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Responsabilidade civil do Estado pela morosidade na prestação jurisdicional

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21/01/2005 às 00:00
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A doutrina e a jurisprudência pátria ainda não se firmaram quanto a questão, mas há uma nítida tendência doutrinária pela adoção da responsabilidade do órgão estatal para estes casos.

RESUMO

A responsabilidade civil do Estado pela morosidade na prestação da atividade jurisdicional tem suscitado grandes discussões no âmbito do direito brasileiro e mundial. Por atividade jurisdicional compreende-se todo ato praticado no curso do processo pelo Estado-Juiz. Como serviço público, a prestação jurisdicional deve ser prestada de forma correta e tempestiva. Os erros cometidos por ato jurisdicional devem ser reparados, através da responsabilização do Estado por ser este o órgão que deve prestar o direito constitucional à jurisdição. Desse modo, também deve o poder público ser encarregado de responder pela morosidade na prestação jurisdicional como denegação da justiça. A Constituição de 1988, em seu art. 37, § 6º, adota a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas, no entanto há divergências quanto à inclusão ou não da atividade jurisdicional neste dispositivo. A doutrina e a jurisprudência pátria ainda não se firmaram quanto a questão, mas há uma nítida tendência doutrinária pela adoção da responsabilidade do órgão estatal para estes casos. No direito alienígena, já é adotada a responsabilidade do Estado nos casos de demora para pôr fim a tutela jurisdicional, se fazendo mister a utilização da ciência da comparação para analisar e adaptar o direito nacional neste aspecto. Sendo assim, o presente trabalho visa analisar a responsabilidade civil do Estado pela morosidade na prestação jurisdicional e suas nuances, com o intuito de demonstrar a necessidade da aplicação de uma sanção a esse ente, objetivando o combate à impunidade daqueles que se amparam na falta de responsabilização para a eternização dos processos ensejando um descrédito na justiça.

Palavras-chave:

Responsabilidade civil; Estado; Prestação Jurisdicional; Morosidade.


INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por finalidade cumprir o requisito para a conclusão do curso de Bacharelado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco.

O tema explorado é "A responsabilidade civil do Estado pela morosidade na prestação jurisdicional", que foi escolhido em razão da divergência quanto à responsabilização ou não do Estado pelos atos jurisdicionais, especificamente no que se refere à prestação da tutela jurisdicional em tempo hábil.

Para tanto, foi utilizado o método dedutivo, com pesquisa bibliográfica, incluindo o estudo de obras doutrinárias brasileiras e estrangeiras, artigos de periódicos especializados e jurisprudência.

Através destes meios, visa-se demonstrar a responsabilidade estatal pela morosidade na prestação da atividade jurisdicional, como forma de punir o Poder Público pelo exercício intempestivo de uma de suas funções.

No primeiro capítulo, com a finalidade de utilizar a ciência da comparação, faz-se uma análise desta ciência quanto ao seu objetivo, sua aplicabilidade e no âmbito do estudo em questão. O estudo comparativo se faz mister neste trabalho haja vista a escassa jurisprudência brasileira acerca da matéria, bem como a grande discussão existente na doutrina. Também será estudada a evolução pela qual passou a responsabilidade do Estado, desde a teoria da irresponsabilidade até a adoção da responsabilidade, seja pela teoria subjetiva ou objetiva.

O segundo capítulo trata da prestação jurisdicional como direito subjetivo constitucional que deve ser prestado aos indivíduos. Mostra o direito de acesso à justiça, bem como o de ter a tutela jurisdicional prestada de forma eficiente e célere. Aborda também a prestação jurisdicional como dever do Estado, pois uma vez que o Poder Público concentrou a função de exercer a tutela jurisdicional, cabe a este se estruturar para prestá-la de forma propícia a satisfazer os jurisdicionados que lhe confiaram este serviço.

Há ainda neste capítulo uma breve disposição dos princípios aos quais o Estado deve obediência com o intuito de fornecer a jurisdição de maneira tempestiva.

O terceiro capítulo já adentra no mérito do tema proposto ao tratar da responsabilidade civil do Estado-Juiz. Primeiramente, se faz uma delimitação doutrinária acerca do conceito de atos jurisdicionais, posicionando estes dentro do gênero dos atos judiciais Há, ainda, uma exposição da teoria da irresponsabilidade, da responsabilidade subjetiva e da objetiva do Estado-Juiz.

Em seguida, discorre-se sobre os atos jurisdicionais danosos que acarretam a responsabilidade civil do Estado. Dentre estes, analisar-se-á, inicialmente, os atos jurisdicionais danosos considerados pela jurisprudência como passíveis de indenização que são aqueles previstos em lei e, posteriormente, estudar-se-á aqueles que constituem denegação de justiça, mas que, no entanto, não estão inseridos expressamente na legislação como passíveis de reparação, seja pelo Estado ou pelo causador direto do dano.

No quarto capítulo há uma recapitulação da responsabilização do Estado pelos atos jurisdicionais, enquadrando-se nestes a morosidade na prestação jurisdicional. Nota-se as opiniões conflitantes do tema em questão, da responsabilização ou não do Estado pelos atos jurisdicionais e, em específico, pela demora na prestação desta atividade.

Neste capítulo final há uma abordagem dos motivos que dificultam a prestação da tutela jurisdicional em tempo hábil, visando meios de solucionar esta morosidade excessiva em julgar que, infelizmente, só acarreta o descrédito público na Justiça. Busca-se, caracterizar a responsabilidade do Estado de ressarcir o prejudicado pela prestação defeituosa - intempestiva, seja pelo reconhecimento deste dano pela jurisprudência ou por alteração legislativa.


I – DIREITO COMPARADO

1.1. Noção, pressupostos e histórico

A ciência da comparação é tão antiga como a própria ciência do direito, no entanto, o desenvolvimento da ciência do direito comparado é bem mais recente do que aquela, visto que só se deu no século XIX.

A finalidade desta ciência foi ao longo do tempo sendo modificada. Em 1900, no 1º Congresso da Société de législation comparée, R. Saleilles proclamava que:

A ciência do direito comparado, no sentido jurídico do termo, tem como objeto extrair do conjunto das instituições particulares uma base comum, ou, pelo menos, pontos de contato capazes de trazer à luz a unidade fundamental da vida jurídica universal. (1)

Com o término da 1º Guerra Mundial, os comparatistas acreditavam que a finalidade da ciência da comparação fosse a unificação conforme constata M. Sarfatti: "Qualquer que seja a meta que o comparatista se proponha, ele deve ter presente como ideal extremo a unificação internacional do direito privado". [2]

Em 1974, no IX Congresso da Academia Internacional de Direito Comparado conclui-se que um melhor conhecimento do direito era a finalidade da comparação. Esta Academia, em 1991, limita o objeto desta ciência apenas a comparação dos sistemas jurídicos.

No ano de 1979, abriu-se a discussão entre as teses opostas de R. Sacco e V.Denti. Para aquele a comparação era a busca de um mero conhecimento e para este a comparação significava a busca de melhores modelos para inspirar as reformas legislativas. Durante muitos anos os debates giraram em torno destes dois sentidos.

Para Rodolfo Sacco, perante todas estas divergências em frente à finalidade da ciência da comparação a que prepondera é a de que esta visa "o melhor conhecimento dos modelos jurídicos". [3]

O direito comparado, como ramo da ciência jurídica, tem como objetivo o conhecimento de um certo número de dados que pertencem ao direito.

Inúmeras são as vantagens trazidas pelo direito comparado. Contudo, para este estudo, a vantagem principal será a de aperfeiçoar o direito nacional brasileiro na medida que:

...quer se considere o direito comercial, penal, o direito do trabalho e da segurança social, ou mesmo o direito da família, o do processo e o direito administrativo, constata-se não apenas a existência de algumas grandes correntes que se assemelham, mas, mais concretamente, a concordância de numerosos desenvolvimentos legislativos; num período de vinte anos, de dez anos, ou mesmo inferior, a reforma que foi realizada num país e que aí provou o seu valor, é introduzida noutros países, com uma ou outra modificação, levando em conta circunstâncias especiais ou que visam aperfeiçoá-la ou integrá-la mais perfeitamente no direito desse novo país. (4)

O direito comparado é de grande valia para o legislador que, por intermédio do estudo da legislação alienígena e sua aplicabilidade, busca adaptar o dispositivo legal estrangeiro ao ordenamento jurídico nacional. Também cabe à doutrina e à jurisprudência utilizar-se do direito comparado visando uma interpretação mais adequada da legislação.

Vale ressaltar a importância do direito comparado para os estudiosos e aplicadores do direito. Neste sentido, dispõe René David:

Todos os juristas são chamados a interessar-se pelo direito comparado, quer para melhor compreenderem o seu próprio direito, quer para o tentarem aperfeiçoar, ou ainda para estabelecer, de acordo com os juristas dos países estrangeiros, regras de conflito ou de fundo uniformes ou uma harmonização dos diversos direitos. (5)

O valor do direito comparado é notório em todo o universo jurídico, na medida que confere ao estudioso o conhecimento dos sistemas jurídicos confrontados, bem como proporciona um aprofundamento no sistema ao qual o pesquisador se integra.

1.2 Aplicabilidade

Ao utilizar-se do direito comparado, se faz mister saber que as regras jurídicas de um país para outro são bem distintas, posto que são formadas a partir da cultura de cada sociedade, com estrutura, crença e costumes diversos. Deste modo, tendo o fito de aperfeiçoar o sistema jurídico nacional em determinado ponto, há de se ter o discernimento para utilizar-se de dispositivos alienígenas com as devidas adaptações à estrutura jurídica e a conjuntura atual.

Com propriedade dispõe Rodolfo Sacco a respeito:

A comparação acompanha o conhecimento dos modelos, pois só é possível a comparação de modelos conhecidos. Mas as ciências (sociais ou naturais) comparativas não ignoram – e ensinam à ciência jurídica, que lhe é muito próxima – que o conhecimento dos modelos progride por efeito da comparação. Somente a comparação nos revela certos detalhes dos diferentes modelos considerados. É isto que cada comparatista sabe por experiência, de vez que, ao referir-se ao direito do próprio país, encontra, eventualmente, alguma dificuldade em se fazer compreender pelos seus nacionais, cujos interesses são limitados ao sistema de origem, e que, por isso, não vivenciaram essa experiência mais complexa. (6)

É notório que existem diversas famílias de direito, no entanto, para o estudo em questão, usar-se-á apenas algumas, principalmente aquelas baseadas na família do direito romano-germânico, sem adentrar em seus pormenores, enfocando a responsabilidade do Estado. Mediante as regras aplicadas em determinados países sobre o assunto a ser estudado, buscar-se-á adaptá-las ao sistema jurídico brasileiro. Destaque-se que não se trata de novidade, sob o ponto de vista teórico, posto que o princípio da celeridade já é adotado pelo ordenamento vigente, bem como no direito alienígena. Neste, porém, é respeitado e aplicado, vez que já existem julgados que possuem o Estado como legitimado passivo em frente à morosidade para julgar o processo.

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Note-se que não cabe analisar comparativamente o sistema jurídico brasileiro com outros, mas sim a questão da responsabilidade do Estado no Brasil e em alguns dos países que seguiram o direito romano-germânico, precisamente no que concerne a demora na prestação jurisdicional.

Imprescindível se faz a análise do sistema como afirma Marc Ancel:

Esta compreensão global do sistema, em seus dados históricos e nas suas condições sócio-econômicas de aplicação, torna-se, destarte, a condição primeira para uma utilização verdadeiramente científica do método comparativo. (7)

O Brasil, assim como a França, a Itália, a Espanha e Portugal, formou o seu sistema jurídico baseado no direito romano-germânio, onde, segundo René David:

... as regras de direito são concebidas nestes países como sendo regras de conduta, estreitamente ligadas a preocupações de justiça e de moral. Determinar quais devem ser estas regras é a tarefa essencial da ciência do direito: absorvida por esta tarefa, a "doutrina" pouco se interessa pela aplicação do direito que é assunto para os práticos do direito e da administração. (8)

Ora, a realidade atual exige da sistemática jurídico-processual não só teorias para serem estudadas, mas também meios para aplicá-las com o objetivo de obter "justiça". A doutrina e a jurisprudência são fontes essenciais para o direito, elas se completam.

Em homenagem à família do direito da common law, vale enfatizar o êxito que obtêm suas regras por visarem buscar uma solução para cada caso concreto e não princípios para ações futuras, com regras abstratas, como ocorre na família de direito romano-germânica.

Neste trabalho se torna precípuo este aspecto específico da common law, haja vista que a responsabilidade do Estado em face da morosidade processual deve ser aplicada de forma diversa para cada caso, levando-se em consideração os diversos sistemas processuais (civil, penal e trabalhista).

Com o escopo de buscar as semelhanças e as diferenças entre vários sistemas, há de considerar-se não só as leis de cada modelo jurídico, mas também as suas regras jurisprudenciais. Porém, necessita-se observar a realidade atual daquele sistema a fim de concluir se aquela seria a aplicabilidade que se daria ao mesmo caso se este ocorresse no presente.

Questão não menos importante para ser analisada é a influência que está vivendo o aplicador do direito seja pela própria lei, pela doutrina ou até mesmo pela interpretação dada à letra da lei de forma contrastante.

O comparatista não pode ater-se apenas à lei, à doutrina ou à jurisprudência. "A lei pura não é todo o direito. A pura definição doutrinal não é todo o direito. A pura máxima não é todo o direito. Mas nem mesmo a série exaustiva de todas as razões de decidir é todo o direito". [9]

Isto posto, utilizar-se-á o direito comparado como meio para solucionar o problema da morosidade na prestação jurisdicional, através da aplicabilidade de indenização por parte do Estado tendo em vista a sua responsabilidade por este direito fundamental.

1.3 Responsabilidade do Estado no Direito Comparado

A questão da responsabilidade do Estado é tratada a partir da Revolução Francesa (1789), quando os particulares começam a promover ações contra o Estado solicitando reparação por danos causados pela Revolução. No entanto, a teoria da irresponsabilidade, segundo os juristas, ainda vigorou na França até pelo menos o ano de 1873, quando foi proferida decisão acerca do caso Blanco [10], admitindo a responsabilização estatal consoante a teoria publicista, vez que se concluiu que não poderia adotar-se as normas do Código Civil para conciliar os direitos privados com os do Estado.

A França não possui uma jurisdição una, mas sim uma administrativa e outra judiciária. No caso Blanco houve conflitos de atribuições, ficando responsável por este caso o Tribunal Administrativo, haja vista que se tratava de questão acerca do funcionamento do serviço público.

A partir desta época, a responsabilidade do poder público passou a constar como norma de direito público, ficando a teoria da irresponsabilidade estatal como uma exceção. No entanto, só seriam ressarcíveis os danos de certa gravidade causados por atos da administração.

Em síntese, no sistema francês, transparece forte a diferença entre a responsabilidade que resulta de um dano provocado por um particular a outro daquele perpetrado pela Administração ao particular, no exercício do poder público, de forma unilateral e no uso das suas prerrogativas de soberania. [11]

Hodiernamente, admite-se a responsabilidade do Estado e dos servidores públicos por seus atos, individual ou conjuntamente, num fundamento subjetivo. É notável a jurisprudência francesa relativa à responsabilidade do poder público.

No direito lusitano também se deu a adoção, a princípio, da teoria da irresponsabilidade estatal, adotada como regra no Código Civil português de 1867.

A evolução para a responsabilidade do Estado se deu através da doutrina e da jurisprudência, todavia, de forma retraída e lenta, haja vista que só por volta de 1920 passaram a surgir decisões visando responsabilizar o órgão estatal.

Passa-se então a admitir a responsabilidade do Estado de forma solidária com os servidores públicos, porém apenas no que se referisse aos atos ilícitos. Para os demais atos públicos, vigoraria a tese da irresponsabilidade. Esta posição foi defendida até 1950, quando a doutrina passou a adotar a responsabilidade estatal nos casos de culpa, fundamentando-se na teoria do risco, e também por fatos lícitos que acarretassem perda de direitos em algumas determinadas situações. [12]

Com a Constituição lusitana de 1976 consagrou-se a responsabilidade das entidades públicas, conforme se verifica no artigo 22º, in verbis:

O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.

Comentando o assunto, ressalta Vera Lúcia Jucovsky:

É de se esclarecer que esse preceito constitucional permite a responsabilização do Estado não somente por atos administrativos, mas também, por atos legislativos e jurisdicionais, embora os titulares dos respectivos órgãos respondam civilmente em caso de culpa em sentido lato. (13)

Nos dias atuais, ainda vigora a responsabilidade subjetiva, no entanto, tem-se evoluído para a objetivação da responsabilidade do Estado. Esta questão é controvertida na doutrina, posto que alguns juristas questionam se o art. 22 da Constituição portuguesa adotou a teoria objetiva ou a subjetiva. Jurisprudencialmente adota-se a teoria subjetiva.

De maneira diversa dispõe a doutrina espanhola, uma vez que esta, em alguns momentos, trata apenas da responsabilidade do funcionário e, em outros, se preocupa em diferenciar a responsabilidade do agente da responsabilidade geral e direta da Administração.

A Constituição Espanhola de 1978, em seu artigo 121, reza o seguinte: "Los daños causados por error judicial, así como los que sean consecuencia del funcionamiento anormal de la Administración de Justicia, darán derecho a una indemnización a cargo Del Estado, conforme a la ley".

A jurisprudência espanhola também já se faz presente quanto a questão.

No Brasil, a responsabilidade do Estado adotou várias posições conforme o momento histórico vivido. Da teoria da irresponsabilidade caminhou-se para a posição civilista evoluindo para a publicística.

A teoria da irresponsabilidade vigorou no Brasil-Colônia, neste, conforme expõe José Cretella Júnior:

Irresponsáveis Estado e soberano inexistia o instituto em exame, pela ausência de pessoa que respondesse pelos danos causados pelos agentes do governo, porque "o Estado é o rei", "o rei não comete erros", "a vontade do rei tem vigor de lei. [14]

No Brasil-Império já se inicia uma preocupação do Estado em indenizar os particulares em alguns casos. Há este reconhecimento através de leis e decretos, também neste sentido dispunha a Constituição Política do Império do Brasil em seu artigo 179, inciso 29, in verbis: "Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções e por não fazerem efetivamente responsáveis aos seus subalternos".

No período da Primeira República a questão da responsabilidade do Estado entra em evidência ensejando diversas discussões doutrinárias. A Constituição Republicana de 1891 em seu artigo 82 preceituava o seguinte:

Os funcionários públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões em que incorrerem no exercício de seus cargos, assim como pela indulgência ou negligência em não responsabilizarem efetivamente os seus subalternos.

Com o advento desta Carta Magna, foram promulgados várias leis e decretos sobre a matéria. Vale ressaltar que na Constituição de 1824, bem como na de 1891, tratavam apenas da responsabilidade dos funcionários.

A Constituição de 1934 em seu artigo 171 preceituava:

Os funcionários públicos são responsáveis solidariamente com a Fazenda Nacional, Estadual ou Municipal, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus cargos.

§1º Na ação proposta contra a Fazenda Pública, e fundada em lesão praticada por funcionário, este será sempre citado como litisconsorte.

§2º Executada a sentença contra a Fazenda, esta promoverá execução contra a o funcionário culpado.

Desse modo, adotava-se a teoria da culpa civil (teoria subjetiva) – o agente do dano tinha de ser identificado para poder haver indenização por parte do Estado.

Com a Constituição de 1946, passou a vigorar a responsabilidade apenas das pessoas de direito público, acolhendo a teoria objetiva, confira-se:

Art.194. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.

Parágrafo único. Caber-lhes-á regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes.

Bem como preceituou o art. 105 da Carta Magna de 1967:

As pessoas jurídicas de direito público respondem pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.

Parágrafo único. Caberá ação regressiva contra o funcionário responsável, nos casos de culpa ou dolo.

A lei suprema de 1988 compreendeu a responsabilidade objetiva do Estado e a responsabilidade subjetiva do funcionário. Ao Estado cabe indenizar se houver nexo de causalidade entre o ato lesivo e o dano causado ao cidadão e, uma vez identificado o causador do dano, é possível o direito de regresso.

A atual Constituição brasileira trata do assunto no seu artigo 37, §6º, in verbis:

Art. 37. Caput

(...)

§6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causaram a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

(...).

Neste diapasão, se faz mister o estudo das leis, da doutrina e da jurisprudência brasileira e alienígena, principalmente dos países europeus, como a da França, Espanha e Portugal, para analisar comparativamente o instituto da responsabilidade do Estado adentrando em suas peculiaridades até chegar aos atos jurisdicionais com o fito de tornar aplicável ao direito brasileiro a responsabilidade do poder público pelo serviço judicial imperfeito mediante a morosidade processual.

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Sobre a autora
Danielle Alheiros Diniz

Servidora Pública Estadual, Especialista em Direito Privado (civil e empresarial) pela Esmape em convênio com a Faculdade Maurício de Nassau

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DINIZ, Danielle Alheiros. Responsabilidade civil do Estado pela morosidade na prestação jurisdicional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 563, 21 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6205. Acesso em: 19 mar. 2024.

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