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Desconsideração da pessoa jurídica no Código de Defesa do Consumidor

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01/03/1999 às 00:00
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8 - A RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA E SUBSIDIÁRIA PREVISTA NO ARTIGO 28 DO CDC

No presente trabalho pretendemos, no âmbito do Código de Defesa do consumidor, tratar apenas da Desconsideração da Pessoa Jurídica. Não obstante, por se encontrarem enfeixados sob tal rubrica no texto normativo, trataremos também do responsabilidade disciplinada pelos parágrafos 2º a 4º do art. 28 do CDC, que a nosso ver, como já exposto, não compõem o instituto da Desconsideração. Assim tratemos da:

Responsabilidade de Grupos societários e sociedade controladas

O § 2º, estatui responsabilidade subsidiária das sociedades integrantes de grupos societários e sociedades controladas. Aqui, como já dito, não se cuida de desconsideração, mas de hipótese legal de responsabilização de terceiro. A própria redação indica uma responsabilidade objetiva, não sujeita a análise de elementos outros, presentes no caso concreto. Basta o liame a unir as entidades societárias, para dele decorrer a responsabilização. Tal dispositivo previne que as obrigações sob estudo sejam concentradas na sociedade que tenha menor respaldo patrimonial.

Para Genacéia da Silva Alberton (in "A Desconsideração da Pessoa Jurídica no Código de Defesa do Consumidor), em seu trabalho já várias vezes citado, o Código foi tímido em estabelecer apenas responsabilidade subsidiária, concedendo o benefício de ordem e, consequentemente, impedindo que o consumidor ajuíze a ação desde logo contra as demais empresas. Para outros doutrinadores, no entanto, basta a prova da impossibilidade de ressarcimento pela empresa principal obrigada, para, já inicialmente, demandar a sociedade com responsabilidade subsidiária.

No que se refere a sociedades controladas, o preceito parece conter alguma impropriedade. Obviamente a responsabilização subentende-se seja por obrigações da controladora (o texto não é explícito) que incidiria em caráter subsidiário sob o patrimônio da controlada. Temos a considerar que seria lógico que as ações ou quotas representativas do capital da controladora respondessem pelas obrigações da mesma, não o sendo, entretanto, que o patrimônio da controlada, que envolve o de terceiros (que podem deter até cerca de 83% do capital social, totalidade das ações preferenciais + 49% das ordinárias) o fossem, já que nada tem a ver com a conduta da controladora. Só podemos entender o dispositivo legal em sua literalidade, se o considerarmos conseqüência de prevalência especial do interesse de ordem pública da relação de consumo sobre os interesses de ordem privada; ou por outro, que sua aplicação dependa do pressuposto da concorrência da controlada na lesão ao consumidor., ou por outra de sua utilização pela controladora nesse intento.

Responsabilidade das Sociedades consorciadas

O § 3º, constitui também, em favor do consumidor, uma exceção a regra geral, já que a lei das Sociedades Anônimas, que rege esta esfera da ordem jurídica, não preconiza a solidariedade das sociedades consorciadas (art. 278, § 1º, Lei 6.404/76). Sabemos que a solidariedade não se presume, mas decorre da lei ou do contrato, aqui temos a hipótese legal, a proteger o consumidor.

Convém salientar, por ser lógica, a ressalva que faz Fabio Ulhoa:

"... a solidariedade existe apenas no tocante as obrigações relativas ao objeto do consórcio. Quanto às demais não há qualquer vínculo dessa natureza..."
(Coelho, Fábio Ulhoa, in "Comentários ao Código De Proteção do Consumidor", p. 145)

Responsabilidade das Sociedades coligadas

O § 4º, estabelece a responsabilidade das coligadas, apenas na hipótese de culpa. Não poderia ser diferente, já que a mera participação da empresa no capital de outra (10% ou mais), sem controlá-la, não induziria, em si mesma, tal responsabilidade. A sociedade coligada é simplesmente sócia de outra e, como sócia, não tem responsabilidade pelos atos dessa outra a não ser que tenha participado do ato, caso em que será solidariamente responsável. Para alguns, supérfluo tal dispositivo, já que a responsabilidade seria deduzida de qualquer forma, sendo suficiente o art. 159 do CC.


9 - CONCLUSÃO

O CDC é diploma largamente inovador tanto no que se refere ao Direito Material, quanto no que se refere ao Direito Processual. Insere-se no contexto da evolução do Direito Moderno ao voltar-se à proteção e tutela de direitos personalísticos, individuais, coletivos, difusos, do hipossuficiente, etc... Nesse contexto inovador, tem relevância a introdução pioneira, no ordenamento jurídico pátrio, da Doutrina da Desconsideração da Pessoa Jurídica.

O art. 28 desse Estatuto representa o estendimento da longa manus do Estado, para alcançar aqueles atos que, apesar de conformarem-se ao figurino do estrito modelo legal, representam violação do ordenamento jurídico naquilo que possui de mais caro, seus valores e seus princípios asseguradores da paz, da boa fé, do convívio social harmonioso e da justiça.

A despeito de alguma impropriedade da redação, sob o aspecto dogmático ou doutrinário, conforme discutido neste trabalho, o art. 28 do CDC representa um grande avanço não só no campo específico do Direito Tutelar do Consumidor como também de todo o Direito Posto Nacional.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBERTON, Genacéia da Silva; A Desconsideração da Pessoa Jurídica no Código do Consumidor, Aspectos Processuais; Ajuris; Vol 19; N 54; P 146 A 180; Março; 1992.

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Sobre o autor
Osmir Antonio Globekner

acadêmico de Direito na Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhéus (BA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GLOBEKNER, Osmir Antonio. Desconsideração da pessoa jurídica no Código de Defesa do Consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 29, 1 mar. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/596. Acesso em: 26 abr. 2024.

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Esta monografia foi vencedora do 1° CONAJIC (Concurso Nacional Âmbito Jurídico de Iniciação Científica)

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