Conclusões
Membros de uma minoria social, por força de uma característica tida como incomum, a incompatibilidade do sexo biológico com o psicológico; constante sentimento de habitar um corpo que não lhe pertence; persistente busca pela integração física, emocional, social, espiritual e sexual: é neste contexto privado em que se encontra inserida a transexualidade, jamais passível de ser considerada um capricho passageiro.
Não obstante a Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015/73) não prever, expressamente, a referida hipótese de alteração do nome civil, depreende-se que a clássica e arcaica regra de sua imutabilidade absoluta, de forma a tornar efetiva a proteção à dignidade da pessoa humana, tem sido acertadamente afastada pelos Tribunais brasileiros ante a problemática dos transexuais, tenham estes se submetido ou não à cirurgia de redesignação sexual.
Partindo da conclusão de que o nome é o primeiro e principal elemento de identificação do indivíduo perante a sociedade, infere-se que, uma vez que o prenome registral deixa de corresponder à imagem e ao modo pelo qual o transexual é conhecido socialmente, reputa-se salutar sua devida adequação, como propósito de garantir que a função de identificação e decorrente segurança jurídica sejam mantidas, mas também, talvez ainda mais importante, que sejam garantidos os inerentes direitos da personalidade.
Sendo assim, contata-se que vedar a possibilidade do transexual ter sua personalidade integralmente reconhecida, através da adequação de seu nome civil, equivale, por consequência, afronta a garantias constitucionais como o direito à cidadania, dignidade, opção sexual e não discriminação; além, claro, de impedir sua inserção social e revelar visível afronta aos direitos da personalidade.
Referências
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