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A recorribilidade das decisões interlocutórias nos juizados especiais cíveis e o cabimento do agravo de instrumento

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06/06/2017 às 17:00
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6. INFLUÊNCIA DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Deve ser enfatizado que com a vigência do novo Código de Processo Civil, agora alçado pelo modelo constitucional de processo civil albergado pela Lei n. 13.105/15, houve um grande impacto no arcabouço jurídico-normativo vigente, inclusive no tocante aos Juizados Especiais Cíveis, ante a influência, mesmo que secundária, das regras do processo comum no rito sumaríssimo.

Digna de observação é a recente disciplina destinada ao recurso de agravo de instrumento. A doutrina, encabeçada por Cássio Scarpinella[21], é assente no sentido de cabimento do agravo de instrumento somente das decisões interlocutórias expressamente previstas no Código, optando o legislador por restringir as hipóteses de cabimento do respectivo recurso.

Partindo dessa premissa, Daniel Amorim[22] destaca que as decisões interlocutórias previstas no rol do art. 1.015 do NCPC, impugnáveis por agravo de instrumento, podem acarretar prejuízo considerável acaso não sejam recorridas. Nessa guisa, Marcelo Abelha[23] enfatiza que se tratam de decisões que possuem um ponto em comum que é a urgência in re ipsa.

Tecidas essas considerações, é notável que no campo dos Juizados Especiais Cíveis é plenamente possível a ocorrência de determinadas situações descritas no art. 1.015 do novo Código de Processo Civil.

Conforme dito anteriormente, pode haver o deferimento de tutela provisória nos Juizados Especiais Cíveis, hipótese que possibilita a parte prejudicada utilizar-se do recurso de agravo de instrumento como via impugnativa (art. 1.015, inciso I, CPC/15), buscando, assim, afastar dano imediato.

Digna de nota refere-se à assistência judiciária gratuita, instituto admitido nos Juizados Especiais (art. 54, parágrafo único, Lei n. 9.099/95). Ocorre que, o pleito do respectivo benefício pode ser rejeitado, ou, ainda, acolhido o pedido de sua revogação, ocasião que autoriza a parte lesada interpor agravo de instrumento (art. 1.015, inciso V, CPC/15).

Em tempo, a Lei n. 9.099/95 possibilita em seu art. 10° a existência do litisconsórcio no procedimento sumaríssimo. Nesse ínterim, poderá haver ainda a exclusão do litisconsorte ou rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio, circunstâncias que viabilizam a interposição do agravo de instrumento (art. 1.105, incisos VII e VIII, CPC/15).

Ora, como cabalmente demonstrado, o novo Código de Processo Civil limitou as hipóteses de interposição do agravo de instrumento em situações descritas no bojo do Estatuto Processual. Por que não adequar esta sistemática nos Juizados Especiais Cíveis? Conforme exposto, o agravo de instrumento não interferirá no procedimento que tramita em 1° (primeiro) grau de jurisdição, tampouco fere os princípios regentes dos Juizados Especiais. Por outro lado, é congruente com os princípios constitucionais do duplo grau de jurisdição, do contraditório, da ampla defesa e da segurança jurídica.

Dessa forma, é ostensível a possibilidade do manejo do agravo de instrumento no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, competindo a doutrina e jurisprudência pátria delimitar sobre o recurso estudado quando da sua aplicação nos Juizados Especiais.


CONCLUSÃO

Encerrada a exposição acerca da irrecorribilidade das decisões interlocutórias nos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e o cabimento do agravo de instrumento como forma de impugnar essas decisões, conclui-se que, o legislador silente, bem como a doutrina e a jurisprudência, devem considerar a possibilidade de manejar o recurso de agravo de instrumento no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais.

Os Juizados Especiais Cíveis foram instituídos como forma de facilitar o acesso das pessoas ao Poder Judiciário em causas menos complexas das submetidas ao procedimento comum, observando os princípios estabelecidos no art. 2 da Lei 9.099/95.

Em estudo pormenorizado da sistemática recursal dos Juizados Especiais Cíveis, em especial os Estaduais, é notável o desinteresse do legislador com o manejo do agravo de instrumento em face de decisões interlocutórias proferidas no procedimento sumaríssimo. Não obstante, sustentam grande parte da doutrina e da jurisprudência a impetração de mandado de segurança como forma de impugnar tais decisões.

Ocorre que, nos dias atuais, é crível imaginar a utilização do agravo de instrumento como forma de guerrear decisão interlocutória no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, posto que este recurso não enseja interferências significativas no procedimento em trâmite no 1º grau dos juizados especiais. Por conseguinte, urge frisar que os Juizados Especiais Federais e da Fazenda Pública admitem a interposição do recurso em estudo.


Referências

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NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. 1. ed. rev e atual. Salvador: JusPodivm, 2016.

ÓLIANI, José Alexandre Manzano. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 242, p. 251-271, jan./abril. 2015.

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RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil. 6. ed. rev. atual e ampliada. São Paulo: Forense, 2016.

TEDESCO, Paulo Camargo. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 156, p. 343-355, fev. 2008.

WATANABE, Kazuo. Finalidade maior dos juizados especiais cíveis. In: Revista Cidadania e Justiça. Ano 3, nº 07, 1999.


Notas

[1] ÓLIANI, José Alexandre Manzano. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 242, p. 251-271, jan./abril. 2015

[2] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios; Novo Curso de Direito Processual Civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 358.

[3] MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e Ações Autônomas de Impugnação. 3. ed. rev e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 279.

[4] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios; 2010, p. 658.

[5] WATANABE, Kazuo. Finalidade maior dos juizados especiais cíveis. In: Revista Cidadania e Justiça. Ano 3, nº 07, 1999, p. 32/37.

[6] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; Mitidiero, Daniel. Novo Curso de Processo Civil: Tutela de direitos mediante procedimentos diferenciados. 2. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, v. 3, p. 307.

[7] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; Mitidiero, Daniel. 2016, p. 309.

[8] DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de direito processual civil. 10. ed. atual,. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 245.

[9] PIMENTA, Cristovão de Souza; Juizados Especiais Cíveis – Doutrina, Jurisprudência e Legislação. Belo Horizonte: DelRey, 2002, p. 3.

[10] DONIZETTI, loc. cit.

[11] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; Teoria Geral do Processo. 30. ed. rev. atual,. e aum. São Paulo: Malheiros. 2014, p. 79. 

[12] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; Mitidiero, Daniel. 2016, p. 312.

[13] JORGE, Flávio Cheim. Teoria Geral dos Recursos Cíveis. 7. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, 282.

[14] TEDESCO, Paulo Camargo. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 156, p. 343-355, fev. 2008, p. 350.

[15] MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; 2013, 277.

[16] ÓLIANI, José Alexandre Manzano. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 242, p. 251-271, jan./abril. 2015

[17] NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 9 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 1236.

[18] FILHO, Misael Montenegro. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral dos recursos, recursos em espécie e processo de execução. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 148.

[19] TEDESCO, Paulo Camargo. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 156, p. 343-355, fev. 2008.

[20] ÓLIANI, José Alexandre Manzano. Revista de Processo – RePro, São Paulo, n. 242, p. 251-271, jan./abril. 2015

[21] BUENOS, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 36.

[22] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. 1. ed. rev e atual. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 1688.

[23] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil. 6. ed. rev. atual e ampliada. São Paulo: Forense, 2016, p. 1440.

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Sobre o autor
Rafael Nossa Gobbi

Professor de Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Rede Doctum de Ensino Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Cândido Mendes Especialista em Ordem Jurídica e Cidadania pela Escola de Ensinos Superiores do Ministério Público do Estado do Espírito Santo Aprovado para o cargo de Delegado da Polícia Civil nos Estados: São Paulo, Espírito Santo e Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOBBI, Rafael Nossa. A recorribilidade das decisões interlocutórias nos juizados especiais cíveis e o cabimento do agravo de instrumento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5088, 6 jun. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58198. Acesso em: 7 mai. 2024.

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