O terceiro setor precisa de contabilidade?

09/11/2016 às 20:49
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Não possuir registros contábeis expõe a associação ao risco de despersonalização da pessoa jurídica, levando a responsabilidade e o ônus aos dirigentes.

O Terceiro Setor precisa de contabilidade?

Com a crescente demonstração de força do judiciário, que vem colecionando espetaculares prisões que tomaram conta da mídia nos últimos tempos, fica a mensagem subliminar de que todo o formal que levou 100% dos indivíduos para os bancos dos réus passou pela contabilidade.

O que?

Caixa dois, notas frias, comprovantes mal explicados, ausência de formalidades.

O que é um caixa dois?

Um pagamento ou recebimento que não foi feito pela conta bancária da entidade.

O que são notas frias?

São aquelas notas fiscais que foram contabilizadas na sua entidade mas estavam em nome de terceiros ou os bens não existiram.

O que são comprovantes mal explicados?

Sabe aqueles recibos azuis de papelaria que foram usados para comprovar pagamentos por serviços prestados? Pois bem, são bons exemplos de documentação mal explicada. Imagine ainda comprovante de taxi, gasolina, estacionamento, padaria, entre tantos outros, achados isoladamente sem uma convincente explicação.

Ausência de formalidade?

Ausência de relatórios de gastos, falta de contratos, relatório de atividades, ausência da comprovação da origem dos recebimentos, registros contábeis com excesso de “despesas gerais”, “despesas diversas”, etc.

A soma de tudo isso é: “um grande problema”.

Estas saladas de informações são transmitidas aos órgãos reguladores do governo por meio de diversas declarações digitais: SPED, ECD, ECF, DCTF, DIRF, RAIS entre tantos outros.

Hoje com a tecnologia digital que valida todos os dados que são transmitidos para controle público e fiscalização, também servirão de comparação com as demais entidades do seu ramo, podendo ocasionar um grande problema no futuro.

Como solucionar ou minimizar?

Já é de conhecimento geral que todas as entidades precisam apresentar suas peças contábeis para a assembléia de associados aprová-las, mas porque? Quando?

O Código Civil Brasileiro diz em seu artigo 1078 que a assembléia de associados deve se reunir nos quatro primeiros meses do ano para tomar as contas dos administradores, deliberar sobre as peças contábeis (balanço) e de resultado econômico (demonstração dos resultados).

Após essa assembléia que é ordinária, aprovar as contas, os administradores ficam “liberados” de culpas uma vez que as responsabilidades deixam de ser solidárias ou exclusivas.

A atenção tem de ir mais longe, uma vez que o mesmo código civil prega em seu artigo 50 que se não houver clareza nas informações das entidades, a justiça poderá bloquear os bens particulares dos dirigentes. 

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Este alerta traz luz aos dirigentes das entidades sem fins lucrativos para as formalidades legais a que todos estão obrigados, para o grande cuidado em sua elaboração, uma vez que não basta ter as contas, mas sim o cuidado com o seu conteúdo.

Pagamentos efetuados por associados ou por pessoas estranhas à associação, diretores, empresas ou ainda com a apresentação de comprovantes inidôneos, tais como recibos, tickets, entre outros.

A contabilidade tem de estar integrada com a atividade da associação. O contador deverá estar envolvido para conhecer todas as nuances do trabalho da entidade, tem de participar ativamente das decisões, das soluções, além de estar atualizado com as regras públicas que foram criadas para permitir que só os bons consigam se destacar.

Não dá mais para considerar a contabilidade apartada dos meios decisórios e apenas servindo para registrar fatos já ocorridos.

Tudo deve ser planejado, estruturado para a longevidade das ações da associação.

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Sobre o autor
Ricardo Beráguas

Contador especializado no atendimento a entidades do terceiro setor com mais de 20 anos de experiência. Vasto conhecimento em regularização de associações, fundações de direito privado e todas as titulações (Filantropia, Utilidade Pública, OSCIP).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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