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A aplicação do princípio do equilíbrio contratual pelo Superior Tribunal de Justiça

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20/09/2017 às 10:00
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CONCLUSÃO

Da análise das decisões colacionadas no presente trabalho, nota-se que o princípio da força obrigatória dos contratos, ou pacta sunt servanda vem, cada vez mais, tendo seu campo de incidência reduzido, abandonando seu caráter de regra para adquirir uma natureza de exceção, visto que a concepção estanque do contrato não se coaduna com a realidade jurídica e fática das relações contratuais travadas continuamente na sociedade capitalista e plural em que vivemos.

Em relação aos contratos de consumo, o próprio Código de Defesa do Consumidor exige requisitos mais brandos a justificar a revisão dos contratos, bastando que tenha havido alteração da base objetiva do negócio jurídico. Mais relevantes que a análise destes requisitos portanto, é a análise do conceito de consumidor.

Conforme decisões aqui apontadas, nota-se uma prevalência pela concepção finalista de consumidor, segundo a qual consumidor é aquele que coloca fim a cadeia de produção de determinado produto ou serviço, cuja retirada do mercado destina-se exclusivamente a seu uso ou de sua família.

Assim, seja pela procedência, seja pela improcedência do pedido de revisão contratual, as decisões fundamentam-se, em sua maioria, nos princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva.

Tais princípios serão observados, com ainda mais rigor, sempre que se tratar de contrato de adesão ou de contrato de consumo, tendo em vista o desequilíbrio de forças entre as partes contratantes, de forma a se evitar a imposição de deveres e obrigações a serem suportados por apenas uma das partes que, portanto, terá que arcar unilateralmente com os riscos do contrato.

Em atenção ao já citado princípio da função social do contrato, o Superior Tribunal de Justiça vem flexibilizando a exigência da imprevisibilidade do fato superveniente que justifique a revisão dos contratos empresariais, sempre que o fato, ainda que previsível, onere de tal forma uma das partes que torne impossível a continuidade da relação jurídica estabelecida pelo contrato.

Da análise das decisões aqui colacionadas, nota-se uma tendência do judiciário pela revisão dos contratos de forma a garantir a ambas as partes o sucesso de suas pretensões e, portanto, o distanciamento da concepção de contrato como “amarra” e a adoção de uma visão de contrato como instrumento gerador de riqueza.

Conclui-se, portanto, que, embora o Código Civil tenha adotado a Teoria da Imprevisão (Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato), ainda que não configurada a imprevisibilidade do fato superveniente, tal como ocorre no aumento posterior da inflação ou na desvalorização da moeda, o contrato empresarial admitirá a revisão com vistas à sua manutenção e à continuidade de geração de riqueza.


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Notas

[1] Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009.

[2] STJ - REsp 256.456 – SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 22.03.2001

[3] Amaro, Antonio Ambrósio; Maia, Maria Lúcia; e Noronha, José Ferreira de. O Contrato de Participação na Compra e Venda da Laranja no Estado de São Paulo. Disponível em ftp://ftp.sp.gov.br/ftpiea/ASP9-0292.pdf

[4] Alves, Francisco José da Costa; e Vieira, Ana Claudia. A quebra do contrato-padrão e o acirramento dos conflitos no setor citrícola. Disponível em http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/ie/1997/tec1-0897.pdf

[5] Fernandes, Bruno Campos. Desenvolvimento histórico da citricultura. Unesp. Araraquara: 2010. Disponível em http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/118999/fernandes_bc_tcc_arafcl.pdf?sequence=1

[6] STJ - REsp 256.456 – SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 22.03.2001

[7] TJSP – Ap 728.763-4, Rel. Des. Roque Mesquita, julgado em 18.08.1998

[8] STJ - REsp 256.456 – SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 22.03.2001

[9] http://www.pioneersementes.com.br/blog/108/o-comportamento-da-ferrugem-asiatica-na-soja-ao-longo-dos-anos-dificuldades-de-controle-e-seus-custos

[10] http://www.agrolink.com.br/culturas/soja/ferrugem.aspx

[11] STJ - REsp 858.785 – GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, retificação de voto em 08.06.2010

[12] STJ - REsp 858.785 – GO, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 08.06.2010

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[13] STJ EREsp 213.828, Min. Rel. Edson Vidigal, julgado em 07.05.2003.

[14] Martins-Costa, Judith. Os contratos de leasing financeiro, a qualificação da parcela denominada Valor Residual Garantido – VRG e a sua dupla função: complementação de preço e garantia. In: Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. Ano 13, n. 49, jul./set. 2010, p. 109-148.

[15] Transcrição de discurso realizado na cerimônia de comemoração do 10º aniversário do regime de câmbio flutuante no Brasil. Disponível em http://www.bcb.gov.br/Pec/ApPron/Apres/10AnosDeCambioFlutuantevf.pdf

[16] TJSP – Ap nº 601164-00 /3, Rel. Des. Claret de Almeida, julgado em 23.05.2001

[17] Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 6 ed., ver., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016

[18] STJ – REsp 437.660-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 08.04.2003

[19] Garcia, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: Lei 8.078/1990. São Paulo: 9 ed. Editora Jus Podivm, 2015

[20] Art. 2º: Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utliza produto ou serviço como destinatário final

[21] http://www.apape.org.br/antigo/planos.htm

[22] REsp 8473-RJ, Rel. Min. Athos Carneiro, julgado em 25.11.1991

[23] A economia brasileira nos anos 90 / organizadores Fábio Giambiagi, Maurício Mesquita Moreira. 1. ed. – Rio de Janeiro: BNDES, 1999. Disponível em https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/bitstream/1408/2972/1/1999_A%20economia%20brasileira%20nos%20anos%2090_P.pdf

[24] STJ – REsp 73.370 – AM, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 21.11.1995

[25] Art. 924. Quanto se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento.

[26] Averbug, Marcello. Plano Cruzado: Crônica de uma Experiência. In: REVISTA DO BNDES, Rio de Janeiro, v. 12, n. 24,p 211-240, dez. 2005. Disponível em http://www.bndespar.com.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/revista/rev2408.pdf

[27] STJ – REsp 324.882 – GO, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 07.11.1994

[28] Súmula 16 do STJ: A legislação ordinária sobre crédito rural não veda a incidência da correção monetária

[29] Julgado em 07.06.1994

[30] http://www.salcisne.com.br/empresa.php

[31] A Portaria ANP nº 80 / 1999 relaciona tipos de óleos: A1, B1, A2 e B2. Os números 1 e 2 identificam a consistência do óleo pelo grau de viscosidade. O óleo tipo 2 possui maior resistência ao escoamento e precisa ser aquecido a uma temperatura mais alta do que o do tipo 1 para ser manuseado (escoado e transportado). As letras A e B indicam o teor máximo de enxofre permitido no óleo, ou seja, o tipo A possui um teor máximo de enxofre de 2,5 % em massa, enquanto o tipo B possui um teor máximo de 1,0 % em massa. Disponível em http://www.br.com.br/wps/wcm/connect/925aab8043a7a31182598fecc2d0136c/addcleaner-manual.pdf?MOD=AJPERES

[32] STJ – REsp 300.129 – RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 04.09.2001.

[33] “A doutrina finalista (ou subjetiva), partindo do conceito econômico de consumidor, propõe que a expressão destinatário final seja restrita, fundamentando-se no fato de que somente o consumidor, parte mais vulnerável na relação contratual, merece a especial tutela. Assim, consumidor seria o não profissional, ou seja, aquele que adquire ou utiliza um produto para uso próprio ou de sua família. Em outras palavras, o destinatário final é o que retira o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final fático), é aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econômico), e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois ele não é o consumidor final, já que está transformando e utilizando o bem para oferecê-lo, por sua vez, ao cliente, consumidor do produto ou serviço”. Garcia, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: Lei 8.078/1990. São Paulo: 9 ed. Editora Jus Podivm, 2015

[34] Sum. 5 – STJ: A simples interpretação de cláusula contratual não enseja recurso especial

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Sobre a autora
Fernanda Gallo de Carvalho

Advogada do escritório Loeser e Portela Advogados

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Fernanda Gallo. A aplicação do princípio do equilíbrio contratual pelo Superior Tribunal de Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5194, 20 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60623. Acesso em: 7 mai. 2024.

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