Os rurícolas e o direito legal ao intervalo intrajornada

06/06/2016 às 21:59
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Um estudo aprofundado e moderno, e atualizado, sobre o tema do intervalo dentro da jornada, para aqueles que trabalham no ambiente rural. Tratamos de analisar, atualizando os conceitos, o direito justo de obter esse intervalo intrajornada aos rurícolas.

  1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

Dentro do presente artigo, faremos uma verificação didático-expositiva sobre a Norma Regulamentadora nº 31 defronte do que hoje temos como entendimento jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema, em que, esta lacuna que a lei demonstra possuir em sua integralidade, já fora devidamente suprimida, como bem veremos, por interpretação do artigo 72 da CLT aos rurícolas luz da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho. Tudo isto, à luz da Norma que verificaremos durante o artigo que passamos a apresentar.

  1. HISTORICIDADE BRASILEIRA ACERCA DO TEMA

Em recente julgado[1], o Tribunal Superior do Trabalho, doravante aqui denominado apenas por sua sigla, TST, fez o reconhecimento legal do conteúdo do artigo 72 da CLT, in verbis:

Art. 72 - Nos serviços permanentes de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), a cada período de 90 (noventa) minutos de trabalho consecutivo corresponderá um repouso de 10 (dez) minutos não deduzidos da duração normal de trabalho.

E ao realizar este julgado, foi conferida a aplicabilidade do mesmo, de maneira analógica, portanto, sob interpretação analógica, ao rurícola, com visão à garantir a descanso necessário que, também é bem previsto na Norma Regulamentadora nº 31 do Ministério do Trabalho e Emprego, que trata do tema da segurança e saúde no trabalho na agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura, inclusive, trazendo em seu bojo, seu objetivo, transcrevemos[2]:

31.1. Esta Norma Regulamentadora tem por objetivo estabelecer os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar compatível o planejamento e o desenvolvimento das atividades da agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura com a segurança e saúde e meio ambiente do trabalho.

Factualmente, esta decisão proferida pelo TST, segue o instinto tendencioso que a SDI-1 possui, dentro dos seus julgados hodiernos sobre o tema, inclusive, trazendo à tona, a possível aplicabilidade deste direito à todos os rurícolas.

Demonstraremos, aqui, objetivamente, a possibilidade de a norma legal ser aplicada tendo-se em vista o teor expositivo precedente do TST, que esclareceremos, não de forma a limitar, mesmo porque, não se poderá jamais limitar, mas, de forma expositiva e superior, os fundamentos que levaram a Corte Superior a estabelecer o entendimento entabulado.

  1. DO LUDISMO – REVOLUÇÃO INDUSTRIAL – ÀS SEQUELAS ATUAIS DE PROTEÇÃO AO LABOR RURÍCOLA PELAS NORMAS REGULAMENTARES.

Com a finalidade precípua de se fixar conduta que conceda, de forma a discriminar e imputar, proteção à segurança – com suas margens centralizadas – saúde e higiene do trabalhador, dando-lhe, então, a consequência de um ambiente salutar de labuta, não se pode haver instituído de modo claro, e objetivo dentro da esfera laborativa.

Nesta esteira, a história do nosso tempo demonstra as batalhas populares que se travaram para que pudéssemos estabelecer novas alterações positivas e reais dentro da relação empregado/empregador, buscando melhorias consideráveis às condições gerais laborativas.

Entre essas manifestações destaca-se o movimento Ludita (entre 1811 e 1813), quando os trabalhadores, contrários aos avanços tecnológicos em curso, iniciaram uma sistemática destruição e queima das instalações industriais em várias regiões inglesas[3].

Em meados do século XIX, inclusive, dentro do lapso da revolução industrial, é o momento histórico em que temos a alteração substancial do direito do trabalho, situação em que criaram-se várias e tantas discussões parafraseadas, porém, que fizeram com que os labutadores pudessem sentir em si mesmos o quesito da dignidade, e, situação em que, passamos a ter o estudo histórico nacional e global de rotas e diretrizes que buscavam alcançar estas melhorias, dentre as quais a mais buscada era a minoração da excessiva jornada de trabalho imputada ao trabalhador da época, bem como, num segundo momento, porém tão importante quanto o primeiro, questões de segurança e higiene do trabalho[4].

Hodiernamente, necessariamente precisamos promover um ambiente salutar no labor diário de todos e de cada um dos trabalhadores, isto é, almejamos cada vez mais, e mais intimamente e diretamente, um estado de completo bem-estar físico, mental e social nas relações de trabalho, sejam elas quais forem.

Ademais, a Organização Mundial da Saúde, doravante denominada por sua sigla O.M.S. preza que haja sempre um estado de bem-estar físico, mental e social e não somente a ausência de doença e enfermidade.

Amauri Mascaro[5], nos demonstra que:

Não há dúvida de que a primeira condição que o empregador está obrigado cumprir é assegurar aos trabalhadores o desenvolvimento da suas atividades em ambiente moral e rodeado de segurança e higiene.

Ainda, demonstra, o doutrinador supramencionado, num outro trecho[6]:

O meio ambiente do trabalho é, exatamente, o complexo máquina-trabalho: as edificações do estabelecimento, equipamentos de proteção individual, iluminação, conforto térmico, instalações elétricas, condições de salubridade ou insalubridade, de periculosidade ou não, meios de proteção à fadiga, outras medidas de proteção ao trabalhador, jornadas de trabalho e horas extras, intervalos, descansos, férias, movimentação, armazenagem e manuseio de materiais que formam o conjunto de condições de trabalho etc.

Acrescendo-se ao entendimento de Amauri Mascaro, reza José Cairo Jr[7]:

Da mesma forma, é imperativo criar e sustentar um meio ambiente de trabalho hígido, visto que o empregado permanece parte de sua vida neste local. Com efeito, considerando uma jornada normal de trabalho, em média, 1/3 (um terço) de sua vida.

Concluímos, portanto, sem interpretações extensivas, que, há objetivo dever de o empregador sempre conceder ao empregado, ou trabalhador, não nos importando a classificação que queiramos dar, um nicho laboral que passe segurança, seja saudável e higienizado, dentro do qual se possa aplicar as regras e conceitos que determinam as leis e normas, como por exemplo, o uso pelo empregado de seus equipamentos que façam sua proteção individual, buscando não haver acidente nem com a empresa e, muito menos com a vida dos que lá labutam, mantendo a incolumidade física de cada um deles, sempre perfeita.

Ademais, se quisermos conquistar este objetivo, leia-se, para estabelecer e conseguir, factualmente, haver um nicho de trabalho seguro e higiênico, inúmeras normas, em sentido amplo, foram editadas.

Citamos, a Constituição da nossa República, que vige desde 1988, que em seu bojo traz a expressa previsão que ratificam nosso tema, buscando-se assim proteger o habitat natural do ser humano, bem como o nicho laboral, conforme se vê da leitura dos artigos 7º, XXII; 170, VI; 200, VIII e 225, in verbis:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...]

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...]

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: [...]

VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho;

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Junto com nossa Constituição, supracitada, trazemos à baila, o Decreto nº 5452/1943, a Consolidação das Leis do Trabalho, em que, se destina, em seu interior, apenas e tão somente a presença de um capítulo para tratar sobres questões que envolvem a mantença do meio ambiente saudável, que é o Capítulo V do Título II – Da Segurança e Medicina do Trabalho.

Isto significa, há aqui o estabelecimento dos quesitos necessários que se relacionam à segurança, saúde e higiene do trabalhador, visando, de forma consequencial, a redução de riscos inerentes ao labor, que é o meio ambiente saudável, ou ainda, o nicho laborativo hábil e útil à saúde pessoal e individual a todos e a cada um.

Podemos, e devemos, citar sobre a esfera administrativa, em que, ainda que possamos verificar a existência de legislação que possa disciplinar sobre o tema de segurança, saúde e higiene ao trabalhador, e que, “data vênia” não temos qualquer razão de expor abertamente aqui, destacamos a Norma Regulamentadora, nº 15, que busca estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente.

Há, ainda, a Norma Regulamentadora nº 09, que reza sobre o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, e, esta deverá ser destacada, embora, não estudaremos afundo neste trecho, visto que estabelece a obrigatoriedade da elaboração e implementação, por parte de todos os empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados, do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais - PPRA, visando à preservação da saúde e da integridade dos trabalhadores, através da antecipação, reconhecimento, avaliação e consequente controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho, tendo em consideração a proteção do meio ambiente e dos recursos naturais.

Ainda temos que apresentar a Norma Regulamentadora nº 31, e, dentro de nosso presente artigo, buscamos conceituar e enumerar os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de trabalho, causando, destarte, a compatibilidade e o bom planejamento e desenvolvimento das atividades da agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura com a segurança e saúde e meio ambiente do trabalho.

  1. DEFINIÇÕES LEGAIS E SUAS RESPECTIVAS PROTEÇÕES SOBRE O EMPREGADO RURAL COM A NORMA REGULAMENTADORA Nº31.

Trabalhador rural, rurícola, ou ainda dentro da legislação n° 5.889/73[8] define o Empregado Rural como sendo toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário.

Nos termos da doutrina[9]:

É o trabalhador que presta serviços em propriedade rural, continuamente e mediante subordinação. Assim, será considerando como tal o trabalhador que cultiva a terra, que cuida do gado, e o pessoal necessário à administração da empresa ou atividade rural.

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A norma traz em seu bojo várias questões e procedimentos a serem adotados visando um ambiente de trabalho essencialmente seguro ao trabalhador rural, dos quais destacamos, in limine, o contido nos itens 31.10.7 e 31.10.9:

31.10.7 – Para as atividades que forem realizadas necessariamente em pé, devem ser garantidas pausas para descanso.

31.10.9 – Nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica devem ser incluídas pausas para descanso e outras medidas que preservem a saúde do trabalhador.

Via de regra, temos que, os supracitados, estabelecem regra de segurança e saúde do trabalhador rural dispondo sobre a obrigatoriedade de se garantir as pausas para descanso intrajornada laboral, para as atividades realizadas em pé ou para as atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica.

Contextualmente, são expressos direitos aos trabalhadores rurais, que laborem em pé ou com sobrecarga muscular estática ou dinâmica, possuírem suas pausas intrajornada de trabalho, bem como, direta e claramente, temos que, é dever do empregador concedê-las pois, desta forma estará fazendo com que haja um ambiente de trabalho equilibrado, além dos riscos voltados à segurança e saúde do trabalhador.

Sendo assim, podemos conectar preceitos que visem a proteção ao bem mais precioso de todos e de cada um de nós, qual seja, a vida, bem como com a integridade física do trabalhador no ambiente de trabalho.

  1. HERMENÊUTICA JURÍDICA SOBRE LACUNAS DA LEI E A NORMA REGULAMENTADORA Nº 31.

Verificamos, ainda que, a referida norma, não prevê o tempo da pausa que deve ser fornecido ao trabalhador rural no exercício das suas atividades, se ingressamos no quesito intervalo.

Portanto, causamos aqui, o fator lacuna normativa, visto que não possui imediata aplicabilidade no caso em concreto.

Ao verificarmos o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro temos:

 Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Daí, admitimos que, num caso concreto, em que temos a omissão da lei, em contrapartida temos a chance do operador do direito buscar o uso de outras fontes que possam almejar o fim precípuo de aplicar a norma que se busca ao caso.

A fonte do direito, à luz da doutrina, será[10]:

...o lugar de onde surge essa coisa. O lugar de onde ela nasce. Assim, a fonte do Direito é aquilo que o produz, é algo de onde nasce o Direito. Para que se possa dizer o que é fonte do Direito é necessário que se saiba de qual direito. Se cogitarmos do direito natural, devemos admitir que sua fonte é a natureza humana. Aliás, vale dizer, é a fonte primeira do Direito sob vários aspectos.

Carlos Maximiliano preleciona ao tratar sobre a interpretação das leis[11]:

A Hermenêutica Jurídica tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito.

As leis já devidamente positivada, serão formuladas em termos gerais, para uma situação dita, hipotética, já que, fixam regras, consolidam princípios, estabelecem normas, de maneira ampla, sem descer a minúcias.

Agora, daí decorre a tarefa máxima do exegeta da relação entre o texto abstrato e o caso concreto, entre a norma jurídica e o fato social, isto é, aplicar o Direito.

Para haver o almejar do objetivo, devemos descobrir e fixar o sentido verdadeiro da regra positiva; e, logo depois, o respectivo alcance, a sua extensão.

Em suma, o executor busca realizar da norma tudo o que na mesma se contém: é o que se chama interpretar, isto é, determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito.

Na seara trabalhista as fontes estão previstas no art. 8º da CLT que estabelece:

“As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”.

Baseando-se nestes pressupostos, a conclusão a que podemos chegar é que, ainda que exista uma norma prevista em regra, leia-se, norma positivada para que se estampe claramente qual seria o tempo plausível do intervalo, ou dos intervalos que devam ser aplicados aos rurícolas, dentro de  sua jornada, aquele que aplicará o direito ao caso concreto deverá observar os dispositivos acima destacados, além de se fazer buscar na legislação, ou em outra referência, algo devidamente expresso que possa, real e factualmente se adequar ao caso em concreto, afinal, desta forma haverá a perfeita supressão da lacuna jurídica com a devida aplicação correta dos preceitos informados na legislação.

Ademais, quando da confecção do presente, é dado ao juiz, a luz do art. 126 do CPC, a capacidade de, prontamente, se eximir de julgar o processo alegando lacuna ou obscuridade na lei ou norma a ser aplicada no caso em concreto, senão vejamos:

Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.

Ainda, tentando aqui, buscar algo dentro do bojo jurídico nacional algo que se pudesse alegar para usarmos como base para a aplicabilidade do contido na Norma Regulamentadora nº31, temos o que nos está expresso dentro do artigo 72 da CLT:

Art. 72 - Nos serviços permanentes de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), a cada período de 90 (noventa) minutos de trabalho consecutivo corresponderá um repouso de 10 (dez) minutos não deduzidos da duração normal de trabalho.

Temos, presente, aqui, a situação que nos garante demonstrar que, há a aplicabilidade do dispositivo em referência, através do instituto da analogia, conforme nos apresenta Carrion[12], quando faz uma citação ao jurista Clovis Beviláqua:

A operação lógica em virtude da qual o intérprete estende o dispositivo da lei a casos por ela não previstos; com ela, o juiz aprecia o sistema jurídico, em seus fundamentos e na sua teleologia, extraindo o princípio aplicável.

E, ao iniciarmos por esta modalidade de pensamento, temos que, a Subseção Especializada em Dissídios Individuais – I do TST, (SDI-I), solidificou posicionamento sobre a maneira em que se há de dar a aplicabilidade, analogicamente, do que prevê a regra do artigo 72, da CLT, supracitado, aos trabalhadores rurais. Exemplificamos:

“EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. CORTADOR DE CANA. PAUSAS PREVISTAS NA NR 31 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Embora a Norma Regulamentar nº 31 do Ministério do Trabalho e Emprego tenha manifestado o cuidado com a ergonomia dos trabalhadores rurais, prevendo pausas para descanso nas atividades que exigem sobrecarga muscular estática ou dinâmica, não especificou qual o tempo de duração da interrupção do trabalho. Considerando a omissão quanto à duração dessas pausas, bem como o fato de que a realidade do cortador de cana, que ‘chega a desferir até mais de 10.000 golpes de podão diariamente, fora a intensa movimentação dos membros superiores’ (informação extraída da Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 26, n. 97-98, 2001, p. 17, e citada pelo excelentíssimo senhor Ministro Aloysio Corrêa da Veiga no acórdão alusivo ao processo nº TST-E-RR-21-68.2011.5.15.0156, SBDI-1, DEJT 29/11/2013), a aplicação analógica do artigo 72 da CLT se faz necessária, remetendo o julgador ao que dispõem o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, bem como o artigo 8º da CLT. Note-se que a essência jurídica que motivou a edição da Súmula 346 do TST é a mesma que ampara o pedido do trabalhador que exerce suas atividades em lavouras de cana de açúcar, o que autoriza a incidência do que o Mestre Rubens Limongi França denomina de analogia legis, a saber ‘é aquela que extrai a igualdade de tratamento para certo caso de uma norma legislativa existente para outro similar. Embora seu fundamento último seja o mesmo da analogia iuris, as bases que a sustentam encontram-se exaradas em velho brocardo jurídico, cujos termos são os seguintes: Ubi eadem legis ratio, ibi eadem legis dispositio. Como se vê, supõe a descoberta da ratio legis’. (in Hermenêutica Jurídica, Editora Revista dos Tribunais, 11ª Edição, pagina 47). Precedentes. Recurso de embargos conhecido por divergência jurisprudencial e, no mérito, provido”. (TST-E-RR-1797-40.2010.5.15.0156, Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT de 28.03.2014)

“HORAS EXTRAS. EMPREGADO RURAL. ATIVIDADE DE CORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR. PAUSAS PREVISTAS NA NR-31 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 72 DA CLT. 1. A NR-31 do Ministério do Trabalho e Emprego, aprovada pela Portaria GM nº 86, de 3/3/2005, prevê a obrigatoriedade de concessão de pausas para descanso aos empregados rurais que realizem atividades em pé ou se submetam a sobrecarga muscular. A norma regulamentar, no entanto, não especifica as condições ou o tempo de duração de tais pausas. 2. A lacuna da norma regulamentar e da própria legislação trabalhista sobre aspecto de menor importância, relativo ao modus operandi das aludidas pausas, não pode servir de justificativa para a denegação de direitos fundamentais constitucionalmente assegurados ao empregado, relativos à ‘redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança’ (artigo 7º, XXII, CF) e ao meio ambiente do trabalho equilibrado (artigo 225, caput, CF). Necessidade de utilização da técnica processual de integração da ordem jurídica, mediante analogia. Aplicação das disposições dos artigos 8º da CLT, 126 do CPC e 4º da Lei de Introdução ao Código Civil. 3. Ante a ausência de previsão, na NR-31 do MTE, quanto ao tempo de descanso devido nas condições de trabalho lá especificadas, aplica-se ao empregado que labora em atividade de corte de cana-de-açúcar, por analogia, a norma do artigo 72 da CLT. Precedentes das Turmas e da SBDI-1 do TST. 4. Embargos de que se conhece, por divergência jurisprudencial, e a que se dá provimento”. (TST-E-RR-1943-81.2010.5.15.0156, Relator Ministro: João Oreste Dalazen, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT de 09.05.2014)

“RECURSO DE REVISTA. TRABALHADOR RURAL. PAUSAS POR RAZÕES DE SAÚDE PREVISTAS NA NR 31 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. INTEGRAÇÃO JURÍDICA DO ART. 72 DA CLT. A Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso XXII, garante aos trabalhadores urbanos e rurais, a "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança". Nessa esteira, a Lei nº 5.889/73, que institui normas reguladoras do trabalho rural, em seu artigo 13, determina que "nos locais de trabalho rural serão observadas as normas de segurança e higiene estabelecidas em portaria do ministro do Trabalho e Previdência Social". Com a edição da Portaria nº 86, de 3 de março de 2005, do Ministério do Trabalho e Emprego, entrou em vigor a Norma Regulamentadora nº 31, que estabelece medidas de segurança e higiene para profissionais rurais, entre as quais estão previstas pausas para descanso do trabalhador: "31.10.7 - Para as atividades que forem realizadas necessariamente em pé, devem ser garantidas pausas para descanso"; "31.10.9 – Nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica devem ser incluídas pausas para descanso e outras medidas que preservem a saúde do trabalhador". Tais pausas para descanso estipuladas pela NR 31, item 10.9, com suporte nos comandos do art. 7º, XXII, CF, e art. 13 da Lei nº 5.889/73, correspondem a 10 minutos de intervalo a cada 90 trabalhados, sem dedução da jornada, por ser tal lapso o que melhor se harmoniza aos objetivos de saúde enfocados pelas regras jurídicas mencionadas. Integração jurídica inerente ao Direito, em geral (art. 4º, LINDB) e ao próprio Direito do Trabalho (art. 8º, caput, CLT). Precedentes jurisprudenciais desta Corte Superior. Recurso de revista conhecido e provido”. (TST - RR-1767-05.2010.5.15.0156, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT de 01/07/2014)

Daí, podemos compreender que, o TST buscou ao aplicar analogicamente o conteúdo do art. 72 da CLT no contexto do rurícola, atingir o objetivo precípuo e primaz da Norma Regulamentadora nº31 que, reavivando o entendimento e a nossa colocação anterior, busca fixar uma conduta de segurança, saúde e higiene ao empregado no ambiente de trabalho.

Ademais, buscamos resolver a questão e demonstramos o que, acertadamente, determinou o ilustre Ministro Augusto César Leite de Carvalho, no RR nº 0003853-46.2010.5.15.0156, que o que nos prevê o artigo 72 da CLT poderá ser devidamente usado e aplicado pois, aos trabalhadores rurais dentro do principal propósito da Norma Regulamentadora nº 31, deve-se, também, não obstante, promover o ambiente seguro e saudável ao trabalhador.

Eis o trecho da decisão:

Com efeito, a aplicação analógica do art. 72 da CLT se impõe não em razão do tipo de atividade desempenhada, relativa aos serviços de mecanografia em comparação com a de cortador manual de cana de açúcar, mas sim em razão do fator repetitividade de movimento, presente em ambos os métodos de trabalho, como fator de risco para doenças ocupacionais. É de conhecimento geral que o trabalho no corte da cana de açúcar é uma das mais penosas e extenuantes atividades laborais. Soma-se ao esforço excessivo pela repetitividade dos golpes de facão, a rotina operacional permeada por agentes penosos. A soma desses fatores de risco impõe, com maior razão, a aplicação analógica do art. 72 da CLT, a fim de que se torne efetivo o direito fundamental de proteção à saúde do trabalhador.

Ademais, temos que, não fora aqui a primeira vez a situação em que se vê um posicionamento do TST desta maneira, aplicando, analogicamente, o conteúdo do art. 72 da CLT ao caso em concreto. É o que se vê da leitura dos precedentes que justificam a Súmula nº 346[13] do TST:

A 1ª Turma desta casa restabeleceu a r. sentença, de modo a condenar a reclamada ao pagamento de horas suplementares relativas aos intervalos não concedidos. Este entendimento teve como suporte o fato de o digitador de computação equiparar-se ao mecanógrafo, para os fins previstos no art. 72 consolidado. Irresignada, a demandada pretende demonstrar infringência ao art. 72 da CLT e dissenso pretoriano com o aresto que acosta. Os embargos merecem ser acolhidos, considerando a existência de conflito pretoriano com o julgado transcrito às fls. 113. Mérito. Deve ser mantido intacto o "decisum" turmário.

A atividade do digitador, por analogia, encontra-se ao abrigo do art. 72 consolidado. Esta possibilidade decorre da aplicação do art. 8º do mesmo diploma legal. Note-se a existência de portaria do MPAS de nº 4.062/87, classificando como possível causa de doença do trabalho a denominada “Inflamação da Bainha dos Tendões”, catalogando neste mesmo ato as atividades de digitador, datilógrafo e pianista profissional. Em sendo assim, não tenho dúvidas acerca da similitude das funções. Destarte, rejeito os embargos.

  1. NOTAS FINAIS CONCLUSIVAS.

Podemos inferir que, o Tribunal Superior do Trabalho, ao buscar a aplicação do artigo 72 do diploma trabalhista, buscou alcançar um final, que é o principal, ou um deles, objetivo da relação entre o empregador e o empregado, conforme bem vimos ao longo de toda nossa exposição, qual seja, o de estabelecer um ambiente de trabalho adequado a todos, como bem vem fazendo o agronegócio hodierno.

Somando-se a tudo isto, temos que, em seu art. 7º, inciso XXI, a nossa Constituição Federal nos apresenta os direitos dos trabalhadores, sejam urbanos, sejam rurícolas, e, temos o direito do trabalhador rural bem respeitado nos dias atuas, à redução dos riscos inerentes ao trabalho.

Noutras palavras, aqui, aplicamos a chamada regra jurídica “Ubi eadem legis ratio, ibi eadem legis dispositivo” que, no entendimento do mais alto Tribunal Pátrio, o Supremo Tribunal Federal, quer dizer, onde há a mesma razão de ser, deve prevalecer a mesma razão de decidir[14].

Contextualizando, buscamos pelo certeiro posicionamento do Supremo, visto que, ao empregar uma das fontes do direito, qual seja, a analogia, temos a efetiva, real e factual aplicação da Norma Regulamentadora nº31, pois, ainda que haja uma lacuna legislativa, buscamos a promoção do melhor e mais salutar ambiente de trabalho, pois, o rurícola, como bem assistimos, atualmente, deve ter – e na sua realidade tem – um ambiente saudável, higiênico e seguro, incluindo seus direitos a intervalos, pois, trata-se de um alguém que exerce atividades em pé, ou ainda, são atividades que lhe exigem sobrecarga muscular estática ou dinâmica, portanto, congratulando aos empregadores, que vêm seguindo as regras do direito, é bom que sigamos na concessão à eles, dos direitos garantidos não só na CLT, e legislação esparsa, ainda que analogicamente interpretados, como também, os expressamente expostos na Constituição Federal, dentre os quais, o intervalo intrajornada, que é bem aplicado, já que, temos uma forma salutar de haver a mantença da incolumidade do cidadão rurícola, para que possa sempre laborar bem, visto que são eles, hodierna e dioturnamente, que usam de seus corpos para o trabalho diário nas lavouras e nas empresas rurais.

  1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

FERRAZ, Duração do Trabalho e Repouso Remunerado, 1977.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho, 2009.

CAIRO JUNIOR, José. Curso de Direito do Trabalho, Salvador, 2011, 6ª Ed.

MACHADO, Hugo de Brito. Uma Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Dialética. 2000.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1979.

CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, 2008, pág. 69.


[1] RR-1767-05.2010.5.15.0156, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT de 01/07/2014

[2] http://www.guiatrabalhista.com.br/legislacao/nr/nr31.htm#31.1_Objetivo – acessado em 10/03/2016

[3] O ludismo (ou luddismo) foi um movimento que era contrário a mecanização do trabalho proporcionado pelo advento da Revolução Industrial. Hodiernamente, o termo ludita (do inglês luddite) identifica toda pessoa que se opõe ao processo de industrialização intensa ou a novas tecnologias, geralmente vinculadas ao movimento operário anarcoprimitivista. As reclamações contra as máquinas e a sua substituição em relação à mão de obra humana, já eram normais. Mas foi em 1811, na Inglaterra, que o movimento operário estourou, ganhando uma dimensão significativa. O nome deriva de Ned Ludd, personagem criada com a finalidade de disseminar o ideal do movimento operário entre os trabalhadores. Os luditas chamaram muita atenção pelos seus atos. Invadiram fábricas e destruíram máquinas, que, segundo os mesmos, por serem mais eficientes que os homens, tiravam seus trabalhos, requerendo, contudo, movimentos operários e duras horas de jornada de trabalho. Os luditas ficaram lembrados como “os quebradores de máquinas”. Para além de histórico, este termo representa também um conceito político, usado para designar todos aqueles que se opõem ao desenvolvimento tecnológico ou industrial. Estas pessoas são também chamadas de “luddites”, em inglês, ou “luditas”, em português, e o movimento social é hoje conhecido como o neoludismo. Um exemplo de um autor que se identifica com esta designação é o Kirkpatrick Sale, que escreveu o livro “Rebels Against the Future” ou Movimento Operário. Para o historiador Eric J. Hobsbawn, o ludismo “era uma mera técnica de sindicalismo de operários no período que precedeu a revolução industrial e as suas primeiras fases operárias”.

[4] FERRAZ, Duração do Trabalho e Repouso Remunerado, 1977, pág. 25.

[5] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho, 2014, pág. 528.

[6] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho, 2014, pág. 528.

[7] CAIRO JUNIOR, José. Curso de Direito do Trabalho, Salvador, 2011, 6ª Ed., pág. 739.

[8] A lei nº 5.889/73 Estatui normas reguladoras do trabalho rural. Nos termos o seu art. 1º, regula as relações de trabalho rural, no que com ela não colidirem, pelas normas da Consolidação das Leis do Trabalho.

[9] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho, 2014, pág. 740.

[10] MACHADO, Hugo de Brito. Uma Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Dialética. 2000, p. 57.

[11] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1979.

[12] CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, 2008, pág. 69.

[13] Súmula nº 346 do TST – DIGITADOR. INTERVALOS INTRAJORNADA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 72 DA CLT (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Os digitadores, por aplicação analógica do art. 72 da CLT, equiparam-se aos trabalhadores nos serviços de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), razão pela qual têm direito a intervalos de descanso de 10 (dez) minutos a cada 90 (noventa) de trabalho consecutivo.

[14] AI nº 835.442

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Sobre o autor
Fabio Tadeu Rocchi

Advogado, especialista em Direito Processual (Civil, Penal e Trabalhista) e Direito Canônico. Professor de Direito em Cursos Preparatórios para concursos públicos em São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia. Professor de Direito no curso de graduação no Centro de Ensino Superior em São Gotardo /MG. Autor de livros específicos na preparação para concursos públicos pela Editora AgBook e Editora Rideel. Palestrante. Consultor Jurídico.

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