. Se os indivíduos que possuem as mesmas características serão tratados igualmente, os que não possuírem estas características, e, portanto, diferentes dos primeiros, serão tratados também diferentemente dos que recebem aqueles.

  Dessas duas concepções aleijadas, de uma certa maneira nasce uma terceira. De uma concepção de igualdade formal como um instituto de ordem genérica, abstratamente ampla, abre-se a visão da justiça para igualdade material que se orientaria para os detalhes da vida real e concreta, que se apresentam sempre segundo um conjunto de parciais e fragmentadas igualdades e diferenças entre indivíduos e entre grupos (o elemento da primeira), ao mesmo tempo que se projeta o prospecto de que os tratamentos desiguais à certos grupos e indivíduos não devem ser somente consequência necessária e lógica do fornecimento de tratamento iguais à pessoas detentoras de iguais características, mas que a própria desigualdade deve ser tomada como alavanca de medidas jurídicas e normativas a serem executadas (o elemento da segunda). Todavia, não sendo uma quantidade ínfima de detalhes distintivos, — caminhando mesmo em direção a uma contabilidade infinita-, quais elementos da vida concreta serão relevados? A terceira corrente surge como uma tentativa de responder a essa pergunta. Sua plataforma é dirigida com objetivo de suprimir as chamadas desigualdades injustas de ordens sociais, econômicas e culturais. Os Bens em questão são os bens da "vida humana”


4 BIBLIOGRAFIA

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NOTAS

[1] Na literatura como um todo, encontra-se uma grande quantidade de terminologias, não se resumindo a dualidade material e formal. Porém, como são esses dois os mais frequentes, e para não estender em demasia o trabalho, exclui as demais.

[2] Nem sempre essas três terminologias são compreendidas como institutos distintos e autônomos.

[3] Pedro Lenza Lenza faz uso das expressões igualdade material, igualdade substancial e isonomia material, uma atrás da outra. Por falta de clarividência, suponho que se equivalham. 

[4] E que nem é tanto seu, pois Novelino sintetiza boa parte do capítulo voltado ao princípio da igualdade, que se encontra na obra de Robert Alexy. Porque deste falarei mais adiante, reduzo a participação daquele nesse trabalho monográfico 

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHAVES, Artur Leite. O princípio da igualdade e suas modalidades. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4707, 21 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/48854. Acesso em: 20 mai. 2024.

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